quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

GRANDES ERROS: A SENHORA DO MANTO AZUL E O ELECTRÃO

Na última revista "Pública"(suplemento dominical do "Público"), há uma engraçadíssima entrevista com o escritor espanhol Javier Sierra, que acaba de lançar em português (na Bertrand) o livro "A Senhora do Manto Azul". O livro conta a história de uma freira espanhola do século XVII que teria ido 500 vezes à América, sem que nunca tivessem dado pela falta dela no convento. O espantoso fenómeno dá pelo nome de "bilocação".

O autor, que além desse "best-seller" tem outros do mesmo género (ver aqui a página do autor), assegura que a "bilocação" é científica. O jornalista Paulo Moura, honra lhe seja, quando Serra critica a estreiteza de vistas da ciência ("A Ciência... tem uma visão muito estreita. Acho que terá de humanizar-se, mas é muito difícil que isso aconteça neste momento"), diz-lhe:

"Há cientistas com uma visão transdisciplinar do conhecimento, o que significa estar aberto a outras áreas, até fora da ciência".

Ao que ele responde:

"Eu entreguei este livro a vários amigos meus que trabalham com Física Quântica e disse-lhes. "Leiam isto como se a Senhora do Manto Azul fosse o electrão. Depois falamos." Porque, se eles admitem [emendei uma gralha óbvia] que uma partícula pode estar num lugar e noutro, ao mesmo tempo, porque não poderá isso acontecer ao nosso nível?"

Não li nem conto ler o livro. Mas a avaliar pelas declarações do autor trata-se de ficção pura, não tem nada de científico. De facto, a dita "bilocação" de um ser humano nunca foi observada!

13 comentários:

Anónimo disse...

Já agora a explicação do porque sim e porque não: de acordo com a dita Mecânica Quântica, um corpo pode ter comportamento de partícula (dotada de massa, velocidade, etc) e de onda (com comprimento de onda e frequência). Assim, enquanto partícula, um objecto só pode estar num local em determinado instante. No entanto, enquanto onda, não podemos falar de uma posição específica, mas sim de uma probabilidade do objecto se encontrar em determinado ponto.

Recordemos que uma onda, ao encontrar um obstáculo, sofre um fenómeno de difracção; especificamente, se se deparar com uma parede com duas fendas, e o comprimento destas for semelhante ao comprimento de onda da onda (passe a redundância), esta irá sofrer um fenómeno de interferência: neste, as duas propagações da onda, cada uma emanando de uma fenda, irão interferir entre si. Tal interferência será construtiva (aditiva) quando os picos das duas ondas se encontram (ou os vales), e destrutiva (subtractiva) quando o pico de uma onda encontra o vale de outra. Esta interferência pode ser observada colocando um alvo (uma placa, por exemplo) a uma certa distância das fendas, originando um padrão de interferência descontínuo. O exemplo mais corriqueiro deste fenómeno consiste na figura de difracção da luz que observamos no chão, após esta encontrar as múltiplas fendas de um estore de janela.

Este fenómeno foi observado com luz, obviamente. Menos óbvia foi a sua verificação numa experiência em que, em vez de uma fonte luminosa, se utilizaram electrões: a mesma figura de interferência foi observada (pelo cientista Claus Jönsson, em 1961)! Tal implica que os electrões se comportam como ondas e, nesse sentido, que atingem as duas fendas simultaneamente: estão em dois locais ao mesmo tempo!

Para eliminar a possibilidade do efeito se dever à existência de muitos electrões "em võo" (ou seja, um passando por uma fenda, e outro em simultâneo pela outra), a experiência foi várias vezes repetida e refinada, ao ponto de se garantir que apenas um electrão atinge o plano das fendas de cada vez.

O cerne da questão reside na aplicabilidade deste efeito: como escrevi atrás, tal sucede apenas quando as dimensões das fendas são da ordem do comprimento de onda associado a cada corpo. Este é dado pela chamada relação de De Broglie,

la = h / (m v)

em que la é o comprimento de onda, m a massa, v a velocidade, h =6.6 x 10^(-34) J.s a constante da Planck.

Assim, para um electrão movimentando-se a uma velocidade de 100 m/s, por exemplo, com uma massa de aproximadamente 10^(-30) Kg, obtemos um comprimento de onda da ordem de 6.6 micrómetros; assim, o comportamento ondulatório deste electrão poderia ser manifestado através de uma experiência de dupla fenda com dimensões semelhantes às de um cabelo.

No entanto, a dita freira, com uma massa de 50 Kg (formosinha), deslocando-se a um metro por segundo, tem um comprimento de onda associado da ordem de 10^(-35) m, ou seja, 0,...34 zeros ... 1 metro! Assim, não se verifica uma difracção espontânea da função de onda de objectos macroscópicos porque não existem "fendas" suficientemente pequenas (recordemos que um átomo de Hidrogénio tem um diâmetro da ordem do Angstrom, ou seja, 10^(-10) m).

Moral da história: a Mecânica Quântica funciona realmente, mas só é aparente a uma escala microscópica.

Anónimo disse...

Bilocação, projecção astral, psicometria, mediunidade, quiromancia, telepatia entre outras, tudo tretas e pseudo ciencia, a esperteza do autor é a afirmação de ser cientifico pois à custa do desconhecimento e da fraca formação cientifica e intelectual dos portugueses a pseudo ciencia vende-se muito bem mas disfarçada de ciencia, outro livro de ficção que quer passar por historico e cientifico, mais na senda do codigo da vinci..

paulu disse...

Caro Armando Quintas, parece-me um pouco injusto incluir a Psicometria no conjunto em questão. A Psicometria é tão só uma área da Psicologia prosaicamente dedicada à medição do comportamento. Dos seus labores saem, por exemplo, aparelhos de medida que se costuma designar por testes psicológicos, usados em clínica, orientação escolar, selecção profissional e por aí fora.

Enfim, não sei se o termo não estará também a ser explorado para designar actividades mais exóticas, mas, pelo menos no seu sentido original, aplica-se, mais coisa, menos coisa, a artes enfadonhas como as que refiro. E, creia-me, quando bem feita, envolve estatística, análise factorial e trabalheira suficientes para afugentar qualquer vidente a sete pés... ;)

LA disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Jorge, as fendas do estore de uma janela não são do tamanho do comprimento de onda da luz, logo, não podes ver nenhuma figura de interferência! No máximo poderias ver difracção dos bordos do estore! Aquilo que te parece que é uma figura de difracção, onde a luz passa de muito intensa para uma zona de menos luz, quase sombra, até à sombra, resulta de que o Sol não é uma fonte pontual. Enquanto que certas zonas do chão recebem quase toda a luz do disco solar, outras, devido a um angulo diferente em relação ao Sol, recebem menos, de apenas parte do disco, até que se atinge a sombra.
Quanto à experiencia das fendas de Young, está completamente (quase) ultrapassada. Hoje em dia sabe-se que a figura de difracção depende também do material porque é constituido as fendas, do tamanho destas, e da distância ao alvo. Ora informa-te lá sobre o assunto. Há experiências muito interessantes sobre esse assunto, que são agora do domínio da nano-óptica, como coisas sobre o near field. E isto já nem é novo, julgo que tem mais de 10 anos.
Não te quero contradizer, é só para dar mais umas dicas sobre o assunto, a luz continua a ter um comportamento ondulatório, mas cada vez mais estranho!

Ó Carlos, bilocação é facílima de fazer, trilocação é um bocado mais difícil, mas tetralocação entre as pernas de quatro mulheres diferentes foi a experiência quântica mais louca que tive na minha vida!
luis

Anónimo disse...

Concordo com muitas das coisas que por aqui se escrevem relativamente à pseudociência, às modas "New Age", etc., mas convenhamos que a filosofia e a ciência puramente materialistas têm as suas óbvias limitações.

Sobre telepatia, gostaria de sugerir ao Armando Matias (e a outros curiosos) que "desse(m) uma vista de olhos" nas obras e na investigação desenvolvida pelo biólogo Rupert Sheldrake. Não, não tenham medo... não morde!!!

Anónimo disse...

Luís,

Sim, o comprimento de onda da luz visível é da ordem das centenas de nanómetros, e as fendas são quase centimétricas: queria dizer apenas que o padrão no chão era semelhante a uma figura de difracção, não que a origem era a mesma. Mea culpa.

Quanto à ultrapassagem da experiência de Young, parece-me que continua a ter um enorme valor ilustrativo, independentemente dos naturais desenvolvimentos e subtilezas entretanto descobertas.

Anónimo disse...

O facto a reter:

"De facto, a dita "bilocação" de um ser humano nunca foi observada!"

O facto é que a bilocação nunca foi observada, seja com humanos, seja com objectos quânticos.

A confusão ali do estudante jorge entre ondas e ondas de probabilidade seria anedótica se não fosse sitomática. Assim vai a ignorância na lusa pátria.

Anónimo disse...

Caro electrão: se discorda, basta um aviso e eu, honestamente, posso admitir o hipotético excesso (que, em minha ténue defesa, se resumiria a meia frase talvez não muito bem esgalhada). No entanto, julgo que este erro não teve lugar.

Aqui fica a elucidação: o quadrado da dita função de onda de que falei interpreta-se como a distribuição de probabilidade das várias grandezas passíveis de serem medidas (posição, velocidade, etc).

Quanto à luz, esta é entendida classicamente como uma vibração transversal do campo electromagnético, propagando-se no espaço, cuja forma matemática é regida pelas chamadas equações de Maxwell, equações clássicas conhecidas antes da formulação da Mecânica Quântica.

No entanto, a manifestação do comportamento dual onda/partícula remete para a noção de função de onda. Com efeito, se no caso da luz podemos considerar que esta pode ser definida como partícula (fotão) ou onda (vibração do campo electromagnético), no caso de uma partícula com massa, tal não é tão claro: o que é que vibra, no seu comportamento ondulatório? Não existe um "campo do electrão" (não confundir com o campo eléctrico, que juntamente com o perpendicular campo magnético constitui o campo electromagnético, e que afecta electrões e outras cargas eléctricas).

Assim, podemos afirmar que o comportamento dual da luz é passível de uma interpretação clássica, mas que a dualidade do electrão não, visto que sempre foi entendido (até à Mecânica Quântica) apenas como uma partícula.

Como tal, não compreendo a diatribe electrónica contra a suposta confusão: de facto, nos tempos idos em que era estudante Jorge (o que fica sempre bem, tentar denegrir alguém com esse terrível epíteto), foi assim que compreendi o fenómeno. E, para esclarecer, consultei o distinto tomo do tema "Quantum Mechanics I" (do Nobelizado Claude Cohen-Tannoudji), de onde passo a transcrever (pág. 14) no original:

"After many tentative efforts [...], the concept of wave-particle duality was formulated:

(i) The particle and wave aspects of light are inseparable. Light behaves simultaneously like a wave and a flux of particles, the wave enabling us to calculate the probability of the manifestation of a particle.

(ii) Predictions about the behavior of a photon can only be probabilistic.

(iii) The information about a photon at time t is given by the wave E(r,t) (N.J. - r é a posição, E o campo eléctrico, proporcional ao magnético), which is a solution of Maxwell's equations. We say that this wave characterizes the state of the photons at time t. E(r,t) is interpreted as the probability amplitude of a photon appearing, at time t, at the point r. This means that the corresponding probability is proportional to E(r,t)^2."

Assim, afastando-me de uma menos elegante citação do nosso indignado seleccionador nacional, prefiro aproveitar esta época de concórdia para convidar o electrão a passar pelas luzes da minha árvore de Natal. Não há que enganar: primeira tomada à direita, a seguir ao sofá, sempre em frente.

Anónimo disse...

olá

Anónimo disse...

Meus amigos. Andava eu aqui a dar uma vista de olhos por estas modernices que agora inventaram da internet e deparo com esta discussão sobre bilocação e se Eu "Jogos aos Dados". Meus amigos sobretudo em relação ao Jorge e ao Electrão, o que eu tenho para vos dizer é que não se metam nestas coisas de tentar descodificar-Me. O Alberto Einstein quase deu em maluco, nos últimos anos de vida, a tentar provar que Eu não jogava aos dados- nunca conseguiu. Entretanto, foram, para além da do Heisenberg e do Alberto, surgindo outras teorias. Umas dizem que o electrão se "mascara" dentro das vossas cabeças, de partícula quando é visto defendido pelo Bohr, Heisenberg, Born e Dirac. Outras dizem que é por causa dos aparelhos que o observam. Outras que o electrão é uma autêntica partícula possível de localizar deterministicamente, com o qual se identificava o Alberto, o Schrödinger, o De Broglie, o David Bohm e que por isso, segundo o Alberto, "Eu não jogava dados". O Everett, por sua vez, ao ver um filme de ficção científica quando era pequeno, no final dos anos 40, a comer pipocas no sofá da sala nos EUA, mais tarde quando andava na Universidade e como estes tipos não se entendiam, lembrou-se de dizer que o electrão pertencia ao vosso mundo e, ao mesmo tempo, também pertencia a outros mundos- todos eles feitos por Mim e parecidos uns aos outros- Agora, alguns fizeram as contas e dizem que o Everett estava certo. Imaginem bem, já não me chegava ter um um planeta cheio de humanos meio malucos, senão, pelo que Everett dizia ainda tenho que aturar milhares de mundos parecidos com o vosso. Eh, pá deixem-se lá dessas coisas se não daqui a pouco estou a anti-depressivos (risos)...

Unknown disse...

TODOS OS COMENTARIOS SOBRE BILOCAÇAO, TRILOCAÇAO FISICA, ESTAO EQUIVOCADOS, UMA AMIGA JA FEZ BILOCAÇO FISICA, E 'E REAL, NAO FANTASIA, LEIAM VALDO VIERA OU CLIQEM NO GOOGLE A PALAVRA PROJECIOLOGIA, ASSIM VCS NAO COMENTAM SEM CONHECIMENTO DE CAUSA, ABRAÇO A TODOS

Cláudia S. Tomazi disse...

Talvez a tolerância enquanto fenômeno. O que poderia citar para contribuir com este post, apesar de estar um pouco atrasada em relação a discussão, é que atribuem como caractrística do padre Pio de Pietrelcina como factor a bilocação.

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...