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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

a história química de uma raia eléctrica

Mais um episódio da história química de animais marinhos. Desta vez a raia eléctrica, que ajudou a descobrir a electricidade e contribuiu para o entendimento da transmissão dos impulsos nervosos nos animais, abrindo caminho ao desenvolvimento de medicamentos mais específicos e eficazes.


A raia eléctrica (Torpedo marmorata L.) possui orgãos eléctricos que podem dar um choque de mais de duzentos volts durante cerca de um segundo. Este peixe, assim como a enguia eléctrica e o peixe-gato eléctrico, desde sempre maravilharam os naturalistas e atraíram a atenção de médicos e cientistas. Os orgãos eléctricos destes peixes comportam-se como verdadeiras pilhas eléctricas com as quais estes animais podem atordoar as suas vítimas, mas só depois do final do século XVIII tal começou a ser entendido. O excêntrico Cavendish, ao construir um modelo da raia eléctrica com base numa garrafa de Leiden, que era na altura um objecto científico bem conhecido pelos choques eléctricos que dava, convenceu a comunidade científica de que a mordedura destes peixes era de natureza eléctrica. Mais tarde, a discussão entre Galvani e Volta sobre a existência da electricidade animal, conduziu Volta ao desenvolvimento da primeira pilha eléctrica. A pilha de Volta revelou-se um modelo muito melhor da raia eléctrica, com a vantagem de proporcionar uma corrente eléctrica contínua. Estava aberto o caminho aos desenvolvimentos científicos e tecnológicos que a electricidade nos trouxe. E tudo isso com a ajuda de uns peixes exóticos!

Mais recentemente, a raia eléctrica e os seus primos eléctricos revelaram ser um óptimo meio para estudar os mecanismos de transmissão dos impulsos nervosos nos animais. Os cientistas puderam fazer isso medindo as correntes eléctricas ao mesmo tempo que manipulavam células nervosas da raia eléctrica e mediam as concentrações dos iões no seu interior e exterior. Verificaram que o processo envolvia os iões sódio e potássio que circulavam para dentro e para fora das células nervosas através de canais com a ajuda de uma molécula chamada acetilcolina que estes peixes produzem em grande quantidade e para a qual têm muitos receptores. Os cientistas contaram também com a ajuda de venenos de outros peixes e cobras que usaram para bloquear a transmissão dos impulsos nervosos e assim estudar melhor o funcionamento e controlo destes impulso.

Só há pouco tempo foi possível perceber qual a estrutura tridimensional dos canais iónicos e entender melhor porque os canais de sódio e potássio são específicos para cada um destes iões e não permitem a passagem do outro ião.1 Para isso, os cientistas contaram com uma técnica muito poderosa para determinar a estrutura das moléculas: a difracção de raios x.2

Mas voltando à raia eléctrica: por que razão não dá esta choques em si mesma, pergunta o meu filho? Os peixes eléctricos controlam, através do seu sistema nervoso, o momento em que produzem a descarga eléctrica. São também muito sensíveis aos campos eléctricos que os rodeiam, controlando muito bem as descargas eléctricas que produzem. Os peixes eléctricos não dão choques em si mesmos porque as suas células produtoras de electricidade, assim como os órgãos que originam a descarga eléctrica, estão muito bem isolados do resto do seu corpo. Por outro lado, as suas vítimas recebem o choque eléctrico em todo o corpo, através da água. Assim, embora não dêem choques em si mesmos, os peixes eléctricos poderiam na prática dar choques uns aos outros, o que normalmente não fazem.

Referências
- The Shocking History of Electric Fishes: From Ancient Epochs to the Birth of Modern Neurophysiology, S. Finger e M. Piccolino (OUP, USA, 2011).
- Biochemistry, J. M. Berg, J. L. Tymoczko e L. Stryer (Freeman, USA, 2002).

Notas
1O sódio não passa no canal de potássio por, paradoxalmente, ser muito pequeno e assim não ser favorável, em relação à energia de solvatação, a energia de interacção deste com os resíduos moleculares do canal. Já o potássio não passa no canal do ião sódio por ser demasiado volumoso.

2A difracção de raios x está relacionada com as típicas radiografias apenas por usar radiação da região dos raios x. De facto, a imagem que a difracção de raios x permite obter das moléculas é conseguida de forma indirecta. Primeiro é preciso que as moléculas tenham sido cristalizadas. Em seguida, como num cristal as distâncias entre os átomos apresentam regularidades periódicas, aparecem padrões no espectro dos raios x difractados que, depois de analisados (actualmente usando programas de computador), revelam a estrutura tridimensional da molécula. Vale a pena o esforço, pois conhecer a estrutura e o funcionamento dos canais iónicos é muito importante para um melhor entendimento dos mecanismos de controlo da dor e do vício das drogas e se poderem desenvolver medicamentos mais específicos e eficazes. Apenas em 1998 foi obtida a estrutura dos canais de potássio por raios x (Prémio Nobel em 2003). Nos livros de bioquímica publicados até 2011 não aparecem estruturas tridimensionais do canal de sódio. De facto, só em Julho de 2011 foi publicado na Nature (The crystal structure of a voltage-gated sodium channel, Payandeh J, Scheuer T, Zheng N, Catterall WA, Nature. 2011, Jul 10) a estrutura obtida por difracção de raios x de um canal de sódio de uma bactéria, revelando os truques utilizados para a sua especificidade para o sódio.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

HAWKING SOBRE O ESPAÇO E SOBRE A CONSCIÊNCIA

Dado o interesse suscitado pela recente entrevista do astrofísico Stephen Hawking aos leitores da "Time", traduzi mais duas das dez respostas que deu, agora sobre o espaço e a consciência:

"-Pensa que a nossa civilização sobreviverá o suficiente para dar o salto para o espaço profundo?" (Harvey Bethea, Stone Mountain, Ga.)

- Penso que temos uma boa probabilidade de sobreviver o tempo suficiente para colonizar o sistema solar. No entanto, não há nenhum sítio tão adequado como a Terra, de modo que não é claro se sobreviveremos se a Terra ficasse impracticável para ser habitada. Para assegurar a nossa sobrevivência a longo prazo temos de chegar até às estrelas. Isso vai demorar muito mais tempo. Resta-nos desejar que consigamos lá chegar.

- O que julga que acontece à nossa consciência depois da morte? Elliot Giberson, Seattle

- Penso que o cérebro é essencialmente um computador e a consciência é como um programa de computador. Deixará de funcionará quando o computador for desligado. Teoricamente, poderia ser recriado num rede neuronal, m,as isso seria muito difícil, uma vez que exigiria todas as memórias de uma pessoa."

terça-feira, 19 de outubro de 2010

DAMÁSIO DIXIT


Mensagem recebida do nosso leitor Augusto Kuettner Magalhães:

Mais uma excelente entrevista na revista Pública, a António Damásio, o neurocientista português a ensinar, investigar e escrever nos Estados Unidos. Grande cientista português!

Sem medos e sem tabus estuda o cérebro, a consciência, as emoções, o eu.

Frases interessantes da entrevista:

- Gosto de escrever e gosto de conseguir explicar bem o que penso.

- Não há razão nenhuma para que os artigos científicos sejam escritos de forma maçadora, num mau estilo ou numa língua pouco trabalhada. Devem ser tão bem escritos como as peças literárias.

- …há também pessoas que suspeitam ou temem que tanta biologia, que uma abordagem tão com pletamente biológica do ser humanos, possa de algum modo reduzir a dignidade humana.

- … como é que nasce a mente, como é que nasce o eu e como é que se constrói a mente consciente?

- a criação da mente propriamente dita reside na capacidade que o cérebro tem de criar mapas neurais que vão dar origem a imagens.

- … são imagens que começam a ser geradas ao nível do tronco cerebral, numa região do cérebro que está naquilo que eu descrevo no livro como uma união, uma fusão praticamente completa com o corpo.

- Quando olhamos para o mar, não vemos apenas o azul do mar, sentimos que estamos a viver esse momento de percepção.

- A ínsula é um córtex com uma parte mais moderna e permite repetir com maior pormenor aquilo que já está no tronco cerebral em matéria de sentimentos.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Os desafios éticos das neurociências

Informação recebida pelo De Rerum Natura:

As neurociências estudam as várias abordagens científicas que nos levam a melhor compreender o nosso cérebro e a tratar as suas disfunções. A importante evolução que conheceram nestes últimos vinte anos levanta hoje novas questões. A bio-imagem funcional (tema mesa redonda 1), técnica importante para a investigação médica cuja precisão tem aumentado consideravelmente, vê cada vez mais a sua utilização em áreas judiciais, militares e sociais. O campo de aplicação da estimulação intra-cerebral (mesa redonda 2), técnica utilizada há mais de 20 anos no tratamento sintomático dum certo número de problemas neuropsiquiátricos estendeu-se recentemente de forma impressionante. Até onde a utilização da estimulação irá chegar ? Com a Psicofarmacologia (mesa redonda 3) o mesmo problema se coloca e a questão surge aqui também, até onde deve ir a terapia ?

Para responder a estas questões e a muitas outras, investigadores, médicos, jornalistas e políticos, franceses e portugueses, irão debater a 31 de Maio de 2010 (das 9h30 às 19h30), em Lisboa, no Auditório 2 da Fundação Calouste Gulbenkian.

Jean-Pierre Changeux
, neurobiólogo, Professor do Collège de France e Director do laboratório de Neurobiologia Molecular do Instituto Pasteur inaugurará o colóquio com uma conferência intitulada : A caminho de uma neurociência da pessoa humana.

A entrada é gratuita.

Inscrição e mais informação: celine.martins@diplomatie.gouv.fr / 21 393 91 69 .
Fundação Calouste GulbenkianAv. de Berna, 45A1067-001 Lisboa
Transportes públicos:
Metro: S. Sebastião (linhas Azul e Vermelha)Autocarros: 16, 718, 726, 742, 746, 56

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Descascar a fruta


O habitual destaque para a crónica de J.L. Pio de Abreu no "Destak" de hoje (na figura quadro de Caravaggio):

O que nos faz mexer com agrado não é o próprio prazer, mas sim o esforço feito para o obter. A chave deste paradoxo é uma molécula que dá pelo nome de dopamina. Ela liberta-se, nos nossos neurónios, sempre que as coisas estão a correr no sentido da expectativa desejada. A expectativa realizada reforça este caminho mas, por si, não é tão intensa como os passos dados até lá. O facto é que, obtido o desejo, cessa a libertação de dopamina.

Este pormenor explica porque é que os alpinistas se torturam para chegar ao cume de um monte, porque é que os toxicodependentes insistem na difícil obtenção da droga que, a partir de certo ponto, apenas lhes traz mais dores, ou porque é que o amor difícil é o que se vive mais intensamente. Mas ajuda-nos também a perceber que a melhor forma de fortalecer a vontade é adiar a recompensa.

Na sociedade do "pronto-a-vestir" as recompensas estão na montra e serão obtidas logo que se arranje o dinheiro suficiente. A dopamina vira-se então para o "vil metal", o único caminho para todos os prazeres. Onde está o prazer de cozinhar, de construir um brinquedo, de bordar uma colcha, de preparar um encontro? Tudo sucumbiu perante o tempo dedicado à obtenção do dinheiro.

Para aqueles que foram bem treinados na vontade de ganhar dinheiro, fica o golfe. Chegar ao primeiro, segundo e outros buracos, é incentivo suficiente para a expectativa de alcançar o décimo oitavo. Para os outros, resta o prazer de descascar a fruta antes de a comer. Pelo menos, enquanto os supermercados não a venderem já sem casca.

J.L. Pio Abreu

segunda-feira, 16 de março de 2009

Egas Moniz. 60 anos do Nobel - Colóquio no Museu da Ciência


Do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra recebemos esta informação:

Um conjunto notável de descobertas científicas realizadas por Egas Moniz valeram-lhe a atribuição do Prémio Nobel da Medicina há 60 anos. Este permanece o único Prémio Nobel português de ciência.

Aproveitando a efeméride, durante a Semana do Cérebro, o Centro de Neurociências e Biologia Celular, o Museu da Ciência da Universidade de Coimbra e o Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX convidaram neurocientistas, neurocirurgiões e historiadores para debaterem o que significam hoje as descobertas deste importante cientista português.

O colóquio "Egas Moniz. 60 anos do Nobel" no dia 18 de Março procura ajudar a conhecer e compreender a importância das decobertas, os meandros da sua investigação e ainda as consequências sociais da atribuição do Nobel.

O programa está em post anterior.

SOBRE O GRANITO E A SUA ORIGEM, NUMA CONVERSA TERRA-A-TERRA.

Por A. Galopim de Carvalho Paisagem granítica na Serra da Gardunha. Já dissemos que não há um, mas sim, vários tipos de rochas a que o vulgo...