A minha crónica semanal no "Diário de Coimbra".
É do conhecimento comum que o sistema nervoso, o cérebro e sistemas de outros órgãos e tecidos que estão neste momento a processar a informação que está a ler nestas linhas, é constituído por centenas de biliões de neurónios, células eficientemente especializadas na tarefa de receber, processar e transmitir informação de e para milhares de outros neurónios.
A ideia da centralidade neuronal na função cerebral é pelo menos centenária. As famosas e pioneiras ilustrações da realidade microscópica do cérebro, efectuadas pelo neurocientista espanhol e laureado Nobel, Santiago Ramon e Cajal (1852 – 1934), apresentam essencialmente diversos tipos de neurónios. Muitas dessas ilustrações, saídas da pena artística daquele que muitos consideram o pai da neurociência moderna, continuam a ser utilizadas em aulas, livros e artigos científicos, para ilustrar quer a diversa estrutura neuronal quer a filigrana arquitectura das redes que estabelecem.
Nas últimas décadas, os avanços verificados nas neurociências, nas tecnologias de visualização histológicas (tecidos e células) e imagiologias funcionais (ressonâncias magnéticas, por exemplo), têm permitido aos especialistas considerarem a centralidade neuronal das funções cerebrais como uma imagem incompleta da realidade do sistema nervoso.

Por cada neurónio existem em média cerca de dez células da glia! Assim, se o número de neurónios num cérebro é astronómico, o número de células da glia será de uma grandeza cósmica!

Recentemente, revistas científicas de referência como a Nature e a Science, mais generalistas como a Scientific Americam ou de especialidade nesta área como o European Journal of Neuroscience, incluindo a própria Sociedade Internacional de Neurociências, têm vindo a reunir e sistematizar o conhecimento entretanto acumulado sobre o papel das células da glia na actividade do sistema nervoso: de “simples cuidadodoras” dos neurónios, para modeladoras da actividade neuronal e mesmo parte integrante da solução da equação “receber, integrar, decidir e transmitir uma dada informação”.
De cuidadoras para decisoras em algumas acções, as células da glia “dizem-nos” que há um outro cérebro para além dos neurónios.
Nesta Semana Internacional do Cérebro, se tiver oportunidade de falar com um neurocientista, não hesite em lhe perguntar sobre as células da glia. Há um mundo novo a descobrir dentro de si.
(continua)
António Piedade
8 comentários:
Interessantíssimo - não tenho cultura para expandir o meu comentário, mas a curiosidade é um dos meus muito queridos deslumbramentos, e estas "Glias" prometem. E nunca é demais agradecer a estes "amigos" cientistas que nos mostram estas novidades.
HR
são os neo-lombrosos de volta?
E se eu falo com o tal neurocientista que refere e descubro que tenho poucas células da glia?
A ciência e a poesia,
ao seu jeito cada qual,
têm a mesma moradia
no tecido cerebral!
JCN
É no cérebro que está
todo o nosso sentimento,
que ninguém duvidará
ser irmão do pensamento!
JCN
Não tenho dúvida agora
de possuir mais neurónios
do que as estrelas que os nónios
vão descobrindo hora a hora
por esses espaços fora!
JCN
Olá António,
Li o escrito e gostaria de perguntar se teria uma indicação de bibliografia ou bibliografias que trazem os dados "Por cada neurónio existem em média cerca de dez células da glia".
Obrigada
Cara Anónima de 25 de Outubro de 2011.
Só hoje vi o seu comentário. Queira enviar-me um email a identificar-se e eu enviar-lhe-ei a fonte com todo o gosto. Depois publicar-la-ei aqui.
Muito Obrigado
António
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