quarta-feira, 11 de abril de 2007

CONSCIÊNCIA SEM CIÊNCIA


Foi o sociólogo Edgar Morin que disse que era preciso consciência para fazer ciência. Nada mais certo. A consciência também pode ser estudada pela ciência. Mas há quem se debruce sobre a consciência deixando a ciência de fora...

Basta ver o livro "Science and the primacy of consciousness: intimation of a 21st century revolution", vol. 1 da colecção "Readings in the Cosmology of Consciousness", publicado pela obscura The Noetic Press, Orinda (Califórnia), nos Estados Unidos, no ano de 2000. Deve ter sido resultado da febre do milénio!

O livro, ou melhor parte dele (11 dos 39 capítulos originais) está traduzido em português, com o título "A revolução da consciência", publicado pela mais conhecida editora Vozes, de Petrópolis, Brasil, em 2004. Os seus editores são o médico brasileiro Francisco Di Biase, autor de "O homem holístico" e o norte-americano Richard Amoroso", psicólogo que inventou o transdutor cerebroscópico. A colecção em que se insere chama-se "Psicologia Transpessoal".

Basta ver o índice para verificar que se trata mais de pseudo-ciência do que ciência. Por exemplo, um dos autores (Amit Goswani) fala de "um novo paralelismo quântico-psicofísico", outro (Rupert Sheldrake) fala da "mente ampliada". No final Goswani conclui: "Na cura da mente e do corpo, as energias vitais tornam-se importantes uma vez mais" (rima mas não é verdade!). As séries em que se insere o livro tanto no original como no Brasil não deixam também margem para dúvidas: "A Transpessoal é um ramo da Psicologia que estuda os diferentes estados de consciência pelos quais passa o ser humano (...) A Psicologia Transpessoal estuda a relação desses estados e a vivência da realidade, mais particularmente a consciência cósmica".

Mas o mais espantoso é que há uma "Portuguese connection": os artigos do livro são as conferências apresentadas num congresso internacional realizado de 22 a 24 de Abril de 1998 na Universidade de Lisboa, com apoios da Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação daquela Universidade e da Fundação Bial. E esta hein?

17 comentários:

Anónimo disse...

Ver aqui:

um comentário interessante sobre propósito de alguns cientistas em subverter a ciência ao interpretar o colapso da função de onda como uma necessidade de integrar o sistema que a faz colapsar (observador) na descrição física do fenómeno.

Isto está vagamente ligado ao post, especialmente quando algumas propostas começam a elucubrar sobre uma extensão da teoria quântica ao cérebro e, por conseguinte, ao último dos observadores dos dados fenomenológicos.

José Luís Malaquias disse...

Possivelmente, a UNL, a FPCEUNL e a Fundação BIAL não tiveram "consciência" de quem estavam a patrocinar.

Paulo disse...

o exemplo citato é realmente ridiculo,

o que não quer dizer que a questão não possa ser abordada,

e há quem o faça de forma séria, por exemplo, Alan Wallace, e só para aguçar a curiosidade

http://video.google.com/videoplay?docid=983112177262602885

ou ainda muito melhor

http://www.uctv.tv/search-details.asp?showID=6442

as questões que Alan Wallace coloca são de alguma forma "incómodas" para alguma ciencia,

uma das formas de diminuir a questão é colocar todas as abordagens no mesmo saco, falo neste caso no trabalho que se quer considerar sério e na ciencia-circo-entretenimento, espero que o seu post não seja uma forma de diminuir a questão mas sim de diferenciar as abordagens

relacionado ainda com o tema decorre neste momento a 14º conferencia Mind and Life em Dharamsala, sempre muito muito interessante de acompanhar

Anónimo disse...

Tal como os autores dessa pseudo-ciência, que deve resultar de uma profunda junção confusa entre ignorância e pretenciosismo, o anónimo também desconhece aquilo que está a dizer. A subersão, como estupidamente a denomina, está intimamente ligada à teoria quântica e tem sido extensamente abordada desde da sua origem, tanto por cientístas como filosofos. É um problema sério e inevitável para todos os que abordam os profundos problemas dos fundamentos da física quântica. Só numa visão radicalmente instrumentalista se pode pensar que existe "subversão" da física, neste caso. Em relação ao problema da consciência, qualquer pessoa, com o mínimo de formação filosófica, percebe que não é um objecto de estudo que possa vir a ser completamente determinada no âmbito da ciência. Talvez um dia se possa fazer um seminário, sério, sobre esse assunto.

antfilfon disse...

Uma interessante explicação sobre o fenómeno da consciência vem descrita aqui.

Anónimo disse...

"A subersão, como estupidamente a denomina, está intimamente ligada à teoria quântica e tem sido extensamente abordada desde da sua origem,"

Se lesse o link, teria evitado interpretar mal as minhas palavras. Por outro lado, a forma iletrada como redige o seu comentário só revela a profunda confusão que vai na sua cabeça.

Posto isto, deixe-me apenas dizer-lhe que se um hipopótamo está a observar um fenómeno, você, apesar de parecido, também deverá ver a mesma descrição do fenómeno.

Porquê? É simples, o objecto da ciência deve ser independente do observador, por construção e por definição. Ao tentar integrar o observador de forma activa na descrição do fenómeno, estamos a fazer treta.

A visão radicalmente experimentalista é a única coisa que financia a ciência, é a única coisa que faz sentido à ciência, é a definição de ciência.

Anónimo disse...

"Posto isto, deixe-me apenas dizer-lhe que se um hipopótamo está a observar um fenómeno, você, apesar de parecido, também deverá ver a mesma descrição do fenómeno." Como sabe disso? É um hipopótamo?

"Porquê? É simples, o objecto da ciência deve ser independente do observador, por construção e por definição. Ao tentar integrar o observador de forma activa na descrição do fenómeno, estamos a fazer treta."

É incrível que, dois séculos passados sobre a morte de Kant, exista ainda quem não tenha despertado do seu sono dogmático. O objecto de conhecimento empírico é sempre subjectivo. Qualquer aprendiz de filósofo lhe pode ensinar isso. Aliás, defender que o sujeito epistémico - o tal observador) não participa activamente na descrição (formal) do fenómeno é, no mínimo, um contra-senso. Vejo que o Anónimo falha por completo em perceber o problema da consciência na Física Quântica. Aliás, anonimamente nem sequer perceber como este problema se liga intimamente com o idealismo material. Leia, sobre este assunto, um pouco, por exemplo, de Popper.

"A visão radicalmente experimentalista é a única coisa que financia a ciência, é a única coisa que faz sentido à ciência, é a definição de ciência."

Socorro! Tanto disparate junto! "Visão radicalmente experimentalista é a definição de ciência"?? É a única coisa que faz sentido em ciência?? Socorro! Estão, aqui, a tentar assassinar dois milénios de esforço da razão humana. Alguém acuda!

Desculpe, afinal vejo que não só não percebe o problema da consciência na FQ, como tem também uma total ignorância por toda a epistemologia. Ou melhor, por toda a metafísica.

Por favor, se não quer andar a fazer treta, não se meta nos fundamentos de qualquer ciência.

P.S. Desculpe a minha iliteracia formal. Acredite, eu fui muito condescendente com a sua iliteracia material.

Anónimo disse...

Você desatou a chamar-me de ignorante, material, ou o que o valha. Não sabe discordar de mim sem me apelidar de ignorante? É insegurança?

Eu tenho consciência plena dos desafios interpretativos que a MQ gera, como deixei patente noutros comentários. Mas tal não me leva a dissertar muito profundamente sobre as consequências dessa interpretação levadas às últimas consequências.

E não me leva a dissertar porquê? Porque a interpretação começa a sair fora do âmbito que interessa, e o âmbito que interessa é poder aplicá-lo à realidade, e como tal, a realidade tem de ser tomada como exterior ao observador, sobre pena de, em caso contrário, não termos descrições fenomenológicas capazes de produzir resultados sobre uma realidade.

Quem utiliza a mecânica quântica não se costuma preocupar com essas questões interpretativas hard-core, pelo simples facto de que não levam a lado nenhum. Se levar a algum lado não é, com certeza, no âmbito da ciência nem no âmbito dos resultados.

Por conseguinte, ao contrário de perder tempo em teorias que não servem para nada (as interpretações hard-core da mecânica quântica), é melhor fazer algo que sirva para produzir resultados experimentais. Até porque, vendo bem, há sempre a possibilidade de a mecânica quântica poder vir a ser reformulada eliminando a necessidade de interpretações tão inquietantes.

Anónimo disse...

Acrescento mais coisas:

A mecânica quântica não nasceu da dialéctica fenómeno-numeno (acho que esta dialética era Kantiana), nem nasceu da filosofia.

Por incrível que pareça (not, não é incrível, é ciência!), a Mecânica Quântica nasceu da necessidade de prever resultados experimentais ou, dito de outra forma, de modelar matematicamente os resultados experimentais.

A MQ não nasceu porque o Bohr, o Heisenberg e o Schrodinger andaram a ler Kant e acharam que deviam incluir o observador no sistema. Que o observador acabou por vir ligado ao sistema físico, foi um efeito colateral. Não é ciência, porque não se prova que, por exemplo, a interpretação Many-Worlds está correcta, porque não é testável.

Portanto, se quer a minha opinião, a interpretação feito sobre a MQ excede o propósito da criação dela. E se calhar, isso deve ser tomado como uma inevitabilidade, ou como um defeito do modelo matemático.

Anónimo disse...

Para os dogmáticos científicos, ou os cientisto-religiosos, há dois problemas interessantes que não os devem sossegar:

1) O caos. O teoria de caos permite descrever algumas propriedades do comportamento de um sistema esquecendo por completo a sua dimensão física, isto é, esquecendo a descrição tipicamente física do sistema, ou seja, despreza a noção atomista que é a base da ciência típica (não interessam as forças, as partículas, não interessa nada). Esta descrição está longe de ser satisfatória, mas resulta e tem muitos resultados, no mínimo, inquietantes para quem anseia construir o mundo a partir de fenómenos elementares.

O caos, ao conseguir produzir resultados correctos, coloca a seguinte questão? Até que ponto os resultados que andamos a prever com teorias atomistas (física) não podem ser construídos com uma outra teoria consistente que "veja" o mundo de outra forma? E aqui o "ver" está entre aspas, porque ver é no sentido de "modelizar matematicamente".

Pode-se no entanto argumentar, que o caos provém do desconhecimento de todas as variáveis que compõem o sistema, ou que, embora conhecidas, não se conhecem com a precisão necessária para fazer uma previsão analítica acertada do andamento do sistema.

Não me oponho a esta ideia, o relevante é que é possível descrever propriedades da evolução de um sistema olhando-o de uma forma completamente diferente. Tão diferente, que desafia a interpretação, tal como a MQ.

2) A termodinâmica é a mãe da física, e a mecânica Newtoniana o pai. Ora, a termodinâmica nasceu donde? Por incrível que pareça, é muito velhinha, no entanto é intocável. Intocável porque é toda experimental, não há bloco mais sólido que a termodinâmica, não tem intuição, não tem nada, tem quantidades experimentalmente relacionadas. Tem leis, que são assim porque se verificou experimentalmente que são assim.

Depois temos a física moderna, que por muitos passos que vá dando, quer sempre casar com a Termodinâmica. E quer casar com a termodinâmica porquê? Porque a termodinâmica está certa!

Agora, não é possível partir de descrições estatísticas diferentes, para um mesmo sistema (ou até outras que não estatísticas), e conseguir casar também com a termodinâmica? Não interessa se é ou não.

Parto do princípio que o modelo é intuitivo (numa idealização atomista), e tomo isso como sendo a interpretação certa para a realidade. Mas essa interpretação não está certa nem errada, é prática, produz resultados experimentais, vale!
Tirando isso, nada mais se pode dizer.
Agora, a questão é, até que ponto é legítimo eu começar a dissertar filosoficamente sobre o modelo matemático que vai casar com a termodinâmica, se poderá haver outros, com interpretações não intuitivas? (não atomistas)

Anónimo disse...

A mecânica quântica não nasceu da dialéctica fenómeno-numeno (acho que esta dialética era Kantiana), nem nasceu da filosofia.

Podia ter isolado outro parágrafo qualquer do seu texto, que a conclusão seria a mesma: não sabe nada sobre o que está a tentar dizer. Nem em relação a Kant, nem em relação à Quântica (pode até saber as contas - eu também sei - mas não entende, certamente, nada delas). Enfim, mais um exemplo de quão acre é a mistura da ignorância com o pretenciosismo.

A bibliografia sobre este assunto é muito extensa. Mas experimente, para começar devagarinho, por ler, por exemplo:

A teoria dos quanta e o cisma na física - Popper

A imagem da natureza na Física moderna - Heisenberg

Anónimo disse...

Grato pela indicação dos livros.

Devo também concluir que, apesar de eu ser pretensioso, você é imbatível quanto a isso.

Sou tão ignorante que não vou ler esses livros, por não ter tempo, mas ficou a indicação. Poderia, por outro lado e admitindo que esses livros são consensuais para todos os cientistas, iluminar-me só um bocadinho ligeiro, não vá eu ficar tão pretensioso como você.

Anónimo disse...

E não vamos entrar em contas, que eu passava-lhe já um exercíciozinho e ía ser a bonita.

Anónimo disse...

"E não vamos entrar em contas, que eu passava-lhe já um exercíciozinho e ía ser a bonita."

Obrigado. Já me bastam aquelas que a minha actividade académica ( na área da Quântica) obriga.

Quanto ao resto...pois, tem tanta falta de tempo que nem tem tempo para crescer. Pobre coitado. Olhe, enfim, continue a frequentar - como tem tido tempo para o fazer - este estabelecimento de ensino.

Grato pela sua atenção.

Anónimo disse...

Tem de aprender a ser mais original.

A piada da "atenção" foi introduzida por mim. Quanto à outra do estabelecimento de ensino, foi muito bem conseguida.
Quanto ao "vá frequentando", não espero ir tão longe como você.

Espero que tenha oportunidade de ler isto (que se segue) antes de ser removido por alguém zeloso pelo bom nome deste site.

Vá-se foder, várias vezes ao dia, sem intervalos. Se quiser, pode vir ter comigo, já que aparenta conhecer-me, e podemos tratar aqui da presunção como eu gosto, isto é, vamos ver quem arrebenta o focinho a quem.
No entanto, se não quer ter a iniciativa, diga-me quem você é, que eu tratarei de lhe resolver os problemas.

Anónimo disse...

Um comentário sério:

Partindo do princípio que eu sei menos que você (é possível), a sua atitude foi construtiva? Não me mostrou onde eu estava errado, não me corrigiu, limitou-se a mandar bitaites e a sustentar os bitaites com uma eventual superioridade na compreensão do tema.

Depois, adornou essa sua postura endeusada com referências vagas a chavões que não fazem sentido algum.

Eu posso estar errado no que penso, é sempre possível estar-se errado, agora você não me mostrou aonde é que eu estava errado. É preciso ser muito snob para se estar convencido que se tem razão quando nem sequer se faz um debate de ideias.

Posto isto, não vou concluir como você o faria, considerando-o estúpido, ou ignorante. Vou, isto sim, concluir com o que pode ser concluído do que você escreveu: você não é uma pessoa decente, porque não tem o mínimo trato.

Anónimo disse...

Já vi que as ciências noéticas não são muito conhecidas por aqui... Ah! E quanto a pseudo-ciência, basta apenas ler um bocadinho acerca da evolução da ciência para ver quantas vezes a tal "pseudo" lá teve de ser incluída nos manuais, logo muitas vezes tem de se engolir o orgulho, que remédio! ;)

Esclarecendo... A Noetic Press é a editora do Institute of Noetic Sciences - http://www.noetic.org/ - uma organização que nasceu após o antigo astronauta Edgar Mitchell ter tido uma vivência "life-transforming" durante uma missão espacial, em 1971.

O termo "noético" tem a sua origem no grego nous, cujo significado é "conhecimento interior" ou a intuição directa da realidade. Só sobre isto já haveria muitíssimo a dizer, pois uma tal definição enquadra-se nos objectivos da Psicologia Transpessoal, também referida no texto.

Basta ver o índice para verificar que se trata mais de pseudo-ciência do que ciência.

Hummm... isto soa muito a parapsicologia ou qualquer capacidade transcendente extraordinária, ó Fiolhais!!! :)

Aliás, as 4 breves citações são perfeitamente anódinas e não se descortina nelas nada de especialmente anti-científico... nem à lupa!!! Ou ainda, será bom que não nos percamos unicamente nalgum léxico um pouco mais arrevezado - que nem sequer existe em nenhum desses exemplos, volto a frisar! - e assim fiquemos embasbacados a olhar o dedo que nos aponta a Lua, não é verdade?!

E que tal um comentário um pouco mais sério e científico acerca de algum dos livros de Goswami, que é um físico quântico teórico e foi durante 32 anos professor na Universidade de Oregon? Sugiro "O Universo Autoconsciente" que é sem dúvida a sua obra mais radical. Ora bem e só o título original é de deixar os cabelos em pé, não?! ;)

Voici: "The Self-Aware Universe: How Consciousness Creates the Material World"

Isto, conjuntamente com os vídeos de Alan Wallace indicados atrás, já é muita... mas mesmo MUITA!!!... food for thought! Mas claro, é preciso ter um espírito aberto e com fome de verdade, recusando ficar meramente parado no tempo e preso a um paradigma materialista que ainda não inclui a consciência... pois a ânsia de saber é o fito da Ciência!!!

Por fim, e aproveitando até a explicação do nome deste belíssimo blog Rerum Natura, a verdadeira questão científica, filosófica e religiosa que cada vez mais se coloca é saber qual a natureza última do vazio ou o nada material de onde o Universo terá surgido, seja por flutuação quântica ou fiat lux ou o que mais se vier a descobrir ou inventar!

What is NOTHING after all?! Could it be the seed of EVERYTHING?! I guess so, and in that "emptiness" there is total "awareness"! :)

So now we have science within consciousness, a new paradigm of science based on the primacy of consciousness that is gradually replacing the old materialist science. [...] the new paradigm resolves many other paradoxes of the old paradigm and explains much anomalous data. (Amit Goswami)

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