Novo texto de João Boavida, como sempre, antes publicado no diário As Beiras.
Podemos dizer que nos últimos quarenta, cinquenta anos houve uma desformalização generalizada da vida e também da educação. Os grupos sociais que faziam do formalismo e da formalização da vida uma mentalidade, um estatuto e uma distância, desformalizaram-se. Mais por empurrão da história, da economia, da política, da sociedade que por convicção, é certo, mas foi assim. A realidade cultural obrigou a isso.
A desformalização, que levou à generalização do informal e do de-qualquer-maneira, transformou estes em regra, e de regra depressa se tornaram em moda. E, com a moda, formalizou-se a desformalização; isto é, as fórmulas, os modelos, passaram a ser, por regra, a falta deles, a não-fórmulas, os não-modelos. Pelas piores razões, pois, como acontece a todas as modas quando se massificam.
Esta desformalização de modos, comportamentos, linguagens, retirou boa parte dela aos que a tinham, dissolveu o resto que havia nos que pouca possuíam e, assim, a educação deixou de a fornecer, como se se tratasse de uma coisa inútil e desprezível. Daí hoje dizer-se que imensos jovens não têm maneiras, não sabem estar e faltam-lhe atitudes adequadas às circunstâncias. Mas, pior, não são só os jovens.
Podemos considerar que não é importante dar primazia aos mais velhos nos corredores ou à passagem duma porta, nem pedir licença para passar à frente, nem desculpa pelos encontrões, nem cuidado com as grosserias, nem agradecer pequenos favores ou atenções, etc. Pois são tudo coisas que não aumentarão a produtividade. Talvez, mas deixarão muitos a pensar quando for preciso escolher pessoas para certos cargos e funções, e que uma boa empresa ou serviço não pode desprezar.
Serão pois pequenas coisas, e a diferença entre as grandes e as pequenas coisas será pouca, aqui, mas grande ao nível das implicações, lá. Além de que nem sempre avaliamos as consequências de como as qualidades e os defeitos, a boa ou a má formação interferem num complexo infinito que é a sociedade.
A verdade é que tudo tem a sua forma e, portanto, as relações humanas exigem a sua formalidade. Talvez em certas épocas, lugares e grupos se tenha exagerado na formalização, transformando-se a boa formação em formalismo, e como este é mais exterior que interior, a boa educação tornou-se, muitas vezes, mais aquilo que parece do que aquilo que é. Ou seja, a formalização excessiva, em certas classes, tornou a desformalização uma necessidade. Mas não estaremos a caminho do excesso disso? Não se sentirá hoje a falta que faz um certo número de fórmulas e de modelos? Penso que é urgente reequilibrar as coisas.
João Boavida
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3 comentários:
Há formalismos (bom dia, com licença, desculpe...) que até são uma questão de saúde pública.
É urgente é, Professor Boavida. Ou seria...
Por exemplo nas escolas públicas (desculpem a insistência...), é comum os professores terem que esperar que o grosso de alunos entrem ou saiam nos corredores, sob pena de (insensivelmente) serem levados na enxurrada. Também é comum entre o passar um professor ou um aluno, numa qualquer porta, passar o aluno, sem qualquer cerimónia...
Mas também há casos em que, na fila da cantina, os professores, como se algum direito divino lhes assistisse, passam sem hesitação para o ínicio da fila, ultrapassando os alunos (claro que isto se passa em cantinas onde comem relativamente poucos alunos...). Ora eu até percebo que os professores, por razões que vão desde a idade à saúde não devam estar muito tempo em filas, mas nesse caso mais valia terem um espaço à parte para se servirem...
E assim vamos indo, mas indo mal...
Julgo que é uma pena terem-se perdido alguns formalismos.
Os ritos formais dão elegância à vida!
Concordo com o comentário anterior.
Uma graça mesmo pequena pode encher o dia.
Foi como este post que me fez sorrir! :)
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