sexta-feira, 25 de março de 2011

FUKUSHIMA E O FUTURO DO NUCLEAR


Minha crónica no "Sol" de hoje (na imagem a central de Fukushima):

O terramoto recente no Japão causou em Fukushima o que é, depois de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, o pior desastre numa central nuclear nos últimos 50 anos. Embora a situação não esteja ainda resolvida, foi talvez pior do que Three Mile Island, nos Estados Unidos, em 1979. Tal como nesses casos, houve provavelmente fusão parcial do combustível nuclear devido a falhas dos sistemas de refrigeração. Mas, ao contrário deles, não houve erros humanos óbvios na operação da central: o terramoto, o maior do Japão e o quarto maior de sempre em todo o mundo, e, principalmente, o tsunami, uma vaga de mais de dez metros de altura, foram devastadores.

O acidente de Three Mile Island causou uma onda de medo largamente injusticado. Não houve vítimas. E foram insignificantes os níveis de radioactividade fora do perímetro da central. Como é muito fácil medir radioactividade, muitas pessoas acabaram por tomar consciência da radiação natural, atribuindo-a ao acidente na central. Contudo, do ponto de vista de saúde pública, os efeitos foram, como os especialistas disseram, apenas ao nível da ansiedade e stress.

Chernobyl foi muito pior. Para além da meia centena de bombeiros que morreram no local, foram estimadas em cerca de quatro mil as vítimas de cancros mortais causados por partículas radioactivas. Este cálculo não é exacto, pois se baseia não só em medições de radioactividade, mas também em modelos descritivos do pequeno acréscimo de doenças cancerosas na população da região. Infelizmente o cancro é uma doença muito comum, sendo difícil, se não mesmo impossível, dizer que um dado cancro na zona afectada se deveu a radioactividade proveniente de Chernobyl.

É cedo para tirar conclusões sobre Fukushima. O medo do perigo invisível é bem patente, tal como em Three Mile Island e Chernobyl, embora os japoneses sejam menos propensos a manifestações de pânico: veja-se o modo disciplinado e até estóico como reagiram ao terramoto. O governo do Japão não está a cometer o disparate, como o da União Soviética, de ocultar as notícias: um boletim na Internet do Ministério da Ciência tem divulgado os níveis de radioactividade que, até agora, fora da zona de exclusão de 30 km à volta da central, não são preocupantes. E, ao contrário do soviético, tem divulgado recomendações para evitar o consumo de leite e vegetais na região, uma vez que os isótopos radioactivos penetram facilmente na cadeia alimentar.

A energia nuclear vai acabar? Não, as notícias sobre o fim do nuclear são muito exageradas. O Japão precisa dessa energia por não ter acesso fácil e barato a outra. Fukushima vai ser fechada e a segurança das outras centrais vai ser reforçada. O mesmo vai ocorrer no mundo todo. O ser humano aprende sempre quando algo corre mal.

4 comentários:

Anónimo disse...

As vítimas de Chernobyl não foram só os 4 mil mortos estimados, são também todos os que ainda sofrem devido ao acidente. Nomeadamente as pessoas que ficaram com doenças crónicas e as crianças que nasceram com deformações. E para além das doenças, todo o impacto na vida das pessoas da evacuação à pressa de uma enorme área ainda hoje restrita.
Passaram há dias tanto na SIC como na TVI documentários sobre o acidente de Chernobyl. Ambos mostraram as crianças que, apesar de ainda não serem nascidas na altura do acidente, sofrem ainda hoje as consequências directas ou indirectas. Radioactividade ou efeitos psicológicos, é certo que há dúvidas. Mas quando vemos uma responsável de um hospital local, que estudou o antes e o depois, afirmar que os casos de doenças nas crianças dispararam desde o acidente e que hoje em dia cerca de 80 a 85% das crianças são consideradas doentes, acho que não restam grandes dúvidas quanto à origem do problema e o impacto que o acidente teve e continua a ter na vida das pessoas naquela área.
24 anos depois, a tragédia de Chernobyl ainda não acabou. Esperemos que os Japoneses tenham melhor sorte e que não tenhamos nós por aqui também um terramoto que destrua uma central espanhola perto da fronteira ou um simples erro humano mais provável em tempos de crise em que se torna necessário cortar nos custos.

Anónimo disse...

E quantas pessoas morreram em acidentes de automóvel na Ucrânia (ou em Portugal) em 24 anos ? 50.000 (50.000 cá)? E quantas crianças ficaram com as vidas destruídas por isso? A física nuclear tem sido extremamente importante nas suas mais diversas aplicações, para o progresso da Humanidade. A origem do acidente de Chernobyl nada tem a ver com a origem do acidente de Fukushima. Não devemos culpar as tecnologias pelo mau uso que delas se faz. Se assim fosse acabávamos já com a metalurgia porque as armas são feitas de ligas metálicas. Para uma apreciação racional das diferentes soluções de produção de energia, é preciso ponderar todos os elementos relevantes, e manifestamente, no que concerne à energia nuclear, isso não tem sido assim.

Anónimo disse...

A origem dos dois acidentes tem tudo a ver: falha humana. É a nossa natureza. Coloque-se uma central nuclear numa zona de terramotos, à beira-mar e dimensionada para resistir a terramotos e tsunamis menores do que os que conhecemos na história recente. Depois culpa-se a natureza e aceita-se como inevitável o evitável.
Comparar automóveis com centrais nucleares? Acabar com a metalurgia porque a as armas são feitas de ligas metálicas? Pois, há de haver sempre por aí um Homer Simpson a trabalhar numa central nuclear ou em qualquer outro lado para por à prova a mais segura das tecnologias...

Geopedrados disse...

A localização das Centrais (viradas para o Pacífico - o oceano onde há mais tsunamis...basta ver o gigantesco número deles só no século XX...) e o facto de agora se saber que havia graves problemas, sempre escondidos, com esta e outras Centrais, leva-me a discordar do Doutor Fiolhais. Percebo que a dependência de outras fontes energéticas teria de ser "combatida" pelo Japão, mas a opção nuclear no único país que sofreu os efeitos directos da bomba nuclear parece-me insano.

E, se tinha de ser, o lado virado para o mar da China era o lugar óbvio para pôr as Centrais - o que não é o caso em metade destas instalações japonesas.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...