A notícia de hoje do Diário de Notícias, “Formação dos Pais Decisiva no Sucesso Escolar dos Filhos”, torna mais plausível a hipótese de que a política educativa promovida ao longo das últimas décadas no nosso país é socialmente discriminatória: favorece as crianças de classes culturalmente favorecidas.
Como se faz tal favorecimento? Como foi defendido neste blog, essa discriminação faz-se baixando os padrões de exigência cognitiva nas escolas, eliminando exames nacionais e conteúdos cognitivos sólidos dos programas, eliminando as disciplinas centrais do conhecimento e substituindo-as por vacuidades vagamente relacionadas com a “cidadania” e brincadeiras que os próprios estudantes desprezam.
Isto pode parecer paradoxal. Mas se a escola deixa de ser cognitivamente exigente e em vez de ensinar matemática a sério ensina brincadeiras vácuas, os estudantes culturalmente carenciados nunca irão contactar com a matemática a sério — mas os outros contactam, claro. Até porque os outros frequentam muitas vezes os melhores colégios privados, ou escolas de excelência, no centro das cidades, que os estudantes culturalmente carenciados não podem frequentar. Quando o sistema educativo em si não é exigente, coloca os estudantes culturalmente mais carenciados em desvantagem relativamente aos estudantes que têm acesso ao ensino de alta qualidade, ao estímulo cognitivo que resulta de um ambiente familiar onde há livros, articulação de ideias, estudo e valorização da escola e do conhecimento.
Para se compreender a mentalidade pedagógica que tem regulado a política educativa nacional é preciso compreender a crença errada que tem animado a sua perniciosa acção ao longo de décadas. Essa crença é de tal forma escandalosamente falsa, que basta formulá-la claramente para toda a gente a negar. A crença é que os filhos das famílias culturalmente carenciadas têm intrinsecamente menos talentos e interesses cognitivos do que os outros. Além de falsa, esta crença é eticamente repugnante porque é “classista”: é ter a crença de que certas classes sociais têm geneticamente mais capacidades cognitivas do que outras.
É esta crença falsa e eticamente inaceitável que explica a ideia querida do “eduquês” nacional: para combater o insucesso escolar, provocado pela massificação do ensino, é preciso baixar os padrões, porque os pobres que invadiram a escola, que era coutada dos ricos, são estúpidos. Não ocorre aos responsáveis pelas políticas educativas dos diferentes ministérios que o problema é a escola não saber ensinar quem não vem ensinado de casa. Não lhes ocorre porque têm a crença de que tais crianças não são genuinamente ensináveis por causa das suas limitações cognitivas. Filho de cigano, de pobre, de negro ou de seja quem for que não tem uma licenciatura não tem talento cognitivo para se interessar pela física quântica nem pela música clássica e por isso nem vale a pena a escola promover tais coisas. E assim se vai desperdiçando talentos que, geneticamente, não escolhem classes sociais.
segunda-feira, 2 de abril de 2007
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20 comentários:
Boa noite a todos.
A questão da massificação do ensino é mais um exemplo do resultado de análises apressadas e superficiais dos resultados de vários estudos.
A partir de resultados de estudos de Sociologia da Educação, chegou-se à conclusão que a escola é uma escola de massas (todos têm direito à educação; mas pelos vistos não de qualidade!). Por si só não necessitaria de ser um problema, excepto quando, em vez de se pretender promover um ensino de qualidade para todos, quis-se - erradamente! - baixar o nível do ensino no geral.
É o resultado de análises apressadas e superficiais dos estudos que são feitos. Assim em vez de se promover uma escola que permitisse a todos abrir os seus horizontes, esta acaba por reproduzir as desigualdades da sociedade.
E depois ainda falam em ensino democrático...
Cumprimentos,
José Oliveira
Tomar
Não penso que as coisas sejam assim tão complexas. São bem mais simples do que parecem: os ministros da educação querem apresentar bons resultados; para isso dificultam a reprovação ( agora, cinicamente, apelidada de RETENÇÃO)obrigando os professores a preencherem tantos papéis para reprovarem um aluno que eles, para não se chatearem, preferem passar um aluno que nada sabe. Tanto mais que se reprovarem o menino, pobre ou rico, têm os pais à pega (frequentemente mais os pais pobres do que os ricos, ao contrário do que o paternalismo do texto pretende fazer crer).
Resumindo: os programas são uma desgraça,mas os ministros e os pais unem-se para tornarem a desgraça total.
Olá Henrique Dória,
Penso que o Henrique entendeu mal o texto. O texto não refere que se passa os filhos dos ricos e se retém os dos pobres. O texto refere-se à valorização que o eduquês dá ao background do contexto familiar dos alunos. Ensinar conteúdos científicos de modo apelativo (como o faz Carlos Fiolhais) requer, da parte dos alunos, a sua capacidade de raciocínio, ao passo que ensinar conversa da treta sobre temas da actualidade, os alunos que têm pais com formação académica, obviamente marcam passo em relação aos restantes. E é isto que o Desidério refere. Curiosamente trata-se de uma estratificação social muito subtil e só possível num contexto social muito hipócrita, mas que existe. É claro que as ciências ditas sociais ou humanas são muito mais vulneráveis a este tipo de "reprodução social". De resto, como professor, sou testemunha ocular deste discurso que já faz escola em portugal entre os professores: "vê-se logo que não traz educação de casa"; "o aluno x nota-se que é bom porque traz muitas referências de casa, porque o pai é da ordem dos médicos e a mãe beata da ordem de cristo". Pois é! Aquilo que questiono é: então a escola não ensina aos filhos dos peixeiros? Será a ciência e o saber mais ensinável aos filhos dos doutores? Como resposta possível a este problema tenho: uma escola que ensina aqueles que já estão ensinados, então trata-se de uma escola mais preparada para uns que para outros. Já agora, mesmo abusando do espaço que me é concedido, vou contar uma anedota, abreviando-a: "a professora da escola primária da aldeia coloca este problema: estavam 3 passarinhos em cima de uma árvore. Um caçador matou um. Quantos ficaram? A joaninha, filha do Dr da aldeia respondeu que ficaram 2. O Zézinho, filho do bebedolas da aldeia, respondeu que o tiro assustou os pássaros e fugiram pelo que não ficou nenhum. A Sra Professora respondeu que a Joaninha é que tinha razão, mas que compreendia o raciocínio do Zézinho. O Zézinho, que era filho do bebedolas, mas não era estúpido colocou um problema à Sra Professora: Sra Professora, estavam 3 mulheres sentadas num banco de jardim, cada ma delas com o seu gelado. Uma lambia, a outra chupava e a outra trincava. Qual é que é a casada?, perguntou o zézinho. A Sra professora, embaraçada respondeu que talvez fosse a que chupava, ao que o Zézinho respondeu que não. A casada, disse o menino, é a que usa aliança, mas, "Sra Professora! Compreendo o seu raciocínio" disse o Zézinho.
Abraço
Rolando Almeida
Boa noite a todos, igualmente
Caro Demétrio, não seja radical. Eu, discordando como você do "eduquês", nunca ouvi os seus protagonistas defender que "os filhos das famílias culturalmente carenciadas têm intrinsecamente menos talentos e interesses cognitivos do que os outros" (ou defender que são mais estúpidos, como diz à frente). Partem é de um entendimento "facilitista" e muitas vezes paternalista das dificuldades provenientes dum contexto cultural desfavorável (e que são inegáveis, como mostra o dito estudo e como qualquer professor poderá confirmar). E por isso resolvem baixar os níveis de exigência e nivelar por baixo, esquecendo que a função da escola é exactamente a de contribuir para equilibrar os desníveis de partida.
Agora, muito deste facilitismo é feito a partir de uma mal entendida ideologia "de esquerda", igualitária, de "igualdade de oportunidades" contra o "elitismo" e mesmo contra o "racismo" a que a "demasiada exigência" eventualmente conduziria. A "balda" do nosso ensino (e não só nosso, aliás, mas especialmente nosso) provém muito daqui, desta deturpada ideia de "escola para todos e não só para alguns", e que rejeita, por exemplo, os exames porque acha que “eles são injustos”. E esta ideologia é que é a mais perigosa, acho, porque se baseia num equívoco aparentemente “bem-pensante”. À mistura com uma noção estritamente utilitarista, tecnocrata e vesga da dita escola, como é evidente.
Marvl
Marvl, tem razão que a ideologia facilitista tem por base uma certa ideia de esquerda -- apesar de não se distinguir as políticas educativas dos governos do PSD ou do PS. O facilitismo é o mesmo, apesar de haver alguma tendência para maior rigor e seriedade nos governos PSD. Mas o Roberto Carneiro, que foi quem começou tudo, estava num governo PSD. Portanto, todos têm telhados de vidro.
Mas é preciso é compreender que a ideia de ser facilitista para ser igualitário só se compreende se ao mesmo tempo se tiver a ideia falsa e repugnante de que os estudantes culturalmente carenciados são mais estúpidos. Claro que as pessoas não pensam isto explicitamente, mas é o que está implícito. Caso contrário, tentariam encontrar estratégias para atrair esses estudantes para o estudo das matérias escolares sólidas e centrais, em vez de entrarem no facilitismo. Entram no facilitismo porque acreditam implicitamente que não vale a pena pensar em estratégias para ensinar os Maias ou as ideias de Kant, porque pura e simplesmente essas crianças querem é Big Brother e música RAP.
A culpa é do sistema, mas também é dos professores e da própria sociedade que coloca a aprendizagem e o conhecimento não como um valor em si mas apenas como um meio de atingir determinado estatuto financeiro e social, quando o objectivo de estar na escola é ter um emprego o valor das matérias que se ensinam e/ou aprendem são irrelevantes. Todos conhecemos a vontade de muitos serem médicos, mas claro que não é a vontade de serem médicos de uma povoação mais pequena , o objectivo é ser
médico num grande hospital ou clinica privada, tratar os velhos reformados? não esses não têm dinheiro para pagar.
Já agora vou contar a minha história, para perceberem que estive presente nesses momentos em que se percebe como funciona o sistema de ensino e no desperdicio e na vontade de nivelar a exigencia por baixo. Estive sempre no ensino publico, nada de colégios privados ou outras coisas que tais,um excelente aluno ( não sou modesto ), sempre gostei de aprender e o meu professor da primária percebeu que eu sabia muito mais que os meus colegas e muitas vezes nos intervalos ensinava-me coisas que não fazem parte do que era suposto ser ensinado na primária , lembro-me de ele me ter ensinado o que eram plantas criptogamicas e fanerogamicas , lembro-me de geometria e desenho em prespectiva e outras coisas , ele chegou a chamar os meus pais á escola para lhes "fazer queixa de mim" porque eu estava sempre a falar nas aulas
com os colegas e "o problema não é ele, porque quando eu lhe faço perguntas ele sabe sempre responder , mas distrai os colegas e eles assim não aprendem",
lembro-me de ajudar vários colegas a fazerem os testes, mesmo tendo em conta que em dias de teste tinha de ficar sentado numa mesa que havia perto da mesa do professor longe de todos os meus colegas.E assim foi a primaria , na preparatória e secundária a situação foi parecida, nos tempos em que a classificação era de 1 a 5 posso dizer que sempre tive no final do ano 5 a todas as disciplinas e no segundo periodo ouvi muitas vezes a frase "só não
tens 5 porque no segundo periodo eu não gosto de dar 5" nos ultimos anos do secundário as notas já não eram de 1 a 5 mas de 1 a 20 , mas depois de tantos anos a arrastar-me pelo ensino e a ver colegas que não sabiam nada passarem com médias de 8 e 9 e a acabarem por ter 10 valores comecei a perceber que o sistema é injusto e não valoriza quem sabe, o importante é passar.Lembro-me de várias discussões que tive com professores que muitas vezes falam sem terem também formação para o que estão a dizer, vou dar 2 exemplos , uma professora de filosofia uma vez para tentar
explicar qualquer coisa que já não me lembro disse em jeito de prova "por exemplo a água ferve sempre a 100 C" e eu lá do fundo da sala ( nunca fui um cromo tipico dos que se sentam na primeira fila ) disse "isso não é verdade" , silencio na sala e a
professora diz "não é verdade porquê ?" e eu respondi em tom arrogante que comecei a ter com os vários problemas que fui vendo ao longo tempo "para que é que serve
uma panela de pressão ?" ao qual a professora não sabia responder e ficou sem saber o que dizer e eu respondi "pergunte á professora de fisico-quimica que ela é capaz
de saber a resposta" , portanto eu tornei-me um aluno um bocado problemático mas nada tipico porque o meu problema era saber demais, lembro-me de outro problema quando numa aula de tecnologia de electricidade se não me engano a professora diz
explicando o funcionamento do trinco eléctrico da porta dos prédios que se a corrente fosse num sentido o trinco era atraido se fosse no outro sentido era
repelido, mais uma vez ouve-se uma voz do fundo da sala , "isso não é assim" ao qual a professora pergunta "então porquê" e eu respondo "seja qual for o sentido da corrente o trinco é sempre atraido porque é um bocado de ferro" a professora sentindo-se desautorizada tenta-me calar com umas teorias,mas, tem azar é que eu passava os meus tempos livres tal qual aprendiz de frankenstein a fazer experiencias e tinha construido electroimans portanto respondi " se a professora
quiser eu amanha trago um electroiman e fazemos a experiencia... " é óbvio que este
assunto ficou por aqui , numa aula de fisico-quimica a professora estava a explicar qualquer coisa e lembrou-se de no intervalo levar alguns de nós ( reparem no pormenor alguns de nós ) a ver uma experiencia no laboratório com uma máquina que permitia ver a atracção electroestática, ela estava visivelmente nervosa e pediu a todos que se afastassem porque "a máquina dá 4 mil volts , é muito perigoso" , a demonstração mal dava para ver alguma coisa e os meus colegas ficaram extremamente disiludidos , porquê ? porque eu tinha construido em casa uma máquina que produzia 120 mil volts que fazia uns efeitos muito melhores que a máquina da escola.
E assim passou-se o secundário, então vou para a faculdade, aula prática de electrónica , o professor escreve no quadro várias expressões e deduções e no fim
diz " e assim se prova porque os voltimetros são ligados em em série e os amperimetros em paralelo" , e mais uma vez uma voz do fundo diz , "isso está mal"
,"está mal , então venha cá fazer" , eu vou e faço o esquema de como se deve ligar um voltimetro e um amperimetro ( em paralelo e em série respectivamente ) ao qual o
professor me diz "então prove-lá isso com contas" e eu respondi "as contas não sei , mas que é assim que se liga na realidade é porque..." e a minha desilusão foi
aumentando cada vez mais e ao fim de vários anos ainda não acabei nenhum curso superior embora já vá no 3 curso em que estou inscrito,no ano passado pedi
transferencia e neste ultimo onde estou já tive os meus problemas com dois professores, para dizer a verdade os unicos que para já conheci e aos quais fui a
algumas aulas, no semestre passado numa cadeira em que se fala de electroquimica embora o curso não seja de quimica a professora foi várias vezes arrogante dizendo
por exemplo frente a uma sala completamente cheia de alunos, "não se preocupem com
fórmulas quimicas , as que precisarem no teste vão lá estar escritas , também mesmo que vocês todos digam fórmulas quimicas duvido que digam em numero suficiente que me gastem os dedos de uma mão" , isto é extremamente arrogante e visto que embora
não fosse a primeira aula do semestre daquela cadeira era a minha primeira vez que lá pus os pés deixei a coisa passar mas eu já fazia electrólises em casa desde para ai dos 14 anos e sei fórmulas de cor suficientes para que os dedos das mãos e dos
pés e de várias pessoas sejam suficientes.
Esta professora disse uma pérola de sabedoria dizendo que se bebermos água pura morremos.
E mais recentemente numa outra aula em resposta a uma pergunta de um colega o professor dia isto "em regime livre não há atrito não há inercia , não há nada disso" , estavamos a falar do sistema oscilatório massa/mola , é obvio que isto está incorrecto e eu tentei falar na aula mas o professor disse o seguinte "
podemos falar do que quiserem mas isso não vai sair no teste , se quiserem falar nisso no café podemos falar" , eu esperei pelo fim da aula e tentando dar uma
hipotese de se retratar sem perder a face perguntei " O professor disse á pouco ... isso vai contra o que eu pensava que acontecia , então quando temos uma massa a
inercia não está sempre presente ?"
tentei ser o mais humilde possivel para lhe permitir dizer outra coisa do que o que tinha dito na aula, mas ele não cedeu e ainda disse coisas do tipo , "não vês que perguntas dessas como a que o teu colega e tu estavam a fazer só confunde os vossos colegas" e não cedeu numa coisa que está completamente errada e depois de uma hora em que a minha paciencia e consequentemente a minha arrogancia foi aumentando e
fui falando da definição de inercia , da primeira lei de newton e outras coisas que tais ao que ele para finalizar com um argumento altamente cientifico me responde " fica lá com a bicicleta , o que é que queres ouvir , queres que te dê razão é ? , pronto , tens razão " , mas atenção que ele estava a ser irónico ele não me estava a dar verdadeiramente razão.
Isto é apenas um minusculo resumo do meu percurso escolar que ainda está em curso, e pode ser que algum dia tenha uma licenciatura se a desilusão não se tornar
demasiado grande, por exemplo colegas meus do secundário aos quais eu fiz os testes de fisica , apesar da professora fazer teste A e B para que as pessoas não copiassem e eu no tempo suposto para fazer um teste eu fazia o meu e o do meu colega do lado em folhas de rascunho e depois passava para mais alguns colegas,
esses meus colegas foram juntamente comigo para a faculdade em cursos diferentes mas o que interessa é que já acabaram e têm as suas licenciaturas.
Portanto o sistema não está nada bom e a todos os niveis de ensino, se calhar o melhor professor que tive foi o meu professor da primária.E para terminar os meus pais só têm a quarta classe e ninguem da minha ascendencia tem mais escolaridade do que isso.Desculpem o texto longo mas penso que com exemplos fica mais bem explicado.
"as matérias escolares sólidas e centrais"
"estratégias para ensinar os Maias ou as ideias de Kant"
Aparentemente, para o Desidério "Os Maias" e as ideias de Kant são matérias sólidas e centrais.
Mas há muita gente que tem uma opinião diferente.
Para muita gente honesta e trabalhadora, é irrelevante apender "Os Maias" ou as ideias de Kant.
Na minha opinião, os curricula têm que ser mais livres. Isto é, devem de facto ser reduzidos a matérias sólidas e centrais - das quais, claramente, nem "Os Maias" nem as ideias de Kant fazem parte. Porque uma pessoa pode perfeitamente levar uma vida honesta e trabalhadora sem nunca ter lido "Os Maias" nem aprendido as ideias de Kant.
Os alunos devem ter maior liberdade de escolher as matérias que desejam aprender. E serem menos submetidos a paternalismos ditatoriais sobre matérias pretensamente sólidas e centrais.
Luís Lavoura
Caro Luís: claro que podemos disputar se devemos ensinar os Maias ou a música do Quim Barreiros na escola. O ponto é que ou algo de sólido se ensina, ou mais vale dar realmente toda a liberdade aos miúdos e permitir que não apareçam na escola se não lhes apetecer.
Por outro lado, não me parece que sejam os estudantes os mais indicados para escolher se preferem estudar X ou Y. Alguém tem de escolher por eles, e mesmo que haja carradas e carradas de currículos alternativos e disciplinas opcionais, não será possível abarcar tudo e mais alguma coisa.
Portanto, ficamos outra vez com o mesmo problema: é preciso escolher o que é central e sólido e o que não é. Ora, a minha crítica é que o ministério decidiu por razões classistas inaceitáveis que os pobres não podem interessar-se por medicina nem física quântica. Talvez usem até o mesmo argumento do Luís: porque uma pessoa pode ser honesta e trabalhadora a vida toda sem precisar dessas coisas de ricos -- Maias e Kant e o caraças.
Claro, uma pessoa pode ser honesta e trabalhadora e nem saber ler, nem saber aritmética, nem saber física nem química. Pelo seu raciocínio, isso significa que tais matérias devem ser opcionais. Eu discordo.
E parece-me que ser ditatorial é oferecer a fantasia de uma liberdade de opção ilusória, pois quem não tem oportunidades para estudar X ou Y porque a escola não lhe dá essas oportunidades e porque não as tem em casa, só em aparência parece mesmo que escolheu Z em vez de X ou Y.
Desidério,
eu concordo completamente que aritmética, física, química, e leitura, são coisas obrigatórias, que todos devem saber. Perfeitamente de acordo.
Já não concordo que "Os Maias" e Kant façam parte de tal curriculum obrigatório.
Um mecânico de automóveis, um jogador de futebol, ou uma cabeleireira não precisam de saber Kant. Mas devem saber fazer contas, ter sólidas noções de física e química e biologia e outras ciências naturais, e saber ler e interpretar um jornal. Nada disso tem a ver com ler "Os Maias" e entender Kant. Isso são saberes académicos, que devem ser ministrados apenas àqueles que se interessam por esse ipo de coisas.
O ensino português peca por ter curricula obrigatórios demasiado extensos e obrigar os alunos a permanecer demasiado tempo na escola, trabalhar de mais, ler de mais, fazer exercícios a mais. É fundamental, para a melhoria do ensino, reduzir os curricula obrigatórios de forma muito violenta. Para que depois os alunos se possam dedicar mais a aprender saberes especializados da sua preferência.
Luís Lavoura
Eu diria que o ensino português se tem de orientar para um sistema de "créditos", em que um aluno só ocupa metade do seu tempo com curricula obrigatórios, e gasta a outra metade a aprender coisas opcionais.
Os curricula obrigatórios devem ser: bom conheciento da língua portuguesa, inglês, matemática, e ciências da natureza (incluindo muitas coisas práticas, como perceber para que serve um preservativo, ou porque é que as tábuas do chão abrem fendas no Verão).
Tudo o resto é opcional. Um aluno pode especializar-se em basquetebol, em serviço de hotel, a tocar violoncelo ou a aprender mandarim. Tudo isso são saberes que os alunos devem ver contabilizados e valorizados no seu curriculum escolar. Se um determinado aluno prescinde de ler "Os Maias" para passar o tempo a treinar salto à vara, viola da gamba, ou instalações elétricas, isso deve ser considerado uma opção válida.
Luís Lavoura
Luís Lavoura
Olá, Luís!
A sua ideia enfrenta duas dificuldades (que podem ser superadas, estou sou a esclarecer as coisas).
1: Quem é que decide o que é central e o que é opcional? O Luís? Eu? Quem? Como, por que processo? Por que razão é importante saber biologia, para uma cabeleireira, ou mesmo química, mas não conhecer as grandes obras da literatura? E por que razão é importante saber ler o jornal? A minha avó nunca leu tal coisa nem sentiu necessidade disso, pela simples razão de que não sabia ler. E foi uma mulher de negócios bem sucedida.
2. Acha realmente que os filhos dos pobres se vão interessar na escola pelo que não têm em casa? No seu sistema, quantos filhos de pobres iriam estudar música erudita ou física avançada na escola? Se já hoje os filhos dos pobres não põem o rabo em certos cursos, como é noticiado no artigo do Diário de Notícias que eu cito, no seu sistema então é para esquecer mesmo. Mas, claro, quem pensar que os filhos dos pobres não podem ter interesse em música erudita nem em física quântica por serem pobres e por isso cognitivamente deficientes, acha isso normal. Só que esta é uma crença falsa.
Penso que, nesta «guerra» de pedagogias, a razão nem está do lado dos - por assim dizer – relativistas pós-modernos, nem do lado dos – por assim dizer – elitistas. E porquê? Porque se a adaptação ao perfil de uma turma conduz à secundarização do conhecimento e à sua degradação, a indiferença perante a condição económica e cultural dos alunos conduz à reprodução das tais diferenças sociais, na medida em que não se tem em atenção a qualidade da recepção da mensagem por parte dos alunos. Aliás a notícia do DN aponta para isto mesmo: as hipóteses de sucesso daqueles pertencem a classes altas e com um nível cultural superior são superiores às dos alunos das classes mais baixas. Não é dito que a causa do sucesso de uns e outros seja o tipo de pedagogia utilizada, como o Desidério conclui forçadamente. Assim, se o artigo confirma alguma coisa são as teses do «eduquês», segundo as quais o ensino está estruturado de forma a reproduzir as diferenças sociais.
O problema do eduquês não reside nos seus princípios relativistas, mas no paradoxo de se terem absolutizado estes mesmos princípios. Se ninguém deve ser prejudicado por um ensino pouco exigente (como afirma o Desidério), a verdade é que também ninguém deve ser prejudicado por um ensino que se esquece dos diferentes «backgrounds» culturais dos alunos, pois disto também depende a melhor ou pior compreensão das matérias. Por isso há diferentes estratégias e formas de ensinar e fazer perceber as matérias aos alunos. O problema é que se caiu num extremismo (mais teórico do que prático) que consiste em dar prioridade à forma de ensinar em detrimento dos conteúdos: a forma, em vez de ser um meio, tornou-se no próprio fim das aulas. O importante deixou de ser o que se ensina para passar a ser o como se ensina. E isto conduz inevitavelmente ao facilitismo (mais evidente nos graus de ensino mais baixos).
Em suma, o que me parece é que ambos os tipos de pedagogia acabam por ser discriminatórios. Se o «eduquês» deve ser rejeitado, a verdade é que o «elitês» também não tem uma boa solução para resolver os problemas do abandono escolar e da massificação do ensino. Até porque a medida que os «eliteses» mais vêm defendendo ultimante é geradora de ainda mais discriminação e exclusão: estou a falar, naturalmente, do cheque-educação, que em última instância conduziria à divisão das escolas em escolas para classes ricas e escolas para classes pobres, assim como em escolas para alunos com boas notas e outras para alunos com más notas.
Por último, se o eduquês é uma criação da esquerda, a verdade é que o elitês não é ideologicamente neutro. Basta reparar que aqueles que mais criticam aquelas pedagogias situam-se politicamente à direita. Desde o J. M. Fernandes, ao J. C. Espada, passando pelo J. C. das Neves, percebe-se que o desejo, mais ou menos escondido, de todos eles é a privatização do ensino e fim do ensino público universal.
Olá Luís,
Deixe-me meter uma colherada! O Luís refere:
"Já não concordo que "Os Maias" e Kant façam parte de tal curriculum obrigatório.Um mecânico de automóveis, um jogador de futebol, ou uma cabeleireira não precisam de saber Kant. Mas devem saber fazer contas, ter sólidas noções de física e química e biologia e outras ciências naturais, e saber ler e interpretar um jornal. Nada disso tem a ver com ler "Os Maias" e entender Kant."
Pois é, mas se o Luís pensa que os meninos, afinal de contas, devem saber ciência, então deveria considerar precisamente um autor como Kant nos currículos. E precisava de incluir Descartes, Platão ou Karl Popper. E, para que as cabeleireiras, leiam os jornais, talvez seria muito útil terem lido os Maias. Para que as cabeleireiras saibam agir responsavelmente compreendendo que a acção envolve conceitos racionais, em muito lhes ajudaria saber umas coisas de Kant e Stuart Mill. O erro começa quando pensamos que estes autores são demasiado académicos e de mais servem do que para entreter a malta do ensino superior. Só que aqui, Luís, teríamos que justificar porque ou para quê que existe o saber e porque razão pagamos impostos para pagar os vencimentos de quem, na universidade, estuda Kant ou os Maias. E isto parece ser muito estranho. Mas deixa de o ser se percebermos que o saber e o conhecimento é operacionalizável nas nossas vidas em todos os sentidos. Ou o Luís pensa que estudar Kant ou os Maias nada tem a ver com as nossas vidas se decidirmos ser cabeleireiros ou jardineiros? Curiosamente essa é a ideia corrente, mas é uma ideia errada. Seria talvez o mesmo que dizer que para ser Consul de Portugal na Patagónia não é necessário ler os Maias. Mas os Maias são uma obra escrita por um ex consul português no estrangeiro. Para que precisou Eça de escrever os Maias se tinha um emprego como consul? E Kant para que precisou de escrever o que escreveu se tinha um emprego como professor universitário? E, já agora, eu, para que é que preciso de ler Carl Sagan ou Richard Dawkins se sou professor de filosofia? E para que preciso de ter perdido horas de sono a estudar matemática se, afinal, sou professor de filosofia? Para que preciso de ver futebol e ser adepto do FCP se sou professor de filosofia? Como professor de filosofia tenho mais obrigação de ler o Eça de Queiroz do que um engenheiro químico ou uma cabeleireira?
Curioso, não é??
Ler Eça de Queiroz e saber umas pitadas de Kant, ajuda tanto a viver a cabeleireira, como a mim, como a quelauer ser que pense e esteja no mundo. A questão é saber se é mais relevante ensinar Filosofia ou Matemática. E aqui há que ser prudente. Como exemplo final, talvez tenha sido por ter formado bons filósofos, que as empresas americanas os recrutam para as suas fileiras. Pensar que isto é uma treta e não é possível, é uma posição tão ditaturial como pensar que toda a gente só devia estudar Eça e nada mais, nem matemática, nem música...
Abraço
Rolando Almeida
Olá
Vou juntar-me às vozes do Desidério e do Rolando.
Estou de acordo com o argumento do Desidério. Não devem ser os alunos que devem decidir o que querem ou não querem aprender e há, sem dúvidas, conhecimentos mais importantes do que outros. Que da disciplina de Português, no ensino secundário, façam parte itens como o de saber interpretar um regulamento, parece-me altamente discutível, embora até possa conceder que é importante que os alunos tenham que aprender estas coisas básicas que, pensava eu, qualquer um de nós aprenderia a fazer na aprendizagem informal quotidiana. Mas que no manual de Português apareça como exemplo de regulamento o do programa “Bigg Brother” é de uma “tonteria” sem precedentes, até porque todas as escolas têm um regulamento interno que muitos professores e alunos nunca leram. Mas, na época em que o manual apareceu, se deixássemos os alunos escolher, qual era o risco que corríamos? Que o tal regulamento fosse o escolhido e não aquela “seca” do regulamento da escola.
Stuart Mill argumenta que “poucas criaturas consentiriam em ser transformadas em animais inferiores, com a promessa de uma dose mais elevada dos prazeres das bestas. Nenhum humano inteligente consentiria em ser convertido em imbecil, nenhum homem culto em ignorante, nenhum homem de coração e inteligência, em egoísta e vil, ainda que soubessem que o imbecil, o ignorante, ou o egoísta, estão mais satisfeitos com os seus lotes respectivos de prazer. (...) Vale mais ser um homem insatisfeito que um porco satisfeito; vale mais ser Sócrates insatisfeito que um imbecil satisfeito” (Stuart Mill, Utilitarismo). Eu não partilho de tal optimismo. Perceber que há prazeres “para lá do prazer das bestas”, e não nos deixemos ofender, as bestas são os animais que se consolam com os prazeres mais imediatos dos quais também gostamos, como comer e dormir, significa esforço, trabalho, empenho, deixar para mais tarde a recompensa. Ora, a leitura d’ “Os Mais” e de Kant exige esforço, exige confrontarmo-nos com que nem sempre percebemos de imediato, significa aprender a ter prazer com uma actividade que não nos dá de comer, nem de beber, não nos conforta o ego, e até pode não nos ser útil para nada, a não ser termo-nos aproximado um pouco mais da profunda riqueza da humanidade.
E aqui volto a reencontrar-me com o argumento do Desidério. Não ensinar Kant ou “Os Maias” aos meninos porque ele não gostam é um passo para os privar de mais uma oportunidade, a oportunidade de entrarem no mundo daqueles que, por privilégio social, estão não só em contacto com “Os Maias” como com o conhecimento que é socialmente valorizado e que proporciona estatuto social. É mais um passo para que, na hora da escolha, só possam mesmo escolher ser cabeleireiras ou jardineiros, porque não podem escolher mais nada. Que alguém escolha ser cabeleireira, pois nada tenho contra, assim como qualquer outra profissão. Mas que um jardineiro não seja capaz de ler o jornal, ou de usar qualquer informação na sua vida quotidiana como cidadão e como pessoa, já é algo que a mim, como professora, diz respeito. E, para falar francamente, não é a ler a “Maria”, o “Regulamento do Big Brother” a colecção “Ciência Horrível” ou qualquer uma destas coisas mais ao agrado do gosto de cada um que se aprende a usar a língua materna de modo funcional.
Para concluir, lamento dizer-lhe Luís, que um dos nosso problemas como professores é os meninos estarem habituados a fazerem apenas aquilo de que gostam e nunca ninguém lhes ensinou de que há muitas coisas de que temos de aprender a gostar e que isso dá trabalho, nem sempre dá prazer imediato, mas compensa depois. Infelizmente, para muitos alunos que já me passaram pelas mãos, só vão descobrir isso anos mais tarde, quando estiverem a trabalhar na caixa de um supermercado, porque mesmo com uma licenciatura, nada mais sabem fazer do que reproduzir meia dúzia de ideias que foram coleccionando, mas que verdadeiramente não possuem.
Olhe, a mim dá-me prazer reencontrar alunos, anos mais tarde, e perguntar-lhes se valeu a pena o esforço (o esforço de terem tido um professora de Filosofia que ensinava Kant e Hegel, Descartes e Marx a alunos do ensino nocturno, que trabalhavam duro todos o dia, com o mesmo grau de exigência com que ensinava os alunos do ensino diurno) e receber como resposta: “valeu a pena, professora, obrigada”, valeu a pena, porque a pessoa em questão, que era uma empregada fabril na altura, é hoje professora de Filosofia, e a outra, que tinha um emprego precário, é administrativa de uma escola, e a outra, que era jardineira numa estufa, é hoje professora de Geografia e assim sucessivamente. Já agora, termino dizendo-lhe que, para nós professores, também seria mais fácil dar aos meninos aquilo que eles mais gostam e não ter de batalhar com eles todos os dias para que aprendam a gostar do conhecimento pelo valor intrínseco que o mesmo possui. Seria mais ou menos (desculpe-me a brutalidade) o mesmo que se fazia antigamente nas aldeias: dava-se uma sopa de leite com um “cheirinho” e a criança ficava sossegadinha sem incomodar nada…
Maria Rodrigues
Um tal Carneiro, ministro de outros tempos, já defendia que ao povo não se ensinasse muito. Uns rudimentos bastavam.
Andam por aí há muitos anos, de modos sub-reptícios, a repor o Carneiro em funções.
Nas análises que por aqui se vão fazendo esquecem-se um bocado do princípio e é logo no princípio que está o problema. O princípio é o primeiro ciclo ou até o pré-primário. E é área de desastre e de divisão - os meninos que têm em casa quem fale bem com eles e os ponha a falar, os leve a ver o mundo cá fora, os apoie nas aprendizagens da escola ficam na grelha de partida quilómetros à frente dos outros. Os que não têm nada disso em casa, na escola, na maioria dos casos pouco vão aprender, vão até detestá-la porque compreendem que lá não estão a fazer nada.
Que acontece neste ciclo para, em zonas suburbanas, um grande número de alunos chegar ao 2ºciclo sem competências básicas de leitura, sem cálculo, sem quase serem capazes de falar para lá do corriqueiro?
Estou a falar de crianças capazes que a escola vai tornando incapazes.
E os pais destes alunos já reclamam muito pouco porque a escola que tiveram não os deixou muito apetrechados. Têm dificuldade em escrever um simples recado para o professor, conhecem essa dificuldade e até evitam expor-se.O regabofe pode continuar.
E, curiosamente, aquele estudante anónimo que comenta lá para cima, teve um bom professor no 1º ciclo, aprendeu e tramou-se.Tem de aprender a calar-se, a saber estar.
Claro que acho que todos poderiam e deveriam ter gozo
ao ler o Eça,
em tentar perceber Kant e muitos outros,
ao entender a física e a matemática, ... e a escola devia servir para conduzir no esforço para esse gozo.
Esta discussão do Knat e do Eça faz-me lembrar uma tira da Mafalda em que a Susaninha perante várias perguntas de um teste, respondia sistematicamente que, para as diferentes profissões que teria quando fosser grande, nada daquilo, verdadeiramente importava.
Na altura, uma tal ideia, mostrava sentido de humor. Sic transit.
O meu filho mais velho tem dois anos e meio. É estimulado diariamente com as mais diversas actividades e desafios, desde a pintura à culinária, passando, obviamente pelas actividades físicas e pela inevitável leitura. Tem uma estante de livros no quarto, que ele consulta autonomamente, vai regularmente à biblioteca com os pais, conhece a maior parte das letras e dos números. Ouve histórias diariamente e muitas vezes é-lhe solicitado que conte histórias.
Uma das nossas (minha e da minha mulher) principais preocupações é ser bons pais e permitir-lhes um desenvolvimento pleno.
É claro que eles estarão, em princípio, em vantagem em relação a outros que não tenham sido estimulados da mesma forma. Não é uma garantia de sucesso - todos sabemos isso - mas é o que nós podemos fazer. Não é genético, é social.
Porém, nem por isso as nossas preocupações com o sistema de ensino são menores. Se ele é ineficaz e injusto para uns não o é menos para outros.
Imaginemos o ensino como uma sala cheia de portas.
Á partida sempre haverá aqueles que trarão algumas chaves de casa, e com elas poderão abrir algumas portas.
Por isso, o que alguns têm feito é deixar as portas destrancadas, para que aqueles que não trazem chaves de casa as possam abrir. Porém, se como não têm as chaves, eles não se aproximam das portas. A solução será então deixá-las ligeiramente abertas e progressivamente mais e mais até que fiquem escancaradas.
Isto significa que, embora formalmente aqueles alunos sem chaves passem pelas portas, eles continuarão a não ter chaves - e elas vão fazer-lhes falta, mais cedo ou mais tarde.
Como muito bem aponta o Desidério, uma melhor solução - eu diria o mínimo - era que a escola desse todas as chaves necessárias para abrir todas as portas que coloca.
Agora vejamos também o caso do tal aluno que já traz algumas chaves de casa. Ao ver as portas escancaradas não é natural que olhe para o molho de chaves e as considere inúteis?
PedroGamaVieira
Sou o estudante anónimo que lá em cima escrevi um texto longo.
Gostava de colocar mais algumas considerações sobre os professores, na minha opinião a função de professor devia ser uma função altamente considerada e da maior importancia, devendo ser desempenhada pelos melhores dos melhores e não pelos que não têm outra opção porque é preciso colocar comida na mesa, se um professor tem um determinado nivel a probabilidade é a de que no geral vá dar origem a alunos de nivel inferior ao dele e assim sucessivamente, tal como fiz no meu outro post lá para cima as minhas opiniões são baseadas em factos presenciais, voltando ao exemplo que dei do professor que disse "em regime livre não há atrito não há inercia , não há nada disso" , o mais grave não é ele achar isso o que é verdadeiramente grave é que quem houve e acredita se a situação se apresentar vai repetir essa informação a outros.
Outra frase que já ouvi da boca de um professor foi "eu só sou responsável pelo que me ensinaram, se ninguem me ensinou eu não tenho culpa , por isso não se preocupem com coisas que eu não ensine nas aulas porque não saem nos testes".
Mas a culpa não está só do lado dos professores , o sistema realimenta-se através dos dois lados, noutra situação acontece o seguinte um professor excede-se e explica para além do que era suposto e depois pergunta , "perceberam ?" e um aluno diz "isso sai no teste ?" o professor responde que não e o aluno "então não faz mal".
Também ao nivel do sistema os resultados têm o seu peso, por exemplo existem semestres melhores do que outros para fazer determinadas cadeiras, vou explicar, quando uma cadeira é um pouco mais dificil ( leia-se mais cientifica ou técnica ) e o número de alunos que tem aproveitamento é baixo ao fim de alguns semestres o numero de pessoas inscritas pode atingir números demasiado elevados , tipo 300 ou 400 pessoas na mesma cadeira, claro que apenas 10 ou 20 vão ás aulas por isso as salas nem sequer enchem , mas como a nivel da instituição a coisa começa a parecer mal em vez de se tentar perceber o que pode estar mal a solução é muitas vezes haver um semestre em que os testes são deliberadamente mais acessiveis para que o numero de alunos inscritos na cadeira baixe para valores "normais", voltando depois á dificuldade normal. Esta situção é dita literalmente assim nas aulas "é melhor aproveitarem este semestre para ver se fazem a cadeira...".
Mais um exemplo do lado dos alunos é a definição de professor bom e professor mau, um professor mau é o que ensina as matérias e faz exercicios e "obriga" a trabalhar , um professor bom é um professor que usa o retroprojector e passa as aulas inteiras a ler o que lá está escrito e que , e aqui é que está o segredo para ser considerado um bom professor, nas duas aulas antes do teste faz umas revisões milagrosas do tipo no teste há-de sair um problema parecido com este , vamos resolver , e também deve sair qualquer coisa deste estilo , vamos fazer. Claro que os alunos dizem que este último é um excelente professor e no momento das inscrições nas cadeiras só não vão para a turma dele os que não conseguirem.
Gostava de ler os comentários de alguns professores sobre o que escrevi, se estou a exagerar é favor corrigirem-me.
Na verdade, não há nada tão pretensioso como isto:
"Ler Eça de Queiroz e saber umas pitadas de Kant, "
Saber "umas pitadas" de alguma coisa, no fundo é não saber nada. E permita-me que Lhe diga, é absolutamente irrelevante "ler" Eça de Queiroz que qualquer criança da primária consegue ler.
Mas, enfim, falando de coisas sérias: Desidério, concordo consigo no post, mas não posso deixar de discordar neste seu comentário:
"Marvl, tem razão que a ideologia facilitista tem por base uma certa ideia de esquerda -- apesar de não se distinguir as políticas educativas dos governos do PSD ou do PS."
Eu sei que em Portugal estamos pouco habituados, mas PS e PSD são partidos de esquerda. Não temos partida de direita em Portugal - liberais ou conservadores.
A verdade é que por mais que debitemos opiniões os problemas não se resolvem sem as pessoas. Problemas de ciência e matemática, não são resolvidos por consenso entre pessoas. Enquanto a gratificação, o mérito não for realmente instituído de cimo ao fundo da sociedade, nunca será criado "estômago" para o conseguir na maioria das pessoas. Após esse fim estar bem à vista de todos, podem então dar liberdade a cada um de aprender e ser ensinado, pelos métodos que achar melhores para si (avaliação exactamente igual, sobre conteúdos, resolver problemas). A situação actual é um passado de "Castas" que se perpetua, onde a origem da família é questão de primordial utilidade, para a obtenção do fim.
Se há alguém que foge dessa tendência e dá de frente com pessoas fechadas sobre si próprias,
provavelmente terá de viver em permanente conflito, até ao dia em que materialize "a olhos vistos" a sua vantagem, deixando de haver margem para dúvidas, e assim entrar no ritmo do consenso.
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