sexta-feira, 13 de maio de 2011

Uns longos, longos oito minutos

Passou-se na Amadora, um dia destes.

Uma certa família não pagava há vários anos a renda do apartamento onde residia. A execução da acção de despejo, decretada pelo tribunal, resolveu a situação. Não fosse o tempo em dívida, que ia nos dezoito anos, penso que esta circunstância não seria digna de atenção por parte da comunicação social.

Mas os tais dezoito anos já são uma coisita que pode prender a atenção das pessoas… Só que, talvez, não o suficiente para fazer parar em frente ao televisor aquelas que têm olhos gulosos pela desgraça alheia. Juntem-se, então, os ingredientes necessários para mobilizar esses olhos...

E assim aconteceu: com o agente de execução, o arrombador, dois polícias e a advogada do senhorio, estava uma equipa de televisão de uns dos nossos quatro canais generalistas.

Porta arrombada, toda esta gente se preparava para entrar na casa, quando do escuro surgiu uma rapariga. Um pouco descomposta… atónita com toda aquela gente e com as luzes direccionadas para a sua cara, gritou…

Inibo-me de contar o que se passou a seguir, documentado numa longa, longa reportagem de mais de oito minutos (que se poderá ver aqui) até porque, reconheço, não tenho suportes intelectuais para explicar o que vi...

No caso concreto, a lei não estava, como o tribunal decretou, do lado da referida família, mas, ainda assim, não posso deixar de achar estranhíssimo que todos os profissionais referidos tivessem ignorado direitos humanos fundamentais, designadamente a não exposição pública (na televisão, nos jornais e na internet) de uma decisão judicial, que dizia respeito apenas ao tribunal e às partes envolvidas.

8 comentários:

maria disse...

Uma reportagem vergonhosa! Com que direito uma tv entra na casa de alguém sem permissão?E como é que um tribunal permite um absurdo destes?
Tristeza de país!

João Lacerda disse...

Completamente surreal! Então aquele 'pronto, missão cumprida ' a olhar para a camara até chega a meter piada.

Anónimo disse...

Piada... ou asco? JCN

José Batista da Ascenção disse...

E se, por hipótese, o ministério público processasse a empresa de televisão que tão bárbara e insensivelmente expôs a intimidade e a miséria humana, sem consentimento das vítimas?
E se aquela empresa de televisão fosse condenada a pagar uma tal indemnização que nunca mais se atrevesse ao mesmo?
Uma indemnização que desse àqueles miseráveis a possibilidade de um viver digno! Mas a que fosse descontada, com juros de mora, a soma devida pelo não pagamento de renda durante tantos anos... Com(o) aviso claro de que a pobreza e mesmo a miséria não dispensam em absoluto um módico de honradez nos procedimentos...
Mas isto tudo era se o meu país fosse outro país.
E se nós pudéssemos ser outros também...
Embora sendo portugueses, porque outra coisa não podemos ser. Ainda que quiséssemos.

Anónimo disse...

Um espectáculo dos abutres da TV a debicarem carne morta. Com os 5 minutos de glória a que a autoridade judicial tem direito. Lastimável.

Cruz Gaspar

Anónimo disse...

Dá-me tristeza às vezes pertencer
à espécie humana, cuja actuação,
à margem de qualquer razão e ser,
nada mais é que pura perversão!

JCN

José Santos disse...

Obviamente, acho lamentável e perfeitamente escusada a reportagem mas a verdade é que a família em causa aceitou esta exposição, muito provavelmente em troca de algum dinheiro.

É este o mundo em que vivemos, vende-se tudo por dinheiro, até os nossos direitos mais básicos. É uma pena terem chegado a este ponto, mas quanto à exposição é, para mim, opção deles.

Em relação aos outros 'actores', aí já me parece mais grave, a PSP NUNCA devia ter autorizado a participação dos seus agentes e o tribunal NUNCA devia ter autorizado a participação do agente de execução. Estas são instituições que têm obrigação de serem melhores do que isto e não se rebaixarem a este ponto.

Anónimo disse...

No meu poema, corrijo a gralha "razão e ser" por "razão de ser". JCN

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