sexta-feira, 6 de abril de 2007

Histórias da evolução do Homem

Várias perspectivas das duas conchas encontradas em Skhul. A linha desenhada para comparação tem 1 cm.

A descoberta de objectos pré-históricos cuja morfologia indica terem sido alvo de acção humana deliberada (por vezes difíceis de distinguir de objectos naturais) levanta algumas questões aos arqueólogos sobre o fim destes objectos, nomeadamente se a sua função última tinha cariz prático ou simbólico.

Os arqueólogos e (antropólogos) associam artefactos simbólicos a uma competência cognitiva que distingue o que chamam a cultura humana moderna, capaz de interpretar a realidade simbolicamente e incorporar e transmitir esse simbolismo - e por extensão um sistema de crenças - no seu comportamento.

Durante muito tempo pensou-se que, embora a anatomia humana, nomeadamente a encefalização, tenha evoluído muito lentamente ao longo de milhões de anos, a evolução cultural e social apresentou um ponto de viragem há cerca de 40 000-50 000 anos, sem se perceber bem o que despoletou tal alteração cultural e inovação muito rápida.

De facto, durante o Pleistoceno Inferior (1.8 milhões de anos a 750 000 anos) até ao Pleistoceno Médio (750 000 a 400 000 anos), o cérebro passou de 440 para 900 cm3- modificando igualmente a forma do crânio, especialmente o frontal e o occipital. No Pleistoceno Superior, 400 a 100 mil anos, período em que viveram os últimos Homo erectus e os primeiros Homo sapiens, ocorreram as maiores alterações na reorganização das proporções cranianas. Desde há aproximadamente 100 000 anos que os nossos esqueletos cranianos e dimensões cerebrais não sofreram mudanças significativas.

No entanto, até recentemente, parecia que o homem moderno, isto é, não só moderno anatomicamente mas moderno em termos de comportamento, só apareceu há aproximadamente 40 000 anos, como parecia sugerir a datação dos primeiros artefactos que evidenciavam uma interpretação simbólica da realidade e a incorporação desse simbolismo no comportamento humano. Os artefactos simbólicos mais antigos encontrados até finais do século XX - de que as grutas de Lascaux, Chauvet ou de Altamira, todas com menos de 35 000 anos, são exemplo - pareciam de facto indicar que esta competência cognitiva surgiu relativamente tarde na evolução humana.

Nas últimas décadas uma série de descobertas tem indicado que esta capacidade cognitiva evoluiu com o próprio homem, quiçá tendo estado presente no Neanderthal e nas populações Sapiens mais antigas. Isto é, pensa-se hoje que as sociedades que criam uma «história acumulada», as «sociedades quentes» de Claude Lévi-Strauss - que se opõem às «sociedades frias» que vivem num eterno presente - podem ser anteriores ao que muitos acreditam. A descoberta de arte paleolítica, entre ela conchas Nassarius kraussianus perfuradas, na caverna de Blombos na África do Sul, sugeriu a existência de sociedades simbólicas há cerca de 70 000 anos.

O artigo «Middle Paleolithic Shell Beads in Israel and Algeria» (artigo completo reservado a assinantes) da Science de 23 de Junho de 2006 situa a existência de culturas simbólicas há pelo menos 100 000 anos.

O artigo descreve descobertas arqueológicas em Skhul, Israel, e Oued Djebbana, Argélia, proeminentes entre elas mais conchas Nassarius perfuradas, análogas às encontradas em Blombos. A datação dos artefactos indica que as duas conchas encontradas em Skhul têm mais de 100 000 anos e que as de Oued Djebbana podem ter 90 000 anos.

«O nosso artigo suporta o cenário que humanos modernos em África desenvolveram comportamentos que são considerados modernos muito cedo, de forma que estas pessoas são não apenas biologicamente modernas mas igualmente modernas cultural e cognitivamente, pelo menos num certo grau» afirmou à World of Science um dos cientistas responsáveis pelo trabalho, Francesco d'Errico.

Como Marian Vanhaeren, outra cientista responsável pelo estudo, declarou: «Comportamento mediado simbolicamente é um dos indicadores da modernidade incontestados e aceites universalmente. Uma característica chave de todos os símbolos é que o seu significado é atribuído por convenções arbitrárias socialmente construídas que permitem o armazenamento e transmissão de conhecimento».

3 comentários:

Joana disse...

Será que o Neanderthal tinha alma? E os primeiros sapiens? E se tinham que pecado original cometeram para merecer a extinção? Foi uma Sodoma ou Gomorra que os extinguiu?

Anónimo disse...

Pode ser dado também o exemplo de Foz Côa, esse sítio importantissimo mas tão desprezado em Portugal...

gabriel luis freire barbosa disse...

a evolução humana foi importante até que ponto hoje?

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