domingo, 2 de maio de 2010

Ainda "O Manifesto para a Educação da República (II)

O resultado desta desastrosa política não se fez tardar!

Segundo um relatório da Caritas Europeia (referido no jornal da SIC, de 8 de Fevereiro último) 'um em cada dois portugueses não percebe o que lê'. Nem de propósito, logo no dia imediatamente a seguir, o Público noticiou não menor escândalo: 'Zero foi a pontuação obtida na realização de problemas matemáticos por 40% dos 118 mil alunos, do 4.º e 6.º anos de escolaridade, que efectuaram provas de aferição, no ano lectivo de 2000/2001'.

Mesmo sem o recurso a uma bola de cristal, no
Público, de 17 de Dezembro de 96, escrevia eu em artigo de opinião: 'Este um facto de que se deve dar conhecimento público e que o bom senso dos responsáveis pela educação deverão ter em linha de conta pelo perigo de uma deficiente alfabetização da juventude portuguesa que salta já à vista de todos'.

Hoje, um coro de vozes muito críticas se faz ouvir, como a do actual reitor da Universidade de Évora, Manuel Ferreira Patrício: 'As políticas educativas seguidas, nos últimos 15 anos, foram um desastre. Os resultados estão à vista. Lemos nos jornais e constatamos que a educação está na rua, na lama da voz pública'.

O estado calamitoso da educação nacional, reflectido na desdita de uma 'república que está a educar mal os seus filhos', preocupa grande franja da sociedade civil, desde intelectuais ao cidadão comum, colhendo expressão no Manifesto para a Educação da República que duplicou expressivos apoios, num só dia, após ser conhecido publicamente.

Julgo que ninguém ousará pôr em causa que um país que não preserva umas tantas leis no respeito de direitos outorgados, com a maior justiça, aos universitários e, por outro lado, ajeita, outras tantas, pondo-as ao serviço de poderosos 'lobbies' do ensino politécnico, como sindicatos de inspiração marxista, em defesa de professores com habilitações de pouca exigência académica, sofre de maleita grave, necessitando, como tal, de uma terapia urgente que se não compadece com mezinhas ou paninhos quentes. Exige um tratamento de choque por parte de gente competente, corajosa, não comprometida.

Para além da descabelada exigência dos politécnicos em conferir o grau de mestre e de doutor, reporto-me às declarações do presidente da Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Superior Politécnico quando profere a seguinte ameaça na cidade de Aveiro, em 28 de Janeiro deste ano, durante a discussão das Linhas Programática para o Ensino Superior: 'Se, de facto, as propostas não forem de encontro [pela certa, deveria querer ele dizer ao encontro] aos nossos interesses nós cá estaremos para responder à altura e no devido momento'.

Apenas três dias atrás, esta mesma federação, em desacordo com a decisão do Conselho de Ministros, exigia 'a revogação da decisão em criar o Instituto Universitário de Viseu', realizando, para o efeito, uma assembleia geral, em Leiria (
As Beiras, 23.Fev.2001). Por seu turno, e na mesma altura, João Pedro Barros, presidente do Instituto Politécnico de terras de Viriato, sentenciou em desfavor desta decisão em judicatura em causa própria e em ocasião em que aproveita, uma vez mais, para buscar em solo de Espanha inspiração para um ridículo 'travesti'. Ou seja, a mudança do nome de Instituto Superior Politécnico, sob a sua directa tutela, para Instituto Politécnico Universitário, ao arrepio de um aforisma bem português: 'Cada roca com o seu fuso, cada terra com o seu uso'.

Mas as surpresas não param de ocorrer! Através do
Diário de Coimbra, de 20 do corrente, ficou-se a saber que a Comissão Política da Secção de Coimbra da Juventude Social Democrática pretende uma mudança nominal de ensino politécnico para ensino universitário, e que as respectiva escolas assumam designação de faculdades. Escuso-me de comentar esta pretensão que a tomo por verdadeira 'boutade', tendo merecido a desaprovação da própria Federação Académica de Coimbra que agrupa escolas faculdades e escolas politécnicas das margens do Mondego.

Só concebo desvalorizar estes factos por acreditar haver o bom senso do governo, a sair das próximas eleições legislativas, em impedir que os 'interesses' dos alunos do ensino politécnico possam continuar a atrasar um país inteiro na cauda da União Europeia. Sem sombra de dúvida, este 'status quo' necessita de estar ao serviço de uma recuperação económica sustentada na força produtiva de uma juventude formada num exigente sistema educativo cuja planificação não descure, com até aqui, a formação de elites por ir a reboque de manifestações deste jaez.

Embora em plena consciência do risco que corri em deslustrar o brilho desta reunião, com a opacidade do meu verbo, não pude deixar de aceder ao simpático convite que me foi formulado pelo Executivo Distrital do Porto para encerrar, na minha qualidade de presidente da Assembleia Geral deste Sindicato, um plenário em que, ao longo de dois dias, se debateram uns tantos problemas que afectam o ensino em Portugal. Debate com a participação de uma plêiade de ilustres personalidades da vida cultural portuguesa que me precederam neste concorrido fórum. A todos o meu muito obrigado”
(Jornal do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, Março/Abril 2002).

Por aqui se vê que foram forças vivas da sociedade civil, v.g., Assembleia Magna da Academia de Coimbra, reitor da Universidade de Évora, Senado da Universidade de Coimbra e Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, a pontuar todas estas valorosas acções que culminaram com o “Manifesto para a Educação da República” que recolheu 20.000 assinaturas de apoio a um verdadeiro acto de cidadania de individualidades mais representativas dos vários espectros da sociedade portuguesa, da cultura à ciência, da arte aos agentes das actividades económicas e industriais.

E se, como escreveu Paul Valéry, “a política é a arte de impedir as pessoas de meterem o nariz em coisas que lhes dizem realmente respeito”, a subtileza actuante da democracia portuguesa parece ser deixar que as pessoas metam o nariz em coisas que lhe dizem realmente respeito para fazer ouvidos de mercador em nome de uma liberdade de expressão que, por si só, não resolve os graves problemas de uma sociedade que se eterniza em erros do passado.

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