Quem viu os filmes Matrix pode ter pensado para consigo: como é que eu sei que não vivemos num mundo de fantasia, como o que é retratado neste filme? Como podemos justificar a nossa crença de que não vivemos na Matrix? Imaginemos que a Paula é um cérebro numa cuba, num laboratório muito sofisticado, e não uma pessoa como nós pensamos que somos. Poderia ela descobrir que é apenas um cérebro numa cuba?
Se as coisas nesse laboratório forem bem feitas, será exactamente como na Matrix. As nossas percepções do mundo exterior chegam ao cérebro através das suas conexões nervosas. Por isso, basta ligar um computador muito sofisticado a essas conexões e produzir exactamente os mesmos impulsos que seriam produzidos se a Paula tivesse um corpo e vivesse no nosso mundo. A Paula vai pensar que está uma árvore à sua frente, quando na realidade à sua frente está apenas uma prateleira do laboratório; vai pensar que está a ver um automóvel, quando na realidade nem sequer tem olhos para ver seja o que for; vai pensar que está a mexer no seu nariz, quando na realidade não tem nariz, nem mãos, nem corpo. Mas como está ligada ao computador tem exactamente as mesmas sensações que teria se estivesse realmente a fazer essas coisas. No filme Matrix as pessoas têm corpos, mas poderiam ser apenas cérebros numa cuba.
Geralmente, pensamos que temos boas justificações para acreditar que sabemos qual é a composição da água, ou a distância da Terra à Lua. Observamos, medimos, raciocinamos, voltamos a medir e testamos. Que outra maneira temos de justificar a nossa crença de que sabemos realmente essas coisas? Mas se o nosso pretenso conhecimento dessas coisas depende dos dados dos sentidos, temos de mostrar que não vivemos num mundo como o da Matrix; temos de mostrar que não somos cérebros numa cuba. Será possível justificar a nossa crença de que não somos cérebros numa cuba?
Este é um exemplo de um problema da epistemologia porque diz respeito ao nosso conhecimento das coisas e à justificação das nossas crenças. Evidentemente, há muitíssimos mais problemas tratados nesta disciplina. Mas fica este cheirinho.
sábado, 26 de maio de 2007
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21 comentários:
Caro Desidério,
Indo completamente fora de tópico, peço as minhas desculpas.
Deparo-me com a seguinte ideia da qual discordo:
"(...) o altruísmo é agir motivado pelo bem dos outros."
A minha convicção é que:
"A motivação principal do altruísmo, é a auto-recompensa; assim sendo, em rigor, altruísmo não existe, aquele no qual há "desapego do interesse próprio"; por mais "duro" que possa parecer.
Gostava de obter a sua perspectiva...
Obrigado,
Mário Miguel
Epistemologicamente não é possível fazer a distinção epistémica entre por exemplo estar a nevar ou o embuste de estar a nevar. Mas é possível epistemologicamente fazer a distinção entre ter uma dor ou um suposto embuste de ter uma dor. Não é possível separar epistemicamente “como se” tivesse uma dor em vez de ter uma dor. Neste caso o embuste não funciona porque ter uma dor é sempre ter uma dor. Esta diferença subtil, remete-me, por exemplo, para a distinção entre percepção e sensação.
Aqui levanta-se-me a questão da confusão de domínios “à moda” de Ryle. É a confusão entre domínio fenomenológico e domínio epistemológico. Faz-me lembrar a questão metafórica da separação entre o domínio da luz e o domínio das trevas… em que ponto é que fazemos a separação?
Poderá o Desidério dizer alguma coisa sobre esta minha confusão entre fenomenologia e epistemologia?
Quando estou a admitir que sou uma mente numa cuba estou, paralelamente, a admitir que não sou uma mente numa cuba, pois se eu não fosse uma mente numa cuba como é que eu podia pensar na possibilidade de ser uma mente numa cuba?
Penso logo existo.
Creio que não é possível justificarmos a crença de que não somos cérebros numa cuba. Poderíamos sempre ser cérebros numa cuba sem que nunca o soubéssemos.
Muitas mulheres, como a Paula, passam nas suas vidas por uma experiência que talvez possa ajudar a resolver o dilema. Um belo dia acordam grávidas e aconteça o que acontecer as suas vidas mudarão para sempre. De repente, são elas próprias a cuba e cresce dentro delas um outro cérebro. Os seus corpos, sem que nada possam fazer para o impedir, mudam todos os dias, contituindo isso, só por si, uma experiência difícil de igualar. É, por outro lado, um desafio intelectual constante: aquele cérebro vai mesmo nascer e serão elas as responsáveis pelo que lhe possa acontecer. Após o nascimento, a experiência começa a sério: todos os dias a um ritmo alucinante (se comparados com o da maioria das actividades profissionais), tudo para aprender e, simultâneamente, inúmeras tarefas a realizar (inadiáveis), um número imprevisível de decisões a tomar (de imediato), cada dia tem que ser uma vitória, enfim uma experiência única em termos de exercício cerebral.
É por isto que duvido muito que a nossa realidade seja fruto de uma qualquer "experiência" numa cuba.
Que laboratório se esqueceria de valorizar o trabalho das mulheres e de beneficiar com a melhoria da actividade mental inerente à maternidade, considerando-as mesmo em desvantagem?
Só um laboratório de muito mau gosto :)
guida martins
O propósito da cuba é simular tudo para iludir o cérebro. O que a cuba de facto faz é iludir o cérebro de que ela (a cuba) não existe. Ora se por hipótese a cuba é perfeita (simula tudo sem falhas), o cérebro não poderá nunca saber da existência da cuba. Porque se o souber, contradiz a hipótese inicial, e a cuba não pode ser perfeita. Fim.
Quanto à crença de que não somos um cérebro dentro de uma cuba, justifica-se com a manifesta incapacidade de o sabermos. Quem quiser acreditar no contrário, tem de assumir uma cuba não perfeita e aí a tarefa é gigantesca, que é propor e fundamentar e testar as falhas que a cuba forçosamente tem de apresentar.
Isto é um problema semelhante ao de acreditar ou não num ser superior que comanda tudo. Deus é a cuba. Não creio numa como no outro.
Carlos Daniel
no meu último comentário, quero subtituir «Não creio numa como no outro» por «Não creio numa nem no outro» pois a frase ficou ambígua dada à palavra «como».
Carlos Daniel
Como é sobejamente conhecido o Solipsismo é logicamente irrefutável. O cogito cartesiano e o "Eu Penso" kantiano são soluções que, em limite, encerram-nos novamente nos limites das percepções pessoais. Ou seja, da certeza apenas da nossa própria existência mental. Parece que estamos sempre condenados, para sair do solipsismo, a partir de crenças justificadas mas que não sabemos se são absolutamente verdadeiras.
Para a experiência ser perfeita, a cobaia não deve poder colocar a possibilidade de poder estar a participar nela.
A experiência, a existir, devia ser perfeita!
Se a experiência não é perfeita porque o seu autor quis que a verosimilhança com a realidade fosse total, ou seja, que a cobaia pudesse colocar infinitas questões e pudesse tomar infinitas opções, então, no limite, todos podemos não participar nela.
Nem autor nem cobaia chegariam a lado nenhum e a cobaia mostrar-se-ia mais perspicaz que o autor da experiência.
A experiência é perfeita porque, ainda assim, foi o autor que pretendeu que as cobaias pudessem, por vontade própria, abandonar a cuba. Uns sairão, outros não.
Neste caso, a resposta à questão - Estamos ou não numa cuba? é, em extremo, irrelevante em termos de consequências para a nossa acção.
Artur Figueiredo
Há um princípio chamado navalha de Occam (nem sei se é essa a tradução portuguesa) que diz que, perante duas explicações, uma simples e outra muito rebuscada, em igualdade de circunstâncias, se deve optar pela mais simples. Eu, por mim, acho a hipótese do matrix demasiado rebuscada.
Se aceitarmos o dualismo (a existência de “substância mental” imaterial e a existência de “substância física” material), Matrix é possível e podemos admitir que as pessoas poderiam ser apenas cérebros numa cuba e pensar, por exemplo, que têm uma dor num pé, sem corpo. Mas se não aceitarmos o dualismo ( e há muito bom filósofo e muita boa gente que não aceita), Matrix é impossível. Ter uma sensação de dor no pé sem pé, é uma inexistência, ou uma impossibilidade, ou uma inconsistência, ou uma incongruência, ou um sem-sentido…
O Fdias disse:
Não é possível separar epistemicamente “como se” tivesse uma dor em vez de ter uma dor. Neste caso o embuste não funciona porque ter uma dor é sempre ter uma dor.
Isto está incorrecto. Uma dor é uma função do sistema nervoso central que pode ser replicada. Alguém pode não ter uma dor e ter uma "dor" porque o seu cérebro é levado a crer que há uma dor presente num pseudo organismo.
Luís
Luís,
Está bem. Se fizer a pouco e pouco transplantes de todos os órgãos, continuarei a ter um corpo. Diferente do suposto corpo genuíno, é certo, mas isto de corpo genuíno oculta uma armadilha. Isto são apenas formas de falarmos, porque ao fim de 7 anos, (dando o benefício a algumas células nervosas que não sabemos se serão perenes), o nosso corpo já não tem nenhuma célula primitiva. O chamado corpo genuíno é capaz de ser uma ilusão..
Este problema já havia sido colocado com a metáfora do barco de Teseu. Ao fim de alguns anos, o barco de Teseu havia recebido paulatinamente tábuas novas até um dia não ter mais nenhuma original. E a pergunta que se fazia era se era o mesmo barco ou não. De certa maneira não deixava de ser o mesmo barco de Teseu. Isto colocava o problema da identidade.
Portanto, parece haver aqui uma falsa questão com o exemplo do pseudo-organismo. Em rigor, parece não fazer sentido o conceito de pseudo-organismos. Existem organismos, independentemente da proveniência das células que o constituem (naturais ou artificiais por transplante).
Mesmo que fosse possível esse cérebro dentro da cuba,o mesmo pressupõe um cérebro fora da cuba,que está realizando o experimento.Ou seja,a ilusão pressupõe a realidade.
“A PERSEGUIÇÃO AINDA CONTINUA”
Massacres, torturas com espancamentos até a morte, demissões, exclusões e expulsões dos civis e militares ativos não alinhados com o Regime Militar, fuzilamentos de brasileiros inocentes e perseguições a todos os políticos e seus familiares, desaparecimento de milhares de brasileiros que a apoiava a classe política do País, dentre eles vários jornalistas, cantores, artistas, escritores, sociólogos e outros. Este foi o saldo negativo que os Comandantes das Forças Armadas deixaram pelo “GOLPE MILITAR de 31 de MARÇO de 1964”, após ter sido instalado o Regime de Exceção no período Ditadura Militar, o qual provocou uma seqüela ainda não cicatrizada, pela decretação do “(AI-5) ATO INSTITUCIONAL Nº. 5” que substituiu as Constituições de 1946 4 1967 neste País
O Partido de Esquerda foi fundado no período do Regime Militar, onde o Líder e Sindicalista Luis Ignácio Lula junto com Vicentinho, criticaram muito administração dos presidentes militares, os quais foram perseguidos e presos. E ao serem libertados defenderam a volta da democracia e os direitos de todos retirados por aquele regime, e hoje como Presidente da República que se proclamou um democrata, após ter feito o juramento de defender a Constituição Brasileira, a primeira coisa a ser feita no transcurso do seu mandato 1º mandato, foi desrespeitar a Lei de Anistia Política 10.559/2002 contrariando a nossa Constituição de 1988, onde prejudicou a maioria dos que tem direito amparados pela referida Lei, concedendo o perdão dado pela anistia somente para uma minoria de amigos e de preferência simpatizantes do seu partido, os quais, até aqueles que ainda não tinham nascidos naquela época, foram contemplados com os benefícios recebidos do próprio Presidente da República, que acabou mais uma vez prejudicando milhares de brasileiros assegurados pela aludida Lei.
Os idosos Ex Cabos da FAB estão indignados com a péssima postura do Presidente Luis Ignácio Lula, que anistiou 3.000 (três mil Ex Cabos) todos parecendo ser seus amigos e parentes. E os demais que foram punidos na mesma situação para estes, a Lei de Anistia 10.559/2002 foi ignorada, onde mais uma vez, estar dando continuidade uma 2ª perseguição a uma parcela considerável de Ex Cabos da FAB, mantendo uma ferida ainda não cicatrizada pelas irresponsabilidades dos Governantes do Regime Militar. Só queremos que o Presidente Lula cumpra a nossa Constituição Brasileira, com objetivo de manter o juramento que vossa excelência fez para defendê-la, anistiando todos os idosos Ex Cabos da FAB que foram penalizados pela Portaria 1.104/Gm3/1964 durante a Ditadura Militar, para acabar de vez com esta perseguição, onde nos quatro do seu Governo culminou com a morte de mais de 4.000 idosos ex militares amparados pela Lei de Anistia 10559/2002, que não foram anistiados como prevê a Lei, sucumbiram por falta de assistência médicas e medicamentos, pelo desrespeito e descaso total por pessoas de idades avançadas, onde a Constituição de 1988 foi totalmente descumprida por alguns setores do seu Governo.
Como disse Heidegger, o escândalo da filosofia não é que uma prova da existência do mundo não exista mas que ela seja procurada. Da forma como Descartes coloca o problema, ele não tem de facto solução (basicamente: a teoria da verdade da representação correcta da realidade tem aporias insoluveis...ficamos perante uma regressão infinita). Mas a forma de colocar o problema pressupôe que a nossa relação com o mundo é a do sujeito-objecto (uma forma de observação teorica). Mas este ponto de partido é um pressuposto teorico que viola a nossa forma básica de relação com o mundo (em que este esquema não se verifica).
A pergunta de Descartes (quer inaugura a epistemologia moderna -o sujeito congnitivo que a epistemologia pressupõe não existia antes de Descartes -a nossa relação com o mundo não era vista à luz da representação) não tem de ser respondida. Podemos rejeitar os termos em que ela é colocada redefinindo a nossa relação com o mundo...
Mesmo que fosse possível esse cérebro dentro da cuba,o mesmo pressupõe um cérebro fora da cuba,que está realizando o experimento.Ou seja,a ilusão pressupõe a realidade.
Isto é falso, pois pressupõe que um acto de encafuar um cérebro numa cuba exige um cérebro. Uma máquina não tem cérebro e pode cumprir essa missão - possibilidade bem explorada pelo filme Matrix.
Luís
O JG disse:
A pergunta de Descartes (quer inaugura a epistemologia moderna -o sujeito congnitivo que a epistemologia pressupõe não existia antes de Descartes -a nossa relação com o mundo não era vista à luz da representação) não tem de ser respondida. Podemos rejeitar os termos em que ela é colocada redefinindo a nossa relação com o mundo...
Experimente-se então uma relação com o mundo sem usar representação. Por exemplo, da próxima vez que o joão atravessar uma passadeira de peões, com carros a passar a grande velocidade, ignore a representação do peão vermelho e a sua representação mental de um carro a atropelá-lo, e atravesse a estrada em perfeita simbiose com o mundo. Vai ver que a simbiose entre si os carros será total.
Depois venha-se cá queixar que a filosofia do Nazi é abstrusa e sem sentido.
Luís
Bem.O que faz o mundo ser real para mim é aquilo que me é impossível fazer.O que devo suportar, ou admitir por não poder mudar por vontade própria.Se tudo dependesse da minha vontade,pouco me interessa se a realidade é real ou virtual, ou seja lá o que for.Se o meu eu não encontrasse barreira alguma,moral ou material...Eu seria a própria Matrix.
A matrix não poderia simular a ela mesma.A verdade seria o pensamento da matrix.
Acho que era isso que Descates queria dizer no Cogito:"Aquilo que em mim duvida deve ser real"O único ser que pode existir absolutamente à sombra de qualquer dúvida é um ser que livremente duvida.
Mesmo que a "res cogitans" em Descartes fosse um ser virtual da matrix,e até mesmo Matrix fosse virtual em relação a uma matrix de segundo grau, etc, mesmo assim, algum grau dessas virtualidades deverá ser a primeira,aquela que deu origem a todas as outras sendo portanto absolutamente LIVRE.
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