domingo, 15 de março de 2009

Se é educação integral...

Um dos grandes mitos actuais sobre a educação escolar é que ela deve ser holística, integral, completa. A ideia de que, neste âmbito, se tem de levar todos os sujeitos a “desenvolverem-se” em todas as dimensões (sabemos quantas e quais são?), para que, independentemente das características que possuam, concretizem as suas potencialidades, realizem-se plenamente e, assim, sejam felizes (sabemos o que isso é?), percorre os documentos curriculares, trabalhos académicos e discursos das mais variadas entidades com responsabilidades no ensino…

Esta é, na verdade, uma tendência de pensamento… Tendência que talvez tenha levado o Ministério da Educação e a Câmara Municipal de Lisboa a reconhecerem legitimidade à organização e fundação a que o Carlos Fiolhais se refere…

Mesmo quando não se entra no raciocínio nebuloso patente nos extractos escolhidos pelo meu colega, e com base na ideia peregrina da educação integral, é comum pedir-se ou exigir-se à escola, que prepare os alunos para isto, para aquilo e para o outro… A escola consente e lá vai acrescentando mais esta, mais aquela e mais aqueloutra componente.

Um das poucas vozes discordantes neste cenário é a do filósofo Fernando Savater que vale a pena ler ou reler:
“Todos os anos se incorporam novas disciplinas na oferta académica, que cresce e se diversifica até à exaustão, pelo menos nos planos ministeriais. É obrigatório incluir música, pintura, escultura, cinema, teatro, informática, segurança rodoviária, noções de primeiros socorros, rudimentos de economia política, expressão corporal, dança, redacção e crítica jornalística, etc. (…). É possível argumentar a favor de todas estas aprendizagens e de muitas outras, que podem completar excelentemente a formação dos alunos.

Tanta oferta educativa tropeça apenas em dois obstáculos fundamentais: por um lado os limites da capacidade assimiladora dos alunos e o número de horas lectivas diárias que conseguem suportar sem sofrer transtornos mentais sérios, por outro lado, a disponibilidade docente dos professores, a maioria deles formados numa época em que nem sequer existiam as matérias em que, anos mais tarde, se virão a converter em mestres (…)"
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Obra citada: Savater, F. (1997). O valor de educar. Lisboa: Edições Presença.

1 comentário:

Falcao Exigente disse...

Ora, analisando o início deste artigo:

"Um dos grandes mitos actuais sobre a educação escolar é que ela deve ser holística, integral, completa. A ideia de que, neste âmbito, se tem de levar todos os sujeitos a “desenvolverem-se” em todas as dimensões (sabemos quantas e quais são?), para que, independentemente das características que possuam, concretizem as suas potencialidades, realizem-se plenamente e, assim, sejam felizes"

encontra-se facilmente um paralelo à missão do escutismo, movimento fundado por Baden-Powell, com mais de 100 anos de existência, e que define claramente as várias dimensões de desenvolvimento dum indivíduo.

Senão vejamos:

"A missão do Escutismo consiste em contribuir para a educação (integral) dos jovens, partindo dum sistema de valores enunciado na Lei e na Promessa escutistas, ajudando a construir um mundo melhor, onde as pessoas se sintam plenamente realizadas como indivíduos e desempenhem um papel construtivo na sociedade.

Isto é alcançado:

- envolvendo os jovens, ao longo dos seus anos de formação, num processo de educação não-formal;
utilizando um método original, segundo o qual cada indivíduo é o principal agente do seu próprio desenvolvimento, para se tornar uma pessoa autónoma, solidária, responsável e comprometida.
- ajudando os jovens na definição de um sistema de valores baseado em principios espirituais, sociais e pessoais expressos na Promessa e na Lei."

Será que é mesmo um mito actual, ou uma simples colagem dum sistema de educação não-formal à formação académica ?

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