sábado, 16 de maio de 2009

Poesia nos céus de Lisboa

Eis os poemas que foram espalhados nos céus de Lisboa quando, em 1819, Robertson filho realizou o seu espectáculo de ascensão aeronáutica. A transcrição é da "Gazeta de Lisboa" (com os renovados agradecimentos a João Boaventura) e conservou-se a grafia original. O autor é anónimo.

Soneto

Vendo que além das Nuvens me remonto,
Talvez julgueis que busco o Paraizo.
Não; na bella Ulysséa eu o devizo,
Pois são quaes d’E’den seus jardins sem conto.

Que Formosas Deidades deste ponto
Vejo soltando pudibundo rizo!
Noto Illustres Varões, de grave sizo…
Tudo me anima, subo aos ares pronto.

Se, a estrada errando, não voltar ao Tejo,
Não lamenteis, Senhores, minha sorte;
Que ao Brazil no Balão meus voos rejo;

E ante o Monarca Luso, e a Regia Corte
Expondo o vosso amor, vosso desejo,
Ao Novo Mundo causarei transporte.

Quartetos

Não imagineis, Senhores,
Que eu, subindo aos soltos ares,
Vá buscar regiões melhores
Que a de Lysia além dos mares

Pois alli Elysio vejo,

Mais não posso cubicar
Só quero imminente ao Tejo
Tão lindo quadro observar.

Décimas

1.ª

Parecia que vedara
Para sempre a Natureza
Ao home’ a arriscada empreza
De subir da Terra cara:
Té que o talento depara
Com tão pasmosa invenção;
Montgolfier forma hum Balão…
Sujeita o Ar aos humanos…
Ah ! que milhares de Arcanos
Os tempos descobriráõ !

2.ª


Qual Lunardi aos Lusos deo
Espectaculo brilhante
Subindo aos ares ovante,
Igual empenho é o meu.
Não vou, não qual Prometheo,
Ao So o raio roubar;
Sómente quero observar
Esta sublime atmosfera,
Onde a influencia se gera
De hum Clima tão singular.

Versos anacreônticos

Nas margens do Neva
A’s nuvens subi;
Mas quadro tão lindo
Como este não vi.
Voei do Danúbio
Aos ares ousado;
Mas lá não fiquei
Como hoje encantado. Por vezes do Sena
M’ergui á atmosfera;
Mas ah ! quanto o Clima
De Lysia a supera !
Do Tejo quem chega
O Clima a gozar,
Melhor sobre a Terra
Não póde encontrar.


Adeus, Povo Illustre;

A vós tornarei:
Benigno os meus votos
Fieis acolhei.

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