quarta-feira, 4 de abril de 2007

CIÊNCIA E PRECONCEITO

Um preconceito largamente expandido é que os ratinhos, como outros mamíferos, vêem em tons de cinzento. Seriam cegos para as cores…

Este é um preconceito que se instalou não se sabe como. Os ratinhos têm dois pigmentos fotorreceptores, as rodopsinas, que respondem nos comprimentos de onda do azul e do verde-vemelho. Isso significa que a sua visão se aproxima da de um daltónico. E é claro que um daltónico vê cores. Apenas confunde cores na gama do verde-vemelho, porque não possui um terceiro pigmento.

Embora não possamos perguntar aos ratinhos como vêem, podemos verificar experimentalmente se os ratinhos conseguem discriminar cores e quão sensíveis são a cambiantes.

Recentemente foi produzido um conjunto de ratinhos geneticamente modificados, aos quais foi adicionado o gene para a produção de um dos pigmentos dos cones da retina que permitem a nossa visão colorida.

Concluiu-se que esses ratinhos conseguiam distinguir cores que os seus parceiros normais não conseguem. Isto é, passaram a ver mais cores. O mais extraordinário é que basta uma alteração nos pigmentos da retina para modificar a visão do animal. O mesmo se deve verificar na nossa espécie. O cérebro, ao que parece, não limita essa possibilidade.

A visão não termina ao nível dos olhos. Os sinais eléctricos produzidos na retina são processados numa região específica do cérebro, o tecto óptico. A organização dos neurónios nessa região, durante o desenvolvimento de uma pessoa, depende da existência de estímulos visuais. Se eles não existirem, não se forma a rede de interacções entre neurónios necessária à visão. E esse processo é irreversível. É por isso que algumas formas de quase cegueira à nascença, se detectadas a tempo (menos de 4 anos) podem ser corrigidas.

Contudo, parece que para se ver mais cores não é preciso alterar o hardware a nível cerebral. Bastará ter mais famílias de detectores ao nível da retina para se passar a ver mais cores.

Os ratinhos têm uma visão semelhante à maioria dos mamíferos. Apenas uma parte dos primatas, na qual nos incluímos, possui visão assente em três tipos de fotorreceptores. Mas, não somos os campeões da visão colorida. De facto, as aves, por exemplo têm quatro tipos de fotorreceptores, o que foi herdado dos seus antepassados répteis (e é comum não só nestes como nas rãs e nos peixes ósseos). Os mamíferos, por seu turno, tiveram um longo período de adaptação à vida nocturna, o que terá conduzido à perda de cones, reduzindo-se a dois tipos. O terceiro tipo de cone que possuímos e não partilhamos com a maioria dos mamíferos surgiu mais tarde, num grupo de primatas diurnos, a partir do qual nós evoluímos. A teoria da evolução explica isso e muito mais.

A visão animal é explicada na exposição ‘Segredos da Luz e da Matéria’ patente no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra, através de módulos interactivos, experiências virtuais e objectos históricos. O visitante ficará a saber mais …

6 comentários:

Musicologo disse...

Eu achei esta notícia especialmente fascinante. O que me levantou logo questões éticas interessantes. Será possível num futuro implementar modificações genéticas de forma a um humano ter mais fotoreceptores? Por exemplo poder captar também os infra vermelhos que tanto jeito dão para visão nocturna? Será que tendo genes capazes de fazer essa recepção o cérebro se adaptaria à nascença e teríamos um humano super visual? Humanos com mais visão!... e as consequências que depois daí poderiam advir para o quotidiano ou até para a arte, todo um mundo de possibilidades...

Anónimo disse...

não quero ser pessimista, mas nesse mundo de possibilidades acho que as mais apeteciveis seriam soldados com visão noturna, como sempre os avanços na ciencia têm aplicações para o bem e para o mal.

Anónimo disse...

interessante artigo, ainda mais porque faz uma das referencias mais importantes no que à visão diz respeito, «o do desenvolvimento e estimulo dos neurónios , durante o desenvolvimento de uma pessoa», ou melhor dizendo, das crianças, com efeito ainda hoje a grande maioria da população não sabe o quanto importante é a correcta percepção dos estimulos visuais na criança. algumas ametropias com especial destaque para o astigmatismo elevado , se forem correctamente «dirigidas» com uma boa prescrição durante a fase de crescimento podem mais tarde originar uma acuidade visual na fase adulta na ordem dos 8/10 e até mais elevada. Se pelo contrario estas ametropias não forem corrigidas a tempo originam ambliopias ( acuidades visuais na ordem dos 1/10) completamente desnecessárias, que não podem ser corrigidas em adultos mesmo com a correcção adequada porque nesta altura o olho "não sabe ver". Dai a extrema importancia dos rastreios visuais em escolas, algo que alguns de nós fazem sem ter um unico apoio estatal, nem mesmo um «obrigadinho».
No dia em que os rastreios visuais fores obrigatórios em todas as escolas , garanto que o insucesso escolar baixa 20% num unico ano.

Satanucho

Paulo Gama Mota disse...

Caro Musicologo

Creio que seria possível, no futuro fazer esse género de modificação genética. Não sei se seria interessante, porque não há bela sem senão. Provavelmente, teria uma perda em cones responsáveis pelas outras cores. A densidade de cones na zona mais importante - mesmo em frente à iris - não aumentaria, pelo que haveria uma diminuição algures. Os riscos daí decorrentes provavelmente não compensariam. Por outro lado há dispositivos tecnológicos que permitem ver no infra-vermelho sem necessidade de manipulações genéticas.

O que pode ter de interessante é a possibilidade de dar visão colorida a quem tem cegueira integral para as cores. Mas, não sabemos se isso será possível, porque se trataria de corrigir um órgão já construído e não de o produzir de início.

Paulo Gama Mota disse...

Caro Musicologo

Creio que seria possível, no futuro fazer esse género de modificação genética. Não sei se seria interessante, porque não há bela sem senão. Provavelmente, teria uma perda em cones responsáveis pelas outras cores. A densidade de cones na zona mais importante - mesmo em frente à iris - não aumentaria, pelo que haveria uma diminuição algures. Os riscos daí decorrentes provavelmente não compensariam. Por outro lado há dispositivos tecnológicos que permitem ver no infra-vermelho sem necessidade de manipulações genéticas.

O que pode ter de interessante é a possibilidade de dar visão colorida a quem tem cegueira integral para as cores. Mas, não sabemos se isso será possível, porque se trataria de corrigir um órgão já construído e não de o produzir de início.

Anónimo disse...

se o olho humano tivesse a capacidade de ver acima dos 780nm (infravermelho) iriamos realmente ver muito bem de noite mas de dia ia ser uma desgraça, já exprimentaram acender uma lanterna à noite usando um aparelho de IR ? era m ais ou menos o que aconteceria se tivessemos visão no IR

satanucho

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