sexta-feira, 7 de maio de 2010

O VELHO ZIRCÃO (1)


Nova crónica de António Piedade publicada há pouco n'"O Despertar":

É comum dizermos que o nosso planeta Terra se formou há cerca de 4500 milhões de anos. Que a vida surgiu no planeta, na forma unicelular, há cerca de 3400 milhões de anos. Que a atmosfera, desta Terra primeva, era pobre em oxigénio - hoje essencial à nossa respiração -, mas rica em outros gases hoje tóxicos à vida (como o dióxido de carbono, o amoníaco ou metano). Mas como sabemos isso?

Sabemos hoje que as células eucarióticas, com núcleo e outros organelos, semelhantes àquelas que hoje nos edificam, terão surgido há cerca de 2000 a 1400 milhões de anos. E que 700 milhões de anos depois, terão ganho estabilidade uma miríade de organismos multicelulares, e uma explosão de formas inundou o planeta. Sabemos isso pela biodiversidade lacrada em estratos geológicos com essa e posteriores idades. Mas como é que marcamos os ponteiros dessas movimentações da crusta e manto terrestre?

Perante estes números, de uma cronologia astronómica em escala, surge-me sempre uma mesma pergunta curiosa: como é que sabemos datar estes eventos, que ocorreram há tanto tempo, um tempo inalcançável pela imaginação mais abstracta, tangível quiçá pela brisa imagética de inúmeras poesias, mas que se volatiliza ao a tentarmos focar?

É, com certeza, através de alguma coisa que, estando presente entre nós, hoje, possa ser analisada pelas técnicas mais finas e nos forneça um número, que nos abra uma janela sobre o passado. Não um número qualquer, mas aguçado pela aresta de acontecimentos catastróficos que evoluíram num determinado sentido e, aparentemente, só nesse, direccionando a história do planeta e da vida que nele floresceu.

Por exemplo, fomos interrogativamente encontrando esqueletos fósseis que, pela análise comparada com os dos animais (e plantas, apesar de elas não terem um esqueleto com um mesmo significado) nos indicaram que já não existia nada igual hoje que vivesse na Terra. Mas quando teriam então vivido, há quanto tempo teriam deixado de existir? Como determinar o há quanto tempo?

As ciências geológicas, físicas e químicas foram determinantes para este conhecimento, ao fornecerem ferramentas analíticas, qualitativas e quantitativas.

O progressivo conhecimento da natureza da matéria e principalmente de uma das suas propriedades intrínsecas veio permitir ler a escala de tempos remotos. Estou a referir-me à radioactividade. Esta, enquanto fenómeno físico, foi descoberta em 1896 por A.H. Becquerel, pela observação que o elemento urânio escurecia uma chapa fotográfica, mesmo quando esta era isolada por um vidro ou papel negro. Mas a dedução que este fenómeno é expressão da natureza dos átomos e que ele é independente do estado físico ou químico em que eles se encontram, foi realizada em 1898 pelos químicos Marie e Pierre Curie.

Na próxima crónica, sobre este tema, irei mostrar como é que o conhecimento da radioactividade foi determinante para a datação das “idades da Terra” e como é que o mineral conhecido por Zircão (de formula química ZrSiO4) nos permite saber quão nova ela é (em relação ao Universo!).

(continua)

Antómio Piedade

1 comentário:

Anónimo disse...

Números inimagináveis em cronologia histórica, mas insignificantes e cronologia cósmica: afinai as harpas, poetas! JCN

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