sexta-feira, 24 de março de 2023

«ABERTO TODOS OS DIAS» DE JOÃO LUÍS BARRETO GUIMARÃES

 


 

Meu artigo no último As Artes entre as Letras:

O livro Aberto todos os dias (Quetzal) é o mais recente do médico-poeta portuense João Luís Barreto Guimarães, distinguido no final de 2022 com o prémio Pessoa. Confirma o que já se sabia: o autor é um dos mais originais poetas portugueses da actualidade. Os leitores que, levados pela leitura deste livro ou dos outros mais recentes (Mediterrâneo, 2016; Nómada, 2018; e Movimento, 2020, todos do prelo da Quetzal e todos não só premiados como objecto de traduções noutras línguas), queiram conhecer a obra integral de um autor que ensina poesia aos estudantes de Medicina tê-la-ão no volume de poesia reunida a sair muito em breve. O tema maior do seu discurso poético é o tempo. O poeta serve-se de momentos do quotidiano para, usando por vezes fina ironia, falar da condição humana no tempo que corre.

A capa - lindíssima -  do livro é a Vista de Delft do pintor holandês Johannes Vermeer. Pintou um panorama da sua cidade, segundo um físico que estudou o assunto, às 8 h da manhã do dia 3 de Setembro de 1659, deixando-nos uma obra prima que pode ser vista na Mauritiushuis em Haia (ou, por estes dias, na grande exposição de Vermeer no Rijksmuseum de Amesterdão). Trata-se de um quadro famoso na história da literatura pois o escritor francês Marcel Proust estava apaixonado por ele a ponto de o ter referido num dos volumes (A Fugitiva) de Em busca do tempo perdido. Ele conta aí um episódio autobiográfico: quando foi visitar uma exposição em Paris que exibia o referido quadro com o intuito de observar um pedaço de muro amarelo que lá aparece, sentiu-se indisposto. No romance, o narrador descreve um escritor nessa situação que coloca num dos pratos de uma balança esse bocadinho de muro, magnificamente pintado, e no outro prato toda a sua vida, e a seguir falece repentinamente. Esse pedacinho de muro pode representa os pormenores  da vida que Barreto Guimarães observa e transmuta em poesia tal como Vermeer transformou um muro em arte pura.

Escritos em tempos de Covid (a nuvem negra paira por cima do quadro!), os poemas deste livro celebram o regresso à vida «aberta todos os dias». Divide-se em quatro partes, retiradas de locuções latinas usadas no Renascimento como máximas: «locus amoenus», lugar ameno; «beatus iles», bendito aquele; «tempus fugit», o tempo voa; e «carpe diem», goza o dia. ´É precisamente nesta última arte que aparece o poema que dá o título ao livro. É bem representativo da poesia do cirurgião plástico que, sem pertencer a nenhuma escola literária, tem projectado no estrangeiro a poesia em português. Vale a pena ler o seu início:

«O mundo/ aberto lá fora. Difícil cansar-me dele/ O céu/ a entrar pela janela. O músculo do homem comum./ As laranjeiras de Córdova. Brindar com/ água da/ chuva. Os peixes do Nilo urinando na/ mesma água onde nadam. O vinho que fez/ um estágio nas caves do Douro/ e passou./ A lua a quem eu uivo cada noite/ (em segredo). Um relâmpago à janela:/ electrocardiograma/ de Deus (…).»

Chama deste logo a atenção os diferentes tamanhos dos versos que assinalam um ritmo variável, num poema que é afinal uma lista de coisas do mundo, erguidas, como o poema diz no final, «com a luva/ da linguagem.» A ironia sobre o vinho do Porto exemplifica o humor do poeta (o humor não passa de uma maneira de resistir ao tempo, isto é, de ignorar a morte). O uso de parêntesis, como na frase sobre o uivo é um dos seus artifícios (há mesmo um poema intitulado «entre parêntesis») ) E a metáfora do electrocardiograma é uma imagem forte, que serve para mostrar como é forte o coração de Deus.

Mais adiante no mesmo poema cruzam-se duas famosas estátuas: «(…) A Vitória de Samotrácia parecendo atrasada/ perguntando quelle haure est–il? à estátua da/ Vénus de Milo.» Não se deixar de sorrir, em primeiro lugar por as duas serem motes literárias – a Vitória de Samotrácia equivale a um automóvel de corrida para Filipo Marinetti no seu Manifesto Futurista e a Vénus de Milo equivale à Vénus de Milo para Álvaro de Campos; depois, porque nenhuma das Vénus pode usar relógio de pulso por não terem braços: e, finalmente, por as duas, feitas de puro mármore de Paros, serem perfeitamente intemporais. Como podem quaisquer estátuas gregas querer saber das horas?

O tempo é um dos grandes mistérios do mundo e, por isso, um tema cont8nuado da poesia. Na Segunda Lei da Termodinâmica, a única lei física que permite distinguir entre passado e futuro, aparece uma grandeza chamada entropia que cresce inexoravelmente nos sistemas isolados.  Charles P. Snow disse, na sua famosa conferência de 1959 sobre «as duas culturas», que não conhecer Shakespeare era tão grave como não conhecer a Segunda Lei. A entropia é uma medida da desordem, isto é, o futuro distingue-se do passado por ser mais desordenado. O poeta do Porto joga com o tema universal da desordem quando refere a desordem dos «barcos na Cantareira», das árvores de fruta no pomar ou dos amigos sentados a uma mesa, em três dos poemas. A tensão entre ordem e desordem está, de resto, omnipresente.

Para os seres humanos, o grande problema do tempo é não serem eternos. O tema da morte é eloquentemente tratado no poema «Comentário sobre os velhos» (o poeta é irónico: «Alguém tem de/ ir à frente. a ir alguém/ que vão/ os velhos (…) ) ou no poema «Auto-retrato (ao cinquenta e cinco anos)» (“A/ cada noite que passa os pés/ensaiam no leito/ a sua/ posição final. A estátua definitiva (…)».  A ironia aqui é o poeta dizer que acordamos, normalmente, com os pés em forma de V de vitória (ou em forma de W, se há dois corpos, acrescenta num parêntesis).

Um grande poeta a seguir com grande atenção. Ainda tem muito tempo pela frente…

"ENSAIOS SOBRE O DIA SEGUINTE" DE DAVID JUSTINO

 


Meu artigo no último JL:


O professor de Sociologia David Justino, que muitos conhecem devido à sua actividade política (foi deputado, ministro da Educação em 2002-2004, vice-presidente do PSD com Rui Rio), deu a sua «última lição», sobre «A Nova Era da Incerteza», na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa no passado dia 24 de Janeiro. Saiu também nessa altura um livro, que é uma reflexão alargada sobre os temas académicos que o têm ocupado ao longo de décadas: Ensaios sobre o Dia Seguinte (Edições 70). O subtítulo O Mundo, Portugal e a Educação reflecte as três partes em que a obra se divide: «O mundo incerto», «Portugal confinado» e «Educação sem utopia». É um volume indispensável para quem pretenda conhecer melhor os estados do mundo e do país.

Na primeira parte, a maior de todas, o autor discorre sobre grandes temas da actualidade mundial: o abrandamento da globalização, a incerteza que é a única coisa que por estes dias damos como certa, a «nova era dos extremos» (radicalismos, fundamentalismos, nacionalismos, etc., os opostos das posições moderadas de um social-democrata), o contínuo progresso das tecnologia e da inovação, a sociedade da informação e do conhecimento, os Estados e as democracias (liberais e iliberais) e a  emergência  de paises asiáticos como a China e a Índia. É um texto bem pensado e escrito, que nalguns pontos solicita o debate, como a tentativa de olhar o mundo pelas teorias dos ciclos económicos de Kondratieff e Braudel (segundo elas, estaríamos no fim de um ciclo).

Para mim, o capítulo mais interessante é o segundo, em que Portugal é visto, numa perspectiva de longa duração, por um historiador económico experiente (Justino doutorou-se em economia e sociologia históricas na Universidade Nova em 1987 com a tese, orientada por Vitorino Magalhães Godinho, Formação do Espaço Económico Nacional 1810-1914, que recebeu o prémio Gulbenkian de Ciência em 1987 e foi publicada pela Vega em 1988). O autor cita alguns académicos que tentaram explicar o atraso da sociedade portuguesa, por exemplo o sociólogo Adérito Sedas Nunes, que lhe chamou uma «sociedade dualista em evolução», para referir o contraste entre tradicionalismo e modernidade. Mas o dualismo em Portugal é também espacial, com a oposição entre litoral e interior, e também económico e social, com a desigualdade entre ricos (poucos) e pobres (muitos). Justino refere a chegada tardia da Revolução Industrial no século XIX, o que causou um desenvolvimento bem menor do que o dos países que então se industrializaram. E fala da dependência económica do estrangeiro, que hoje subsiste. A situação de periferia na Europa é naturalmente abordada.

O autor analisa os constrangimentos portuguesas, a começar pelo «definhar demográfico»: a demografia é um dos mais graves problemas nacionais, uma vez que a imigração está longe de compensar a queda de natalidade e a emigração, designadamente de jovens qualificados seduzidos por maiores salários. Seremos, neste canto da Europa, cada vez menos e cada vez mais velhos. À assimetria entre o literal e interior junta-se a assimetria causada pela polarização da população nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Retratando o crescimento económico através do PIB per capita ao longo de séculos, o gráfico da p. 250 mostra que o crescimento em Portugal foi anémico no século XIX (com um mínimo histórico nas vésperas da Revolução Liberal), que a Primeira República foi um tempo de estagnação económica e que só no Estado Novo se assistiu a continuado crescimento económico (com o alto preço da falta de liberdade), um crescimento que, embora com soluços, continuou após 1974, com a ajuda da Europa, até ao ano 2000. Porém. os últimos vinte anos têm sido de estagnação. No gráfico da p. 251, que compara os PIB per capita português e espanhol, podemos ver como, no século XVIII, estávamos muito acima, passando nos séculos XIX e XX a estar abaixo. E o gráfico da p. 260 mostra como Portugal, Espanha e outros países do Sul não conseguem competir no crescimento económico com os países europeus do Centro, do Norte e do Leste. David Justino fala, para resumir, de um «labirinto» de que não conseguimos sair. Comenta, não apenas como um académico, mas também como um politico desiludido: «Melhor seria que se colocasse a questão: onde e quando pretendemos chegar? O que precisamos de mobilizar e porfiar por o conseguir? O que é necessário mudar para que tudo não fique na mesma? Mas este exercício está afastado dos membros mais proeminentes das elites políticas e intelectuais. Tudo se esgota no efémero, no imediato, no mediatizado, e tudo o que for além disso é tarefa inglória que se pode sujeitar ao ridículo.» Diz, para fechar o capítulo sobre Portugal, que não se enxerga «uma saída, um rumo e um propósito».

Na terceira parte, Justino passa em revista as questões, internacionais e nacionais, da educação, que tem estudado em profundidade. Para além do défice económico, Portugal tem um grande défice educacional. A questão impõe-se: Será a aposta na educação o elixir de uma vida colectiva mais próspera? Será que o investimento na educação conduz necessariamente ao desenvolvimento? Há alguma controvérsia entre os economistas. Mas o curioso é que estes querem mandar na educação. Afirma Justino com sagacidade: «O que se observa é a tendência para que as políticas nacionais se orientem por directivas transnacionais, especialmente as propostas e recomendadas pelas organizações internacionais, como é o caso da OCDE, do Banco Mundial ou da UNESCO. A sua acção, ao contrário das autoridades nacionais, não tem poder coercivo para impor uma determinada concepção curricular, mas detém o poder de indução para condicionar e orientar as políticas nacionais». Justino é inequívoco: ele valoriza o conhecimento em vez das competências apregoadas pela OCDE e outros. A fechar o livro, Justino apresenta  uma proposta de organização de sistema educativo, que essencialmente visa melhorar a articulação entre os ensinos básico e o secundário, e sugere uma instância independente do governo para tratar as questões curriculares.

O tom geral é de algum pessimismo. O autor não está a ver saídas para as crises do mundo e de Portugal. Mas, como vivemos na «era da incerteza», pode ser que haja surpresas positivas. Não sabemos quais nem quando.

quinta-feira, 23 de março de 2023

Não precisas de mo dizer

Não precisas de mo dizer.

Sorri, apenas. as faces

Sabem tudo o que fazer.

Não precisas de me chamar.

Sorri, apenas. e ainda

Às faces voltarás para amar.

quarta-feira, 22 de março de 2023

Os Diários de Viagem de Albert Einstein

  • Edição Março 2023
  • Colecção Ciência Aberta, Gradiva
  • ISBN 978-989-785-203-9
  • Páginas 432
  • Capa Brochada / capa mole
  • Dimensões 13,50 x 21,00
€25,00 €22,50

No Outono de 1922, Albert e Elsa Einstein embarcaram numa viagem de mais de cinco meses ao Extremo Oriente, que o famoso físico desconhecia, tendo, no regresso, visitado a Palestina e a Espanha. O longo itinerário incluiu uma estadia de seis semanas ao Japão, de doze dias à Palestina e de três semanas a Espanha, além de paragens em Hong Kong, Singapura e Xangai. Uma viagem memorável que foi registando no seu diário. As entradas em estilo telegráfico contêm as reflexões de Einstein sobre a geografia, história, ciência, filosofia, arte e política, bem como as suas impressões imediatas sobre o que viu e pensamentos relativos a alguns eventos. Algumas passagens revelam os estereótipos de Einstein quanto aos nacionais de várias nações e levantam questões sobre as suas atitudes sobre a raça.

Uma obra que integra fac-símiles das páginas do diário, acompanhadas da tradução, uma introdução histórica, textos adicionais, ilustrações e anotações. Uma viagem terminada há precisamente cem anos, durante a qual o sábio recebeu a notícia do prémio Nobel. O diário revela a pessoa de Einstein para lá das suas teorias científicas; por vezes irónico, outras vezes feliz, sempre profundamente humano.

O diário fornece-nos percepções emocionantes sobre a experiência da viagem de Einstein, registada pelo próprio. Ele escrevia diariamente, acompanhando por vezes o seu texto com desenhos de coisas interessantes que viu, como vulcões, barcos e peixes. Registou tanto as suas impressões imediatas da viagem como reflexões mais longas sobre as suas leituras, as pessoas que foi conhecendo e os lugares que ia visitando.

Entre outros temas, também anotou, ocasionalmente, acontecimentos mundiais contemporâneos.

«A viagem é esplêndida. Estou encantado com o Japão e com os japoneses e tenho a certeza de que também ficaria. Além do mais, uma viagem marítima como esta é uma magnífica experiência para um pensador — tal como um mosteiro. Acresce o calor acariciante perto do equador. A água morna escorre languidamente do céu e espalha a paz e uma sonolência calma e vegetativa — esta pequena carta testemunha isso.»

Albert Einstein para Niels Bohr, perto de Singapura, 10 de Janeiro de 1923.

«[…] Qualquer pessoa interessada no carácter complexo, por vezes contraditório, de Einstein será agradavelmente seduzida pela leitura dos seus estimulantes Diários de Viagem.»

Andrew Robinson, Science.

NOVOS CLASSICA DIGITALIA

NOVIDADES EDITORIAIS

Série “Mundos e Fundos” [Mundos Metodológico e Interpretativo dos Fundos Musicais]

- Catarina Costa e Silva, Estudos Coreológicos 2016-2020. Contextos da Dança e Música Antigas (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2022).  158 p. DOI: https://doi.org/10.14195/978-989-26-2330-6%20

[A presente publicação (fruto da vertente investigativa da Portingaloise – Associação Cultural e Artística em parceria com a Kale Companhia de Dança e sob a chancela do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra) pretende contribuir para a expansão da produção científica na área da coreologia em Portugal. Acompanhando o crescente desenvolvimento de estudos académicos na área da dança, da performance ou das artes cénicas, os estudos em coreologia histórica informam sobre a prática da dança em contextos específicos, privilegiando o contacto com fontes de época e observando a sua relação com as demais artes, assim como com o contexto filosófico, social e político em que se insere. Este volume pretende acompanhar o empenho da Universidade de Coimbra na promoção da investigação na área das artes performativas, numa lógica simultaneamente especializada e interdisciplinar.]

Série “Ideia” [estudos]

Davide Eugenio Daturi, Merleau-Ponty y el cuestionamiento de la Metafísica del sujeto (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2023).  262 p. DOI: https://doi.org/10.14195/978-989-26-2428-0

[¿En qué sentido las primeras obras de Merleau-Ponty representan un parteaguas en la historia de la filosofía de los últimos trecientos años? Para contestar a esta pregunta, el autor nos introduce al paradigma de la “Metafísica del Sujeto” que modernamente queda disfrazado detrás y debajo de aquella “filosofía de la reflexión” que desde el pensamiento de Descartes caracteriza tanto el intelectualismo como el empirismo. Dentro de esta perspectiva, la propuesta contenida en las primeras obras del filósofo francés, Maurice Merleau-Ponty, representará una clara tentativa de cuestionar las explicaciones epistemológicas que vinculan a una suerte de ojo trascendental (un Yo, una subjetividad) con todo tipo de experiencia, real y posible, y contemporáneamente pondrán las bases para una ampliación ontofenomenológica del horizonte filosófico, más allá de la tradición y en directa conexión con la revolución que viven el arte y la ciencia del siglo XX.]

FÍSICA DE PARTÍCULAS EM PORTUGAL - NOVO LIVRO LANÇADO EM COIMBRA EM 23 DE MARÇO, 18H

segunda-feira, 20 de março de 2023

IMPÉRIOS, IMPERADORES E SUAS "AMIZADES SEM LIMITES"

Aos imperadores havidos e a haver.
Quando os imperadores afirmam 
uma “amizade sem limites”, 
todos sabemos como se acaba…

A DOENÇA DE SER IMPÉRIO

Há uma doença de ser império,
que é parecida com um carcinoma:
o império acresce, sem critério,
ao que originalmente foi Roma.

Império é doença prolongada,
que se arrasta, com muito sofrimento.
Tem vida longa e degenerada
e só a morte põe fim ao tormento!

Possuir tanto poder enlouquece
imperadores e quem lhes obedece.
O carcinoma, dentro deles,

tece teia mortal que se não compadece.
Ser império é autodevorar-se,
com bárbaros à porta, a preparar-se!

Eugénio Lisboa

FUGIDO À JUSTIÇA

O Putin anda fugido à justiça, 
indo esconder-se em Mariupol.
Está sem motorista, grande injustiça,
e conduz com maus ares de mongol!

Se sair da Rússia, será fisgado
e mandado curtir no Tê Pê I:
ficaria em Haia, mal amanhado,
e iria portar-se como uma Fifi!

Vai ter saudades do Kapa Gê Bê,
onde tinha os orgasmos que sabia:
fazer tortura com creme flambé!

Gozava, digamos, como podia,
mas resta-lhe agora comer borche
e guiar a versão russa do Porche! 

Eugénio Lisboa

domingo, 19 de março de 2023

OS PODERES DO GATO E OS SEUS DIREITOS

Por Eugénio Lisboa

Na falta de tema, recorro ao gato. O gato é inesgotável e os outros temas disponíveis, no mercado, não são. Como é que os grandes poetas passaram a vida a esbanjar talento com temas de carregar pela boca, havendo o gato?! Isto só confirma uma suspeita que sempre tive: os grandes poetas serão grandes, mas não são inteligentes. Ainda bem: deixaram o gato para eu recorrer a ele, sempre que me não apeteça falar de coisas menores e áridas.

Depois dos Poderes do Gato, vieram os Direitos do Gato. E ainda a procissão vai no adro…

OS PODERES DO GATO

Os gatos olham-nos com uma atenção
que só mesmo os gatos conseguem ter:
olhar de cognição ou de paixão?
Olhamos e ficamos sem saber!

Tudo, no gato, é misterioso:
o que ele faz e também o que não faz!
É inteligente e ardiloso
e nada de que não seja capaz!

Quando o gato decide o que quer,
não adianta nada resistir-lhe: 
o gato acaba sempre por vencer, 

como se fôssemos nós a pedir-lhe!
Os gatos têm poderes ocultos,
que dominam vontades e tumultos!

Eugénio Lisboa 


OS  DIREITOS DO GATO 

Se a Declaração Universal
dos Direitos do Gato é pra valer,
isso quer dizer que em Portugal 
todo o gato tem muito a haver!

Ela garante comida e colo,
bom aquecimento e também cama
e tudo conforme o protocolo
que o gato impõe e proclama!

Com Declarações destas, não se brinca
e, desta, o gato nunca se esquece:
lê-a com atenção e logo vinca

o parágrafo que mais lhe apetece!
Direitos são direitos e o gato ganha,
em direitos, o campeonato!

Eugénio Lisboa 

A GENEROSIDADE DO GATO

Aos meus gatos todos, antigos e recentes. 

Nenhum animal foi tão caluniado
como o gato: que é egoísta,
que é arrogante e malcriado,
só falta dizer que é Maoísta!

Que é amado mas não sabe amar.
Que gosta de receber mas não dá!
Se o maçamos, manda-nos bugiar.
Que se julga oriundo de Bagdá!

Mas do que toda a gente se esquece
é de que o gato, como ninguém,
sem nunca pestanejar, nos oferece

sem “mas”, sem “se” e sempre sem “porém”,
a majestade e a esbelteza
da sua inconfundível beleza!

Eugénio Lisboa

Sim, queridos destinatários deste soneto, nunca se esqueçam do sumptuário cadeau royal que é um gato! É como possuir um Leonardo que nos tivesse sido oferecido e não comprado. Nunca se distraiam a não devidamente avaliarem o tesouro que não merecem!

Eu não posso olhar para ti

Eu não posso olhar para ti,

Sem que o coração seja o mesmo.

Até o sangue é outro

E parece quebrar o silêncio.

quarta-feira, 15 de março de 2023

O perdão maior está em dar a mão

O perdão maior está em dar a mão

Ao corpo que a pede e parte o rosto

Por não ter a mão nem ter o corpo

Que sofreu outrora com coração.

 

O perdão maior está em dar o pão

À boca que o pede de olho no corpo

Que lágrimas trouxe à boca e ao rosto

Por só para si querer todo o chão.

 

A justiça imane, o perdão maior,  

Está em perdoar quem foi injusto,

Num instante que seria de amor,

 

Em dar o coração, sem qualquer custo.

Do nosso corpo dar o astro melhor

Ao corpo que volta em sagrado lustro.

A história global da ciência em Portugal


 

Prefácio a Física de Partículas em Portugal (Origem e Desenvolvimento) (Gradiva)

 


Prefácio  (sem as notas)

A Génese da Física de Partículas em Portugal de Gustavo Castelo-Branco, Margarida Nesbitt Rebelo, João Varela

Nas últimas três a quatro décadas a ciência em Portugal cresceu muito. Hoje, é frequente lermos notícias sobre a ciência que fazemos. Não era assim há 35 anos. Praticamente não havia investigação científica nas Universidades e eram raros os doutoramentos feitos em Portugal. Alguns recém -licenciados conseguiram bolsas de investigação e realizaram o doutoramento no estrangeiro. Muitos regressaram e tiveram um papel pioneiro na modernização da ciência no país.

 Este livro incide sobre um campo específico da ciência e pretende descrever e ajudar a compreender a origem e desenvolvimento da Física de Partículas em Portugal. É um relato em forma de testemunho de acontecimentos e experiências vividas pelos autores. Simbolicamente, associamos a adesão de Portugal ao CERN em 1985 à génese da Física de Partículas no País. De forma a situar este evento no contexto internacional, consideremos a data da formulação do Modelo Padrão (em inglês Standard Model)  das Interacções Electromagnéticas, Fracas e Fortes como ponto de partida. Este modelo tem tido um enorme sucesso na descrição das partículas elementares e das suas interacções e ainda hoje constitui a base teórica neste domínio. Essencialmente o Modelo Padrão  acabou de ser construído por volta de 1967. A pergunta que se pode fazer é: o que se fazia em Portugal em Física de Partículas nessa altura? A resposta a esta pergunta é: muito pouco, quase nada.

 A Física de Partículas, cuja  origem reside na Física Nuclear,  é o ramo da ciência que estuda os componentes fundamentais da matéria. À medida que se foram conhecendo os constituintes elementares da matéria, a Física de Partículas constituiu -se como um domínio novo de investigação, distinto da Física Nuclear, da mesma forma que a Física Nuclear nasceu depois da Física Atómica. Pode considerar -se que a Física de Partículas como disciplina independente se iniciou com a descoberta do muão por Carl Anderson e Seth Neddermeyer em 1936 no âmbito dos estudos da radiação cósmica. O muão foi a primeira partícula descoberta sem relação com os constituintes do átomo. O ciclotrão fora inventado uns anos antes e as pesquisas em Física de Partículas passaram progressivamente a ser realizadas em aceleradores que permitiam colisões a energias consideradas elevadas. As experiências de Física de Partículas requerem energias mais elevadas que as de Física Nuclear para aceder a escalas mais pequenas. Por esta razão este domínio foi inicialmente denominado de Física de Altas Energias. É esse ainda actualmente o nome da Divisão da EPS (European Physical Society) que agrega os Físicos de Partículas: High Energy Physics (HEP). 

Para se compreender a ausência de desenvolvimento desta área fundamental da Física em Portugal nos anos 1960 e 1970, há que ter em conta que, em  três universidades portuguesas - a  Clássica de Lisboa, a  de Coimbra e a  do Porto - havia vários físicos  nucleares, mas a transição para a Física de Partículas nunca se tinha dado de modo significativo. Acima não referimos a Universidade Técnica porque o IST - Instituto Superior Técnico nesse tempo nem sequer tinha um Departamento de Física. Claro que o fraco desenvolvimento científico em Portugal contribuía para esta situação da Física de Partículas. No entanto, o país tivera várias oportunidades para se desenvolver. Por exemplo, durante o período da Segunda Guerra Mundial Portugal podia ter captado vários dos cientistas que tiveram de abandonar a Alemanha e outros países europeus para escaparem à barbárie nazi. Não só não captámos estes cientistas como perdemos alguns dos nossos melhores cientistas que tiveram de sair do país para escapar da ditadura salazarista.

 Do ponto de vista da Física Experimental de Partículas, a situação em Portugal era desoladora, sobretudo por Portugal não ter aderido ao CERN, o grande laboratório europeu de Física de Partículas, quando criado em 1954. Nesse ano, doze países europeus incluindo a Grécia, país com riqueza equivalente a Portugal, fundaram o CERN. O desenvolvimento da Física de Partículas em Portugal está muito ligado à adesão ao CERN cerca de 30 anos mais tarde. Portugal começou assim com um grande atraso em relação ao mundo, mas podemos orgulhar -nos de, hoje em dia, já no século XXI, Portugal estar plenamente inserido na comunidade internacional de Físicos de Partículas. Para que isso pudesse ter acontecido foi instrumental a adesão de Portugal ao CERN. Contudo, é notável o facto da International Conference on High Energy Physics da EPS em 1981 ter tido lugar. O Departamento de Física do IST foi criado em 1980. Até essa data havia apenas a secção de Física.  em Portugal  o que se deveu em grande parte ao regresso a Portugal de vários físicos que fizeram carreira no estrangeiro e à existência de vários jovens acabados de formar. Isto contrasta com o cenário nacional aquando da conferencia desta série que teve lugar em Viena em 1968. Nesta conferência não participou nenhum físico com afiliação numa universidade ou centro de investigação português Vê -se, porém, na lista de participantes quase 20 físicos que vieram a receber o Prémio Nobel em Física. 

O objectivo dos autores deste livro é por um lado o de descrever na primeira pessoa a nossa experiência do que tem sido fazer Física de Partículas em Portugal desde a sua génese e por outro lado contribuir com alguma informação rigorosa e documentada para uma futura história desta disciplina em Portugal. Este não é um livro de História da Ciência ainda que os autores tenham tido o cuidado de fornecer uma lista de referências tão detalhada quanto possível de todas as fontes usadas para os factos e as descrições históricas apresentadas. Grande parte da experiência profissional internacional dos autores desenvolveu -se na Europa em  estreita relação com o CERN. Por outro lado, a sua vida profissional em Portugal esteve ligada ao IST em Lisboa. Também é importante referir que os EUA -  Estados Unidos da América contribuíram para a formação científica de dois dos autores numa fase inicial e crucial das suas carreiras. A Universidade de Coimbra tem também uma história rica e com impacto na Física de Partículas feita em Portugal. Este facto não se reflecte neste livro simplesmente porque os autores não têm competência para o descrever. Esperamos que outros testemunhos venham preencher esta lacuna. 

Assim, neste livro contamos os detalhes deste desenvolvimento, incluindo a Física Experimental e a Física Teórica. Considerámos relevante incluir no livro as nossas experiências pessoais como alunos de doutoramento, como posdocs5 e depois como professores e investigadores na área da Física de Partículas. Claro está que estas apresentações têm inevitavelmente algo de subjectivo, mas procuramos dar uma visão tão correcta quanto possível da origem e desenvolvimento da Física de Partículas em Portugal.

NOVIDADES DA GRADIVA EM MARÇO

 

NOVIDADE




Uma edição publicada no âmbito das comemorações do Centenário do Nascimento de Eduardo 



Lourenço que decorrerão em 2023.

 

Eduardo Lourenço, Correspondência com Jorge de  Sena


«O que não hesito chamar amizade, ainda que apenas epistolar, destes dois camaradas de letras iniciou-se, creio, com o envio, por Jorge de Sena, do inquérito sobre André Gide que se destinava e foi publicado em Unicórnio, em Maio de 1951. Quando ou como se conheceram pessoalmente não sei exactamente, mas sei que se dedicaram amizade, respeito e admiração mútua por cerca de 28 anos. Para mim, Eduardo Lourenço começou por ser o ‘Faria’, ainda meu contemporâneo na Faculdade de Letras de Coimbra, finalista quando eu, tardiamente ‘caloira’, começava a minha via-sacra de aluna ‘voluntária’, enquanto ele se desenhava já como diferente dos demais.»

Mécia de Sena, «Acerca desta correspondência»

Já disponível: "O que é uma lei física", de Richard P. Feynman. De €14,00 por €12,60.

Uma série de fascinantes palestras de Richard Feynman sobre a Natureza e a Ciência, recolhidas ao vivo pela BBC em 1964.

 

Richard Feynman foi um dos professores de Física mais originais de sempre. Nesta série de conferências, que é intemporal, oferece-nos um panorama da Física, clássica e moderna, enfatizando o que as leis físicas têm em comum. Trata-se de uma descrição simples, clara e elegante, recolhida ao vivo em 1964 pela BBC, de um conjunto de palestras sobre o que é a Natureza e o que é a Ciência. Um livro fascinante e eterno, pelo brilho e pelo entusiasmo do autor. Inimitável: só Feynman, que além de professor de Física foi arrombador de cofres e músico no Carnaval do Rio de Janeiro, pode ser Feynman!

Para esta edição, o físico Carlos Fiolhais, autor do prefácio, reviu a sua tradução. Para ele, «Feynman deve ser conhecido pelas novas gerações, porque a sua inteligência continua hoje a iluminar-nos».

Destaques e Relançamentos
"O Significado de Tudo", de Richard P. Feynman.


O Significado de Tudo
Richard P. Feynman

 

€9,59 8,63


Em três conferências inesquecíveis, Feynman - o cientista e o cidadão - reflecte sobre a ciência e a sociedade, o conflito entre a ciência e a religião, sobre a guerra e a paz, o nosso fascínio universal pelos discos voadores, a fé nas curas milagrosas e na telepatia, as desconfianças do povo em relação aos políticos - sobre as grandes preocupações do cidadão-cientista moderno.
"O Prazer da Descoberta", de Richard P. Feynman.


O Prazer da Descoberta
Richard P. Feynman

 

€12,11 10,90


Das reflexões sobre o lugar da ciência na nossa cultura às descrições das propriedades fantásticas da física quântica ou ao discurso de aceitação do Prémio Nobel, este livro vai fascinar qualquer pessoa interessada em Feynman e no mundo das ideias. Quase todos os textos agora publicados são, pela primeira vez, tornados acessíveis ao grande público.
"QED - A estranha teoria da luz e da matéria", de Richard P. Feynman.


QED - A estranha teoria da luz e da matéria
Richard P. Feynman

 

€14,00 12,60


Richard P. Feynman, um dos físicos teóricos mais célebres do mundo, apresenta aqui a teoria da electrodinâmica quântica com a clareza, o rigor e a perfeição que tornaram famosas as suas conferências. Pressupondo que os leitores possuem poucas bases científicas, procura sempre ilustrar as interacções da luz com exemplos de fenómenos que todos podemos observar no quotidiano.
"Antero ou a Noite Intacta", de Eduardo Lourenço.


Antero ou a Noite Intacta
Eduardo Lourenço

 

€13,63 12,27


«Não há na nossa literatura, nem mesmo Camões, poeta tão naturalmente universal como Antero de Quental, dada a natureza ideal e intemporal da sua inspiração e o conflito que a alimenta, pura interpretação do espírito por si mesmo no meio de um mundo incompreensível. Nenhum objecto empírico, natural ou histórico, é, ao menos nos Sonetos, matéria determinante da sua poesia. Os Açores como qualquer outro. É como se estivesse só no Universo, ilha pura, sem qualquer arquipélago.»
"Sentido e Forma da Poesia Neo-Realista", de Eduardo Lourenço.


Sentido e Forma da Poesia Neo-Realista
Eduardo Lourenço

 

€13,63 12,27


«O neo-realismo de que nos ocupamos é, antes de tudo, um fenómeno cultural, ideológico e literário, português. Quer dizer, encontra-se inserto como actor e sujeito de drama num contexto preciso que é o da nossa específica história desde 1936 até aos dias de hoje. Este dado é mais relevante que a referência, mesmo a menos abstracta e eivada de ilusões, a uma superestrutura ideológica condicionante. Para os autores neo-realistas (e não só para eles) essa casa habitável nunca existiu nem pôde existir senão como sonho recusado ou mito encarnado algures, sobre o qual a sua pessoal experiência de portugueses não tinha apoio algum.»
"A Conspiração", de Will Eisner.


A Conspiração
Will Eisner

 

€14,64 13,18


Will Eisner, o grande mestre da banda desenhada americana, concluiu A Conspiração no seu último mês de vida, considerando-a a obra mais poderosa de toda a sua carreira. Profundamente perturbado pelo facto de os Protocolos dos Sábios de Sião - um alegado plano de domínio mundial escrito por líderes judeus - continuarem a ser publicados e distribuídos em todo o mundo, Eisner esperava que o seu relato gráfico desta injuriosa fraude pudesse alcançar uma audiência muito mais alargada do que a de qualquer obra académica sobre o assunto.

Nesta história extraordinária, Eisner leva o leitor numa viagem que tem início na Paris de finais do século XIX, onde um agente da polícia secreta russa plagia uma velha obra filosófica francesa, fabricando um documento com o qual se pretendia provar a existência de uma conspiração judaica contra a civilização cristã. Concebido como um esquema antissemita para desviar as atenções do regime repressivo do czar, o texto dos Protocolos foi inicialmente publicado na Rússia em 1905. E o sucesso da falsificação superou em larga medida as ambições propagandísticas dos seus criadores.
"História da Cultura em Portugal, vol. 1", de António José Saraiva.


História da Cultura em Portugal, vol. 1
António José Saraiva

 

€15,14 13,63


António José Saraiva foi professor e historiador de Literatura portuguesa. Publicou uma vastíssima e importante bibliografia, considerada uma referência nos domínios da História da Literatura e da História da Cultura portuguesas, amadurecida quer na edição de obras e no estudo de autores individualizados, quer através da publicação de livros de grande fôlego como a História da Cultura em Portugal (uma obra em quatro volumes) ou, em parceria com Óscar Lopes, a História da Literatura Portuguesa.

terça-feira, 14 de março de 2023

SONETO: MODO DE USAR

Use o soneto pra dizer amor.
Use o soneto para odiar.
Use-o também para cozinhar.
Use-o para abanar o torpor.

E também serve para limpar nódoa,
quando ela tomba no nosso pano
e ali causa não pequeno dano:
o soneto, serve, então, de antinódoa!

O soneto presta-se a ir à guerra, 
pra esborrachar as ventas ao tirano
e afocinhá-lo, com força, na terra!

Quando o tirano se põe ufano,
então o soneto caga-lhe em cima,
com gosto e porreiríssima rima!

Eugénio Lisboa

PENSAMENTO DO DIA (AVISO POR CAUSA DAS COISAS)

A tirania está sempre melhor organizada do que a liberdade.
Charles Péguy 

Enquanto passamos o nosso tempo a fruir descontraidamente esse tesouro que é a liberdade, o candidato a tirano vai semeando a desordem e o barulho, armando-se e organizando-se até aos dentes, PARA PODER INTERVIR E SALVAR O PAÍS DO CAOS QUE SEMEOU. 

A liberdade deve organizar-se melhor que o tirano, para poder batê-lo no próprio terreno.

A liberdade deve andar à frente do tirano. 

NÃO DEVE DEIXÁ-LO TORNAR-SE INDISPENSÁVEL OU MESMO INEVITÁVEL. 

O tirano não é particularmente inteligente, mas é muito manhoso. Saibamos derrotá-lo também nesse terreno. 

Não deixemos que a tirania se instale, para só então lutarmos contra ela. Nessa altura ela estará armada e a liberdade desarmada.

Como recomendava Chesterton, não devemos gritar, só quando já estamos feridos, devemos fazê-lo antes, para fugirmos à possibilidade da ferida. 

Ataquemos, com vigor, os candidatos a tiranos, para não termos de lutar contra eles quando já forem poder.

Que eles saibam que somos um exército bem preparado e bem armado e que lhes conhecemos os pontos fracos – que são muitos e estão bem à vista. 

A tirania não tem obrigatoriamente de triunfar: podemos atrapalhá-la e destruí-la no ovo.

Eugénio Lisboa

segunda-feira, 13 de março de 2023

domingo, 12 de março de 2023

A MINHA PROFESSORA DE FILOSOFIA

À memória de Maria Luísa Soares, 
minha inesquecível professora de Filosofia. 

A minha professora de Filosofia,
carinhosamente chamada “a mamba”,
nada tinha de cobra que assobia,
mas, como ela semeava, caramba!

Inteligente, culta e sedutora,
sabia ensinar e inspirar:
ensinando, ensinava a doutora
o saber e a arte de pensar!

Fazia-nos ler, além do manual,
textos excitantes de pensadores,
que nos lançavam em voo astral.

Cheia de alegria e de pudores,
abria-nos portas insuspeitadas
para riquezas nunca antes visitadas! 

Eugénio Lisboa

sábado, 11 de março de 2023

PENSAMENTO DO DIA

O IDEAL CRISTÃO NUNCA FOI TESTADO E REPROVADO. 
FOI CONSIDERADO DIFÍCIL E NUNCA FOI EXPERIMENTADO. 
G. K. Chesterton, 
escritor católico 

Seria uma ideia refrescante, ao fim de dois mil anos, a Igreja Católica experimentar seguir o guião do Cristianismo. Seria uma boa e grande surpresa, para padres, bispos, cardeais e Papas. 

Teríamos uma Igreja Católica muito diferente desta que temos. Mas seria provavelmente necessário fechar o Vaticano. Alguns perderiam empregos sumptuários, mas, em vez de "empregos", teriam missões a cumprir. Ficariam menos ricos, exteriormente, mas infinitamente mais ricos, interiormente. E a Igreja Católica deixaria de ser o ANTI-CRISTO que tem sido.

A pompa seria substituída pela mais severa humildade franciscana. As belas palavras do Sermão da Montanha deixariam de ser retórica vazia. Um bispo ou um cardeal deixariam de existir, assim deixando de ser uma afronta a tudo quanto Cristo viveu e pregou. 

Cristo crucificado, dentro da majestade de pedra de uma catedral é uma infame contradição.

Eugénio Lisboa

sexta-feira, 10 de março de 2023

O COMEÇO DA AVENTURA

À memória do Sr. Cruz, 
homem bom como o pão, 
e rei do Infulene! 

Correr pelo mato, no Infulene,
descobrir o cheiro da liberdade,
o negro da pele, fresco e perene,
os desejos à solta, em tempestade,

a fúria de viver e de comer,
um mundo sem limites, a abrir,
afastar, com destreza, o sofrer,
a certa glória, futura, a sorrir!

As leituras boas e clandestinas, 
o cinema às dezassete e cinco,
no Scala, que se lixem as rotinas!

O gostoso aprender, com afinco,
sentirmo-nos crescer em sítio vasto,
onde tudo é bom, saboroso e fasto! 

Eugénio Lisboa

João Luís Barreto Guimarães, em Coimbra, 11 de Março,, 16 h

 João Luís Barreto Guimarães, o mais recente premiado Pessoa, estará amanhã, sábado, 11 de Março, pelas 16h,  em Coimbra, na Livraria Almedina Estádio, para assinar o seu último livro «Aberto todos os dias» (Quetzal). A obra será apresentada por Carlos Fiolhais.


quinta-feira, 9 de março de 2023

quarta-feira, 8 de março de 2023

A ERA DOS “SENSITIVE READERS”

Por Eugénio Lisboa

Quando George Orwell cunhou, para a posteridade, a NEWSPEAK (NOVILÍNGUA), criada pelo Ministério da Verdade, para esconder as coisas mais horríveis, sob o casto manto das palavras bem escolhidas, pensava que essas picardias eram só próprias dos regimes totalitários. As maiores ignomínias eram descritas num estilo altamente purificador, que lhes dava um ar de inocente formulação erudita. O horror era desinfectado pela filologia ao seu serviço. 

A verdade, porém, é que Orwell se enganou. O Newspeak está agora em vigor nas democracias e invade o mundo editorial, com a emergência dos “sensitive readers”, que acabam de descobrir um novo nicho de emprego. Estes leitores, mais do que provavelmente, grosseiramente iletrados, como é sempre o caso dos censores, passam a funcionar junto dos editores, com o fim benévolo de catarem, em Homero, Virgílio, Camões, Garrett. Camilo, Eça, Régio ou Pessoa, ou Faulkner ou Lawrence ou Proust ou Garcia Marquez, qualquer palavra mais grosseira ou menos conveniente.

Mas aquilo que eles são, isto é, CENSORES, é, por sua vez, censurado e eles passam a ser apenas LEITORES SENSÍVEIS. Dá-se assim aos assassinos da cultura, perdão, aos vigilantes da cultura, o poder egrégio de corrigirem os deslizes indesculpáveis dos grandes criadores de cultura. Tudo a bem da protecção de sensibilidades mais finas e subtis de leitores a quem incomodam muito palavras obscenas como “descobrimentos”, “gordo”, “feio” , “coxo”, “cego”, etc.

De facto, seria imperdoável permitir-se que gente de pele tão fina se magoasse, ao encontro de tais palavrões. É mais uma das muitas invenções estapafúrdias que as universidades americanas, com grande alarido, exportam regularmente, para um mundo gulosamente desejoso de se pôr à la page com a sabedoria do Tio Sam.

Nós, cá em Portugal, costumávamos ser os últimos a consumir as pérolas de sabedoria que atravessavam o Atlântico, mas as coisas andam a mudar. Tornámo-nos mais atentos, mais depressa modernaços, passámos a consumir mais fluentemente expressões como “sair do armário” & outras, que gostamos de manipular a torto e a direito, para não parecermos demasiado antiquados.

Por mim, faço sinceros votos por que, pelo menos, um ou outro editor mais destemido, da nossa praça lusíada, consiga resistir a esta imensa maré de imbecilização, que nos chega, impetuosa, da pátria de Sherwood Anderson. 

O Novo mundo deve ter coisa melhor a oferecer-nos: não precisamos de ter orgasmos com este lixo. 

Eugénio Lisboa

«ABERTO TODOS OS DIAS» DE JOÃO LUÍS BARRETO GUIMARÃES

    Meu artigo no último As Artes entre as Letras : O livro Aberto todos os dias (Quetzal) é o mais recente do médico-poeta portuense ...