domingo, 22 de maio de 2011

A invasão e a erosão do espaço privado

Texto de Carlos de Sousa Reis muito oportuno tendo em conta o que se pode ver em muitos canais de televisão: concursos, programas para entreter, noticiários centrados no que é do foro privado e intímo.

"A mediatização que atravessa as nossas sociedades apresenta, como é natural, uma duplicidade de oportunidades e ameaças. Todas as coisas que alteram as nossas vidas comportam esta duplicidade e temos de viver com ela. Como assinalava Aldous Huxley, “toda a descoberta científica pode ser subversiva em potência”. A questão está em saber viver com a duplicidade de riscos e vantagens que traz cada nova criação humana.

Comecemos por considerar uma forma de invasão da vida privada para a qual estamos um pouco adormecidos, ao ponto de por vezes nem a reconhecermos. Todos podemos verificar que a televisão entra de forma muito natural no nosso lar. Disse-se que era uma janela aberta para o mundo, porém resta dizer que também é uma porta para entrar dentro de cada casa. Temos de perguntar-nos o que traz, o que faz entrar e o que altera.

Traz muita coisa que, se fizéssemos uma análise séria, não quereríamos deixar entrar e altera o nosso quotidiano de um modo que, se o considerássemos criticamente, também não estaríamos dispostos a aceitá-lo.

De facto, a televisão penetra sistematicamente as relações familiares, promovendo de modo espontâneo – através do aproveitamento do clima de íntima afectividade – estilos de vida duvidosos, o consumismo, a passividade e a ingenuidade crítica.

Aliás, uma vez que não existe uma resposta reflectida e estruturada das famílias perante a exposição à televisão, é com facilidade que ajusta ao seu horário às refeições familiares, propõe certas actividades em detrimento de outras e reúne os membros da família a seu bel-prazer, embora usurpando-lhes o relacionamento, a comunicação e a vida afectiva (Quintas, 2000). Por causa dela não se dialoga, nem se compartem projectos e problemas.

Como bem notaram Popper & Condry (1995), a televisão exerce a sua influência por meio de dois factores: o tempo e o conteúdo. Rouba o primeiro e trafica o segundo. A televisão aparece-nos hoje como um poder incontrolado, que instila valores duvidosos e rouba tempo, que se poderia e deveria dedicar a coisas mais importantes.

Ora, como assinalou Lazar (1980), mais do que culpar a televisão devemos questionar-nos se não teremos outras alternativas mais produtivas de ócio. Devemos questionar-nos por que se aceita que a televisão esteja a absorver a nossa privacidade no seu regime. O que perdemos com isso e que podemos fazer para o alterar."

Referências bibliográficas:
- Lazar, J. (1980?). Escola, comunicação, televisão. Porto: Rés Editora.

- Quintas, S. F. (2000). Los medios de comunicación y la familia (en torno a la televisión). Pedagogía Social, 5, 111-125.
- Popper, K. & Condry, J. (1995). Televisão: Um perigo para a democracia. Lisboa: Gradiva

5 comentários:

Anónimo disse...

A televisão mudou bastante desde 1995 e muito mais desde as referências anteriores. Para melhor e para pior.

Para melhor no sentido de que há hoje imensos conteúdos para além do entretenimento que ensinam e inspiram à acção.

Literalmente, farto-me de aprender coisas na TV que aplico na prática. Saúde, culinária, bricolage, ciência, são apenas alguns exemplos.

Com o enorme número e diversidade de canais, hoje a escolha está do lado de quem vê, já não estamos sujeitos à programação. A pergunta já não é "o que dá hoje na tv?", mas sim "o que não dá na tv hoje em dia?".

Anónimo disse...

Cada criatura tem,
desde a altura em que nasceu,
um território só seu,
ou seja, de mais ninguém!

JCN

Anónimo disse...

SONHAR ATÉ MAIS NÃO!

Sonhar, sonhar, sonhar sempre mais alto,
mais alto ainda do que a torre Eifel,
viver em alvoroço e sobressalto,
passando os sonhos todos ao papel!

Deles fazer o corpo dos poemas
que inspirados nos saem das entranhas,
rivais das mais acrisoladas gemas
que se ocultam no seio das montanhas!

Sonhar até mais não! até que a morte
nos feche os olhos, nos apague a mente,
e para lá dos astros nos transporte!

E mesmo ali continuar sonhando
aos pés de Deus ininterruptamente
e não de longe em longe ou quando em quando!

JOÃO DE CASTRO NUNES

Anónimo disse...

A ninguém Deus concedeu
o direito de intervir
no território que é meu
até deixar de existir!

JCN

Anónimo disse...

Por lapso, este meu soneto saiu deslocado do respectivo "post" subordinado ao título "NUNCA DEIXE DE SONHAR!". As minhas escusas. JCN

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