quarta-feira, 13 de abril de 2011

Química das coisas banais: o papel

Para onde quer que vamos o papel acompanha-nos: livros, jornais, revistas, cadernos, agendas, formulários, cartas, folhetos, bilhetes, notas, guardanapos, papel higiénico. Há um sem número de objectos de papel sem os quais dificilmente vivemos.

A história do papel é antiga e razoavelmente conhecida. Os egípcios produziam e utilizavam o papiro. Os antigos chineses já conheciam processos de produção de papel e dominavam processos de impressão baseados na xilogravura e, mais tarde, na tipografia. Mil anos depois da sua invenção na China, o papel começou a ser produzido na Europa do século XII. A tipografia e a revolução associada a Gutenberg surgem, mais tarde, no século XV, datando deste século a primeira fábrica de papel portuguesa, O Moinho de papel em Leiria, e os primeiros livros impressos em Portugal. Durante a idade Média dominou o pergaminho que era produzido a partir de peles de animais e era muitas vezes reutilizado, originando os palimpsestos dos quais, com processos físicos e químicos, é por vezes possível recuperar obras mais antigas. Actualmente, reciclar o papel faz perder os vestígios dos documentos anteriores, mas, o que já não é pouco, contribui para minimizar o corte de árvores e poupar energia. E, no entanto, o papel mantém, até ao limite em que começa a deixar de poder ser reciclado, a memória das árvores que o originaram: se rasgarmos um pedaço de papel podemos ver as minúsculas fibras que se projectam para os lados na zona de separação.

A madeira de que é feito a maior parte do papel é composta principalmente por celulose, lignina e hemi-celulose. Nos processos mais simples de produção de papel os troncos de madeira são triturados e separados em fibras. Em seguida, usando água são retirados uma boa parte da lignina e dos compostos não poliméricos, ficando uma mistura aquosa denominada polpa. Para a produção dos papéis de melhor qualidade são usados métodos químicos, nos quais a madeira é submetida a altas temperaturas e pressões para solubilizar a lignina. Podem ser empregues dois processos de produção da pasta de papel: num usa-se o ião sulfito e no outro o ião sulfureto. No primeiro caso o papel é quase só constituído por celulose, mas o papel obtido não é muito resistente, além de que todo o processo é bastante poluente. No outro, utiliza-se hidróxido de sódio e hidrogenossulfureto de sódio (obtido a partir de sulfato de sódio) para a separação da polpa, obtendo-se um papel muito mais resistente. Este último processo pode, no entanto, provocar a libertação de cheiros desagradáveis devidos à formação de compostos de enxofre denominados mercaptans. Durante a digestão da madeira vão sendo libertados vapores de forma a que a pressão se mantenha controlada. O aparecimento de cheiros é por isso praticamente inevitável embora seja feito um controlo rigoroso do processo e os gases libertados sejam recolhidos, condensados e neutralizados. Também existe actualmente um rigoroso controlo dos efluentes para evitar a poluição dos cursos de água.

Os processos químicos e físicos de conservação e restauro de obras em papel são uma necessidade fundamental para a preservação da memória, porque a celulose se oxida facilmente devido ao oxigénio do ar, sofre hidrólise em meio ácido, é digerida por bactérias e, para terror dos bibliotecários, é consumida em doses razoáveis por bichinhos da prata. A química é, também por isso, importante no desenvolvimento de aditivos que tornem o papel mais resistente à degradação. E, claro, há toda uma química fantástica nos cheiros dos livros novos e antigos e nas tintas de impressão.

A minimização da utilização do papel e a promoção da sua reutilização e reciclagem são importantes, mas é necessária também uma atitude racional. Se os plastificados e papéis com revestimentos especiais são difíceis de reciclar e por isso devem ser evitados, há produtos de papel que não são necessariamente piores que outros. Por exemplo, o papel colorido, em particular o papel higiénico de cores fortes, não tem, em geral, mais custos ambientais do que os outros tipos de papel porque a quantidade de pigmentos utilizada é insignificante, podendo até ter menor impacto ambiental se for baseado em papel reciclado não branqueado.

2 comentários:

P.A. Lerma disse...

e compostos de enxofre denominados mercaptans

Mercaptanas ou Mercaptanos já ahora fué abandonado pela IUPAC , hoje los llamamos de tióis

faltou toda a panóplia de adjuvantes, branqueadores variados

é que os pigmentos e os fillings são muitos
agentes dispersantes para o papel
agentes branqueadores para a indústria do papel-moeda agentes de assentamento e solidificação para o papel
aditivos não-deslizantes para o papel e a indústria gráfica papel anti-reflexo dos livros da editora panorama especialmente os de bolso

o papel é um mundo

Anónimo disse...

A nobreza do papel
tira-lhe a banalidade:
ele foi o mais fiel
porta-voz da humanidade!

JCN

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