domingo, 7 de outubro de 2007

Nobel da Literatura: façam as vossas apostas


A Academia Sueca informou na sexta-feira que anunciará o prémio Nobel da Literatura no dia 11 de Outubro. Os Nobel da Literatura e da Paz são normalmente os mais controversos e aqueles cuja nomeação dá por vezes azo a acesas discussões, como aconteceu em Portugal quando José Saramago foi distinguido em 1998 com o Nobel.

Entre outros laureados cuja nomeação deu origem a uma enorme polémica, podemos referir a escritora americana, negra, feminista, que fazia ensaios fora dos limites literários estabelecidos, Toni Morrison, galardoada em 1993, o politicamente provocante Dario Fo no ano antes de Saramago, Elfriede Jelinek - cujo galardão em 2004 levou à demissão de Knut Ahnlund, que já tinha criticado a escolha de Saramago e Fo - ou mesmo em 2005 a escolha de Harold Pinter, o dramaturgo mais complexo do pós-II Guerra Mundial, e, em conjunto com Samuel Beckett, um dos expoentes do teatro do absurdo.

Este ano, pelo menos segundo as previsões da Ladbrokes, que acertou nas suas apostas por três anos consecutivos, incluindo o ano passado, em que colocava à frente o escritor turco Orhan Pamuk (5/2), parece que não vai existir grande polémica, já que os primeiros classificados na corrida da corretora são nomes que não me parecem controversos. Claro que o Nobel da literatura é muitas vezes uma total surpresa, mas desafiamos os nossos leitores a deixarem as suas apostas na caixa de comentários. Não aconselhamos fazê-lo na britânica Ladbrokes, que aceita apostas para o prémio literário de maior prestígio do mundo, mas podemos olhar para a sua lista para inspiração.

A Ladbrokes apresenta como favorito o romancista e ensaísta italiano Claudio Magris (5/1). De Magris, doutorado em 1962 pela Universidade de Turim com a tese «O mito Habsburgo na literatura austríaca moderna», existem pelo menos dois livros disponíveis em Portugal, «Um Outro Mar», Edições ASA e «Danúbio», da D. Quixote.

A prosa erudita de Magris, que incide sobre as contradições e fricções a vários níveis no «espaço europeu», já foi galardoada por diversas vezes, incluindo o Praemium Erasmianum em 2001, ocasião para a qual Magris escreveu um ensaio simplesmente fabuloso, a «A Feira da Tolerância», que relembra ser a laicidade a pedra basilar da tolerância.

Laicidade «que não se identifica a priori com nenhum credo, nenhuma filosofia ou ideologia mas é a aptidão crítica de articular credos pessoais ou filosóficos de acordo com regras lógicas e princípios cuja consistência nenhuma fé pode estabelecer, porque nesse caso colapsaríamos inevitavelmente numa confusão obscurantista e turva». Para Magris, «Laical, uma palavra tão rica em significado e valor, não significa de todo, como muitas vezes é ignorantemente pensado, a oposição ao religioso, nem indica em si um crente, agnóstico ou ateísta. Laicidade não é um objecto filosófico, é antes um hábito mental, a capacidade de distinguir o que é racionalmente demonstrável daquilo que é, pelo contrário, objecto de fé».

Mas continuemos com a lista que tem em segundo lugar o poeta australiano Les Murray (6/1) e em ex-aequo, com 7/1, o romancista americano Philip Roth e Thomas Tranströmer, uma das vozes mais respeitadas da literatura sueca contemporânea. O quinto da lista é o poeta sírio-libanês Adonis (8/1) e em sexto com probabilidades 10/1 estão 5 autores onde se inclui Amos Oz, o mais popular escritor israelita. Com a excepção do australiano Murray, todos já foram sugeridos como possíveis vencedores em anos passados.

Como ajuda para os palpites, deixamos ainda a opinião de Peter Stothard, editor do The Times Literary Supplement. Stothard disse que, se pudesse escolher, daria o Nobel ao poeta britânico Geoffrey Hill (que não consta da lista que inclui, na última posição, Bob Dylon).

Stothard, que descreveu Hill como «o maior poeta da dúvida religiosa da nossa era, uma era que precisa muito de cépticos religiosos sérios, alguém que pode ser trágico e cómico, como só podem ser os escritores mais sérios», indicou Philip Roth como a sua segunda escolha.

O Carlos na sua lista de leituras de Verão, recordou que Roth, um dos melhores escritores norte-americanos vivos, tem vários títulos em português, o último, «Todo-o-Mundo», publicado pela Dom Quixote.

A escolha não será fácil certamente e aguardo com a curiosidade expectável a decisão da Academia Sueca. A minha aposta vai para Claudio Magris, claro, com Philip Roth em segundo.

10 comentários:

Joana disse...

Claudio Magris, claro!

Não conhecia o senhor, vou já comprar antes que se dê a corrida aos livros do Nobel e estes desapareçam :)

Fantástico! Adorei, adorei, adorei o ensaio do prémio Erasmo :))))))

Este ensaio devia ser de leitura obrigatória como antídoto para as mentiras da beatada que arma mais teorias da conspiração por causa da alteração do regime de assistência religiosa nos hospitais que, vejam lá o horror, impede que os abutres de sotaina evangelizem os doentes contra a sua vontade.

Gostei do artigo da Fernanda Câncio a pôr os pontos nos ii!!!!

Alda M. Maia disse...

Oxalá a sua aposta seja de bom augúrio para Claudio Magris!
Leio sempre com atenção e profundo interesse os editoriais deste escritor, no Corriere della Sera.
Seria un Nobel bem atribuído. Mas a não elegerem Magris, viva Amos Oz!

António Viriato disse...

Interlúdio linguístico : «Fazei as vossas apostas» ou «Façam as suas apostas» ou simplesmente «Façam as apostas».

Qual das afirmações lhes (a vocês, aos senhores, etc.) ou vos (a vós)parece mais correcta ?

Aceitem ou se preferirem/preferirdes aceitai a pequena provocação.

Aguardo comentários.

Unknown disse...

Claudio Magris, no Corriere della Sera sobre a arte de educar:

"A escola sã é aquela em que professor e aluno aprendem a rir juntos, a viver com solidariedade e a amar o estudo como aventura da descoberta. É normal que o aluno tenha tentação de copiar e que o professor trate de o impedir. O professor deve saber punir, rejeitar a violência do mais forte, mas aplicar com sensatez pequenas sanções disciplinares. O professor não pode ser tolerante ou evitar ver que um aluno usa o telemóvel durante as aulas, deve repreendê-lo. A educação tem algo da poesia, porque ensina a distinguir o bem e o mal, a dignidade e o comportamento penoso."

Claudio Magris, claro :))

Unknown disse...

A esperança é um conhecimento completo das coisas... não só de como são e como aparecem,
mas também de como devem transformar-se
para estar de acordo com a sua própria realidade...
e com a lei do seu ser...
O desencanto é uma forma irónica, melancólica e aguerrida
da esperança; modera o ímpeto profético
e generosamente optimista, que facilmente subvaloriza
os possíveis receios de regressão, de descontinuidade,
da trágica barbárie latente na história.

Mais Claudio Magris :)

Unknown disse...

António Viriato:

Tirando uma minha avó, originalmente de Trás os Montes e sem emenda ao fim de 50 anos, e conjuga verbos como "vós ides", "quereis sopa", "vós sois lindas" não conheço ninguém em Lisboa que conjugue a segunda pessoa do plural :)

Fazei as vossas apostas soa mal a ouvidos alfacinhas :)

Anónimo disse...

Viva, desde o técnico, sugiro-lhe uma lista. Não dá para apostas mas imagino que sairá daqui:
Ismail Kadare

Hans Magnus Enzensberger

Peter Carey

Peter Handke

Hugo Claus

Margaret Atwood

Milan Kundera

Bei Dao

Norman Mailer
Gore Vidal
Edward Albee
Edgar Lawrence Doctorow

John Updike

Philip Roth

Cormac McCarthy

Don DeLillo

Joyce Carol Oates

Sam Shepard

Julien Gracq

Alain Robbe-Grillet

Michel Tournier

Doris Lessing

Salman Rushdie

Ian McEwan

Cees Nooteboom

Amos Oz

Claudio Magris

Umberto Eco

Haruki Murakami

Amin Maalouf

Tahar Ben Jelloun

Carlos Fuentes

Mário Vargas Llosa

António Lobo Antunes

Adonis

Tomas Tranströmer

Anónimo disse...

Eu aposto na Carolina Salgado

Anónimo disse...

Eu também voto no Claudio Magris!

Acho que a nossa era "precisa muito de cépticos religiosos sérios" mas precisa mais de pessoas que percebam que sem laicidade não vamos lá!

Ainda este fim de semana uma cambada resolveu "consagrar a Europa" a uma impostura, sem pedir autorização a ninguém e sem o mínimo de respeito pelos milhões que não são católicos.

Gostava de saber como se sentiriam se os muçulmanos resolvessem consagrar a Europa a Maomé ou os evangélicos a Lutero!

E depois vemos Jorge Ortiga a acirrar os crentes "exortando-os a lutar contra o secularismo da sociedade actual".

Há muita gente e não só muçulmanos que sonha com teocracias...

António Viriato disse...

Caros Contertulianos,

Afinal, verifico com algum pesar que a minha questão não suscitou a curiosidade intelectual dos confrades da De Rerum Natura. Desculpem a insistência, mas ela não era inocente, antes visava, da minha parte, avaliar a sensibilidade iriam revelar para estes assuntos da Língua Pátria.

Na verdade, a frase que eu tomei para exercício traduz um velho erro de sintaxe do português europeu, ainda que se invoquem as esmagadoras maiorias que o praticam. E não devemos desculpar-nos com a nossa falta de especialização na matéria para nela não emitirmos opinião, porque esta é matéria entre todas da nossa geral responsabilidade, já que nela assenta a essência da nossa cidadania.

Quero crer, no entanto, que ela voltará a debate, dada a sua intrínseca importância cultural e, nessa altura, pode ser que logre maior atenção da parte da comunidade que aqui se reúne, que noutros assuntos tem conduzido debates muito interessantes, de utilidade cívica evidente, como esse da cultura científica versus crendices ou contra a equiparação das explicações de motivação religiosa às baseadas na fundamentação científica, comummente verificada e comprovada por quem quer que se disponha a investigar o mundo que nos rodeia.

E por ora não os maço mais.

Boa semana e continuação de inspirada produção intelectual, para nossa comum fruição.

AV_08-10-2007

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