sexta-feira, 10 de setembro de 2010

ÁGUA VIRTUAL


Texto feito a pedido do Museu da Água de Coimbra:

“Mundo redondo, tenho o mar nas veias.
E no mar há sereias.”


Miguel Torga, “Orfeu Rebelde”, Coimbra, 1958.

Miguel Torga tem razão poética, mas a razão científica diz que no mar há moléculas, uma multidão inimaginável de moléculas. A água, qualquer porção de água, não é mais do que um conjunto de moléculas de água. Cada uma delas, pequeníssima, é formada por um átomo de oxigénio central, ladeado por dois átomos de hidrogénio: o aspecto não é muito diferente do perfil da cabeça do rato Mickey, com uma cabeça redonda e duas orelhas, também redondas mas menores.

E essas moléculas vagueiam mais ou menso livremente pelo espaço vazio: no vapor de água são mesmo bastante livres, na água líquida fazem-se e desfazem-se constantemente ligações entre as moléculas – é espantoso o jogo das moléculas num simples copo de água! - e, no gelo, as moléculas estão fixas a posições de uma rede cristalina. Para perceber melhor a dinâmica molecular, um dos meus colaboradores, na sua tese de doutoramento, criou, há alguns anos, com a ajuda da empresa de Coimbra Mediaprimer, um programa de simulação, que permitia dar um mergulho na realidade molecular da água, inacessível à vista desarmada. Esse programa intitulado “Água Virtual” (que, numa das suas versões, está acessível aqui ) usava modernas técnicas de realidade virtual para fazer com que as moléculas nos entrassem pelos olhos dentro e, por isso, também pelo cérebro dentro. Com a ajuda de manípulos, pode-se alterar a temperatura e a pressão de modo a causar mudanças de estado físico, isto é alterações da movimentação molecular. Pode-se fazer “zoom” para examinar de perto os inevitáveis choques moleculares. E pode-se também ver como eram supermoléculas, tal como existem temporariamente num copo de água, formadas por duas, três ou mais moléculas de água.

Ao mergulhar no mundo microscópio da água, apercebemo-nos que a água – um dos mais banais líquidos do nosso planeta pois mais de 70 por cento da superfície do planeta é coberta por água e 60 por cento da maioria dos seres vivos não é mais do que água – é também uma substância muito complexa. De facto, a forma peculiar das moléculas e as complicadas interacções entre elas tornam-na num líquido que ainda hoje é objecto de intensas investigações científicas em laboratórios de física e de química, investigações essas que podem vir a ter relevância para questões do ambiente e da biologia.

Depois de ter “viajado” pela “Água Virtual”, a leitora ou leitor nunca mais vai olhar para a água da mesma maneira...

4 comentários:

Anónimo disse...

O metafórico mar
que Torga tinha nas veias
tudo podia albergar
menos a voz das sereias!

JCN

Anónimo disse...

Pessoa não saberia
que antes de as mães portugusesas
chorarem suas tristezas
já sal o mar possuía?!

JCN

Anónimo disse...

Há muito género de águas
à nossa disposição
desde da que brota das fráguas
e vendida em garrafão
à que se chama aguardente,
para não falar também
da água-benta que tem
sobre as demais ascendente.

JCN

Anónimo disse...

AVENTURA AMBIENTAL

A senhora governante
que de pássaro tem nome,
mas não é dos que se come
ou se serve em restaurante,
depois de ter visitado
numa viagem febril
em serviço ambiental
o concelho de Arganil
em mau cheiro mergulhado,
diz-se ter-se perfumado
ao voltar à capital
após deixar a parvónia
com montanhas de colónia
de tal modo que o mercado
terá ficado esgotado!

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