Escreveram um sobre o outro e sobre as obras que criavam; o primeiro, artista multifacetado, pintou o quadro do segundo alguns anos após a sua morte.
A sua ligação não terminaria aqui: ambos faleceram no mesmo quarto do Hospital de São Luís dos Franceses.
Sobre o autor da Mensagem disse Almada:
"Devo a Fernando Pessoa (repito: pela primeira vez na minha vida) a alegria de ver noutrem a oposição e não o costumado contrário ao alheio. Obrigado Fernando. Não há aqui de quê agradecer. Também o sei. Desculpe. É afectividade. Carinho.
De parte a parte, em ambos nós nada havia de contrários pois que nenhum dependia dessas classificações engendradas a título social para o sossego e a comodidade de uns tantos. Não. Éramos poetas. Perdão: apresentávamo-vos para poetas. Antes de bons ou maus poetas bebíamos já ambos o delirante veneno de não pertencermos a nada e sermos cá. Partíamos logo desde o respeito muito bem pesado por tudo quanto a outros lhes era forçado participar no quotidiano. Não ter este forçoso era o nosso carimbo de poetas. Mas para melhor fazer entender o carimbo, direi que esta isenção que significa poeta tem arrumo na nomeclatura social e na mesma palavra que faz do réu em desclassificação.
Foi neste momento que dei a Fernando Pessoa um pequeno papel muito dobrado e que ainda o dobrei mais diante dele. Desdobrou-o com o mesmo cuidado com que o dobrei e leu: «Quer o queiramos quer não, nós (o artista) estamos muito longe de pertencer à comunidade» Assinado: Cézanne."
Referência: Almada Negreiros, J. (1985). Obras completas – Textos de Intervenção, Vol. VI. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda.
Imagem: Retrato de Fernando Pessoa, pintado em 1954 por Almada Negreiros, para o restaurante Irmãos Unidos.
2 comentários:
"Éramos"... falta saber em que altura. JCN
Acaso Almada... alguma vez foi poeta?! JCN
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