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sexta-feira, 5 de julho de 2019

FRONTEIRAS



A vida é um diálogo entre fronteiras!

A vida no planeta Terra só terá surgido quando se formou uma fronteira, constituída por uma membrana de natureza lipídica primordial, que separou, de forma mais ou menos permeável e selectiva, um espaço interior e o meio exterior envolvente. 

Passados talvez um pouco mais de 3,5 mil milhões de anos, a funcionalidade bioquímica dessa membrana, dessa fronteira que permite diálogos entre o interior celular e o espaço extracelular, continua a ser decisiva para a viabilidade da vida. É através dela que entram e saem substâncias, tanto nutrientes como a glicose, como “comunicadores” como as hormonas e neurotransmissores, por exemplo. Nas células do sistema nervoso, nos neurónios, é através da fronteira membranar dos seus axónios que os impulsos nervosos se propagam permitindo, por exemplo, o pensamento. É na fronteira que o sonho explora a existência!

Num nível fisiológico seguinte encontram-se os órgãos. Estes são formados por tipos específicos de células, que os definem e caracterizam. A fronteira dos órgãos é essencial para a sua função bem definida, para a sua integridade, forma, suporte, etc. E essa fronteira também é funcional constituindo, em alguns casos, como seja o cérebro (com a fronteira hematoencefálica), uma barreira protectiva contra a entrada de potenciais substâncias nocivas. E é através das suas fronteiras que os órgãos interagem homeostaticamente com o restante organismo de que fazem parte.

No nosso caso, assim como em muitos outros seres vivos, o nosso corpo possui uma fronteira cuja integridade e perfeita funcionalidade é essencial para a nossa vida: a pele. Barreira protectora, por exemplo, contra microorganismos. Fronteira que também permite a excreção de substâncias através do suor, que nos protege das radiações solares e outros agentes nocivos, mas que também participa activamente no controle da temperatura corporal. É uma fronteira que permite e potencia o tacto, esse sentido tão importante para a humanidade com sentido.

Poderíamos discorrer sem fim sobre as fronteiras geofísicas e/ou administrativas que delimitam as freguesias, os concelhos, os distritos, os países, os continentes, os mares. Essas fronteiras delimitam espaços distintos e elas próprias estão repletas de conteúdos históricos, culturais, políticos, científicos e tecnológicos. 

Mas pensemos no planeta Terra como um todo e na importância para a vida dessa fronteira feita de atmosfera. Sem ela, a vida não seria possível tal qual a conhecemos. E a própria dinâmica geológica seria diferente na ausência da atmosfera. O invólucro maioritariamente gasoso que caracteriza essa fronteira condicionou a evolução da vida na Terra, permitindo-a, ao impedir que a maioria das radiações a ela nocivas, como sejam as radiações ultravioleta e os raios cósmicos, atinjam a superfície terrestre. Essa fronteira também está envolvida na dinâmica do ciclo da água, substância ubíqua à vida, e na regulação da temperatura da superfície do planeta. A sua história dinâmica alberga as preocupantes alterações climáticas e o seu impacto decisivo para a vida. É a fronteira que nos separa do nosso sentido cósmico.

E uma última fronteira, a heliopausa, que delimita o sistema solar, que separa a heliosfera (a região imensa de espaço sob a influência do vento solar) do resto do universo. Foi atravessada há alguns anos pelas sondas Voyager que continuam as suas viagens cósmicas em direcção a outras estrelas, outros mundos, repletos de fronteiras a explorar.

Por fim uma questão cosmológica, a de se o universo em que existimos, e que está em expansão acelerada, terá uma fronteira. Se esta existe, o que é que existirá para além dela?

António Piedade
Crónica primeiramente publicada na imprensa regional.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

People, we have a problem

Estão neste momento 6 mulheres fechadas num simulador de viagem à Lua, na Academia de Ciências da Rússia. Têm entre 24 e 35 anos, todas com experiência em investigação científica, desde Medicina a Biofísica. Foram escolhidas entre dezenas de voluntárias para testar a viagem que a Rússia pretende fazer à Lua em 2029, e assim estudarem a forma como uma equipa exclusivamente feminina lida com os constrangimentos técnicos, científicos e emocionais de uma missão de ida e volta ao nosso satélite natural.


Apesar da imprensa portuguesa ter ignorado olimpicamente esta experiência, os jornalistas do resto do mundo ficaram interessados na façanha. O Guardian lembra que os russos foram os primeiros a mandar uma mulher para o Espaço, e que esta equipa irá levar a cabo 30 experiências científicas nos 8 dias da missão simulada, sublinhando o interesse dos aspectos psicológicos de uma combinação ainda não testada. Já o Independent e o Daily Life, entre outros, fazem manchete não com a missão mas sim com as perguntas que os jornalistas fizeram durante a conferência de imprensa. Parece que mais interessante que a sua experiência científica, competências técnicas, ambições ou aspirações, é saber como é que as mulheres pensam conseguir sobreviver tanto tempo sem maquilhagem, estar com homens ou lavar o cabelo. Até o director do Instituto, Igor Ushakov, não resistiu a fazer uma piada desejando ausência de conflitos entre os membros da equipa "ainda que se saiba que é difícil a convivência entre duas donas de casa na mesma cozinha".  Não consta que tenham feito perguntas semelhantes ao grupo de 6 homens que fez uma simulação parecida em 2010, mas que durou 520 dias já que Marte é um bocadinho mais longe que a Lua. E é pena, seria interessante saber como pensavam eles manter a nave limpa e arrumada, organizar as refeições, sobreviver sem after shave ou se levavam alguma revista marota às escondidas na mochila.

No mês passado conheci Alice Bowman, Mission Operations Manager da Missão New Horizons da NASA, que nos deu a conhecer Plutão (e de caminho mais umas quantas coisas). Quando conversámos um bocadinho no fim da sua palestra quis saber se lhe perguntavam muitas vezes sobre ser mulher naquele trabalho. Respondeu-me que isso nunca foi uma questão para si, que fez o melhor trabalho possível em todas as equipas em que esteve e nunca ninguém sublinhou o facto dela ser mulher. Apenas quando começou a ter contacto com a imprensa no fim dos 9 anos que durou a missão se deu conta que o seu género podia ter interesse noticioso. Infelizmente estas 6 investigadoras não poderão dizer o mesmo.


"Somos bonitas mesmo sem maquilhagem", "vamos ali para trabalhar, não para estar a pensar em homens", foram algumas das respostas que as investigadoras se viram obrigadas a dar perante a insistência dos jornalistas. 

Portugal é um caso raro no panorama mundial, com 40% dos cientistas mulheres e a chegar aos 50% nas engenharias. Segundo o relatório She Figures, em toda a Europa as mulheres estão a ganhar terreno mas continuam a ser uma minoria dos trabalhadores da Ciência, em especial nos lugares de chefia e liderança. A União Europeia está preocupada com o assunto, e tem lançado programas para estimular a presença feminina na Ciência e a tentar captar os talentos de outra forma perdidos, numa discriminação positiva das mulheres. Às vezes sai o tiro pela culatra, como no video Science, it's a girl thing, que parecia defender que a Ciência tem de ser sexy, sem cabelos fora do sítio, com verniz impecável e maquilhagem ton sur ton adequada para poder interessar às raparigas que interessam. A mensagem deve ter chegado aos jornalistas que apareceram na conferência de imprensa da missão russa.

É trabalho dos comunicadores de ciência, como eu, dar cabo dos estereótipos que não correspondem à realidade. Sem perder a capacidade de apreciar uma boa piada quando a encontramos.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

OS MARCIANOS SOMOS NÓS

Texto publicado hoje no SOL:

A ciência e a tecnologia são irmãs inseparáveis. Se a tecnologia é filha da ciência, a ciência é impulsionada pela tecnologia. A ciência é, por exemplo, o conhecimento da lei da gravitação universal e das leis da aerodinâmica, que ajudam a explicar o movimento na atmosfera da Terra ou de qualquer outro planeta. Tecnologia é, sabendo-as, colocar um carro de quase uma tonelada numa cratera de Marte, depois de uma impecável manobra de aterragem (ou amartagem?) totalmente automática.Também eu, logo que acordei a 6 de Agosto, estava curiosioso em saber se o robô Curiosity, lançado pela NASA a 26 de Novembro último, tinha chegado com segurança ao seu destino, na cratera Gale de Marte, onde vai procurar vestígios de vida. Porque as leis que conhecemos da mecânica, tanto gravitacional como dos fluidos, estão certas e porque, conhecendo-as, e de posse de várias outras leis da Natureza, como as do electromagnetismo e da mecânica quântica que explicam a electrónica, construímos mais um engenho para chegar ao planeta vermelho. Invadimos, mais uma vez, Marte com sucesso, não temendo a praga que parecia vir do facto de, das 38 missões a Marte, metade terem falhado. O robô Opportunity, em Marte desde 2004, já tem companhia, o Curiosity.

Não sabemos se existiu ou se existe vida em Marte. Os instrumentos do novo robô vão procurá-la e, passados alguns minutos, logo teremos notícias na Terra. Mas um dia havemos de ir a Marte, levando connosco a vida que lá eventualmente falta. Este é o único planeta conhecido, além do nosso, que tem condições para ser habitável pelo homem. Essas condições poderão ser melhoradas com o auxílio da tecnologia. Demorará, mas atrevo-me a prever: será tão ou mais confortável viver em Marte do que como aqui.

O escritor norte-americano Ray Bradbury, autor das Crónicas Marcianas, morreu em Junho passado sem ter tido oportunidade de assistir ao êxito do Curiosity. Mas há três anos, já de cadeira de rodas, visitou o Laboratório da NASA em Pasadena, que controla o Opportunity e o Curiosity. Ouviu os cientistas e engenheiros dizerem-lhe que a exploração marciana não teria sido possível sem a inspiração dada pelos seus livros. Foi Bradbury que escreveu que os marcianos somos nós. Mas só quando lá chegarmos...

Carlos Fiolhais

domingo, 4 de dezembro de 2011

O nosso homem em estúdio

"(...) Existiram muitos momentos em que nada se disse,
porque os astronautas foram dormir e tive que esperar
que eles acordassem. (...) tinha levado muita literatura,
nomeadamente um artigo fabuloso, do Norman Mailer,
que já falava das perspectivas da chegada do Homem à Lua."
José Mensurado.


De 20 para 21 de Julho de 1969, José Mensurado, o tranquilo jornalista da Rádio e Televisão Portuguesa, que havia acompanhado e noticiado andanças das várias Apollo pelo espaço, foi o nosso homem em estúdio para, via CBS, dar conta da chegada à Lua, da saída de Neil Armstrong da nave e do primeiro passo que deu em solo não terrestre.

Antes de todos os portugueses, foi ele quem, pelos auscultadores, o ouviu dizer, em voz pausada, mas muito segura: “Um pequeno passo para o homem, mas um salto gigantesto para a humanidade”.

Emocionou-se com tudo isso, disse mais tarde, na sua sobriedade. Emocionou-se, sobretudo, quando viu a Terra do espaço. E disse também que “foi uma honra” ter acompanhado tudo isso, e ter “a sensação de que estava a entrar, embora como jornalista, para protagonista da história”.

Dessa emissão em directo, que durou 18 horas, onde a ciência, a tecnologia foi acompanhada de literatura não existe registo em arquivo da Televisão. Resta a memória que José Mensurado nos legou (que se pode ver, por exemplo aqui) e a memória do próprio José Mensurado.

Sítios consultados:
http://www.rtp.pt/web/historiartp/1960/homem_lua.htm
http://www.casadaimprensa.pt/?p=1501#more-1501
http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=33400&op=all

sábado, 12 de junho de 2010

O espaço essencial

No post É esta a visão que a Parque Escolar tem para o ensino em Portugal, questionei os pressupostos de ensino e de aprendizagem subjacentes a algumas decisões arquitectónicas para os espaços escolares tomadas pela empresa Parque Escolar; não questionei, naturalmente, a relevância da arquitectura no delineamento desses espaços, que entendo ser óbvia.

O nosso leitor José Nascimento, arquitecto de profissão, enviou-nos um comentário do qual reproduzo algumas linhas pelo facto de denotarem pressupostos de ensino e de aprendizagem distintos dos que guiam essa empresa e que, a serem adoptados, teriam aplicações também distintas daquelas que prevemos quando entrarmos nas escolas intervencionadas.
No meu caso, às justificações que a Parque Escolar apresentou para a escolha de propostas de intervenção adiciono as que agora deram origem ao seu post.

Falo por experiência própria de aluno que fui e de arquitecto que sou nas poucas intervenções que tenho tido na área, e que se resumem no essencial aos seguintes pontos:
1- a educação resulta de um diálogo, entre o professor e o(s) aluno(s), como tal o essencial é o espaço em que esse diálogo acontece (sala de aula) e para isso acontecer não são necessários grandes investimentos materiais. Basta silêncio e paz;
2- fora da sala de aula, a escola é um espaço de prática social entre os alunos e entre a comunidade em que se insere. Também para isso não são essenciais grandes teorias de espaço ou pedagogia. Basta um limite físico claro para todos, que indique onde começa e acaba a escola.

Conclusão cínica: a actuação da Parque Escolar é tão má que dentro em breve será necessário corrigi-lhe os erros. E cá estaremos todos para os pagar. Sempre.

domingo, 29 de novembro de 2009

ATLANTIS STS-129: uma das últimas viagens do Space Shuttle

O Space Shuttle é uma fabulosa realização de engenharia e permitiu, entre muitas outras coisas, o desenvolvimento da ISS (International Space Station). A NASA vai retirar estes veículos de serviço em 2010, tendo adoptado soluções mais baratas para a realização das missões entregues ao vaivém e das novas novas missões que se aproximam como o retorno à LUA. A missão STS-129, realizada pelo vaivém Atlantis, demorou 11 dias e terminou com a aterragem do Atlantis na sexta-feira passada no Kennedy Space Center.

A NASA realizou uma cobertura mediática desta missão como forma de mostrar os pormenores de lançamento (vejam pelo menos até ao minuto 3:16, altura em que têm uma perspectiva do piloto do shuttle vendo parte do nariz do vaivém e tendo a sensação de velocidade), entrada em órbita, processo de ligação à ISS (muito interessante a partir do minuto 9:00), operação dos vários equipamentos a bordo, realização de missões, vida no espaço, separação da ISS e retorno à terra (minuto 49:00). O vídeo foi recentemente tornado público.

Vale a pena ver: são 59 minutos de puro prazer! Cheio de detalhes e de perspectivas inéditas, este vídeo é não só instrutivo como fascinante.

A criatividade humana é verdadeiramente admirável! O que conseguimos fazer com o conhecimento que adquirimos é fabuloso. Se virmos isto em perspectiva, desde os primórdios da humanidade, é impressionante o caminho que percorremos em conjunto. E esse caminho é uma enorme fonte de esperança no nosso futuro colectivo.

:-)

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

UM MAPA DE ESTRADAS PARA O ESPAÇO


A Planetary Society, sociedade fundada por Carl Sagan, está a aproveitar este momento de mudança de Presidente no Estados Unidos para promover um novo alento na ciência e na exploração espacial. Este é o teor da declaração que a Sociedade tem no seu sítio para recolha de assinaturas:

The current U.S. Administration’s Vision for Space Exploration has been fatally compromised. But with the new Administration, the U.S. has an opportunity to embrace a new Roadmap to Space: one that will galvanize public support, reach out internationally and will be both politically and financially sustainable for years to come.

I support these Principles of the Roadmap to Space and have endorsed them below.

* Human exploration of Mars should be a primary goal. Mars poses extraordinary scientific opportunities, and offers tremendous potential benefits...including a long-term abode for humankind. Mars also commands public interest: it can unify and electrify mass public enthusiasm. The Moon is an international stepping stone to Mars.

* The United States’ human space flight program is an enduring symbol of global leadership, and an incomparable engine for technological innovation. It should be continued, but with robust international partnerships reflecting its importance to humanity everywhere.

* Science and exploration are inseparable. They complement and benefit each other, and one should not be sacrificed for the other. Robotic exploration is no less vital than human exploration: both are part of the great missions of discovery driven by our human need to reach out and explore the unknown.

* NASA’s mission—including the development of human space flight capabilities—needs to be realistic in scope and time. An arbitrary and unrealistic schedule in the current program has resulted in massive funding shortfalls, and the sacrifice of Earth and space sciences and other programs.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O PAI DO SPUTNIK


Minha crónica do último "Sol". Na foto Yuri Gagarine com Sergei Korolev:

Quando se comemoram os 50 anos do início da era espacial, que ocorreu com o lançamento do primeiro satélite, é justo lembrar o “pai do Sputnik”, o ucraniano Sergei Pavlovich Korolev.

Em contraste com o engenheiro alemão (depois naturalizado norte-americano) Wernher von Braun, o “pai do Saturno V” e portanto o “pai da viagem à Lua”, o engenheiro Korolev não é muito conhecido. Muita gente sabe que von Braun construiu durante a Segunda Guerra Mundial as bombas voadoras V2 que, do norte da Alemanha, espalharam o terror na Inglaterra. E sabe que foi preso pelas tropas norte-americanas e levado à força para a América, onde veio a desenvolver o poderoso foguetão que levava a nave Apollo na ponta.

Mas pouca gente conhece a biografia de Korolev. Pouca gente sabe que, antes de dirigir o programa espacial soviético, foi apanhado numa purga de Estaline e passou a guerra internado primeiro no Gulag da Sibéria e depois num campo de prisioneiros cujo trabalho era fazer aviões. Um dos seus colegas na prisão foi outro génio da aviação – Tupolev - de nome bem conhecido. E pouca gente sabe que a ideia da ida do homem à Lua pertenceu não a von Braun nem ao Presidente Kennedy, mas sim a Korolev. Isso nunca foi assumido pelos soviéticos porque seria uma confissão de derrota depois das estrondosas vitórias de Korolev. O primeiro engenho a alunar tinha a foice e o martelo – foi a Luna 2 em 1959. E o primeiro homem no espaço foi o russo Yuri Gagarin, a bordo da Vostok em 1961. Contudo, a União Soviética não estava em condições, no final dos anos 60, de competir na corrida humana à Lua. Em 1969, nas vésperas da missão Apollo 11, von Braun ainda receava que, nesse tempo de guerra fria, houvesse uma surpresa de última hora do outro lado. Mas não houve.

Uma das razões para não ter havido foi a morte prematura do engenheiro-chefe. Korolev faleceu em 1966, no auge da sua carreira, durante uma operação de rotina. O Presidente Putin prestou-lhe homenagem no início deste ano, por ocasião do centenário do seu nascimento.

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Luzes do norte

Aurora Australis ou «southern lights», fotografada do vaivém espacial Discovery durante a missão STS-114 à Estação Espacial Internacional.

Todos os anos a Universidade de East Anglia, em Norwich, organiza uma palestra sobre religião e educação, normalmente um evento pouco concorrido. A palestra de 2005 foi a excepção, embora o convidado não fosse o bispo proeminente de outras ocasiões mas sim um ateu muito vocal, o escritor Philip Pullman. Pullman escreveu uma trilogia de culto, «His Dark Materials», supostamente uma fantasia para crianças, que vendeu milhões de exemplares apenas em Inglaterra e a sua prosa figura frequentemente nos jornais britânicos.

Comprei por acaso o Northern Lights, o primeiro livro da trilogia - cuja adaptação cinematográfica estreará em Dezembro - um livro que, como seria de esperar, me fascinou pelas alegorias que apresenta. E um livro que, igualmente como seria expectável, mereceu violentas críticas pela mesmissima razão, imediatamente denunciada como um ataque ao cristianismo.

Achei assim interessante que Rowan Williams, o Arcebispo de Cantuária, tenha conseguido ver que as críticas implícitas na trilogia de Pullman se dirigem não ao cristianismo propriamente dito mas sim ao fanatismo religioso, ao dogmatismo, à mistura política religião e concomitantes opressão e perseguição de «dissidentes». Rowan William propôs mesmo que «His Dark Materials» integrasse os curricula de educação religiosa nas escolas públicas inglesas. Uma conversa muito interessante entre Pullman e o arcebispo sobre religião na arte e literatura - e ensino - pode ser encontrada aqui.

Segui a prosa de Pullman quando este opinava vigorosamente contra a censura que Blair tentou introduzir a coberto de uma nova lei da blasfémia. Mas gosto especialmente do que Pullman tem a dizer sobre educação, nomeadamente no tema que é recorrente neste blog:

«O que receio e deploro no campo das «escolas de fé» é o seu desejo de fechar a argumentação e colocarem alguns assuntos acima de questões ou debate. É vital que seja claro para as mentes jovens o que é uma posição de fé e o que não é - para que, por exemplo, não sejam enganados por pessoas religiosas que dizem que a ciência é uma posição de fé que não difere do cristianismo. A ciência não é uma questão de fé e permite-se que demasiadas pessoas o digam, e que digam que a minha «crença» na evolução é algo na mesma linha da «crença» deles em milagres. O que precisamos nas escolas, na realidade, é de filosofia básica».

Aurora borealis ou «northern lights» sobre o Alasca. As auroras, quer as boreais quer as austrais, devem-se a partículas carregadas com origem no Sol, o plasma que conhecemos como vento solar. O escudo magnético da Terra deflecte a maior parte dessas partículas. As que são aprisionadas na magnetosfera aceleram ao longo das linhas de campo da Terra até atingirem uma região circular, na parte superior da atmosfera, denominada oval das auroras, ou annulus. No annulus as partículas colidem com os gases presentes, transferindo-lhes energia. Os gases excitados libertam este excesso de energia sob a forma de fotões, ou seja, emitem luz.

No passado, as auroras preencheram o léxico do imaginário mitológico dos que as observavam fascinados. Fascínio que permanece inalterado embora hoje consigamos explicar este fenómeno sem recurso a qualquer mitologia.

domingo, 8 de abril de 2007

ASTROS E SEXO



A Doutora Fiorella Terenzi é uma astrofísica italiana com um doutoramento pela Universidade de Milão que descobriu uma vocação artística juntamente com a científica. No Laboratório de Investigação se Som Computacional da Universidade da California - San Diego, nos EUA, conseguiu converter sinais de galáxias recolhidos por radiotelescópios em música que gravou em CD. No seu sítio pode aceder-se à sua música assim como a uma lista de toda a sua produção quer musical quer bibliográfica.

O seu livro "Heavenly Knowledge", com o subtítulo "An Astrophysicist seeks wisdom in the stars", publicado pela Avon Books de Nova Iorque em 1998 é muito engraçado. Não é comum um livro de divulgação científica ter o retrato do autor na capa, em meio corpo, mas este tem. Há o curioso pormenor do título de "Dr." anteceder o nome da autora. Ela é a bela e o mestre, aliás, mais do que isso, bela e doutora!

No livro a astronomia aparece muito "sexy", tal como a capa sugere. Escreve a Doutora no capítulo primeiro, intitulado "O Universo é uma bela mulher": "Sonho com uma cosmologia na qual o Universo é uma bela mulher". O capítulo 4 intitula-se "A vida sexual do Universo", onde ela escreve "É preciso que a imaginação dê alguns passos para aprender sobre o amor e o sexo a partir das estrelas." Mas a imaginação dela dá-os... Não, não é astrologia, ao contrário do que possa parecer... mas, como já alguém disse, uma espantosa mistura entre Madonna e Sagan.

A imaginação humana, tal como o Universo, não tem limites...

quarta-feira, 21 de março de 2007

JOAQUIM BARBOSA, DE BEJA



(Minha última crónica do "Sol")

Subir mais alto, para ficar mais perto das estrelas, sempre foi o sonho do homem. Do homem género humano, mas também do português comum como Joaquim Barbosa, de Beja. Sabemos, pelo anúncio televisivo, que este último conseguiu!

A proeza foi possibilitada por duas circunstâncias. Uma foi o alargamento das viagens espaciais, o chamado “turismo espacial”. Desde 2001 que se pode pagar um bilhete para subir mais alto. A excursão ainda não é para todos, só para quem tem posses. Mas quem pode pode: têm subido para o espaço pessoas como o gestor de investimentos Dennis Tito (dos EUA), o empresário de informática Mark Shuttleworth (da África do Sul), o empresário de electrónica Greg Olsen (dos EUA) e a empresária de telecomunicações Anousheh Ansari (do Irão). Pagaram cada um mais de 20 milhões de dólares pelo seu passeio na Estação Espacial Internacional, com uma ajuda dos russos para o transporte. É bem possível que surjam qualquer dia ofertas de voos suborbitais “low cost”. Nessa altura pessoas sem grandes posses como eu e o leitor poderão também voar alto.

Mas, pelo menos no anúncio, Joaquim Barbosa, de Beja, já voou. Vemo-lo até a acenar aos portugueses (a nós todos) no final do voo. E como é que ele conseguiu? Terá ele criado uma empresa de sucesso na Amareleja, por exemplo de células fotovoltaicas que aproveitam melhor o sol alentejano? Não. Ao contrário do português de Quinhentos que partia para a aventura do Cais de Belém, basta ao português de hoje entrar no quiosque e jogar. Joaquim simplesmente ganhou o Euromilhões. Ele é o português comum, o tal que joga no Euromilhões todas as semanas (somos de entre os povos europeus quem mais joga e, por causa disso, quem mais Jackpots ganha!). É o português comum que confia na sorte mais do que no saber, que confia no acaso mais do que no trabalho. Ele “fia-se na Virgem e não corre”. A Virgem hoje dá pelo nome de Jackpot e há, de facto, milagres estatísticos. Por alguma razão o Euromilhões é, entre nós, administrado pela Santa Casa.

SOBRE O GRANITO E A SUA ORIGEM, NUMA CONVERSA TERRA-A-TERRA.

Por A. Galopim de Carvalho Paisagem granítica na Serra da Gardunha. Já dissemos que não há um, mas sim, vários tipos de rochas a que o vulgo...