sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Química das coisas boas: pimentos de Padrón

Em resposta (com algum atraso) a uma questão do meu amigo Albino M. que mantém um interessante blogue de poesia (Rua das Pretas) vou procurar a química do prazer de comer pimentos de Padrón.

Os pimentos de Padrón (Capsicum annuum L.) pertencem à grande família dos pimentos, malaguetas e piri-piris originária na América do Sul. Na Galiza, estes pimentos são colhidos ainda imaturos e não são, em geral, picantes. Para além do estado de maturação, o seu sabor característico resulta provavelmente do clima, selecção das sementes e métodos de cultivo. De facto, invernos amenos, verões temperados e chuva abundante parecem dar origem a um menor conteúdo em hidratos de carbono e maior percentagem de amido em relação às variedades da América do Sul. Por outro lado, o tratamento cuidadoso e a colheita precoce evitam o stress vegetal responsável pela produção de capsaicina (o composto responsável pelo sabor picante).

Os pementos de Padrón, uns pican e outros non, dizem na Galiza. Na minha opinião, só os galegos poderiam ter inventado uma coisa tão improvável quanto agradável: pimentos picantes que só picam às vezes!

Com mais de noventa por cento de água e uma quantidade relativamente baixa de lípidos e hidratos de carbono, a presença dos ácidos málico, oxálico e quínico manifesta-se no subtil sabor ligeiramente amargo. Para além disso, embora a capsaicina presente quase não seja detectada na boca, a pequena quantidade disponível poderá ainda (especulo eu) interagir com os receptores celulares dopamínicos, contribuindo para aumentar as sensações agradáveis. Finalmente, o azeite usado na sua fritura, o sal grosso e o odor característico, resultante de ficarem ligeiramente queimados, completam o prazer.

Sabe-se hoje que o sal em excesso e alguns compostos presentes nos alimentos queimados aumentam o risco de cancro entre outras doenças. Existem dúvidas sobre o efeito benéfico ou nefasto da capsaicina. Mas todos os estudos concordam que os pequenos prazeres que diminuem o stress, contribuem para uma melhor saúde.

Assim, não tenho dúvidas de que um final de tarde de verão ou início de outono a petiscar uns pimentos e beber uma cerveja na companhia de amigos é um pequeno prazer com química! E, estando nós em pleno inverno (embora atípico), a recordação desses momentos é reconfortante.

Referência:
Chemical composition of Padron peppers (Capsicum annuum L.) grown in Galicia (N.W. Spain), Lopez-Hernandez J.; Oruna-Concha M.J.; Simal-Lozano J.; Vazquez-Blanco M.E.; Gonzalez-Castro M.J.Food Chemistry 57 (1996) 557-559.

1 comentário:

Cláudia da Silva Tomazi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.

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