quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Knock-out científico















O Nobel da Medicina e Fisiologia de 2007 foi atribuído a Mário Capecchi, Martin Evans e Oliver Smithies pelos trabalhos que conduziram a uma das técnicas mais bem sucedidas da investigação genética: a introdução de alterações genéticas específicas no genoma de um organismo, recorrendo a células estaminais. A ferramenta desenvolvida por estes biólogos (um geneticista, um embriologista e um bioquímico) designa-se por tecnologia ‘knock-out’, porque corresponde à possibilidade de silenciar um único gene do genoma: e precisamente aquele que pretendemos. É o surpreendente grau de precisão desta técnica que a tornou tão famosa e útil.

Até hoje mais de 10 mil genes de ratinhos já foram silenciados (knocked out). Espera-se que dentro de poucos anos haja ratinhos com uma única mutação em cada um dos genes relevantes para estudos biomédicos.

A ideia que Capecchi e Smithies tiveram independentemente foi considerada tão irreal na época, que as agências de financiamento de investigação se recusaram a financiar os seus projectos. Eles pretendiam simplesmente introduzir uma sequência genética específica num local bem preciso de um cromossoma de um animal com núcleo diferenciado (eucariota), como os vertebrados. Foi graças a uma maquinaria existente nas células sexuais – a recombinação homóloga que permite a troca de segmentos de DNA entre os cromossomas homólogos que a técnica se tornou possível. É possível recorrer a DNA de um retrovírus como vector para a introdução da sequência pretendida: uma mutação que silencia um determinado gene. Isso tem como consequência que se pode observar o desenvolvimento desse animal designado ‘knock-out’ e compará-lo com o desenvolvimento de um animal normal. Esta técnica tem sido muito útil para perceber o surgimento de determinadas doenças ou malformações durante o desenvolvimento embrionário de um ratinho – o que permite rápida extrapolação para a nossa espécie.

Ter a possibilidade de silenciar um único gene mantendo toda a restante informação e maquinaria a funcionar normalmente permite um grau de precisão nas manipulações experimentais - é tão extraordinário -, que nem os comités científicos de há trinta anos consideravam uma ideia razoável.

O que faz com que uma fêmea de ratinho exerça os seus cuidados parentais nos seus filhotes? Uma fêmea normal limpa, junta e aquece os seus filhotes. Mas, uma fêmea com o gene fosB knockout não realiza nenhum destes comportamentos e abandona a sua ninhada. Este gene, que é activado muito cedo no processo embrionário, tem uma acção específica numa região do cérebro designada hipotálamo que está implicado no comportamento parental.

Outros ratinhos foram tornados associais quando se colocou knockout o gene Oxt responsável pela produção de ocitocina, uma importante hormona cerebral envolvida no comportamento social e sexual. Na nossa espécie é ainda responsável pela regulação da produção de leite e pelas contracções uterinas durante o parto.

Os mutantes com Oxt silenciado não produzem ocitocina e exibem, em consequência, uma estranha forma de amnésia social. O reconhecimento social em ratinhos ocorre principalmente pelo olfacto: cada indivíduo tem um cheiro próprio que é memorizado pelos conspecíficos, como nós memorizamos uma face (somos uns animais mais dependentes do canal visual). Num primeiro encontro com outro animal há um período relativamente longo em que se cheiram. Nas vezes subsequentes em que se encontram, os tempos de cheiro diminuem rapidamente porque o animal identifica rapidamente o seu visitante. Mas, os ratinhos com o Oxt knockout continuam a gastar sempre o mesmo tempo a cheirar o outro. Isto é, não memorizam os odores dos outros animais, como seria normal.

A utilização da técnica knockout em genes irá sem duvidar ajudar-nos a elucidar muitos dos intrincados processos de regulação e controlo do comportamento de seres complexos como os ratinhos, cuja maquinaria é muito semelhante à nossa.

11 comentários:

Anónimo disse...

Maquinaria? Estranho sentimento me invade! Não, não o consigo descrever, a não ser recordando o belíssimo poema de Walter von der Vogelweide (séc. XIV) que ontem li com os meus alunos numa aula - ver também a ilustração associada ao poema aqui: http://de.wikipedia.org/wiki/Walther_von_der_Vogelweide:


Ich saz ûf eime steine
dô dahte ich bein mit beine,
dar ûf satzt ich mîn ellenbogen;
ich hete in mîne hant gesmogen
daz kinne und ein mîn wange.
dô dâhte ich mir vil ange,
wie man zer welte solte leben.

Esta tradução é relativamente livre, e feita a correr, só para vocês entenderem o essencial:

«Eu estava sentado numa pedra
com uma perna sobre a outra
e o cotovelo por cima.
Na minha mão aconcheguei
o queixo e uma das bochechas.
Pensava, de coração apertado,
em como se deve viver neste mundo.»

O progresso científico há-de um dia acabar por descobrir o gene que permitirá desactivar tais sentimentos incómodos em humanos. Actualmente já se consegue muito com a química, também. Mas a inovação não pára.

Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Estes cientistas mereciam a cadeia não prémios pelo seu trabalho pecaminoso e que escarnece da vontade divina.

Divulgar o pecado é também pecado e este blog continua a sua senda anti-religião disfarçada de ciência. O único conhecimento necessário para acabar com o sofrimento humano é o conhecimento de Deus como Criador, Sustentador e Redentor do Universo, não é o conhecimento científico.

A morte e o sofrimento são, no relato bíblico, consequência do pecado e da maldição que Deus fez impender sobre toda a Criação, agravada, certamente, pelo dilúvio, que representou a morte de muitas espécies vegetais e a súbita alteração climática da Terra.

Por outro lado, a Bíblia diz que nos novos céus e nova Terra o leão e o cordeiro pastarão juntos, não havendo morte, sofrimento ou dano algum.

Para o relato Bíblico, a morte não era desejada por Deus. No entanto, Deus retirou parte do seu poder sustentador do Universo e da Terra para dar aos seres humanos uma razão para se virarem de novo para Ele.

Com pecado não pode existir comunhão eterna com um Deus santo e justo.

Se Deus não tivesse amaldiçoado a natureza e introduzido a morte no mundo como consequência do pecado, este existiria para sempre.

Por outro lado, nós não teríamos uma razão para abandonar o pecado, porque não teriámos consciência da sua gravidade aos olhos de Deus e das consequências eternas daí decorrentes.

É evidente que, uma vez havendo pecado no mundo, Deus não iria ficar indiferente.

Deus promete pôr fim a este estado de coisas e dar a vida eterna àqueles que confessarem os seus pecados e aceitarem a salvação através do seu Filho Jesus Cristo.

Pouco inteligente não foi Deus ter demonstrado o seu ódio ao pecado diante de toda a Criação.

Pouco inteligente é não aceitar a salvação que Deus dá gratuitamente a todos os que crêrem no Seu Filho, que levou sobre si as nossas culpas quando morreu na cruz há dois mil anos.

Pouco inteligente é não aceitar aquele que ressuscitou com um corpo incorruptível, e que promete ressuscitar com o mesmo tipo de corpo todos os que confiarem nele.

O Apóstolo Paulo, na sua carta aos Romanos, diz:

"Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuíto de Deus é a vida eterna, por Cristo Jesus nosso Senhor."

Quem é a maior autoridade em matéria de Bíblia? Jesus Cristo, que é o Criador (João 1:1.4) ou os cientistas , que são as criaturas e não existiam quando Deus criou o mundo nem conseguem compreender tudo o que Deus criou do princípio até ao fim?

Anónimo disse...

Bom, é só uma parte do poema, claro, a mais conhecida. Mas tão bonita e universal que não resisti!
Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Os ratinhos são realmente muito complexos. Na verdade, não existe vida simples. Toda a vida é extremamente complexa, o que coloca problemas inultrapassáveis ao darwinismo naturalista.

Mas dizer que os ratinhos são tão complexos como nós, é um pouco exagerado. As diferenças que nos separam são mais importantes do que as semelhanças que nos unem.

Será que alguém viu um ratinho a declamar um poema ou a compor uma música ou a construir uma obra de arquitectura? Será que um ratinho compreenderia uma frase de um livro? Será que ele pode criar e desenvolver dispositivos tecnológicos?

Só o ser humano faz isso, porque foi feito à imagem e semelhança de Deus.

Alguns dizem que o cérebro humano é a máquina mais complexa do Universo. E com razão. Se Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança é só lógico que tenha feito um enorme investimento tecnológico na criação do seu cérebro.

Os ratinhos, como todos os animais, fazem coisas espantosas por institinto, isto é, porque as mesmas se encontram programadas no seu software. Ou seja, eles estão cheios de informação, que executam com precisão.

O ser humano, diferentemente, foi feito à imagem de um Criador moral, racional, comunicativo e criativo.

Anónimo disse...

Não estou contra a ciência. Acho que ela é precisa. A racionalidade científica deve ser pensada com racionalidade, e não simplesmente propagandeada, sem mais justificações.
Contrariamente ao que muitos pensam, um poema é um acto da razão humana, e a meu ver é tanto melhor quanto menos sentimento derramar.
É esse o caso deste poema: reparem na forma meticulosa como se descreve a posição física do eu lírico. Tanta atenção (5 versos!) puramente descritiva ao corpo, e à posição relativa das partes desse mesmo corpo, enquanto o eu lírico pensa e, em simultâneo, se observa a si mesmo a pensar. É magnífico.
Já agora, tenho também muitos sentimentos relativamente aos fundamentalismos religiosos, mas muito pouco tempo para os expor aqui, ou para encontrar um poema que me ajude a percebê-los (porque transmiti-los não sei sequer se é possível).
Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Cientistas da univ de Ulm (Alemanha) e do Inst. de Investigação Económica de Zurique identificaram as estruturas cerebrais responsaveis pelo cumprimento das normas sociais. Publicaram os resultados na revista Neuron.
Lembrei-me da Laranja Mecânica de Stanley Kubrik (197?) e do Admiravel Mundo Novo de Aldus Huxley de 1931. E fiquei com este "feeling" de que qt mais conheço das pessoa mais gosto da ciência. "i can't help it" como diz o Eric Clapton em Forever Man.

Paulo Gama Mota disse...

Cara Adelaide,

Maquinaria é uma analogia, uma simplificação. Não é a maquinaria de um carro, ou de um telemóvel. Mas é conhecida em grande detalhe. Sabemos que a testosterona é fundamental na reprodução e no comportamento sexual e que ao mesmo tempo é imunossupressora. Sabemos como e onde actua. E grande parte do que sabemos sobre nós ... aprendemos com outros animais. Porquê? Porque funcionam da mesma maneira.

Nós parecemos muito diferentes - e somos realmente muito diferentes em certos aspectos (estamos a escrever à frente de um computador não estamos - quantos imaginavam isto há 50 anos?) - mas somos igualmente muito parecidos noutros. A ocitocina ou a testosterona funcionam basicamente do mesmo modo em nós ou num ratinho - e isso significa que induzem comportamentos semelhantes.

Alguns de nós gostam de saber. Outros preferem ignorar; parecem mesmo preferir que não se saiba por recearem que qualquer novidade possa alterar o seu quadro conceptual. Mas, quando ficam doentes exasperam-se se os médicos não sabem ou não conseguem resolver o problema.

Não os ratinhos não actuam por instinto. Sim, têm programas genéticos para se comportarem (como nós aliás), mas também são extremamente eficazes a aprender e a lidar com a nova informação para resolverem os problemas com que se confrontam - aqueilo a que temos a mania de chamar 'pensar'.

Paulo Gama Mota

Paulo Gama Mota disse...

Caro Anónimo de serviço

quis a vontade divina que houvesse cientistas!
Ou não!


PGM

Anónimo disse...

Obrigado, Paulo!
Sim, � uma simplifica�o da realidade, claro. Eu estava ciente disso. E isso acontece em qualquer ci�ncia que necessite de ser comunicada. Existem met�foras boas e outras m�s, e tamb�m sobre isso se faz ci�ncia, ou seja: tamb�m h� cientistas que preferem n�o ignorar que o discurso sobre a ci�ncia � todo ele mediado pela linguagem e esteja atento, portanto (na medida do poss�vel), �s met�foras usadas.
Abra�o,
Adelaide Chichorro Ferreira

maga.pata.logika disse...

Paulo Gama Mota

Folgo a sua fé num criador, mas há uma explicação mais simples para o anónimo: é um ateu infiltrado que largou aquelas barbaridades para fazer crentes como eu dar mau aspecto! É que crente não é o mesmo que radical nem totó!

Pela lógica, portanto, o anónimo é um ateu com insónias. Depois dá o que dá: lê a Bíblia com maus fígados e vinga-se destilando veneno!

Magda Sá

carolus augustus lusitanus disse...

Mas quando acabará este nevoeiro intelectual de confundir ratos (embora os haja) com seres humanos? (Ou se quiserem, mais especificamente, é uma palermice (para não usar «falácia», tão ao gosto da «omnisciência»...) transpor os resultados das experiências laboratoriais com animais para o ser humano -, como se se tratasse de uma co-relação matemático/estatística!...).

Porque o (péssimo) resultado dessa «associação» está à vista quando se afirma dogmaticamente que o homem descende (evolutivamente) do macaco - já alguma vez tentaram responder à questão inversa: não será o macaco uma degenerescência (involutiva, portanto) do ser humano -,hã?

«Espera-se que os ratinhos...» (e as ratinhas...)... sempre à espera! não se sabe bem de quê, nem para quê, mas enfim... é este o paradigma de formatação da mentalidade moderna (e pós-moderna) que tudo tenta explicar -, infelizmente assente em premissas erradas. (Esta questão levar-nos-ia à discussão sobre as bases do pensamento moderno e à grande mentira que a vasta maioria parece viver e da qual apenas uns quantos se conseguem aperceber (da falsa abordagem à vida e à existência) e muito poucos conseguem discernir).

DUZENTOS ANOS DE AMOR

Um dia de manhã, cheguei à porta da casa da Senhora de Rênal. Temeroso e de alma semimorta, deparei com seu rosto angelical. O seu modo...