terça-feira, 24 de abril de 2007

A autoridade do erro

Os seres humanos erram. Pior do que isso, ficam cegos ao erro por causa da autoridade. Uma afirmação dita por quem detém autoridade num dado assunto é mais facilmente aceite do que a mesma afirmação dita por um desconhecido. Ora, isto levanta um problema: as pessoas, pelo facto de deterem mais autoridade, poderão abusar dela e impedir o progresso. Até porque podem usar a sua autoridade de forma deslocada, para falar do que realmente não sabem nem se deram ao trabalho de estudar cuidadosamente, limitando-se a dar largas aos seus preconceitos favoritos. Além disso, as melhores ideias muitas vezes vêm de pessoas que não detêm autoridade na área — mas que ganham autoridade precisamente por terem tido ideias muito boas.

Logo, qualquer actividade intelectual séria tem de ter mecanismos que façam duas coisas: corrijam erros e neutralizem ou enfraqueçam a autoridade deslocada. Encontre-se uma prática intelectual que desconheça estes dois mecanismos e será sinal seguro de que é uma fraude.

Estes mecanismos materializam-se, por exemplo, no modo como as revistas académicas estão concebidas. Estas não são como jornais, ao contrário do que por vezes se pensa. Os artigos são submetidos às revistas anonimamente, sem que quem avalia o artigo saiba quem é o seu autor. Isso permite contrariar a tendência natural para se aceitar cegamente o que as autoridades dizem — uma autoridade pode ver assim o seu artigo recusado, e um investigador desconhecido pode ver o seu trabalho publicado. Por outro lado, o avaliador do artigo tem por missão encontrar e corrigir erros no artigo. E se o artigo é de ciência experimental, se anuncia um resultado experimental, a experiência tem de ser reprodutível e tem evidentemente de dar o mesmo resultado — caso contrário, é uma fraude ou algo de errado aconteceu.

Os avaliadores rejeitam muitas vezes os artigos. As melhores revistas académicas de qualquer área têm índices elevadíssimos de rejeição de artigos — mais de 90%, em casos como a Analysis, uma das mais importantes revistas de filosofia. A qualidade de uma revista académica mede-se por dois factores principais: a quantidade de artigos dessa revista que são citados noutras revistas e em livros académicos; e a percentagem de rejeições.

Mesmo depois de publicado um artigo, isso não representa o fim da atitude crítica. Pelo contrário, muitos investigadores irão considerar que as ideias ou resultados apresentados estão errados, ainda que parcialmente, e tentarão demonstrar isso escrevendo outros artigos, que tentarão publicar.

Estes sistemas de controlo de erros são ainda complementados com a existência de várias revistas, que competem entre si pela qualidade dos artigos publicados. O resultado é um sistema aberto à inovação e à crítica e que se protege tanto quanto possível dos argumentos falaciosos de autoridade.

Claro que nenhum sistema é perfeito, mas a ausência destes sistemas é ainda pior. Quando estes sistemas existem, não importa muito se algumas pessoas que pertencem à comunidade em causa sejam dogmáticas, porque é o sistema que permite a heterodoxia e a inovação. Quando não existem tais sistemas, não importa muito se algumas pessoas que pertencem à comunidade em causa não sejam dogmáticas, porque é o sistema que não permite a heterodoxia e a inovação.
Quando uma prática intelectual ou académica não usa os sistemas descritos de correcção de erros, é fraudulenta. Baseia-se na autoridade cega, no preconceito, e tem de se proteger da crítica. Dado o sucesso da investigação séria, muitas actividades procuram simular estes sistemas, mas são apenas simulações. Quando uma dada prática intelectual tem medo de debater ideias contraditórias em público, quando exclui do seu seio quem o deseja fazer, é porque quer proteger-se da crítica aberta — mas, ao fazê-lo, está simultaneamente a excluir-se da categoria de prática intelectual séria, ainda que invoque muitas razões sofísticas para o fazer. Se não há realmente a possibilidade de quem discorda publicar os seus resultados no seio da instituição em causa, sem ser liminarmente afastado; se não há sistemas anónimos de submissão; se há uma ortodoxia que é decidida por maiorias ou autoridades e não pela força das provas e da argumentação anonimamente avaliadas — então, não estamos perante ciência, no sentido latino abrangente de scientia (conhecimento), mas perante leite estragado.

27 comentários:

Anónimo disse...

mais do mesmo do Murcho, para mais uma defesa velada da teimosia do Buesco. é bom verificar que não há compadrios nem interesses de intimidade envolvidos nestas coisas da ciência e da filosofia. é tudo peer reviewed. esquecem-se convenientemente de mencionar que se conhecem todos uns aos outros, os estilos, os trabalhos e os tópicos. treta!

Mário Montenegro disse...

Não me parece que o anonimato dos autores de um artigo seja, por regra, mantido, aquando da sua avaliação para publicação. Mas não tenho a autoridade de ser cientista e outros autores/frequentadores do blog poderão, certamente, falar com mais propriedade.

Anónimo disse...

Viva,
belo post. é informativo. Curiosamente basta ler um qualquer bom livro de introdução à ciência para pensar que o trabalho sério é assim. Felizmente existem algumas boas edições disponíveis em lingua portuguesa. Curioso ainda é perceber pelo teor dos comentários que existem autoridades mágicas que não se colocam nunca em causa, mas a ciência, talvez por essa razão, é tomada por treta. Triste cenário mental que mais não é a expressão clara de "ou vai ou Raiva".
Aqui há uns anos ainda era necessário sair do país para perceber como as coisas funcionam. Hoje em dia basta ter meio palmo de testa e alguma curiosidade para evitar o triste cenário das observações reaccionárias que diariamente aparecem no Rerum Natura.Não deveriamos antes estar a discutir as questões do que o mero exercício de esperteza saloia de cometer falácias ad hominem?
Até breve
Rolando Almeida

Anónimo disse...

O compadrio no seu melhor. basta ir á Crítica e ver quem lá tem um link para o seu próprio site: o Rolando! quem diria, ehm!? O Murcho defende o Buesco e o Almeida defende o Murcho. depois vem o Fiolhais e defende o almeida. e depois vem o coleinho da páscoa e defende o filoslhais. quem trés dedos de testa consegue ver o "caldinho" por detrás da seriedade "peer reviewed". Seriedade é sermos avalidos por quem ideias diferentes da nossa, não há sereidade em sermos avaliados por um qualquer elemento do mesmo rebanho que partilha connocsco as mesmas bovinidades intelectuais. tenho dito

Ciência Ao Natural disse...

Viva!
O sistema peer-review tem vantagens e desvantagens.
Algumas das desvantagens têm sido apontadas por um cientista português a trabalhar no estrangeiro – João Magueijo.
Gostaria de referir, por experiência própria, que existe como que um patamar mínimo a ultrapassar quando se submete determinado artigo científico. esse patamar não passa exclusivamente pela qualidade científica do seu trabalho.
Por outras palavras: o investigador nunca é avaliado meramente pelo seu trabalho mas igualmente pelo background académico, com que grupos de investigação tem ou já teve contactos, quais os seus “padrinhos” ou “inimigos” científicos.
Obviamente que me poderão dizer que isso é contrariável pelo carácter anónimo do peer-review mas, apenas posso falar do meus campo, é do conhecimento geral que o anonimato é unidireccional para quem vai ser revisor.
Também poderão afirmar que nunca se está verdadeiramente anónimo porque basta ir verificar a bibliografia para ver de que lado se está…
Assim o patamar/fronteira a ultrapassar nunca é igual para todos no peer-review.
Apenas uma(s) acha(s) para a fogueira…

Saudações

Luís Azevedo Rodrigues

Anónimo disse...

O Desidério perdoar-me-á a correção, mas na minha área científica, a física de partículas, TODOS os artigos científicos são submetidos a revisão sabendo-se quem são os seus autores. Ou seja, os argumentos de autoridade podem existir - e de facto existem.

Mesmo se os autores fossem desconhecidos de quem revê o artigo, eles seriam conhecidos do editor da revista, pelo que os argumentos de autoridade continuariam a existir. É muito difícil um editor de uma revista rejeitar um artigo de um cientista de nomeada, mesmo que tenha na sua posse um parecer crítico a esse artigo. Muitos editores de revistas aprovam quase automaticamente qualquer artigo que lhes seja enviado por um autor famoso - é prestigiante para a revista que certos autores nela publiquem.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

É um disparate de todo o tamanho, Desidério, dizer que a percentagem de rejeição de artigos numa revista científica seja um padrão da qualidade dessa revista. Nunca na minha vida científica vi alguma revista a anunciar qual a percentagem de artigos que rejeita. Há revistas que se gabam de serem muito selectas, mas nunca anunciam exatamente quantos artigos rejeitam e, de qualquer forma, também essas revistas pretensamente selectas se fartam de publicar porcarias e se fartam de aceitar argumentos de autoridade.

O Desidério está a contar uma versão "história da carochinha" da ciência, como se ela fosse um país das maravilhas. Não é, lamento muito informá-lo, e aos leitores deste blogue. E eu sou um cientista doutorado, com experiência de 20 anos em investigação e quase uma centena de artigos (e um livro) publicados. Não me venha com histórias da carochinha!

O Desidério a dizer asneiras assim descredibiliza-se, e descredibiliza este blogue.

Luís Lavoura

Desidério Murcho disse...

Caros Luíses

É verdade que o sistema não é perfeito. Mas isso é uma crítica sensata, pois vai no sentido de o tornar mais perfeito: devia ser melhor do que é. Não é uma crítica selvagem, que defenda o abandono de todos os sistemas de detecção de erros. Além disso, o “blind-refereeing” é apenas um dos sistemas. O outro é a crítica aberta — tão importante quanto esse. (Sei que em muitas áreas não se usa muito o “double blind-refereeing”, o que é lamentável.)

Evidentemente, uma publicação não académica não tem de ter e muitas vezes não tem sistemas de “blind-refereeing” ou de “peer-review” (as duas coisas não são a mesma). Mas mesmo uma revista de divulgação, se for intelectualmente séria, publica os artigos em função da sua qualidade intrínseca, e não em função de o seu director concordar com o teor do artigo. Compare-se isso com uma revista de ocultismo; duvido que qualquer director de tal revista publicasse um artigo que fizesse o “debunking” do ocultismo, por mais cuidadoso e sério que fosse tal artigo.

Anónimo disse...

E porque não aplicar esses príncipios de controle de erros à pão nosso de cada dia dos Sr's Doutores Académicos?????

Onde estão os exames e provas académicas avaliadas em «double blind refereeing»???

Não o fazer chama-se hipocrisia e criação de autoridades! Quantos alunos de 12 viram os seus exames de 18 dimínuidos para 14, porque «o aluno não é destas notas nem vale a pena ir a oral»??? Ou por ser comunista ou anarquista? Ou por ser um ateu, um fanático católico ou evangélico?

Os alunos são seleccionados por questões subjectivas e coagidos a adoptar padrinhos ou pertencerem a claques. E como poderão dizer que isso se trata de uma questão da academia, se as claques e as suas redes de contacto se espalham, perpetuam e manipulam a ciência?

Noto o facto, de por exemplo, no MIT os exames a TODOS os alunos dos primeiros anos serem feitos num mínimo de 24 horas e em conjunto por TODOS os professores das cadeiras avaliadas. Ou ainda o exemplo das avaliações na antiga USSR que eram, na sua maioria, orais com questões do domínio abertas, em que era tanto o aluno, como o PROFESSOR que eram avaliados por académicos das mesmas cadeiras das outras universidades...

DIZEM QUE O JOGO É O MESMO, MAS A VERDADE ESTÁ NOS PORMENORES!!!

Morte á academia!! Viva a ciência!!

Anónimo disse...

A ciência faz-se na academia, ó caramelo. Matas a acedemia e também matas a ciência. a tua visão romântica da ciência já está em desuso p`rai há 2 sécls. Grow up e vai estudar.

Ciência Ao Natural disse...

Discordo com "A ciência faz-se na academia, (..). Matas a academia e também matas a ciência."
A ciência faz-se não só mas também na academia.
Faz-se ciência em laboratórios (privados ou públicos), Museus (privados ou públicos) e noutros "locais " que não a academia.

Luís Azevedo Rodrigues

Anónimo disse...

está fino, aceito isso até certo ponto. mas experimente-se acabar com a academia, e depois? pomos os laboratórios a formar cientistas? por mim, está fixe! mudam-se as moscas e o nome do sítio onde estão as moscas, mas a m... (excuse my french) é a mesma. tipo, os laboratórios fazem ciência porque há academia para formar cientistas que fazem ciência? ou saltamos a parte do "a formação de base é necessaria". bai dai que, reafirmo, acabas com a academia e acabas com a ciência. ou bai ou racha...incha!

Desidério Murcho disse...

Caro Luís Lavoura

As revistas podem ou não apresentar as suas percentagens de rejeições. Hoje isso é mais comum do que há uns anos, e provavelmente depende da área. A publicação académica mudou imenso nos últimos 30 anos.

Em qualquer caso, eu não disse que esse era o único critério de avaliação de uma revista. Mas é um dos critérios. Se uma revista publica quase 100% dos artigos submetidos, isso significa que praticamente não tem filtragem de qualidade. Consequentemente, a qualidade dos artigos deve ser proporcionalmente mais baixa.

O outro é a quantidade de artigos dessa revista que são citados noutras publicações académicas; outro ainda é a quantidade de descobertas fundamentais publicadas na revista -- mas isso aplica-se apenas a áreas científicas que apresentam descobertas, o que não se aplica a todas as áreas académicas.

Mas o fundamental do meu artigo é isto: seja como for que se faça, uma área académica é séria precisamente na medida em que tiver sistemas de controlo de erros e sistemas de discussão aberta de ideias.

Outra coisa é saber se os sistemas que temos hoje em dia são paradisíacos. Não são. Mas é como a democracia: pode ser um sistema idiota, mas não conhecemos outro melhor.

Pense no seguinte, Luís: imagine-se com todo o poder e dinheiro do mundo, para organizar a sua área científica como lhe desse na gana. Iria prescindir do “blind-refeeing” e do “peer-review”, ou iria tentar melhorar este sistema? Iria prescindir de todo e qualquer controlo de qualidade, ou iria tentar conceber melhores sistemas de controlo de qualidade? Iria impedir a publicação dos cientistas que discordam de si, ou iria procurar evitar que os cientistas que discordam de si fossem discriminados por discordarem de si? Iria promover o livre debate de ideias, ou iria tentar impedi-lo? Estas são as questões que interessam.

Anónimo disse...

estas questões pertinentes do Murcho são para desviar as atenções do seu ponto rebuscado inicial, que tinha a intenção clara de atacar quem estava a atacar (com bons argumentos) o Buesco naquele post mirabolante sobre o AG. dizia o Murcho que

(((Quando estes sistemas existem, não importa muito se algumas pessoas que pertencem à comunidade em causa sejam dogmáticas, porque é o sistema que permite a heterodoxia e a inovação))))

A ideia bem disfarçada e tacada pelo Murcho era a de que os anti buescos seriam uns dogmáticos porque não estariam dispostos a aceitar a "inovação" estapafurdia do Buesco. Esquece-se o Murcho que a história da ciência está cheia de hips estapafudias que foram rejeitajas por serem isso mesmo - estapafurdias

Esta atitude do murcho não condiz mesmo nada com aquela ideia do Almeida (ver acima) de que os "Murchos" deste blog são imunes ao ad hominem, dado que o Murcho usou a coisa como poucos sabem.

ou vai ou racha.. e de que maneira (censurem-me que eu mereço por dizer a verdade sobre os jogos de bastidores e outros concluios)

Anónimo disse...

Desidério,

na minha área científica, atualmente, o sistema de "refereeing" já paticamente não tem utilidade. Todos os atigos são divulgados online na internet, e estão disponíveis para todos os que os queiram ler, na data em que os autores o quiserem. Muita gente nem se rala em indagar se um qualquer artigo científico já foi publicado numa revista com "referee" ou não; a citação é feita diretamente à versão online do artigo, e não à versão eventualmente publicada em revista. A qualidade dos artigos é diretamente avaliada por todos aqueles que os lêem, e não por um qualquer referee.

Neste sistema, que é o que atualmente (de facto, já há mais de um decénio) vigora na minha área científica, a publicação em revistas com referee só tem utilidade para um cientista pôr no seu curriculum. Ou seja, um cientista escreve no seu curiculum que já publicou N artigos em revistas com referee. Pode de facto já ter escrito muitos mais artigos, os quais até podem ser muito bons e terem montes de citações, mas que nunca chegaram a ser publicados em revistas.

Este sistema, que, epito, é o que atualmente vigora, é muito democrático. A qualidade de um artigo científico é avaliada por TODOS os outros cientistas, e não apenas por um ou dois referees. Eu posso ver na internet que um artigo meu tem M citações, e se M fôr muito grande esse artigo será bom, mesmo que eventualmente nunca tenha chegado a ser publicado numa revista.

Logo, Desidério, a internet tornou o sistema de revistas com referee praticamente obsoleto. Aliás, na minha área, cada vez as bibliotecas assinam menos revistas e cada vez menos as pessoas se preocupam em saber o que foi publicado nas revistas: está tudo na internet.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

Mas, voltando ao início, o tema do post eram os argumentos de autoridade. O Desidério pretendeu mostrar que em ciência não existem argumentos de autoridade, porque a ciência tem mecanismos que os eliminam. Ora, isso é, lamentavelmente e em geral, falso. E não é certamente o sistema de publicação em revistas que elimina os argumentos de autoridade. Porque os editores das revistas, em geral, respeitam as autoridades. Isso é especialmente verdade nos países europeus em geral, no qual as autoridades tendem a ter muito poder e a ser muito respeitadas. (Não é uma pecha só de Portugal, infelizmente.)

E é bem conhecido que a ciência tem modas, grupos de autores que se inter-citam, e coisas assim. O mundo cor-de-rosa pintado pelo Desidério, no qual as autoridades são desmascaradas e todos os bons cientistas têm acesso a ver o seu talento reconhecido, é tudo menos a realidade.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

bom critério, pá. qdo me perguntarem se tenho artigos cienf, respondo: tenho na internet. e qdo me perguntarem: então e são bons. respondo, são pois! todos os cientistas da net já os leram. e o outro diz. ah, pois... estou a ver. então usastes aquele site par criar artigos manhosos. e eu respondo: claro! pá. mas todos os cientistas com acesso á net já deram uma vista de olhos e dizem na net (local nada dado a falcatruas) que sõ óptimos, pá. vou já por no cv: visto pelos cientistas na net. francamente! onde anda este pessoal com a cabeça? racha, racha

Anónimo disse...

Francamente eu é que não percebo qual é a sua, caro anónimo do racha (para além de escrever com alguma piada). Afinal em que é que ficamos? Já se percebeu que, ao contrário do Jorge Buescu, acha que a coisa está a aquecer. Ok. E depois? As revistas de árbitros não prestam (e eu realmente até nem me custa a conceber uma revista de ocultismo com peer-review), a Net é uma choldra familiar (bom, família alargada e pós-moderna, espero que concorde), o Desidério fala do primo (aqui não sei, nem me interessa)... Enfim, quererá ter a bondade de se explicar um pouco melhor?

Anónimo disse...

Já agora!
Volto a recomendar. O livro de Colin McGinn referido neste blog é uma entrada nos bastidores de Oxford e universidades americanas. É uma bela história real a partir da qual o leitor compreende o fuzilamento intelectual a que é sujeito um autor quando pretende publicar numa revista da especialidade. Para dados adiccionais refiro que a edição original é de 2002 e McGinn trabalha actualmente na Rutgers University. É uma possibilidade de entrarmos nos meios académicos, nas mãos da primeira pessoa. De resto, é pelas universidades que passa todo o trabalho intelectual e científico, ainda que os meios privados paguem investigação para fins igualmente privados.
Rolando Almeida

Bruce Lóse disse...

Dério,
Para não serem só más notícias, venho dizer-lhe que por conselho do Rolando sempre roubei o seu livro do McGinn.

Desidério Murcho disse...

Quero esclarecer que o meu post nada tem a ver com o debate sobre o aquecimento global provocado pelas actividades humanas — o post até já estava escrito antes de o Jorge ter publicado o dele, mas só hoje foi publicado. O meu post vem na sequência de outros que publiquei sobre o mesmo tema.

Aproveito para dizer que, como não sou cientista, não sei avaliar quem tem razão nesse debate. Mas não tenho preconceitos nem vacas sagradas: tanto pode ser que sim, que os activistas ecológicos tenham razão, como pode ser que não. Mas devo dizer que desconfio em geral dos activistas precisamente porque geralmente põem o activismo acima da verdade. Tal como desconfio dos políticos e dos empresários pela mesmíssima razão.

Lavoura: Quanto à publicação na Internet, nada contra. Mas não acredito que esse seja o futuro da publicação académica precisamente porque qualquer pessoa pode publicar na Internet, sem qualquer tipo de filtragem de qualidade — transferindo o ónus da filtragem para cima de toda a gente, o que significa que um autor desconhecido pode ter ainda mais dificuldade em ser lido com atenção, num mar de outros artigos sobre o mesmo tema. Nada contra.

Quanto ao cor-de-rosa, Lavoura, não sou assim tão ingénuo. Repito: não penso que o sistema seja um paraíso, mas qualquer outro sistema tem problemas. E o meu objectivo era só o de mostrar que qualquer sistema tem de ter sistemas de controlo de erros porque as pessoas não são perfeitas. Não posso falar das outras áreas, mas aposto que é como na filosofia: a esmagadora maioria dos artigos publicados nas melhores revistas, para não falar das outras, é lixo inconsequente. Mas eu encaro isso com naturalidade. Ao fim ao cabo, a maior parte de tudo é lixo mesmo: a maior parte da música é lixo, seja erudita ou não, a maior parte da poesia idem, da literatura, do cinema, etc. Ninguém ainda descobriu um sistema de dar talento por encomenda a quem se entrega a actividades criativas como a ciência, a filosofia ou as artes. O risco é alma do negócio, também neste caso. Escrevemos e fazemos e depois os outros logo dizem se vale um cêntimo ou não.

Anónimo disse...

Vale a pena relembrar o decálogo de Bertrand Russell que condensa tudo isto.

1. Do not feel absolutely certain of anything.

2. Do not think it worth while to proceed by concealing evidence, for the evidence is sure to come to light.

3. Never try to discourage thinking for you are sure to succeed.

4. When you meet with opposition, even if it should be from your husband or your children, endeavor to overcome it by argument and not by authority, for a victory dependent upon authority is unreal and illusory.

5. Have no respect for the authority of others, for there are always contrary authorities to be found.

6. Do not use power to suppress opinions you think pernicious, for if you do the opinions will suppress you.

7. Do not fear to be eccentric in opinion, for every opinion now accepted was once eccentric.

8. Find more pleasure in intelligent dissent than in passive agreement, for, if you value intelligence as you should, the former implies a deeper agreement than the latter.

9. Be scrupulously truthful, even if the truth is inconvenient, for it is more inconvenient when you try to conceal it.

10. Do not feel envious of the happiness of those who live in a fool's paradise, for only a fool will think that it is happiness."

Retirado de: http://users.drew.edu/~jlenz/decalog.html

Anónimo disse...

marvl»»»»disse tdo, excepto o importante. este pessoal anda equivocado e tapadinho pelo que lhes lançam no prato. já viram o comportamento das galinhas qdo se manda um bocado de milho para o ar? parecem umas doidas a debicar de um lado para o outro. aqui é tal e coisa: uns cromos pseudo inteligentes e pseudo cultos mandam uns grãos de areia para o ar e aparecem logo uns galináceos a debicar. escusado será dizer que, tal como as galinhas não fazem a menor ideia do que estão a fazer, também os debicantes neste blog não têm a menor ideia do que está em causa, limitando-se normalmente a comer o milho (transgénico, ao que parece) que lançam para o ar. eu vou ter o bom senso de não defender mais nada e de não visitar mais este antro gregário de catatuas lançadoras de milho inquinado por ideiarios anglo-saxonicos, unilaterais, redutores, decadentes e miopes. é sempre assim: qdo lá fora se mudam os comportamentos e as ideias, os portugueses adoptam-nos. são mto provincianos estes portugas. só importam, importam. exportar, tá queito! ou pensavam que o Murcho tinha tirado o seu ideario da cartola. plágio ideológico é pior ainda que ideologia. grow up! tchiao bambinos. ou bai ou bai, e bou mesmo

Anónimo disse...

Anónimo, não seja bera. "Lá fora" também se plagiam uns ou outros - achar que "lá fora" não há provincianismo ou seguidores do "main stream" é que é arriscar-se a ser provinciano yourself.
Pessoalmente, acho este blog engraçado, especialmente a discussão que se processa nos comentários, e que me parece relativamente aberta. Não sei se a tendência é anglo-saxónica ou, pelo contrário, saxo-anglófona, mas não me parece que seja ilícito os bloggers terem-na. Arriscam-se a comentários como o seu e eu acho que isso já é meritório. Ou não é?
De resto, como é humanamente impossível sermos especialistas de tudo, em muitas matérias científicas temos mesmo que ir apanhando o milho dos pardais, como é que você quer que seja? Com sentido crítico, espera-se.
Saudações
Marvl

Anónimo disse...

Bruce Lóse,
Se algum destes temas lhe interessam, já agora, deixe-me recomendar-lhe um outro livro, muito bom, para começarmos a compreender algumas questões que aqui tem sido discutidas e ainda outras. Tome a minha sugestão como uma partilha.
Desidério Murcho, Filosofia, valor e verdade, quasi, 2006
Vai ver que não se arrepende ;)
Rolando A
(P.S. Se não encontrar na livraria o livro, não peça ao livreiro por Dério. É capaz de não o encontrar!!! :-)

Bruce Lóse disse...

Rolando,
Tenho por hábito brincar com pessoas que sei suficientemente inteligentes para entenderem uma piada. Se me permite uma respeitosa sugestão, não seja saloio e não me corrija aquilo que não deve. Interessa-lhe este ramo da filosofia?

Paulo Gama Mota disse...

Na maior parte das áreas científicas os artigos 'peer-reviewed' são avaliados conhecendo-se quem são os autores. Pelo contrário, os revisores costumam ser anónimos. Mas, há casos de pessoas que optam por nunca fazerem comentários anónimos - e eu conheço casos disso, ou que optam por revelar a sua identidade numa ou outra situação particular.

Esses comentários anónimos têm, contudo, que ser bem fundamentados. Porque o revisor também é avaliado pela qualidade da sua revisão - ainda que de uma forma informal e indirecta.

Mas,há sempre um rosto: o do editor. E muitos editores fazem críticas mais consistentes que alguns revisores.

Eu já desempenhei o papel de editor associado e garanto que, ao receber as revisões de alguns revisores fiz a minha avaliação. Nuns casos cresceu a minha admiração por eles e, noutros casos, tomei a decisão de não lhes enviar mais nada porque revelaram que não sabiam avaliar, ou foram mesquinhos e deixaram de lado o essencial, etc.

O sistema não é infalível e pode ser mau em certas circunstâncias. Mas, a maioria faz o possível para que funcione.

Há modas certamente, mas a ciência resiste a essas modas. Isto, é passado algum tempo as modas desvanecem-se, mudam. E o material de qualidade torna-se evidente.

A diferença entre as boas e as más publicações é que nas primeiras é muito raro ouvirmo-nos dizer: mas, como é que eles publicaram esta porcaria. E nas segundas já não é tão raro.

O Luis Lavoura tem razão quando afirma que a publicação do artigo não é o atestado definitivo de autoridade. Passou-se apenas uma barreira. A seguir o artigo é lido por muitos cientistas que fazem o seu juízo de valor. E depois há ainda o impacto das ideias: quantas vezes aparece citado depois.

A avaliação do valor das revistas faz-se aliás pelo factor de impacto: o número médio de citações de artigos nela publicados nos dois anos subsequentes. Quanto mais elevado o factor de impacto - a Nature e a Science têm factores da ordem de 50, enquanto de revistas lider na minha área têm factores entre 2 e 5, havendo muitas com valores inferiores a 1 - mais difícil é publicar. Há mais artigos a serem submetidos e a serem rejeitados; o crivo de avaliação é mais apertado.

Eu não acredito no sistema auto-publicação na internet. A internet tem um signal to noise ratio muito baixo. Há cada vez mais publicações e não há tempo para ler todas. Por isso os cientistas procuram as revistas com mais impacto e que são as mais lidas.

Há distorções e modas sim. Por exemplo, a prestigiada Proceedings of the Royal Society - a mais antiga publicação científica do mundo (disputa com uma francesa), é muito dada a modas. Mesmo assim, é inegável a qualidade do que lá é publicado.

Já passei por uma situação em que revi um artigo muito bom cuja publicação recomendei. Essa foi também a posição de um segundo revisor. Um terceiro, contudo, fez uma crítica demolidora e propôs a rejeição. O editor aproveitou e rejeitou - e o autor era muito conhecido. Achei claramente injusta a crítica e a rejeição e dei conta disso ao editor. Um ano depois o artigo surgiu noutra publicação.

Tive há tempos um artigo que sofreu rejeição em três publicações. Finalmente, foi aceite e publicado por uma quarta revista que até tem um factor de impacto superior às outras. Mas, o artigo já não era o mesmo, tinha sido melhorado com os comentários que foram sendo feitos.

Apesar das deficiências ainda é o melhor sistema.

Paulo Gama Mota

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