A luminescência, emissão de luz por um organismo vivo, material ou por uma reacção química, preencheu o léxico do imaginário mitológico desde os primórdios da História. Um pouco por todo o mundo, da Europa à China, encontram-se testemunhos escritos que confirmam o fascínio exercido por fenómenos luminosos, fogos que ardem sem calor ou a «luz fria» primeiro descrita por Aristóteles.
A «luminescência» foi cunhada por E. Wiedemann em 1888 para distinguir a luz fria da incandescência - termo proposto em 1794 por J. Hutton para descrever a emissão de luz por um corpo aquecido a temperatura elevada. Num artigo clássico no Ann. Physik & Chemie (1888, 34, 446), Wiedemann propôs que «uma substância luminescente» seria uma que «se torna luminosa pela acção de um agente externo que não envolve um aumento apropriado de temperatura». Wiedemann distinguiu seis tipos de luminescência e acrescentou um prefixo ao termo que inventou para as distinguir: fotoluminescência, causada pela absorção de luz; electroluminescência, produzida em gases por uma descarga eléctrica, termoluminescência, produzida por um aquecimento suave; triboluminescência, resultado de fricção; cristaloluminescência, que acontece durante a cristalização e «Das bei chemischen Processen auftretende Leuchten würde Chemiluminescenz genannt»- ou seja, «a emissão de luz associada a processos químicos seria denominada quimiluminescência».
Embora a luminescência fosse desde sempre conhecida e observada pelo homem, a investigação do fenómeno iniciou-se em 1603 quando o sapateiro/alquimista amador Vincenzo Cascariolo observou a emissão de uma luz persistente azul-púrpura queimando um minério a que chamou lápis solaris (pedra solar) que ficou conhecido como pedra de Bolonha (barite, essencialmente sulfato de bário, BaSO4, com alguns dopantes). Cascariolo pensou ter descoberto a famosa pedra filosofal, que supostamente transformaria metal em ouro, mas na realidade apenas sintetizou sulfureto de bário, BaS, o primeiro material fosforescente* de síntese de que há registo histórico.
O fósforo, o elemento mais antigo para que podemos nomear o seu descobridor, foi igualmente sintetizado numa tentativa de obtenção da pedra filosofal. Em 1 de Junho de 1669 o alemão Henning Brand, apelidado O Último dos Alquimistas, descobriu que a destilação com areia de urina devidamente apodrecida dava origem a uma pasta branca com propriedades peculiares, uma das quais ser pirofórica - arder espontaneamente em contacto com o ar. A substância foi chamada fósforo pelo alquimista (Phosphorus, o 'portador da luz') por brilhar no escuro. Brand escreveu sobre a sua descoberta ao matemático e filósofo Gottfried Wilhelm Leibnitz, que a relatou no livro de 1710 Historia inventionis phosphori.
Brand e posteriormente Johannes Daniel Krafft, utilizaram o fósforo como atracção nas cortes europeias e fizeram dinheiro exibindo o portador da luz. Eventualmente o segredo da produção de fósforo acabou por ser conhecido e primeiro Johann Kunckel von Löwenstern na Suécia e depois Robert Boyle conseguiram reproduzir o feito. A fragrante tarefa de «destilar» urina integrou a manufactura de fósforo durante mais de 100 anos, mais concretamente até 1775 quando C.W. Scheele mostrou que era possível obter fósforo (branco, uma das formas alotrópicas deste elemento que se converte por aquecimento em fósforo vermelho e negro) a partir da calcinação de ossos.
A descoberta do fósforo marca igualmente o «fim» da alquimia e o estabelecimento da química. De facto, o século XVIII foi o século de Lavoisier, considerado o pai da Química moderna, em que a nova ciência se tentou demarcar do que era considerado charlatanice pura e dura, que teria impedido o progresso da verdadeira ciência. O exemplo de Brand e Kraft, apenas interessados no dinheiro que a descoberta do fósforo lhes proporcionou, era utilizado como demonstrando a «imoralidade» da alquimia. O primeiro dicionário moderno de Química, de Pierre Macquer, foi publicado em 1766 e proclamava a «química racional», «livre do jargão obscuro dos alquimistas»:
«We have now the advantage of seeing the best days of Chemistry…the profound skill and ardour of modern Chemists, whom we do not attempt to praise, because they are above our eulogiums seem altogether to promise the greatest and most brilliant success. We have seen Chemistry drawing its origin from necessity and receiving a slow and obscure encrease from avarice [dos alquimistas, claro]. To true philosophy it was reserved to bring it to perfection.»
*Fotoluminescência, a emissão de luz de comprimento de onda maior que o absorvido, na realidade designa dois fenómenos diferentes, a fosforescência e a fluorescência. Este último fenómeno foi nomeado por George Gabriel Stokes em 1852 na revista Philosophical Transactions of the Royal Society, após ter observado que a fluorite, fluoreto de cálcio, CaF2, emitia luz visível - violeta- quando iluminada com radiação ultravioleta.
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6 comentários:
Bom, independentemente do espectro contínuo ou às riscas, 100.000 visitas é muita visita. Permita-me que distribua os meus parabéns.
Sobre o fenómeno da emissão e das diferentes velocidades de "decaimento" electrónico, acho que é daqueles caprichos da natureza que podia aprofundar aqui. Já falámos em fosforescência, agora leve-nos em visita a uma lâmpada de cátodo oco. Grupos de 20, em formatura, nada de fotografias.
É interessante notar que no relato bíblico do Génesis a luz (com tudo o que ela encerra de energia) foi das primeiras coisas a ser criada por Deus. Ela é uma maravilha da criação.
As leis da física e da química são elas próprias uma criação de Deus, as quais, evidentemente, não limitam a Sua actuação. Isso mesmo reconhecia o grande Isaac Newton e,em boa medida, Albert Einstein.
Só uma visão naturalistica do mundo, de base ideológica, pode levar as pessoas a não verem evidências da criação de Deus na natureza.
A natureza é a principal evidência da existência de Deus, já que a natureza não se consegue explicar a ela própria. As leis da física são de conservação e entropia e não de criação.
As leis naturais não se conseguem explicar com base nas leis naturais, já que estas necessitariam sempre de explicação, a qual, em última análise não poderia ser buscada em leis naturais carecidas de explicação.
A Bíblia apresenta Deus, repetidamente, como fonte de Luz. Por seu lado, Jesus disse: "Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida."
Anónimo das 11:22:
Mais do mesmo, do seu mestre (será?) Jónatas...
Luís Azevedo Rodrigues
Bem vista, foi a invenção dos óculos escuros!
guida martins
Ó anónimo!
Como é que você sabe que a natureza não se consegue explicar a ela própria? (tente responder sem citações da bíblia, se conseguir...)
Olhe que a ciência ainda não acabou!! E, para além disso, mesmo que o Homem nunca consiga explicar inteiramente a natureza, já lhe ocorreu que isso se poderá dever às obvias limitações do cerebro de mamifero que nós temos?
Ena! quem diria que o fósforo escureceu a alquimia... ilumine-se esse dia! :)
E eram avarentos os alquímicos... e sabe-se lá se cínicos! ;)
Esta insistência em associar pretensas riquezas... e espertezas!... a todos aqueles que não alinham pelos cânones do realismo materialista dito "científico", traz água no bico... Bem, espero que não haja cientistas ricos hoje em dia, como o Nobel outrora! :D
Mas considerando mesmo apenas a versão "química" da Alquimia - que é em essência uma visão filosófica espiritualista do universo - ainda há por aí alguns cientistas que não são lá muito alinhados com o "status quo", vá lá!
Ou ainda, o tal ideal da transmutação continua a sobreviver, muito particularmente no intrigante fenómeno das "transmutações biológicas", um conceito de novo trazido à ciência pelo cientista francês Louis Kervran e que continua a não ser admitido pela comunidade "mainstream", como seria de esperar.
Logo, não sei se o fósforo acabou mesmo lá com a tal raça, parece que eles voltaram com o cálcio... e será que querem massa?! ;)
I have never confused respect for science with the taboos imposed by intellectual conformism.
Corentin Louis Kervran, 1975
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