quarta-feira, 4 de abril de 2007

O DEMÓNIO DE MENDEL

O Demónio de Mendel é um livro da editora Replicação cujo autor é o biólogo Mark Ridley (não confundir com outro biólogo com o mesmo nome) e que vem recomendado na contracapa por Richard Dawkins, o famoso evolucionista de Oxford. Mendel é o frade agostinho que cultivava ervilhas no quintal do seu mosteiro de Brno e que descobriu as leis da genética. Mas qual será o seu demónio?.

No prefácio é apresentada a espécie humana de um modo muito engraçado. Chega ao nosso planeta um grupo de extraterrestres que acham muito estranha a espécie humana. O seu relatório incide sobre as nossas particularidades genéticas:

“As criaturas maiores têm um milhar de milhão ou mais de letras de código de DNA e cerca de uma centena de gerações de células no seu corpo. Elas usam o sexo, evidentemente...’ ‘...mas é um tipo louco de sexo. Eles escolhem os seus parceiros entre apenas metade dos do seu tipo. A outra metade é simplesmente excluída... isto não tem nada a ver com a escolha entre potenciais parceiros, é uma espécie de inibição prévia à escolha. De qualquer forma, levaremos alguns dos maiores para o circo."

O demónio de Mendel é um parente do demónio de Maxwell, conhecido de quem estudou Física (ou, pelo menos, de quem leu "Física Divertida"), que define as nossas características genéticas:

"Eu gosto de imaginar o mecanismo de desordem [mendeliana] como uma figura divina – o demónio de Mendel – que se posta diante de cada gene de um progenitor e decide se este será ou não herdado na próxima geração e quais dos outros genes serão transmitidos. Mendel era quase contemporâneo do físico James Clerk Maxwell, que deu origem ao famoso ‘demónio de Maxwell’. Mendel publicou as suas ideias em 1866; Maxwell descreveu o seu demónio cinco anos mais tarde. O demónio de Maxwell é um demónio hipotético. Ele posta-se num buraco entre duas partes de um condutor e, ao permitir que apenas as moléculas rápidas fluam numa direcção, pode tornar (sem dispêndio de trabalho) uma parte do condutor quente e a outra parte fria. O demónio de Maxwell é um demónio anti-desordem, que se opõe ao movimento desordenado das moléculas, produzindo um estado mais ordenado do condutor (...) O demónio de Mendel, pelo contrário, é um demónio".

A diabólica criatura que Ridley associa a Mendel é o "controlador dos erros" nas cópias do DNA que se realizam na reprodução sexuada - neste planeta de dois sexos, só metade da espécie está disponível à outra metade (poder-se-á perguntar como seria a vida nos mundos com três ou mais sexos se a vida com dois sexos já é tão complicada...). São esses erros que vão determinar a evolução. A complexidade da vida será o espantoso resultado das escolhas do demónio de Mendel!

Portugal entra no livro. Ao falar dos acidentes na selecção natural, o autor socorre-se, com ironia, do terramoto de Lisboa. Vale a pena rematar com um naco da boa prosa de Ridley:

"No dia dos finados em 1755, um terramoto abalou Lisboa e a Sé colapsou, matando as pessoas que estavam no interior. Será que a morte foi selectiva? Voltaire forneceu uma famosa análise voltairiana, na qual os cristãos, estando no interior da Sé, tinham maior probabilidade de morrer e os ateus praticantes que estavam fora tinham maior probabilidade de viver. Se algumas pessoas tivessem uma tendência genética para o Cristianismo, ou para se juntar em grandes edifícios num dia santo, então a selecção estaria a actuar. Se não existissem tais tendências genéticas, a morte teria sido acidental em termos genéticos. Qualquer exemplo particular pode ser discutido, mas suspeito que os terramotos sejam essencialmente acidentais em termos genéticos.”

1 comentário:

Cláudia S. Tomazi disse...

O que entendem por "tendência genética para o Cristianismo" compreende por ética a caridade e assim dizer, entre causas a colonização fora exemplo e está do pioneirismo a quem nem tiranizou em dizimar raças. Então, senhores onde mora o penhor o compreende-se por tolerância?! Tolle e lege.

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