sábado, 25 de setembro de 2010

DE ESPANHA BOM VENTO E NENHUM CASAMENTO


A ministra da Cultura anunciou há dias, com grande candura, a falência iminente do Estado social. Com muito mais propriedade podia ter anunciado a falência iminente do Estado cultural. É talvez devido a ela que a "rentrée" nas instituições culturais estatais está bem aquém do que seria desejável.

Só para dar um elucidativo exemplo. Entre os dia 11 de Março e 30 de Maio esteve patente em Badajoz, no MEIAC - Museu Estremenho e Ibero-Americano de Arte Contemporânea, uma grande exposição sobre as relações culturais, mais precisamente literário-artísticas, luso-espanholas no início do século XX, mais precisamente de 1890, data do começo do simbolismo português, até 1936, data de eclosão da guerra civil espanhola. A ambiciosa mas muito bem conseguida mostra, intitulada "Suroeste" (do nome "SW Europa Sudoeste" de uma revista escrita apenas por Almada Negreiros e da qual saíram apenas dois números em 1935), enquadrou-se na Presidência Espanhola da União Europeia, tendo tido a presença do Rei de Espanha e tendo o catálogo prefácio do primeiro-ministro espanhol.

Pois bem. A exposição que era para agora estar patente em Lisboa, na Assembleia da República, não será vista entre nós: foi desmanchada e dissolvida sem que o público português possa apreciar os esforço de cooperação de intelectuais ibéricos num tempo em que os comboios para a Espanha eram de muito pouca velocidade. Além de Almada Negreiros (amplamente representado na Exposição por amabilidade do Museu Gulbenkian), que trabalhou em Madrid, nomes portugueses que tiveram a ver com Espanha naquela época foram Eça de Queirós, Eugénio de Castro (cujo epistolário está conservado na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, que o cedeu para Badajoz), Teixeira de Pascoais, Fernando Pessoa, etc. Do lado espanhol avultam nomes como Miguel de Unamuno, Ramon Gomez de la Serna e Vasquez Días. As relações luso-espanholas, se eram recíprocas na época, hoje, dada a falência do estado cultural português, já não o são. O primeiro-ministro português nem ajudou a pagar a exposição nem ao menos escreveu uma palavrinha para pôr ao lado das do seu amigo Zapatero ("La Cultura Corazón de Europa"), na portaria do grande catálogo, em edição trilingue (português, espanhol e inglês).

A Assembleia da República devia ter recebido a mostra, uma vez que havia um compromisso com Espanha nesse sentido, mas, como se diz agora, borregou. Vale-nos a distribuição entre nós do utilíssimo catálogo, que se encontra nas livrarias nacionais graças à Assírio e Alvim, para minorar a nossa insuficiência cultural. Mas é uma vergonha que a exposição, que foi toda feita e bem feita sob a batuta luso-espanhola de Antonio Saez Delgado, Luís Manuel Gaspar, Juan Manuel Bonet, Sara Afonso Ferreira e Antonio Franco Dominguez, não seja vista entre nós...

2 comentários:

Anónimo disse...

Num país deficitário
em matéria de cultura,
creio não ser necessário
outra qualquer criatura!

JCN

Cláudia da Silva Tomazi disse...

"uma vez que havia um compromisso com Espanha nesse sentido"
o assunto era o quê mesmo?! Hã...ética.

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