quarta-feira, 25 de abril de 2007

GRANDES ERROS 5


Em 1991, a editora Eurosigno de Ponta Delgada publicou um livro intitulado "O Ordenamento Maravilhoso do Cosmos" e subintitulado "O homem entre o quark e a galáxia". O seu autor era Dinis Pimentel da Silva, licenciado duas vezes (em Ciências Matemáticas e em Engenharia Geográfica) e técnico do Instituto Geográfico e Cadastral. Eis algumas das pérolas do livro no que toca à relatividade. Dizer que se trata de uma caricatura da relatividade é dizer pouco.

"Admitamos que no dia 27 de Fevereiro do ano 2000 se dava uma explosão na estrela de Orion. Este facto só seria registado na Terra 300 anos depois ou seja no dia 27 de Fevereiro de 2300 e para um observador situado em Touro a mesma explosão só seria vista em 27 de Fevereiro de 2250. Se do Touro comunicassem para a Terra esse sinal só o saberíamos a 27 de Fevereiro de 2303.

Vê-se assim claramente que o mesmo acontecimento não é simultaneamente registado nos três lugares e, portanto, daqui se infere da influência da luz nos nossos registos de medição do tempo e das distâncias desde que estas sejam muito grandes. Isto é a relatividade, esta interdependência Espaço – Tempo."


"Suponhamos agora que o comboio se desloca a uma velocidade de 300 000 Km/s – velocidade da luz, da esquerda para a direita do observador em Terra.
Disparado o automático que acende os dois focos [nos extremos do comboio], o que registarão os dois observadores, considerando que as luzes se acenderam no segundo imediato à partida?

O observador parado na linha registará que a luz à sua direita se acende 3 segundos depois e que a luz à sua esquerda se acendera ao fim de 2 segundos. Daqui concluirá que o acender das luzes não foi simultâneo, ou então que não eram rigorosamente iguais os dois troços do comboio. O que sucede é que em virtude da alta velocidade do comboio a luz da direita que deveria levar 2 segundos a percorrer a distância do meio comboio, devido à velocidade deste, igual à velocidade da luz, tinha mais um segundo a vencer que é o do atraso inicial no acender um segundo depois da partida. Entretanto para o observador no comboio dar-se-ia o seguinte: nunca veria a luz à sua direita e receberia a da sua esquerda ao fim de 2 segundos."


"Referir-me-ei a duas das principais [dificuldades a vencer pela ciência] que são a da medição da velocidade da luz e a prova da existência do chamado ÉTER (“fluido cósmico”) (...) Só Einstein com a formulação dos seus postulados da Teoria da Relatividade daria a explicação das razões por que o Éter, existindo, não podia ser detectado."


Mas há mais, muito mais e muito melhor. Lê-se no final da p. 55:


"Se conseguíssemos viajar à 'velocidade do pensamento', tudo nos estaria acessível, mas o pensamento é um Dom de Deus Criador e, a esta velocidade, só viajará o homem ao Seu encontro para o objectivo da Eternidade".


Está explicado: não conseguimos viajar à velocidade do pensamento...


(Agradeço a Daniel Sá a indicação deste livro; se outros leitores quiserem contribuir para esta antologia do erro...)




13 comentários:

Miguel C. Romão disse...

Caro Carlos,

Sendo eu um estudante de Física, também reconheço as gralhas. Também acho grave o facto de esse livro ter sido publicado sem uma revisão. Contudo, acho de baixo nível (não comum de si ou deste blog), vir "gozar" com o trabalho de outros aqui.
Deveria ter informado o autor e a editora das gralhas, sugerindo uma revisão científica, e, quanto muito, avisar que há um livro de divulgação científica que tem graves erros científicos.

Contudo, o que você acabou de fazer, é uma manifestação triste do seu snobismo intelectual. Snobismo esse que tem mantido os intelectuais, académicos, cientistas, em geral, distantes do resto da população. Não estará na altura de mudar?

Um grande bem-haja caro (futuro da minha parte) colega.

Um abraço.

JVC disse...

Conheci muito bem Dinis Pimentel da Silva, amigo do meu pai. Como micaelense, sei muito bem o que era a vida cultural de província açoriana, muito rica. Nela me fiz e, perdoem-me a imodéstia, para ela contribuí, ainda no liceu.

É claro que tudo isto era carolioce de amadores, inevitavelmente com muitos erros. No entanto, fico com alguma amargura pelo tom um pouco injusto desta entrada. E, com o meu brio bairrista de micaelense, pergunto em que cidade de província havia um simples engenheiro preocupado em escrever sobre a relatividade?

Há dois homens notáveis na minha formação que, se fossem vivos, eles que tanto intervieram na viida cultural micaelense, ficariam dedsgostosos ao ler esta entrada. Ilídio Sardoeira e Ernesto Melo Antunes.

Anónimo disse...

Embora saiba reconhecer os erros científicos deste texto, concordo que só os deveriam denunciar se, e só se, os exibissem claramente. Não só apontando-os, como dando-lhes a volta, isto é, a formulação correcta. O que fizeram não foi sério e enquadra-se muito mais no pueril fanforronismo, no que numa acção professoral. Diga-se de passagem que o próprio Carlos Fiolhais comete igualmente imensos erros (graves) sempre que se mete nos trilhos, por exemplo, da filosofia da ciência, e por isso não me parece que se possa dar a grandes arrogâncias intelectuais.
Para se mostrar como se deveria fazer - se se quissesse ser sério na denúncia - aqui fica um bom exemplo: Como distorcer a física: considerações sobre um exemplo de divulgação científica - http://www.ifi.unicamp.br/~ghtc/danca1.htm

Não deixa de ser interessante notar que este blog tem sido um bom espelho da intelectualidade social deste burgo: pobre e pretenciosa. Bem haja por isso. Como escreveu José Régio: Não sei por onde vou, mas sei que não vou por aí.

Anónimo disse...

JLC,
Na verdade discordo parcialmente com algumas coisas que disse: não conheco, na realidade portuguesa, que seja prática a denúncia de erros. Conheço mais a atitude da palmadinha nas costas de amigos chegados. Também já fui acusado neste blog de dar palmadinhas nas costas a um ou outro autor. É verdade que me identifico com o que aqui se escreve e apendo muito com a obra que alguns autores do Rerum Natura vão publicando. aliás, conheço esses autores pela obra, sendo que não tenho contacto pessoal com nenhum deles (a não ser pela internet, como é o caso deste blog). Parece-me que o que está em causa é que entendemos que errar é o pior que nos possa acontecer. Mas o erro é uma possibilidade com a qual devemos habituar-nos a lidar. O que tem de ofensivo apontar erros? É curioso que escrevo este comentário e tenho a fotografia de Carl Sagan por baixo desta janela. Recordo uma passagem do livro um mundo infestado de demónios, onde Sagan é muito claro quando fala do erro e de como os homens de ciência devem lidar com ele. Aliás, ao lermos este livro de Sagan, passamos a saber que Sagan recebeu dezenas de cartas a chamar a atenção de erros, foram publicados centenas de artigos que faziam o mesmo, milhares de telefonemas. Com efeito, sempre existiu uma atitude positiva em relação a isto porque Sagan, como bom cientista, sabia que as suas possibilidades de lidar com o erro são mais importantes que a possibilidade de lidar com a verdade!
Pessoalmente não vejo que Carlos Fiolhais tenha cometido qualquer crime ao colocar em causa um dos seus pares. E também estou convencido que Carlos Fiolhais sabe perfeitamente que também comete erros. de resto, se não os cometesse, não seria o homem de ciência que é.
Infelizmente esta é uma prática pouco comum na comunidade académica portuguesa, pelo menos em determinadas áreas. Ninguém se crítica racionalmente, por isso, todos pensam que criaram obras sem erros. Curisamente, quando toca a ofensas pessoais, somos absolutamente implacáveis. Um fenómeno psicológico de de nota!
Rolando Almeida

Anónimo disse...

1º Carlos Fiolhais não demonstra erros, repete-os.
2º A Carlos Fiolhais falta elegância: falta elegância quando fala de si como falta também elegância quando fala dos outros. Não contesto os erros que Carlos Fiolhais aponta - não há nada a contestar porque ele nada disse - contesto apenas a forma como expõe aquele que, certo ou errado, é o trabalho dos outros. Contesto a forma como ele desrespeita sistematicamente aqueles a quem aponta erros. Se calhar pensa que é tão divertido como a física. É um erro que não chega a ser grande.

Anónimo disse...

Anónimo,
o que me parece interessante é que temos todos muitas verdades morais para julgar este ou aquele, de saber, dogmaticamente até, o que é o certo e o que é o errado. A minha leitura é esta: discutem-se atitudes e não o trabalho (como eu também estou a fazer agora) por duas razões principais:
1- ausência de informação relevante sobre o que se está a discutir;
2- Desconhecimento das regras básicas da discussão racional.
Deste modo não é estranho que qualquer assunto resvale com facilidade para questionar a atitude deste e daquele.
Rolando Almeida

Anónimo disse...

Caro Rolando,

Como diria o JPP, a questão não é essa.

Dou de barato que não tenho conhecimentos em matéria de Teoria da Relatividade. Os livros que li sobre o assunto - mesmo os livros supostamente de "divulgação" - eram ou tão fracos que era óbvio que a teoria da relatividade não era aquilo ou não era só aquilo ou tão complicados que eu não consegui percebê-los.

Desta forma não tenho dúvidas que o CF perceberá muito mais do assunto que eu - e pelos vistos muito mais do que o Dinis Pimentel da Silva.

O que eu digo é que depois deste post ninguém ficou a perceber melhor a teoria da relatividade.

É um pouco como bater no ceguinho, percebe? Não fica bem.

Contribui para aquela ideia do cientista sem escrúpulos nem princípios que já aqui vi discutida noutro post.

PG (anónimo das 10.27)

Anónimo disse...

(Desculpem as falhas ortograficas, mas ainda nao disponho de keyboard/software para a lingua portuguesa.)

Passei por aqui e achei este blog interessante, com substancia e de utilidade para a generalidade do mundo internauta. Continuem, nunca descuidando a busca da perfeicao.
Quando houver azo para critica, que esta seja incisiva e construtiva. Quando ha' erros a apontar, apontem-se as correccoes, sem pruridos nem atencao a susceptibilidades bacocas; mas (e aqui dirijo-me tambem aos comentadores), nunca se deixem resvalar para o banal da polemica regateira, pois que esta, mesmo quando vestida com roupagens intelectuais, nao deixa de o ser. E ponto final.

Sem balelas, a bem da ciencia...e do bom senso.

Anónimo disse...

PG,
De acordo. Este seu segundo cometário é muito mais elucidativo que o primeiro.
Obrigado pela resposta.
Um abraço
Rolando A

Anónimo disse...

Já agora, e se não for pedir demais, gostaria de saber a resposta do Carlos Fiolhais ao exemplo do comboio, que me parece de mais directa compreensão para todos os leitores.
Porque eu concordo com a divulgação de erros, até da forma que aqui está feita, mas, desde que quem os aponta pelo menos consiga corrigir os erros que aponta.

Carlos Fiolhais disse...

Caro António:
1) O registo de uma explosão em momentos diferentes em lugares diferentes não é a relatividade.
2) Um comboio não pode andar à velocidade de 300 000 km/s.
3) O éter não existe!

Anónimo disse...

Exmo. Carlos,

1) É verdade. a relatividade não se refere a tempos de registo relacionados com a distância, mas, a tempos diferentes da mesma realidade por acção da "velocidade".

3) O Eter é treta, sim senhor.

2) Neste é que eu queria que o Carlos Fiolhais esclarecesse as alminhas, como exercicio teórico, matemático, para demonstrar o quanto longe a realidade estava do dito senhor, que se dignou a escrevêr um livro com baboseiras do género "diz que disse, e ouvi que era assim", para alguém além de mim, perceber que não há correcção a apontar a um bando de disparates, mas apenas o tratar das mesmas como um "Tesourinho Deprimente" da portugalidade cientifica.

Foi-se-lhe a oportunidade de explicar que à velocidade da luz, o tempo para esse objecto, seja comboio ou uma barata voadora, parou, e que tudo o que se desloca à velocidade da luz é luz, poderia divagar que se fosse possível esse object se deslocar à velocidade da luz as luzes não se acendiam, etc., e que quem quer escrevêr sobre o que quer que seja em livro, devia saber do que está a falar e não andar a propagar idiotices, por muito genial que esse senhor fosse lá para o seu circulo de influência.
O facto de alguém escrevêr isto, e alguém "exigir" que o Carlos o corrigisse sem escarnecer é para mim um conceito tão rídiculo, como o são as coisas que reproduziu desse livro.

O "comboio à velocidade da luz" pode ser um exercicio matemático sem existência real/fisíca, como o são a esmagadora maioria dos conceitos matemáticos. Permitem é explicar as coisas a leigos com maior facilidade. Preferia que me tivesse dito que não desejava dar credibilidade aos desejos correctivos de outros comentadores, do que demonstrar tamanha falta de capacidade de abstracção. Estou desiludido... :-)
Ou talvez não...

Anónimo disse...

Duas pérolas:

"2) Um comboio não pode andar à velocidade de 300 000 km/s.
3) O éter não existe!"

Como Fiolhais maltrata brutalmente o Einstein. Primeiro, a questão do comboio é, obviamente, uma experiência mental. Uma gedanken, que, diga-se de passagem, o próprio Einstein realizou. Segundo, o que a relatividade contesta é a existência de um éter com propriedades mecânicas e. Não de um outro tipo de éter, como por exemplo, os éteres defendidas por Dirac, Schrödinger e...pelo próprio Einstein. Logo, é um disparate científico afirmar taxativamente "o éter não existe".

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