quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Arthur C. Clarke: da Órbita ao Elevador Espacial


Transcrevo minha crónica da Gazeta de Física que acaba de sair. Aproveito para dar os parabéns publicamente à Teresa Peña e à sua equipa pelo magnífico número.

A 16 de Dezembro próximo o escritor de ficção científica Arthur C. Clarke vai, no Sri Lanka onde reside há muitos anos, soprar 90 velas no seu bolo de aniversário. Quem não viu o filme com argumento dele, em colaboração com Stanley Kubrick, 2001: Uma Odisseia no Espaço? Mas menos gente sabe que é formado em física, tendo estudado no Kings College de Londres logo após a Segunda Guerra Mundial. Durante a guerra serviu o seu país na Royal Air Force, tendo ajudado no desenvolvimento do radar.

Foi em Outubro de 1945, quando tinha apenas 28 anos, que numa revista de electrónica amadora (Wireless World) avançou com uma das maiores ideias das ciências espaciais: o satélite geoestacionário. O artigo intitulado "Can Rocket Stations Give Worldwide Radio Coverage", especulava sobre a possibilidade de uma rede de satélites fornecer uma cobertura radiofónica à escala mundial. Um satélite geoestacionário devia situar-se numa órbita especial, a chamada órbita de Clarke. Essa órbita, a cerca de 36 000 km de altitude, está hoje povoada de satélites, não só de comunicações como de meteorologia.

Porquê 36 000 km É so fazer as contas, usando a segunda lei de Newton e a força de gravitação universal. Aprende-se na Física do 10º ano que um satélite a essa altitude, colocado sobre o equador, demora exactamente um dia a dar a volta a Terra. Como a Terra dá uma volta completa nesse tempo, o satélite é visto do equador da Terra como estando permanentemente parado. Em 1945 não se sabia que a tecnologia dos satélites só se viria a concretizaria com o primeiro Sputnik, em 1957 (fez agora 50 anos). O Sputnik 1 girava a uma órbita a menos de 1000 km e o primeiro satélite geoestacionário, o Syncom 2, só foi lançado pelos americanos em 1963. O artigo de Clarke não era, portanto, ficção: era científico.

Hoje há ideias que parecem tão lunáticas como a órbita de Clarke parecia no fim da guerra. Uma das mais curiosas consiste é a construção de um elevador espacial, isto é, um fio estendido na vertical até à órbita de Clarke e que se mantenha esticado, a rodar com a Terra pelo facto de a ponta estar em condições geoestacionárias. O fio teria de ser muito resistente para permitir levantar objectos para o espaço, dispensando os pesados e caros foguetões (em 1945, Clarke previu erradamente foguetões a energia nuclear). Há quem tenha proposto nanotubos de carbono, faltando porém saber se essa tecnologia é mágica (para Clarke a tecnologia suficientemente avançada é indistinguível da magia). O próprio Clarke descreveu em pormenor o elevador espacial no seu romance de ficção científica. As Fontes do Paraíso (original de 1979; em português, Edições 70, 1990) recorrendo a um fio de diamante. Situou-o na região do Sri Lanka, Taprobana para os portugueses dos Descobrimentos. Mais precisamente, na montanha sagrada de Taprobana, onde um templo budista impedia a contrução. O elevador espacial talvez um dia se venha a realizar: e não nos levará, como escreveu Camões, além da Taprobana, mas para cima dela!

6 comentários:

JSA disse...

É interessante ressalvar a ciência de Clarke, mas não faria mal nenhum ter um pouco de atenção. O filme 2001: A Space Odyssey não "é" de clarke, antes é baseado na sua obra e ele trabalhou como argumentista e consultor do filme. Iso não faz dele um filme "de" Clarke, antes "baseado em".

A noção do elevador é interessantíssima, mas parece-me (talvez de forma tacanha) como impraticável. Não é uam questão de o elevador ter que ter uma enorme resit~encia por causa das cargas, antes o de ter uma resistência enorme apenas para se suprtar a si próprio. Mesmo com nanotubos de carbono, tal material teria problemas imensos em existir. E isto sem considerar a enorme resistência que teria de ter aos elementos ao longo da atmosfera e da capacidade de suportar imensas variações de temperatura, por exemplo ou resistência a colisões causadas por objectos ainda não incinerados por se estar fora da atmosfera terrestre. Tudo isto ainda antes de se construírem as máquinas que puxariam o equipamento e que teriam de suportar todos os pesos (mesmo que beneficiassem da inexistência de atmosfera).

Nesse aspecto mais vale a pena imaginar que um dia destes se conseguirá construir algo como um elevador anti-gravitacional ou seconseguirá então a "teleportação" de objectos. Muito pessoalmente, acho que serão objectivos mais realistas, mas claro que sonhar nunca fez mal a ninguém.

Carlos Fiolhais disse...

Já emendei. O argumento é que é de Clarke e Kubrick.
Carlos Fiolhais

Manuel Rocha disse...

Este interessante post do C.Fiolhais tem no fim do seu terceiro parágrafo uma ilacção cujo inteiro alcance não atinjo.

" O artigo de Clarke não era, portanto, ficção: era cientifico."

Mas...se em virtude de condicionantes decorrentes, por exemplo, de não ter sido possível dominar a tecnologia dos foguetes, a tecnologia dos satélites não tivesse progredido, a ideia de Clarke seria considerada apenas ficção ?

Nesta óptica, onde se classificam algumas das ideias de Verne, por exemplo ?

Fulano de Tal disse...

Continuando com a especulação, será a rotação do satélite(a q o elevador estivesse ligado) à volta da terra, n seria suficiente para reduzir a tensão do peso da estrutura do elevador, de forma a tornar esta situação praticável.

Anónimo disse...

este comentário já vem tarde mas aqui fica na mesma.
acerca do elevador espacial, existe muita informação online, mas o mais interessante é a respeitante ao concurso promovido pela nasa para a construção de um protótipo para demonstração da exequebilidade da ideia (tipo x-prize ou robot race). muito provavelmente é um problema de engenharia e tecnologia que estará resolvido em poucos anos...
sites:
http://www.spaceward.org/elevator2010.html
o artigo na wikipédia é bastante completo:
http://en.wikipedia.org/wiki/Space_elevator

Miguel Esteves

Leonardo Lopes Carnelos disse...

Uma vez que a viabilidade técnica esteja resolvida, qual será a verdadeira utilidade da concretização do cenário de 3001? Fugir do planeta que virou uma selva cheia de radiação?

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