terça-feira, 1 de março de 2011

COIMBRA FLORESCE


A minha crónica semanal no "Diário de Coimbra".

Na sua translação ao redor do Sol, o nosso planeta Terra aproxima-se do momento, na sua orbita, em que ocorre o equinócio da Primavera, o que no nosso calendário ocorrerá no próximo dia 20 de Março, pelas 23h21. Nessa data, a duração do dia será igual à da noite.

Desde o inicio da estação invernal que no hemisfério terrestre norte e às nossas latitudes, o período de iluminação diário tem aumentado. O dia espreguiça-se e a natureza sacode-se dos refulgentes cristais de gelo da sua hibernação. De entre animais e plantas, o florescimento vegetal sobressai e estimula os nossos sentidos.

Em resposta a um maior tempo de exposição solar várias árvores angiospérmicas, como as dos géneros Magnolia e Prunus (cerejeiras, ameixoeiras, amendoeiras), florescem encantando inúmeras ruas e espaços jardinados de Coimbra e arredores... Nestas árvores, o primeiro verso do prefácio primaveril vem na forma de flor, que nestes casos preenche de cor a copa arbórea despida de folhas verdes.

As folhas virão depois com a progressiva mobilização radicular de recursos minerais, como o ferro (Fe), o magnésio (mg), o manganês (Mn), entre tantos outros elementos. O primeiro (Fe) é essencial para a síntese de clorofilas (ver, por exemplo, aqui e aqui) e citocromos. O segundo (Mg) é constituinte das clorofilas. O terceiro (Mn) é fundamental para a organização da estrutura lamelar dos tilacóides dos cloroplastos, organelos onde ocorre a fotossíntese.

A magnificência da flor grande e perfumada das magnólias, das primeiras a florescer, nas suas variantes corolas coloridas desde o branco ao rosado mais ou menos intenso, tecem o olhar com a mensagem segura, que a experiência de 100 milhões de anos de evolução e adaptação a mudanças inspira, de que melhores tempos estão mesmo a chegar, que uma nova estação traz consigo os aromas de uma exuberante e diversa fertilidade.

O perfume floral anuncia pólen, rico alimento de inúmeros insectos e pássaros que exprimem na atmosférica partitura primaveril as sonatas da sua fértil evocação. Em troca, os animais vectorizam células reprodutivas masculinas, de flor em flor, fertilizando eficazmente plantas distantes da mesma espécie. Esta polinização cruzada minimiza “a consanguinidade” (a da mesma planta fecundar-se a si própria) e promove a biodiversidade vegetal. É desta cooperação sinérgica entre diferentes espécies, géneros e reinos que floresce a força motriz capaz de gerar uma capacidade ajustada à resolução de adversidades, utilizando os recursos existentes, num belíssimo exemplo do uso harmonioso da bioeconomia característica e intrínseca à vida.

E hoje, dia 1 de Março, dia da Universidade que floresceu na cidade de Coimbra há 721 anos, o Doutor João Gabriel Silva é investido nas magnificentes funções reitorais para que foi eleito pelo Conselho Geral. E a Universidade recebe a visita de uma das mais florescentes cientistas portuguesas, Maria de Sousa, de cujo trabalho resultaram muitos frutos para o conhecimento do funcionamento do sistema imunitário e da homeostase do ferro no nosso organismo.

O mesmo elemento (Fe) necessário para sintetizar as clorofilas que permitem às plantas fixar dióxido de carbono e eliminar oxigénio, o oxigénio que, conjugado com o ferro presente na hemoglobina dos nossos glóbulos vermelhos é transportado até todas as células do nosso organismo para permitir a respiração celular.

Maria de Sousa vem receber o Prémio Universidade de Coimbra de 2011 com que foi recentemente distinguida e, com certeza, um ramo de flores. Adiciono ao ramo uma magnólia.

António Piedade

5 comentários:

ana disse...

Muito interessante a abordagem à Primavera que se aproxima, um hino às flores e ao reviver da Universidade mais antiga do país.
Parabéns, deu-me prazer ler.

Anónimo disse...

Muito bem!
Helena Freitas

João de Castro Nunes disse...

GLICÍNIAS E MAGNÓLIAS

Há pelas ruas de Coimbra um cheiro
inconfundível, morno, açucarado,
espécie de perfume sem letreiro,
glicínia com magnólia misturado.

Não sei donde lhe vem um tal aroma
que impregna as ruas todas da cidade;
talvez lhe venha da época de Roma
que lhe outorgou cartão de identidade.

O certo é que é um cheiro sedutor
que se pegou de modo irreparável
à minha capa negra de doutor.

O mesmo cheiro doce e agradável
que desde o nosso tempo de noivado
nos nossos corações anda entranhado!

JOÃO DE CASTRO NUNES

José Batista da Ascenção disse...

Este mesmo texto é, em si mesmo, uma bonita flor num tempo em que (já) se aproxima a Primavera. E tanto que nós estamos precisando de Primaveras...

Ana Sofia disse...

Gostei muito! Uma bela homenagem as magnólias que nos presenteiam nesta altura do ano!
Ana Sofia

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