segunda-feira, 16 de maio de 2011

"A criança não tem um lugar bem definido"

Aqui se destaca um pequeno texto de Agustina Bessa-Luís, enviado pela nossa leitora HR sobre o lugar das crianças nas sociedades contemporâneas e sobre quem deve, afinal, a função de cuidar delas...

“As cidades crescem de maneira anárquica e perversa, a criança não tem nela um lugar bem definido. Procura-se satisfazer os pais, que são uma maioria sugestiva, mas as crianças ficam um pouco reféns do Estado-Nação, que as guarda para um dia trocar por uma produção que consumirá vertiginosamente as suas energias, dando-lhes a ilusão de que o seu processo físico, mental e moral foi cumprido.”

Agustina Bessa-Luís, Dicionário Imperfeito, 2008.

1 comentário:

Anónimo disse...

Se me permitem, acrescento aqui o texto completo:

"Crianças

Vivemos ainda num mundo concebido com propósitos muito rústicos: para lograr sucesso, tendo como única visão da realidade um entendimento material com as coisas.

As cidades crescem de maneira anárquica e preversa, a criança não tem nela um lugar bem definido. Procura-se satisfazer os pais, que são uma maioria sugestiva, mas as crianças ficam um pouco reféns do Estado-Nação, que as guarda para um dia trocar por uma produção que consumirá vertiginosamente as suas energias, dando-lhes a ilusão de que o seu processo físico, mental e moral foi cumprido.
A criança que é despojada da sua riqueza de convivencialidade incrementa a frustração do adulto de amanhã.

Uma pessoa infeliz não pode obter bom resultado com crianças. A infelicidade é um desequilíbrio na balança da sabedoria; a criança percebe isso rapidamente e reage de maneira convivencial, isto é, tomando a infelicidade do adulto como uma prova de inabilidade e de ignorância.

Em Portugal há actualmente uma perfeita improvisação do destino. Todos se contradizem, mas ninguém entra em conflito. De facto, não há nenhum desejo de luta. As pessoas confraternizam com o irremediável, mais do que estão divididas nas ideias.. Isto, quanto aos adultos. Mas as crianças, os adolescentes, são outro território: um território que não aceitará intrusos, como nós todos, a gente vinda duma civilização litigiosa, uma civilização de impropérios, e que parece completamente desinteressada dos seus efeitos. Os meninos troçam e apontam para nós. Cuidado em não ceder à tentação de os massacrar, como sempre sucede."
HR

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