quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
TEMPO PARA OS ALUNOS
Um grupo de alunos do secundário fez-me algumas perguntas sobre o tempo para prepararem melhor um trabalho sobre esse assunto. Partilho aqui as respostas que lhes dei:
P- Como se explica a unidireccionalidade do tempo? Existem várias teorias?
R- A chamada "seta do tempo" é um dos grandes mistérios da Física. A Segunda Lei da Termodinâmica diz que distinguimos futuro do passado porque num sistema isolado a entropia cresce espontaneamente com o tempo em todos os processos (reais (processos ditos irreversíveis). Mas o problema é que não é fácil fundamentar essa lei de uma teoria macroscópica a partir de leis de teorias microscópicas (mecânica newtoniana ou relativista, mecânica quântica) que não distinguem passado de futuro. Parece que a seta do tempo aparece quando se caminha do microscópico para o macroscópico, do pequeno para o grande, do simples para o complexo. Sim, há várias teorias que tentam explicar a seta do tempo. O Prémio Nobel da Química Ilya Prigogine trabalhou muito nesse problema e tem um excelente livro de divulgação sobre o assunto ("A Nova Aliança", Gradiva, com Isabel Stengers).
P- A noção que o ser humano tem do tempo corresponde realmente ao tempo como é visto na Física? Ou, pelo contrário, a noção de tempo (no senso comum) encontra-se desfasada da realidade?
R- O tempo dos físicos tem de ser definido com mais precisão do que o tempo do quotidiano, o tempo do senso comum. O tempo é medido com relógios e Einstein foi o primeiro a reconhecer que, ao contrário do que Newton supunha, não há um relógio universal: o ritmo do relógio depende do estado do movimento e depende da proximidade a corpos com massas. O tempo está ligado ao espaço e o espaço-tempo é deformado pela matéria-energia. Logo aí houve um abalo do sendo comum. O filósofo francês Henri Bergson, por exsmplo, não aceitou as ideias de Einstein com base no senso comum. De modo que podemos dizer que a noção de tempo nos seres humanos se encontra um pouco desfasada da realidade física. Por outro lado, há a questão, que já mencionei, de explicar com base em teorias físicas microscópicas a diferença entre passado e futuro que todos vemos. Einstein declarou um dia que essa diferença era uma "ilusão" uma vez que, nas equações fundamentais da física, ela não é evidente.
P- Cientistas afirmam que o tempo poderá algum dia acabar. Esta afirmação tem alguma credibilidade? Porquê?
R- Segundo a teoria da relatividade de Einstein o tempo está ligado ao espaço: há uma entidade a quatro dimensões chamada "espaço-tempo". Hoje sabemos que o espaço-tempo começou há cerca de 14 000 milhões de anos. com o momento inicial do Big Bang. Não havia tempo antes do Big Bang, pelo que, em Física, não se pode falar de antes do instante zero. Tanto quanto sabemos hoje, o Universo vai continuar em expansão. Não haverá, portanto, fim do espaço-tempo. O Universo é semi-eterno: não é eterno para trás, mas é eterno para a frente. As afirmações sobre o "fim do tempo", no estado actual da Astrofísica, não têm credibilidade.
P- Quais foram os físicos que mais contribuíram para o conhecimento actual que temos do tempo?
R- Já falei de Newton e de Einstein, na Mecânica. Na Termodinâmica os grandes autores da famosa Segunda Lei foram o alemão Rudolf Clausius e o britânico Lord Kelvin. Entre os que identificaram o problema da justificação microscópica da irreversibilidade do tempo estão o austríaco Ludwig Boltzmann, que associou entropia e probabilidade, e o britânico James Clerk Maxwell. Entre os estudiosos mais recentes da questão do tempo, está o referido Prigogine, embora deva nota que as teorias dele são controversas.
P- Quais as diferenças da concepção do tempo entre a Física Quântica e a Relatividade Geral de Einstein?
R- Na Física Quântica o tempo é um parâmetro ou variável independente tal como na Física Clássica. Nas duas teorias há reversibilidade temporal: as equações não mudam se se mudar o sentido do tempo. Na teoria da relatividade restrita o tempo passa a ser tratado como as variáveis que descrevem o espaço. Na teoria da relatividade geral o espaço-tempo é associado à matéria-energia, sendo o tempo ainda um parâmetro.associado aos parâmetros de espaço. Essa teoria consegue descrever buracos negros (o fim do espaço-tempo) e buracos brancos (o Big Bang é, afinal, um grande "buraco branco": o início do espaço-tempo). No século XX, após a Teoria da Relatividade e a Teoria Quântica terem aparecido, desenvolveu-se a Física Quântica Relativista, que junta a teoria da relatividade com a teoria quântica. No entanto, ainda não existe uma teoria da gravitação quântica aceite por todos, isto é, uma teoria que junte a teoria da relatividade geral e a teoria quântica de um modo incontroverso.
P- Os físicos estão a tentar elaborar uma teoria do tudo, em que unificam todas as interacções fundamentais. Em que grau de desenvolvimento se encontra esta teoria?
R- A chamada "teoria de tudo" pretende ser uma teoria unificadora das forças. Já foram unificadas três das quatro forças fuindamentais da Natureza, no quadro da teoria quântica relativista (teoria de campos). Está ainda a faltar a unificação final com a força da gravidade, precisamente por não existir uma teoria quântica da gravitação. Uma "teoria de tudo" deverá conter uma teoria quântica da gravitação. A proposta mais defendida tem sido a teoria das cordas. Não há, porém, nenhuma evidência experimental ou observacional para essa teoria que deverá descrever unificação de forças a energias extremamente elevadas. Para alguns a teoria das cordas é, por isso, uma teoria mais metafísica do que física. Mesmo que se viesse a validar uma "teoria de tudo", ela de facto não seria uma teoria de tudo. Por exemplo, o mistério da irreversibilidade do tempo em sistemas grandes (sistemas complexos) permaneceria...
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6 comentários:
Quando não ser é impossível
em já sendo o que é possível
nesta viagem, se ter é ler
quando ler, então, seja e veja
que viajante estivera.
Sobre o tempo dissertar
é perder tempo, no fundo,
pois um abismo profundo
nos impede lá chegar!
JCN
O tempo presentea-nos com o presente.
Com "o presente" ou com "um presente"?! JCN
Enquanto nós discutimos
com toda a nossa ciência
acerca da sua essência,
o tempo com suas fintas,
que não vemos nem sentimos,
para nós se está nas tintas,
pondo à prova a eficiência
dos sábios que possuímos!
JCN
Sábio entre sábios,
douta e longa vida
bela e útil quimera
JCN é nossa primavera!
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