Minha resposta a D. Duarte de Bragança

Recebi de D Duarte de Bragança a propósito do meu texto aqui publicado "O Santo Contestável" a seguinte "Resposta ao comentário publicado no Público de sexta feira", que venho, tal como me é pedido, divulgar:

"Exmo. Sr. Prof. Doutor Carlos Fiolhais,

Venho solicitar que esclareça os seus leitores relativamente a uma referência que faz a um texto meu sobre o Santo Condestável . Nesse texto eu citava a "Cronica dos Carmelitas", referindo a lenda ou tradição do que teria acontecido às suas tropas em Fátima antes da Batalha de Aljubarrota.

A maneira como cita o meu texto tem a intenção de divertir os leitores, mas não os esclarece. Aparentemente os preconceitos sociais e políticos ainda têm muita importância, mesmo entre as pessoas mais cultas, mas certamente não o impedirão de repor a verdade.

Com os meus melhores agradecimentos pelo esclarecimento que certamente não deixará de fazer.

Dom Duarte de Bragança
Fundação Dom Manuel"

Agradeço a D. Duarte de Bragança a sua tentativa de esclarecimento. Mas, de facto, não esclarece. Tive o cuidado de o citar com cuidado, pois me parecia inacreditável a frase que li sobre a genuflexão dos cavalos de D. Nuno Álvares Pereira na Cova de Iria, antes da batalha de Aljubarrota em 1385:

"Quando passava de Tomar a caminho de Aljubarrota, a 13 de Agosto de 1385, D. Nuno foi atraído a Cova da Iria, onde, na companhia dos seus cavaleiros, viu os cavalos do exército ajoelhar, no mesmo local onde, 532 anos mais tarde, durante as conhecidas Aparições Marianas, Deus operou o Milagre do Sol» (D. Duarte de Bragança, “D. Nuno de Santa Maria - O Santo”, ACD Editores, 2005).

Copiei o texto palavra a palavra e fui agora verificar, tendo concluído existir exactidão na cópia (op. cit., p. 22). Claro que a citação tinha de ser curta dada a limitação de espaço da minha crónica, mas, se fosse maior, seria decerto pior para o autor citado. É daqueles casos que, quando me dizem que falta o contexto, eu posso replicar que com o contexto seria pior.

Para esclarecimento geral fui, porém, consultar a "Crónica dos Carmelitas". O volume conservado na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, embora D. Duarte de Bragança não indique a referência bibliográfica exacta, deve ser este:

- Santa Ana, José Pereira de, O.C., 1696-1759, "Chronica dos Carmelitas da antiga, e regular observancia nestes Reynos de Portugal, Algarves, e seus dominios, ... Por seu author Fr. Joseph Pereira de Sta. Anna, ..., Lisboa : na officina dos herdeiros de Antonio Pedrozo Galram, 1745-1751. 2 vols.

No 2º volume consta a descrição da batalha de Aljubarrota. Mas debalde procurei a descrição da cena dos cavalos na Cova de Iria. Nem conheço, de resto, nenhuma premonição das aparições marianas de 1917 publicada antes dessa data.

Está à vista quem está do lado do lado da exactidão histórica e quem é que tem "preconceitos" (segundo o "Dicionário da Língua Portuguesa 2008" da Porto Editora, "opinião (favorável ou desfavorável) formada antecipadamente, sem fundamento sério ou análise crítica"). O livro da autoria de D. Duarte de Bragança não é particularmente forte no rigor historiográfico, antes está eivado de preconceitos, o que, como é evidente, não favorece a causa do "Santo Condestável", por muitos méritos que este eventualmente possa ter.