Como referi no post "Um Argumento Contra Todos os Argumentos", alguns filósofos defendem uma posição como a de Alfredo Dinis, como é o caso de Kierkegaard e de Pascal. Wittgenstein parece pensar algo na mesma linha. Esta é a posição de que não é possível provar nem que Deus existe nem que não existe. Há dois aspectos importantes quanto a esta posição.
Primeiro, é muito mais difícil apresentar um argumento que seja minimamente plausível a favor da ideia de que não se pode provar que Deus existe nem que não existe, do que apresentar um argumento a favor ou contra a existência de Deus. Isto porque qualquer bom argumento a favor da ideia de que não podemos provar que Deus existe nem que não existe terá de mostrar 1) por que razão todos os argumentos conhecidos a favor e contra a existência de Deus falham, e depois mostrar que 2) todos esses falhanços se “empatam”, e finalmente mostrar que 3) há razões para pensar que nenhum outro argumento poderá ser bem-sucedido.
Segundo, ao enfrentar a tarefa 3, como faz o Alfredo, o pensamento destes filósofos trai o seu próprio cientismo, o que poderá parecer surpreendente, pois pensa-se por vezes que este tipo de posição é anticientismo. Mas há sempre cientismo envolvido, tanto quanto conheço do pensamento destes filósofos, e também no caso do Alfredo, pelo que consegui entrever.
O cientismo manifesta-se na ideia de que ou temos provas científicas, ou nada podemos ter que seja racional. Os degraus da velha escada de Wittgenstein não são senão provas científicas, e quando estas não podem ser usadas para justificar algo, Wittgenstein quer deitar fora a escada porque pensa que isso ultrapassa a nossa linguagem e a nossa compreensão, a nossa racionalidade e a nossa argumentação. Bom, ultrapassava claramente a comprensão dele. Mas esta não é uma posição razoável. Provar cientificamente algo, ou logicamente, ou matematicamente, é apenas uma das maneiras que temos de argumentar a favor de ideias ou decisões ou compromissos.
É um erro reduzir a racionalidade ao mero cálculo, à prova ou à experimentação. A racionalidade é mais vasta. Vejamos um exemplo. Será supra-racional o João casar com a Maria? Do ponto de vista de quem sofre de cientismo, sim, é supra-racional. É supra-racional porque não há uma prova matemática ou lógica ou experimental seja do que for relativamente a tal casamento. Mas é óbvio que tal decisão é perfeitamente racional desde que o João e a Maria se amem, e nenhuma razão exista contra o seu casamento.
Precisa o João de provar cientificamente, ou matematicamente, ou logicamente, que a Maria o ama para ter justificação para pensar que ela o ama? Claro que não. Ele tem justificação para pensar tal coisa porque ela age de um modo que permite concluir que ela o ama; caso ela se comportasse de outro modo ele concluiria que o seu amor não era retribuído.
E como sabe ele que a ama? Precisa de uma prova científica ou lógica? Não: sabe directamente como se sente quando está com ela, quando faz amor com ela, quando conversa com ela, quando partilha com ela um jantar num restaurante romântico ou um filme na intimidade da sua casa.
Tudo isto não são senão razões ou argumentos a favor da sua decisão de casar com ela. Mas não são “provas” no único sentido restrito em que entende o termo o cientificista. Claro que são razões às quais raramente prestamos atenção: não as estudamos cuidadosamente para ver se são boas ou não; limitamo-nos a aceitá-las acriticamente, tal como aceitámos acriticamente durante séculos que a Terra estava imóvel -- até termos fortes razões para pensar que não estava.
Procurar justificar a crença na existência de Deus só não faz sentido se entendermos a justificação nessa acepção restrita e caricatural de justificação que tem o cientificista. Alguns argumentos tradicionais a favor ou contra a existência de Deus são razoavelmente técnicos, e envolvem o domínio da lógica modal ou da teoria das probabilidades e do teorema de Bayes; outros não são assim tão precisos e "científicos" — mas não são mais desprezáveis por isso. É verdade que não há consenso sobre qualquer um dos argumentos a favor ou contra a existência de Deus; mas também não há consenso de que não é possível provar que Deus existe ou que não existe.
Podemos não ter, é claro, qualquer interesse em justificar as nossas crenças religiosas, e isso é razoável. Afinal, a maior parte das pessoas não tem qualquer interesse em justificar a sua crença de que a água é H2O; deixa isso para os químicos. (Contudo, se não forem os filósofos religiosos a tentar justificar a crença em Deus, quem o fará?) Mas não há substituto razoável para a justificação e a argumentação cuidadas. Contudo, o partidário do cientismo começa por defender que podemos substituir a argumentação cuidada pela prova laboratorial, pela demonstração matemática, pela observação científica. E, quando estes procedimentos "científicos" são insuficientes, abre-se a porta para "sugerir" o que não pode ser falado. Mas, como comentou Ramsey a propósito dessa lamentável mania de Wittgenstein de falar do que está para lá da linguagem, "Se não podemos falar disso, também não podemos assobiá-lo". Se Deus está para lá da linguagem humana, como defende o Alfredo, também não podemos ter emoções sobre tal coisa, nem podemos fazer-lhe rituais, nem criar comunidades em que toda a gente acredita numa coisa que não pode compreender, nem exprimir, nem pensar.
Torna-se assim claro o papel desempenhado pelo argumento dos limites da linguagem. Trata-se de procurar bloquear a nossa maneira normal de pensar, justificar e argumentar, que usamos perfeitamente bem em tudo na vida -- na vida emocional, artística, espiritual, filosófica, e até dá para falar de fenómenos quânticos, que é uma gaita que realmente ninguém compreende bem. O objectivo do argumento dos limites da linguagem é afastar o nosso modo normal de pensar, justificar e argumentar, para se poder festejar a crença religiosa sem nos darmos ao incómodo de a justificar. É mais honesto assumir isso mesmo, mas inibirmo-nos de defender que toda a tentativa filosófica de justificação da fé é um erro e uma incapacidade para compreender a verdadeira natureza da fé. Argumentar desse modo é como argumentar que são irrelevantes todas as justificações das nossas crenças biológicas sobre o mar e a fauna porque muitos pescadores tradicionais desconhecem tais justificações nem mostram interesse por elas.
Serão irrelevantes as justificações da crença religiosa porque os crentes não são crentes com base nelas? Não. Nós queremos saber em filosofia se há ou não justificação, no sentido mais amplo do termo e não no sentido cientificista, para ser crente ou ateu. Não queremos saber quais são os mecanismos psicológicos que levam umas pessoas a ser crentes e outras não. Isso é psicologia. Um estudo não anula o outro. Trata-se de estudar coisas diferentes.
Quando abandonamos a noção cientificista de prova ou justificação, vemos que, na realidade, os crentes têm de facto várias justificações, no sentido amplo do termo, para serem crentes. A esse grupo de justificações chama-se "argumento da experiência religiosa". Qualquer boa introdução à filosofia da religião terá um capítulo sobre esse tema. É um tipo de justificação como qualquer outra, só que não é o tipo de justificação que o cientificista reconheça como justificação. Porque o cientificista não reconhece como justificação para o João casar com a Maria o amor que ele sente pela Maria. Mas tanto pior para o cienticista: reificou o que ele pensa que é a ciência, e depois sente necessidade de deitar fora uma escada que na realidade nunca existiu para poder falar de Deus.
As justificações da ciência estão tão profundamente mergulhadas na vida como qualquer outra justificação existencial. E todas as justificações podem ser estudadas recorrendo precisamente ao mesmo tipo de análise cuidada, paciente e crítica. Nem mais, nem menos. E isso é o que fazem hoje os filósofos mais destacados desta área, e o que fizeram ao longo dos séculos.
Comparativamente, são poucos os filósofos que defendem e defenderam que não se pode provar que Deus existe nem que não existe e que isso é irrelevante. Chama-se fideístas a esses filósofos, por oposição aos teólogos naturais, que acreditam que a razão natural pode estabelecer que Deus existe e que pode estabelecer alguns dos seus atributos. Um teólogo natural pode defender que há muitos aspectos de Deus que estão realmente para lá da nossa compreensão. Mas a posição fortemente fideísta, que declara que tudo acerca de Deus está para lá da nossa compreensão porque está para lá da nossa linguagem, incluindo saber se existe ou não, é das mais implausíveis de entre o vasto leque de posições filosóficas sobre o tema. E além de implausível é fortemente incompatível com a própria prática religiosa, pois os crentes estão o tempo todo a referir-se a Deus, e Deus é o objecto das suas emoções, rituais e vontade de religação. Mas aceitemos essas posições mais radicais, que declaram que a palavra "Deus" não refere uma entidade e que a religião deve ser entendida apenas como um modus vivendi ou uma forma de vida, como lhe chamava Wittgenstein; Cottingham parece recentemente ter defendido esta posição. E o budismo, por ser uma religião que não aceita a existência de divindades, é muitas vezes entendido desta maneira. Que consequências tem isto? Eis algumas delas:
1) Literalmente, Deus não existe, que é precisamente o que defendem os ateus.
2) Todas as emoções religiosas da generalidade dos crentes são ilusórias, dado que Deus não pode ser o objecto de tais emoções.
2) O modus vivendi religioso torna-se então o próprio objecto da reflexão filosófica: será justificável viver daquela maneira, fazer aqueles rituais, constituir aquelas comunidades? Porquê?
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54 comentários:
Um post muito, mas muito, bom!
O toque de mostrar que quem acusa os outros de cientifismo enferma ele próprio de cientifismo é ... divinal :-)
Gostei de ver preto no branco as consequências!
Caro Desiderio, nao percebo de todo o argumento.
Eu estou em geral de acordo consigo no que toca 'a critica aos comportamentos intelectuais irracionais.
No que diz respeito 'a demonstracao da existencia de Deus continuo na mesma.
Nao percebo a analogia com o Joao e a namorada... o Joao tem razoes 'empiricas'
para acreditar nao so' na sua existencia , como no amor que ela tem por ele. Tera' indicios, experiencias obhjectivas e subjectivas, alem de ter vontade de arriscar e apostar na criacao de uma relacao amorosa -- que tambem se cria, nao surge do nada. Em que e' que isto e' semelhante com as razoes para acreditar em Deus?... em que e' que se baseia a analogia? para os indicios que tem o Joao, que indicios tem o individuo que vai tentar abordar a existencia de Deus?
Consideremos a definicao de "maximal greatness" do Plantinga: "a being has maximal excellence in a given possible world W if and only if it is omnipotent, omniscient and wholly good". O que e' que isto quer dizer? Se um Ser e' omnipotente, pode tudo, inclusive' terminar a sua propria omnipotencia. Se o fizer, deixa de ser ter 'excelencia maxima; i.e. Deus, pela propria definicao, deixaria de existir. Apenas a partir da definicao, sem mais nada, posso concluir que Deus tanto pode existir como nao existir. Nao consigo acreditar que esta definicao possa ser levada a serio. Nem entendo para que serve utilizar qualquer tipo de logica sofisticada a partir deste ponto. Como e' que posso salvar este naufragio? Bom, digo que Deus nao e' um ser espacio-temporal; sendo assim, nao faz sentido identificar um ponto (evento) espacio-temporal no qual esse Ser toma uma dada decisa. Muito bem, entao a pergunta seguinte e': o que quer dizer ser omnipotente nesse caso, fora do espaco e do tempo? E por ai' fora....
É uma pena que a razão ande por estes dias tão mal tratada e alheada das nossas vidas.
Um post muito lúcido e bem escrito... Para quando a valorização deste tipo de racciocínio?
E o tempo vai passando e o mundo girando...
e nós, espécie humana, à espera de encontrar uma razão para a nossa existência, quando essa razão já existe e foi descoberta - a contemplação da nossa própria existência, como seres vivos, e a contemplação da existência dos outros seres vivos e a maneira como existem e integram um sistema vivo planetário.
Não é a maneira mais bonita e explícita de expôr o meu pensamento mas julgo que esta é uma razão mais dos que suficiente e racional para amarmos a vida.
"Se Deus está para lá da linguagem humana, como defende o Alfredo, também não podemos ter emoções sobre tal coisa, nem podemos fazer-lhe rituais, nem criar comunidades em que toda a gente acredita numa coisa que não pode compreender, nem exprimir, nem pensar."
Pois ai está a questão primordial do absurdo da religião que eu já tinha falado noutro post anterior.
Concordo com as 3 ultimas perguntas e faço delas minhas, eu diria que a resposta à ultima delas se chama medo, medo do mundo e do desconhecido que continua a ser desconhecido por ignorancia e auto ilusão levando ao refugio em deus e na religiao..
Se no anterior post do Desidério fiquei com a sensação de que certas pessoas tinham parado no primeiro parágrafo agora parece-me que só leram o último, porque está de acordo com as suas convicções ateias.
Na minha leitura muito pessoal as perguntas 1), 2) e 2) referem-se ao fídeismo e não a quem argumenta que Deus existe ou não existe.
Acho abusivo que o armando quintas (desculpe lá, armando, isto não é embirração mas andamos perto um do outro) pegue numa frase do Desidério para justificar as suas próprias palavras sobre o "absurdo da religião".
Qualquer crente também poderia tomar uma atitude semelhante e afirmar que o Desidério reconhece que os crentes têm várias justificações para serem crentes e que os argumentos a favor da existência de Deus são razoavelmente técnicos, etc.
Parece-me que o Desidério procurou continuar o debate com Alfredo Dinis, tentando demonstrar que a posição defendida pelos filósofos Kierkegaard,Pascal e Wittgenstein, subscrita (?) pelo Alfredo Dinis, não é válida.
Quaisquer conclusões sobre o "absurdo da religião" parecem-me abusivas, salvo melhor opinião.
Deus existe e revelou-se ao longo da história da humanidade.
Dessa revelação ficou-nos o relato bíblico, constituído por 67 livros, redigidos por mais de 40 autores, ao longo de mais de 1500 anos.
Aí podemos encontrar a revelação consistente de Deus. A Bíblia tem resistido estoicamente à crítica, mesmo quando ela parecia devastadora.
Quase todos os dias a arqueologia confirma a Bíblia e refuta os seus detractores. A recente descoberta do chamado Muro de Neemias é apenas um exemplo entre muitos possíveis.
O relato bíblico nunca pretendeu demonstrar filosoficamente a existência de Deus. Deus dá-se a conhecer em pessoa, o que dispensa especulações filosóficas.
Deus apresenta-se como “Eu Sou o que Sou”. Ele é o LOGOS, o Verbo que encarnou em Jesus Cristo.
O relato bíblico apresenta Deus como Criador dos céus e da Terra, tendo criado tudo de forma sobrenatural, racional, metódica e num tempo humanamente adequado.
Assim se compreendem as complexas interrelações de todo o Universo e a sua sintonia precisa para a vida.
O princípio antrópico, ou as coincidências antrópicas, mais não são do que uma evidência do carácter racional e metódico da criação de Deus. O mundo é o produto de uma criação racional e não do acaso.
A Bíblia apresentam um Deus vivo, pessoal, infinito, eterno, espiritual, omnipotente e omnisciente, criador da vida, das pessoas, do espaço, do tempo, da matéria, da energia e da informação.
Deus criou o espaço e o tempo e dilatou-os de forma a manifestar a sua infinitude e a sua eternidade.
Na semana da criação operaram forças que não estão em operação actualmente. Hoje temos apenas leis de conservação da matéria e da energia, não de criação.
A lei da entropia mostra-nos que a ordem existente na Criação era maior do que a que existe hoje. Também isso atesta a racionalidade da criação.
Assim se compreende as quantidades inimagináveis de informação e meta-informação contidas no DNA. Elas confirmam que, para funcionar, o DNA tinha que existir perfeito e integrado desde o primeiro momento.
O DNA, com a sua quantidade e complexidade de informação, é inteiramente congruente com um Criador que se auto-apresenta como LOGOS.
A Bíblia afirma que Deus criou as espécies animais e vegetais bem definidas e o Homem à sua imagem e semelhança, dotado de competência racional e moral-prática, bem como de criatividade.
Ontem como hoje, plantas, animais e seres humanos sempre coexistiram. Ontem como hoje, macacos são macacos e seres humanos são seres humanos. A Lucy era um macaco, os Neandertais eram seres humanos.
Além disso, Deus criou o Homem com a capacidade de estabelecer voluntariamente uma relação pessoal com Deus.
Daí que a vida só venha da vida, que todas as espécies se reproduzam de acordo com a informação genética que nelas se contém e que o ser humano seja qualitativamente diferente de todos os animais, dotado de linguagem, consciência, sentimentos morais e engenho inventivo e criativo.
Apesar das semelhanças anatómicas que nos aproximam de outros animais, que atestam um Criador comum, as diferenças são mais significativas.
A Bíblia afirma que o ser humano pecou e que isso afectou toda a natureza humana e não humana. Desde então, a morte, a doença, o sofrimento, as catástrofes naturais e a crueldade predatória passaram a ser uma parte integrante do mundo.
Assim se compreendem as mutações, que são cumulativas e degenerativas. Elas destroem informação genética pré-existente.
A Bíblia diz que a proliferação da violência sem limites levou Deus a destruir o mundo antigo através de um dilúvio global. Daí as grandes camadas de sedimentos e os biliões de fósseis que encontramos nos cinco continentes, juntamente com toda a evidência de catastrofismo na geologia.
A partir do dilúvio e de Babel compreendemos a dispersão de todos os animais e pessoas, dando origem a fenómenos de variação, selecção natural, adaptação e especiação, no mundo animal, e ao surgimento das diferentes nações e civilizações, dentro da espécie humana.
A origem das civilizações e da respectiva historiografia, é muito recente. As estatísticas demográficas são inteiramente consistentes com o crescimento da população de Noé até aos nossos dias.
Mas a Bíblia afirma que Deus escolheu um homem, Abraão, um Povo, Israel, e uma região, a Palestina.
Ou seja, estamos perante um Deus pessoal, bem referenciado do ponto de vista histórico e geográfico, por muitas implicações que isso possa ter ainda hoje, não necessariamente as mais politicamente correctas.
A verdade é que a questão de Israel e de Jerusalém continua hoje, como desde Génesis até ao Apocalipse, no centro das atenções mediáticas. Basta clicar na CNN hoje mesmo.
Isso é mais do que suficiente para separar o Deus de Israel de outras “réplicas”, como Zeus, Júpiter, Thör, etc. Podemos e devemos “matar” estes deuses à vontade, mas o Deus de Abraão, de Isaque e Jacó sempre o teremos connosco.
Além disso, a Bíblia afirma que Deus encarnou em Jesus Cristo, com o objectivo de levar sobre si as consequências do nosso pecado. Ele deveria ser o Salvador da Humanidade.
Daí que Jesus Cristo, apesar de ter nascido numa estrebaria e sido deitado numa mangedoura, como se celebra no Natal, tenha surpreendido os seus contemporâneos com actos reveladores de poderes sobrenaturais, reveladores da sua divindade, e com a sua morte na cruz e ressurreição física.
Estes aspectos foram pormenorizadamente relatados, com indicações pessoais e geográficas precisas, por pessoas humildes, sem qualquer motivação lucrativa.
Pelo contrário, muitos pagaram com a própria vida o terem sido testemunhas da ressurreição de Cristo.
Jesus Cristo foi, sem dúvida, a personalidade com mais impacto na história universal.
Esse impacto continua hoje, dois mil anos depois do seu nascimento.
Esse Deus só pode ser aceite pela fé, que é, ela mesma, um dom do próprio Deus.
Mas não se trata de uma fé cega. Ela pode ser amplamente corroborada pelos factos reais, na medida em que se trata de um Deus real, criador do mundo real e participante da história real.
O que não podemos é cair no erro de tentar encontrar explicações naturais para uma mensagem cujo objectivo consiste em alertar-nos para a existência de um Criador e Salvador sobrenatural.
Eu acho que Desidério Murcho tem razão no seguinte:
Eu sei que se cortar um braço a alguém ele não volta a crescer. E se alguém me perguntar como é que eu sei isso eu digo que resulta “naturalmente da nossa forma de vida” como lhe chamava Wittgenstein. Aprendemos isso com a nossa experiência de vida. Tais aspectos são características intrínsecas à própria vida. O sentido disto não está na tradução nem descrição da vida, mas faz parte da própria vida. E sei pelo exame do seu funcionamento no seio da própria vida, e não no exame da descrição no seio da linguagem. Mas Wittgenstein errou quando disse que a natureza da experiência de vida se esgota no uso público da linguagem. Ora, a vida psíquica não acaba onde pára a linguagem. Alguma fenomenologia da experiência vivida por não ser acessível à linguagem, não deixa por isso de ser real. Mesmo que o testemunho do sujeito não seja facilmente transferível para o conhecimento científico, não podemos derivar daqui a irrealidade da consciência na primeira pessoa.
Mas não acho que Desidério tenha razão no que vou tentar dizer a seguir.
Olá.
Gostei do post, da reflexão.
Pessoalmente sou um gnóstico (não confunfir com agnostico).
Acredito e sinto a existência em Deus, sem ilusão.
Mas é algo que transcende o meu racionalismo e entra no campo intuitivo.
Basta-me sentir o amor nada mais.
As reflexões e provas não me interessam nada. E sou feliz com isso que acho que é tudo que importa.
Paz pra todos
E precisamente tudo em que acreditamos ou não é uma ilusão sempre criada por nós.
Ponto tirado.
É uma ilusão acreditar na mente, como é uma ilusão acreditar no racionalismo ou na religião.
é uma ilusão a Ciência assim como o é a nossa visão de nós.
Mas o que não é o mundo senão um ilusão, um sonho criado e desenvolvido e acarinhado por nós?
Portant criemos o melhor que possámos, com mais humanismo e que nos traga mais paz e alegria
À partida, Deus existe como entidade lógica, como conceito. Mas depois o ele existir ou não na realidade, se não fizer parte naturalmente da nossa experiência de vida, podemos duvidar, independentemente de qualquer veracidade lógica. Portanto, da mesma maneira, para argumentar esta “impossibilidade de…”, não precisamos de conhecer “todos os conteúdos argumentativos a favor ou contra (1)”, eles até poderiam ser infinitos. Por isso aqui dou razão a Alfredo Dinis e não a Desidério Murcho, mesmo que eu me considere um ateu. Mas isto é um aspecto de outra ordem, que é psicológica, e aqui dou razão a Desidério Murcho.
No desenvencilhar argumentativo, já tem de contar o quadro de referências da linguagem que herdamos, para dizer o que vale e o que não vale. É a linguagem que faz o enquadramento das nossas convicções. Mas não o podemos aplicar às questões fenomenológicas da experiência de vida.
Quanto à prova. A experiência privada não pode ser provada, mas não tem que o ser, pois constitui o objecto de uma certeza inabalável, que está fora de toda a dúvida. Claro que aqui não há lugar a prova cientificista. Só não concordo que tenha de ser fideísta.
Se um cego me perguntasse – “tem duas mãos?” – eu não me asseguraria de ver primeiro as mãos antes de dar uma resposta acertada. Porque se tivesse alguma dúvida, então o simples facto de olhar para as mãos não dissolveria essa dúvida. Por que deveria acreditar? Não posso ter mais certeza acerca do significado das palavras que utilizo do que acerca de certos juízos que tenho. Também quando olho para a cor azul de um objecto não posso duvidar que essa cor se chame ‘azul’. Não aprendemos a prática da formulação de juízos empíricos através da aprendizagem de regras. Torna-se plausível para nós uma totalidade de juízos em que uns se interligam com outros. Quando começamos a acreditar em qualquer coisa, aquilo em que acreditamos já é um sistema de proposições e nunca se começa por acreditar numa só proposição.
Não são os axiomas isolados que nos parecem óbvios, é um sistema em que as premissas e as conclusões se apoiam mutuamente. Aprendemos a acreditar ao mesmo tempo num grande número de coisas. Forma-se um sistema daquilo em que acreditamos, e nesse sistema, algumas coisas permanecem inabalavelmente firmes, enquanto outras são mais ou menos susceptíveis de alteração. Aquilo que permanece firme não o é por ser intrinsecamente óbvio ou convincente; tudo aquilo que o rodeia é que lhe dá consistência.
Entre o ruído dos debates que campeiam por estes agrestes temas, sobressaem dois percursos.
Num, muito utilizado, as questões são abordadas segundo uma lógica próxima da matemática. A análise decompõe os factos, submete-os a regras de bem pensar pré-estabelecidas e o resultado tem sempre uma aparência facilmente reconhecível. Aqui, a representação dicotómica é imprescindível, o que faz com que reflexões aparentemente complexas redundem em conclusões de um simplismo assustador.
O outro percurso, mais raro, é sistémico. Tenta uma aproximação mais ampla, pressupondo que há todos que não são meros somatórios de partes. Diz-nos que a razão não é algo da mesma natureza do metro-padrão, que o infinitamente complexo não pode ser lido com os mesmos instrumentos do infinitamente pequeno, receia os conceitos “universalistas”, as evidências inequívocas, as verdades institucionais.
O primeiro, aparenta muitas vezes trazer consigo a arrogância típica dos poderes inseguros que precisam das suas certezas para manter a flutuabilidade.
O segundo, é apanágio de humildes curiosos, que se limitam a ter dúvidas e a rir sem complexos de si mesmos sempre que se enganam.
O texto escrito pelo comentador que assina como "Perspectiva", é bem ilucidativo da enorme confusão que reina na cabeça de muitos cristãos bem intencionados... algumas verdades misturadas com ideias completamente ilógicas, numa imensa salada-russa de constrangedoras inconsistências...
Não me vou alongar mas, por exemplo, a afirmação "a Bíblia afirma que Deus escolheu um homem, Abraão, um Povo, Israel, e uma região, a Palestina" é uma daquelas que provoca arrepios. Não está aqui a causa de muitos milhares de mortes e perseguições ao longo dos últimos séculos e de conflitos que perduram até hoje?
E a afirmação: "Isso é mais do que suficiente para separar o Deus de Israel de outras “réplicas”, como Zeus, Júpiter, Thör, etc. Podemos e devemos “matar” estes deuses à vontade, mas o Deus de Abraão, de Isaque e Jacó sempre o teremos connosco" -- não é ela um exemplo de intolerância e preconceito religioso???
Não imaginava que a Divindade Absoluta e Infinita pudesse "descer" assim à relatividade, reduzir-se, ao ponto de, num Universo prodigiosamente vasto, vir escolher um "povo eleito"? E os outros são o quê? Os condenados?
E que culpa teremos nós que (admitindo esse absurdo) dois individuos tenham "pecado" no Éden? Porque teremos de pagar por isso? Realmente só "acreditando" que esse "Deus de Israel" seja vingativo, ciumento e muito zeloso apenas dos "seus"...
Assim se tocam a fé cega e o cepticismo que tudo nega (porque há, sim, um cepticismo extremamente saudável)!!!
Enfim, muitos disparates juntos... com vislumbres de algumas meias-verdades.
Quanto ao resto do comentário... "no coments"!
Praise the lord ALELUIA!!!
O sr. perspectiva estava entusiasmado.
Eu a pensar que era Mithra que celebrava mos no natal, mas enfim...
Modernices...
Sinceramente, este Jonatas passou-se de vez.
Pobres dos alunos dele que têm de levar com um alucinado que devia era estar num manocómio. Há por lá alguns que estão internados por dizerem parvoíces bem menores.
Comprovei de vez que estes criaccionistas apesar de inteligentes são completamente malucos, o que os torna perigosos.
Uma pergunta que, se não for forçar demasiado, pode servir tanto para o "Jonatas" como para o Alfredo D. :
Como conciliam que a teoria avançada pela ciência que o homem descende do macaco com o "postulado teológico" de que o homem tem origem divina?
Eis um paradoxo na cabeça de muito boa gente...!
A pergunta é:
Como conciliam a teoria avançada pela ciência que diz (ou especula) que o homem descende do macaco com o "postulado teológico" de que o homem tem origem divina?
quim
Penso que está desatento. A resposta a essa questão está num dos posts de Alfredo Dinis.
E mais um detalhe: O senhor Perspectiva e Alfredo Dinis não comungam das mesmas ideias em relação ao criscionismo e evolucionismo.
Manuel Rocha,
Só um esclarecimento breve: os discursos nem são próximos nem distantes da matemática. O que se passa é que o pensamento ou é consequente ou não é e os argumentos avaliam-se pela lógica. Nada mais. Por vezes somos levados a pensar o contrário, mas isso deve-se à nossa formação escolar que é debilitada em matéria de raciocínio lógico, como bem demonstram os resultados do PISA. Como não conhecemos pensamos que não existe. E pensamos que não existe porque a nossa cabeça não foi educada a pensar o mundo, foi, antes disso, amestrada, o que é grave se pensarmos que a liberdade é o que mais desejamos.
Abraço
Rolando Almeida
1.Sobre “não é possível provar nem que Deus existe nem que não existe”, tout court, permita-me observar que é duvidoso que um Kierkegaard ou um Pascal tenham defendido isso, sem outra qualificação; e mais duvidoso ainda que um sacerdote jesuíta sustente tal, porque iria contra o que é artigo dogmático definido já pelo IV Concílio de Latrão, no séc. XII e pelo Vaticano I, reafirmado pelo Motu próprio de 1.09.1910, do Papa Pio X e pela constituição dogmática Dei Verbum (nº 6), do Vaticano II. E todos assentam na Escritura, em passagens como Sb 13, 1; Sl 14, 1 e Rom 1,20.
1.1 Por isso, deverá interpretar-se com esta qualificação: não é possível provar que Deus existe nem que não existe a quem não quiser crê-lo e fechar o coração ou a razão a um exame racional imparcial, alargado e despreconcebido da questão. Assim posto, aqui tem o “argumento minimamente plausível”.
1.2 Com tal qualificação, não segue nem que um bom argumento nem que “nenhum outro argumento” não poderá ser bem sucedido (mesmo um argumento logicamente falacioso mas retoricamente poderoso pode, noutras circunstâncias da existência do sujeito, ser bem sucedido em convencer).
1.3 Por isso mesmo, como bem diz, “provar cientificamente algo, ou logicamente, ou matematicamente” é apenas um género de argumentação.
1.4 Mas, neste caso, não se entende que use a expressão “SUPRA-racional”. O amor do João pela Maria (se existe) fornece um conjunto de motivos que, parcial ou conjuntivamente, podem constituir RAZÃO SUFICIENTE; e à história narrativa das relações deles pode também chamar-se um “argumento”. São, a propósito, as tais “raisons du coeur” pascalianas. Analogamente, como procurei mostrar no comentário que aqui deixei ontem ao 2º do sr. Padre Dinis, para o amor do homem por Deus e de Deus pelo homem.
1.5 Se este amor conhecido por “acquaintance” e/ou pela prática de vida do sujeito (o tal “modus vivendi”) constitui, imparcialmente considerado, razão suficiente, procurar outras “razões” não é, como diz, não querer dar-se a um “incómodo”, mas poupar-se a uma desnecessidade; a algo que, do ponto de vista daquele conhecimento, parece supérfluo e artificioso, em qualquer caso comparativamente insatisfatório.
1.6 Note, contudo, que da posição “fideísta” não pode seguir, nem “literalmente”, que “Deus não existe”: apenas que a “fé” terá um objecto incognoscível, não um objecto necessariamente não existente.
2. Em suma, parece exprimir com muito acerto uma verdade esta asserção do sr. Padre, quando lhe disse: “as pessoas que porventura consideram que há provas da existência de Deus e aceitam alguma delas, já eram crentes antes de aceitarem a racionalidade dessas provas.” (E é de notar que diz “racionalidade”, não validade lógica”.)
3. Se alguém se dispõe a querer acreditar e, por uma “análise paciente e crítica” de uma argumentação lógica a favor da existência de Deus, então o sr. Desidério confessou ter encontrado um argumento VÁLIDO numa certa apresentação modal do “argumento ontológico” anselmiano, que aqui deixou no 1º post sobre “Deus, Religião e Argumentos”, no passado dia 20 de Novembro.
3.1 Se o sr. Desidério acha o argumento válido, talvez nos queira fazer um dia destes o obséquio de nos dizer se/por que não lhe parece tal argumento racionalmente convincente. Estou certo que os ateístas leitores deste blogue e nós outros, todos aguardamos com muito interesse a sua resposta.
(À margem. No mesmo artigo citado, o argumento anselmiano propriamente dito aparece truncado e, não apenas por isso, muito deficientemente apresentado. Os caps. II e III do Proslogion, com os pressupostos do cap. I constituem duas partes de um único argumento. Esperemos também que a advertência do comentador Frank, que o sr. Desidério considerou “importantíssima”, bem como a sua crença em referentes não espaciotemporais, o levem a reconsiderar a pueril objecção da “ilha” de Gaunilo, quando este alegou outras bem mais ponderosas.)
"God is that entity compared to which nothing greater can be conceived."
Caro Carlos Monteiro,
esta e' a definicao de Deus no argumento ontologico de Anselmo (retirado da Wikipedia).
O que e' que esta definicao quer dizer exactamente? E' dificil dizer; e' uma definicao muito estranha.
Qual e' o segmento de recta mais comprido do que qualquer outro que se possa conceber? Qual e' o maior numero natural?
Qual e' a pintura mais bela que se pode conceber?
E' sempre possivel dizer qual e' a pintura mais bela que eu apreciei; nao faz qualquer sentido tentar responder 'a questao de saber qual e' a mais bela que se pode conceber...
Desidério:
Discordando abertamente do argumento do Alfredo Dinis, acabo por não discordar da sua conclusão. Em particular, não discordo que quem acredite que nunca poderá ser provada a existência ou não-existência de Deus deva provar 1), 2) e 3).
Eu creio que faz sentido argumentar contra ou a favor da existência de Deus. Neste sentido, discordo da posição segundo a qual tal discussão é irrelevante, seja fundamentada em diferentes formas de cientismo, seja outro qualquer o seu fundamento.
Mas uma prova final, derradeira, decisiva, (e é a isso que se referem aqueles que defendem que é impossível "provar" a existência ou inexistência de Deus), é algo que está para além de um argumento persuasivo.
Aqui eu creio que é impossível provar a existência ou inexistência de deus pela mesma razão que creio ser impossível provar a existência ou inexistência da lei da gravidade, do Pai Natal, ou de uma cadeira: sou céptico. Creio que nada, em última análise, pode ser "provado" (tendo prova o tal sentido de prova derradeira, final, decisiva).
O que temos são indícios. E os indícios mostram-nos quais as hipóteses mais plausíveis: é mais plausível que a terra seja redonda, que a força da gravidade exista (mesmo que enquanto deformação no espaço tempo), que o pai natal não exista, e que Deus seja uma invenção. Por isso é que sou ateu além de agnóstico.
O inglês neste aspecto tem uma vantagem: a palavra "proof" é diferente da palavra "evidence". Na ciência e nos crimes procuram-se "evidences", e na matemática, nas deduções 100% seguras falamos em "proofs". Em português usa-se a palavra "prova" com ambos os significados, e isso pode gerar alguma confusão. Como sei que para muitos uma prova tem de ser absolutamente incontestável (como uma dedução matemática) acabo por tentar usar a palavra "indícios" para me referir às "evidences".
E entendo que muitos daqueles que defendem que a existência Deus não pode ser provada nem desprovada, se referem a esta acepção "forte" da palavra prova ("proof")
Caro Desidério,
gostaria que fundamentasse melhor o seguinte:
1) Literalmente, Deus não existe, que é precisamente o que defendem os ateus.
2) Todas as emoções religiosas da generalidade dos crentes são ilusórias, dado que Deus não pode ser o objecto de tais emoções.
2) O modus vivendi religioso torna-se então o próprio objecto da reflexão filosófica: será justificável viver daquela maneira, fazer aqueles rituais, constituir aquelas comunidades? Porquê?
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e questiono, se Deus sendo para além de toda a linguagem humana, talvez poderá compreender esta. ou não?
Se Deus compreende a linguagem humana então já faz sentido os rituais, emoções, etc...
Porquê Deus compreender a linguagem humana? talvez porque não é um ser limitado?(!)
o problema é o inverso:
como é que o humano sendo limitado, compreende uma linguagem ilimitada (Deus)? ou será que Deus sendo ilimitado também consegue "traduzir" a sua linguagem para a linguagem humana? se sim... então parece que o que Desidério afirma deixa de fazer sentido. ou não?
um abraço,
Gostaria de questionar o Alfredo Dinis:
1- Deus está para lá do espaço-tempo.
2 - A linguagem humana é limitada ao espaço-tempo.
3 - Logo, como é que a linguagem limitada ao espaço-tempo poderá comunicar com uma linguagem para lá do espaço-tempo??? parece-me ser intraduzível! ou será que não???
Visto, assim:
ainda vale a pena rezar?
vale a pena ir à missa?
...
saudações cordiais,
Caro Desidério:
Se Deus está para lá da linguagem humana, também não podemos ter emoções sobre tal coisa? (Será mesmo assim?) nem podemos fazer-lhe rituais? nem criar comunidades em que toda a gente acredita numa coisa que não pode compreender? nem exprimir? nem pensar?
será mesmo assim?
Pelo facto de Deus estar para além de toda a linguagem humana, quer isto dizer que Ele não compreende a nossa linguagem? Mas se é um ser “perfeito” porque não haveria de compreender uma linguagem “menor” (humana)?! Se é um ser “perfeito” porque não se poderá também comunicar de forma “menor”(linguagem humana)? Mas, se Deus se comunica ao ser humano de forma “menor” não poderá o ser humano dizer algo sobre Deus? Ou será que se Deus não se comunica de forma “menor”, então o ser humano não poderá dizer nada sobre Ele...(?) o que não invalida o facto do ser humano se poder dirigir a Deus (pela linguagem) e Deus compreender essa mesma linguagem).
Achei muito apressada a forma como conclui que não podemos ter emoções, rituais, etc… deduzida do pressuposto “Deus está para lá da linguagem humana”.
Saudações cordiais,
"Quim disse...
A pergunta é:
Como conciliam a teoria avançada pela ciência que diz (ou especula) que o homem descende do macaco com o "postulado teológico" de que o homem tem origem divina?
20 de Dezembro de 2007 17:58"
Esta é exactamente a pergunta a que me proponho responder na minha próxima dissertação. A resposta afigura-se-me tão simples, que o que mais me tem custado a entender é a própria dúvida em si. Penso que uma vez respondida, esta falsa questão provocará uma reacção próxima da que tiveram aqueles que viram Brunelleschi pôr o ovo em pé, para provar que seria capaz de construir a cúpula da catedral de Florença. Terei o maior gosto de mostrar aqui, em primeira mão, esse discurso, se tal me for facultado.
Nota ao Murcho: Escusa de se dar ao trabalho de ser ofensivo para mim, porque eu não irei dar-lhe o prazer de reagir. Talvez entenda então que a maior força do universo é exactamente aquilo que não se vê, não se descreve, não se manifesta. Já sabe o que é, caro Murcho. Pense um pouco, dê as suas sugestões e não se preocupe, porque se não conseguir acertar eu lhe darei a resposta. ;)
"Já sabe o que é, caro Murcho?"
Falhou ali o ponto de interrogação, mas é importante ler a frase como uma pergunta. :D
este jonatas é completamente passado :P
Caro Desidério,
1. Vamos pôr-nos de acordo sobre o que queres dizer com um argumento que falha a existência de Deus. Já anteriormente fizeste a distinção entre um bom argumento, válido e relevante, e a sua capacidade de convencer efectivamente alguém. Fazes aqui, se bem entendo, uma distinção entre o carácter objectivo da prova em si mesma, e o carácter subjectivo do convencimento que essa prova produz em alguém, isto é, uma distinção entre os níveis lógico e psicológico. Acontece que no caso da existência de Deus, eu tenho dificuldade em aceitar que alguém reconheça que o argumento da prova da sua existência é válido, é relevante, mas se recuse a tomá-lo a sério na sua existência. Como diz o Vasco, tomo aqui prova no que se pode chamar sentido forte. E recordo que distinguir não equivale necessariamente a separar.
2. Pedes-me para dizer a razão pela qual todos os argumentos a favor da existência de Deus falham. Tomo como equivalente a prova, no sentido forte, a expressão: “argumento a favor da existência de Deus que não falha” e interpreto “não falha” no sentido de convencer alguém da existência de Deus. Como já disse anteriormente, não conheço ninguém que tenha passado a acreditar em Deus com base num argumento, válido e relevante, a favor da sua existência.. Não sei se o Desidério considera o argumento ontológico de Santo Anselmo um bom argumento, válido e relevante, talvez o exemplo de uma boa razão para acreditar em Deus. Mas por que motivo não se conhece ninguém que tenha começado a acreditar em Deus depois de conhecer este argumento? Como disse acima, considero um bom argumento sobre a existência de Deus aquele que tem algum impacto sobre a vida das pessoas. Depois de séculos e séculos à procura de um tal argumento, não o encontrámos. Poderá ser uma questão de tempo e de imaginação? Disse e digo que não. Não vale a pena refinar os argumentos existentes ou procurar novos argumentos, pela razão que já antes apresentei: a linguagem humana não é adequada a tal demonstração.
3. Não disse que não se pode falar acerca da entidade que designamos por Deus. Referi o carácter analógico da linguagem religiosa. Quando digo que Deus é ‘bom’ estou a referir-me à única bondade que conheço, a humana. Mas repito aqui o que sempre se disse na tradição cristã acerca da analogia aplicada a Deus: quanto mais nos revela mais nos esconde a sua realidade. Por analogia, digo que Deus é bom, e posso também dizer que ele é a bondade absoluta. O seu amor não depende de eu ser bom. Mas é evidente que não há aqui nenhuma demonstração de que Deus tem o atributo da bondade. Há uma afirmação que se baseia no facto de haver bondade neste mundo, de ser uma qualidade humana considerada fundamental e que, se Deus está na origem dos seres humanos, tudo leva a crer que é também ele bom, mas num grau praticamente inimaginável para nós. Mas nada disto constitui um “argumento que não falhe”.
Por outro lado, os cristãos recitam orações sobretudo de louvor e de súplica. Entendê-los-á Deus? Porque não? As palavras dirigidas a Deus exprimem atitudes, e estas são essenciais em qualquer religião. Mas também é verdade que a oração silenciosa, acessível não só aos grandes místicos, mas a qualquer simples cristão, é considerada muito mais profunda do que a que se baseia em muitas palavras. O próprio Cristo aconselhou os seus discípulos a não dizerem muitas palavras nas suas orações.
4. Quanto ao cientismo, não me identifico com ele por duas razões: em primeiro lugar, porque não creio que a linguagem científica seja adequada para podermos falar de todas as dimensões da nossa existência. Em segundo lugar, porque nenhuma prova científica é definitiva.
5. Não considero que as razões que apresentas e que justificam o amor de João pela Maria sejam de natureza filosófica. Não me parece que seja adequado identificar razões com argumentos.
6. Não sou fideísta porque, como já anteriormente referi, a religião necessita do espírito crítico tanto dos próprios cristãos como dos agnósticos e ateus para não cair na superstição e não se tornar inadequada e irrelevante numa cultura em constante e acelerada mudança.
Caro Desidério, tenho tido muito gosto em conversar contigo.
Um abraço.
Caro solquartocrescente, gostaria de compreender um pouco melhor o que queres dizer com a expressão "Basta-me sentir o amor nada mais."
Obrigado.
Caro Quim, a ciência não afirma que o homem descende do macaco, mas sim que todos os primatas descendem de um antepassado comum. A crença na criação da vida por Deus, não depende de qualquer teoria científica que explique como se deu a evolução das espécies. A forma como Deus criou o mundo e o sustenta tem sido explicada de muitos modos por filósofos e teólogos, mas nenhuma delas é convincente nem sequer necessária, além de não nos ser acessível. Porque razão não poderia Deus criar o universo e a vida por um processo que dura há biliões de anos em vez de ter criado tudo em seis dias?
Obrigado pela pergunta que, como diz e bem, causa problemas a muita gente.
Caro anónimo (20 Dezembro, 22:24)
Se ler a minha resposta ao Desidério verá que considero que tem sentido rezar e, por conseguinte, tem sentido a eucaristia, que é a oração por excelência dos cristãos. A linguagem que utilizamos faz sentido para nós, exprime atitudes e intenções. Acredito que há uma unidade profunda entre Deus e a criação, especialmente entre Deus e a humanidade. Os dualismos que usamos e de que abusamos (este mundo e o outro, natural-sobrenatural, imanência-transcendência, sagrado-profano, etc) é que nos tornam difícil compreender como é possível que exista essa profunda unidade entre Deus e a humanidade.
Cuidado com os dualismos! (www.dualismos.blogspot.com)
Uma abraço.
Caro Alfredo Dinis,
Muito obrigado pelas suas respostas muito pertinentes que muito nos ajudam a purgar a nossa imagem do mundo.
Compreendo o diálogo com Deus. Principalmente o facto de nos dirigimos a Deus como um amigo “intimo” em quem podemos confiar infinitamente. Contudo, tenho uma grande dificuldade: Não consigo “ouvir” Deus… eu falo com Deus (dirijo-me a Ele), porque é que Ele não me responde (porque é que Ele não se dirige a mim)?
Como é que Deus nos fala? Será que Deus nos fala no dia-a-dia? Ou não?
Por vezes parece que estou a falar para a parede…! Falo, falo, falo (rezo)… e não “vejo” nada (não sinto nenhum sinal de resposta de Deus)! Que se passa? Porque é que Ele não responde?
Poderia-nos falar da “oração”. Em que consiste este “maravilhoso” (mas incompreensível) diálogo com Deus? E principalmente gostaria de saber como é que Deus nos “fala”, se é que fala connosco…
Muito obrigado por tudo,
Um abraço
Caro Alfredo,
Afastei-me um pouco do debate, mas é interessante observar como é que a filosofia da religião em Portugal pura e simplesmente não existe. O que existe é uma espécie de catequese muito patusca e muito popular. Não vejo qualquer sentido em andar aqui a dizer que faz sentido rezar e que a eucaristia é a coisa melhor do mundo para os cristãos. Ainda que faça todo o sentido, também para mim faz todo o sentido uma série de acções que não interessa para a discussão. É que assim torna-se impossível discutir o quer que seja!
Outro aspecto: por acaso talvez não conheço ninguém que tenha passado a acreditar em deus por argumentos racionais, mas conheço imensa gente que deixou de acreditar em deus precisamente por argumentos racionais.
Ainda que a experiência religiosa esteja para lá da linguagem e da racionalidade, como defende, essa experiência é ainda assim e sempre, questionável filosoficamente. Não me parece suficiente o argumento de que, como se trata de algo para lá do mundo captável pela linguagem, então não se questiona. Como refere em relação a outros aspectos da discussão, se não se questiona que possibilidade temos de saber da sua verdade ou falsidade? Mais um aspecto pequeno: o facto de um problema demorar séculos a ser discutido, isso não significa que não valha mais a pena discuti-lo. Como refere também a ciência não encerra as suas verdades e esse caminho parece o mais acertado. Então temos alguma razão para crer que a verdade de deus não é uma ambiguidade? Porque a tomamos como absoluta se nada mais podemos ter como absoluto?
Obrigado
Rolando Almeida
"Porque razão não poderia Deus criar o universo e a vida por um processo que dura há biliões de anos em vez de ter criado tudo em seis dias?"
Caro Dinis,
Até podem ambas as proposições ser verdadeiras. A questão aqui é o tempo. O tempo de Deus não será o tempo da sua criação. Nós vivemos aprisionados no tempo cronológico, que está indissociavelmente ligado ao espaço, ao Universo tal como o conhecemos. Deus , não sendo finito, material, não faz parte deste Universo, logo não está condicionado a este cronos, mas está fora dele. Isto significa que Deus pode ter criado o Universo num tempo equivalente a seis dias cronológicos, e ainda assim, esse mesmo Universo conter em si um tempo cronológico enorme, podendo mesmo acompanhar a expansão do espaço.
Desculpe esta linguagem pouco filosófica (srictu sensu) e pouco habitual por aqui.
Acredito que o Homem jamais poderá explicar Deus, porque lhe faltam os meios e as referências. Acredito que Deus só pode ser conhecido (e reconhecido) numa experiência pessoal, mas não comprovado dentro dos limites da razão cartesiana ou da lógica aristotélica. Estranho esta necessidade que algumas pessoas têm de fazer este tipo de exercício tantálico de estar à beira Dele e não conseguir "bebê-lo". Estranho é eufemismo: sinto dó.
É tardíssimo. Não vou conseguir estar mais tempo aqui, para poder ler uma eventual resposta imediata. Mas amanhã passarei para me inteirar da reacção a esta minha intervenção pouco canónica. :D
Caro Zé de Portugal,
A que 'tempo de Deus'equivale o 'tempo dos seres humanos'? A expressão 'tempo', o mesmo que 'seis dias' ou '15 biliões de anos', só faz sentido no universo em que vivemos. E é neste universo que podemos dizer que ele não foi criado em seis dias.
Há que evitar os dois extremos, o racionalismo logicista e cientista e o fideismo que dispensa a razão. Não há que temer uma atitude crítica em relação ao modo como formulamos os conteúdos da fé. Uma vez que cultura humana muda, e cada vez mais depressa, há que reformular os conteúdos da fé em termos que sejam compreensíveis e façam sentido para cada geração. Não lhe parece?
Saudações.
Caro Rolando,
Não pretendo aqui fazer filosofia da religião, mas apenas expôr o modo como entendo o cristianismo. Referi-me à oração dos cristãos apenas em resposta a um comentário em concreto.
Gostaria que me referisse os argumentos que levaram pessoas a abandonar a fé religiosa apenas pela força persuasiva desses argumentos. Lembre-se que, segundo Damásio, a razão não funciona bem sem a capacidade de sentir emoções. E uma das áreas em que a emoção se alia à razão - para os crentes como para os ateus e agnósticos - é certamente a religião. Que lhe parece?
Obrigado pela sua crítica.
Caro apaixonado por JC,
A questão que me coloca não se insere bem no debate que está a ter lugar neste blog, não concorda? Por isso digo-lhe apenas que o que bloqueia a nossa relação com Deus não é talvez muito diferente do que bloqueia as nossas relações interpessoais.
Se quiser continuar este diálogo será melhor que o façamos por mail. Deixo-lhe aqui o meu: alfredodinis.facfil@gmail.com.
Boas Festas!
Caro Alfredo,
Obrigado pela resposta. Creio que sim, que a religião é uma das áreas que alia a emoção à razão. Deve ser por isso que alguns como Richard Dawkins se assumem orgulhosamente ateus. Estão emocionados em não acreditar em deus.
Eu não acredito em deus porque não tenho razões para acreditar, melhor, as razões que tenho para não acreditar são muito mais fortes do que as que tenho para acreditar. O Alfredo pode perguntar-me se me der razões para acreditar que sejam fortes se passo acreditar? Admito essa possibilidade, porque não,?,apesar que a mesma se me afigura muito remota. Do que diz da emoção em sentir deus, eu não sinto tal coisa. Com efeito, ao longo da minha educação, ouvi isso muitas vezes. Mas emociono-me bastante, às vezes penso que me emociono muito mais que a maioria dos emocionados com deus. Enfim, não vejo porquê que um indivíduo não possa questionar a sua crença após ter lido, por exemplo, os diálogos sobre religião natural de David Hume. Creio até que a maioria dos filósofos questionam racionalmente a sua crença ou, no minimo, um cepticismo moderado faz muito jeito. Siceramente não vejo nada de extraorinário em uma pessoa se guiar racionalmente mesmo nas suas crenças emocionais. Um indivíduo pode emocionar-se com uma determinada mulher, mas racionalmente saber que não se pode envolver com ela. E esta experiência parece-me extensível a toda a experiência humana. Estou verdadeiramente convencido que não tem de existir aí uma área muito profunda à qual nem todos têm igual acesso. E tenho legitimidade em colocar em causa que tal realidade exista.
Finalmente: sendo o Alfredo de filosofia e tendo as responsabilidades que tem na filosofia acho natural que discutisse ou fizesse filosofia da religião. Admiro alguns teólogos filósofos precisamente por essa razão, mesmo que não concorde com eles.
Conheço várias introduções à filosofia da religião e, tal como referiu o Desidério, praticamente todas começam com a questão da experiência religiosa e da emoção que me fala. Claro que o fenómeno começa por aí. Sem essa experiência, provavelmente nem sequer se colocaria o problema da existencia de deus, por essa razão creio que ninguém passa a acreditar em deus racionalmente. Mas o contrário não sucede da mesma forma e isto porque a questão de deus não se esgota na experiência. Eu posso ter experiências profundas com a música de Arvo Part que me desperta emoções tão profundas que tenho dificuldade em saber se a linguagem traduz a minha emoção, com efeito, a linguagem permite-me questionar que tipo de emoção é aquela? como é que ela se produz em mim? se ela é subjectiva ou objectiva? se é variável, etc... e posso passar o resto da minha vida a ouvir Arvo Part até perceber que, afinal, não me emociona tanto quanto eu pensava. Concluindo: se a emoção em deus é uma condição necessária para justificar deus, ela não me parece suficiente. E também está para provar qual a vantagem que a emoção tem sobre a razão.
Obrigado pela sua disponibilidade
Rolando Almeida
Caro Desidério,
Você afirma: "Se Deus está para lá da linguagem humana, como defende o Alfredo, também não podemos ter emoções sobre tal coisa, nem podemos fazer-lhe rituais, nem criar comunidades em que toda a gente acredita numa coisa que não pode compreender, nem exprimir, nem pensar."
Será talvez falha minha, mas entendo (pelo menos em parte) o seu raciocínio.
Por que razão não podemos ter emoções sobre algo que esteja para lá da linguagem humana?
Presumo que aceitará que as emoções sejam anteriores à linguagem humana. A minha gata tem emoções; a felosinha que a minha gata quase caçou esta manhã tem emoções. Todavia, não têm linguagem humana. Ou, se têm, a minha gata anda a gozar comigo desde há dez anos a esta parte! :)
Além da felosinha e da minha gata, eu também sinto emoções que não sei exprimir em linguagem humana. Mais grave, até sinto emoções que não consigo exprimir em linguagem humana sobre coisas que posso, de algum modo, descrever e explicar em linguagem humana: a morte de um amigo, o canto do rouxinol-grande-dos-caniços, ou o Teatro da Cornucópia a representar Ibsen. Mas não posso exprimir tudo o que sinto sobre estas coisas, e sei que, por melhor que dominasse a expressão da linguagem humana, ainda assim nunca conseguiria exprimir tudo. Faltaria sempre alguma coisa. E – não sei se lhe acontece o mesmo, ou a quem esteja a ler este comentário – não só faltaria sempre alguma coisa, como essa coisa seria sempre sentida como a mais importante.
O haver coisas para lá do alcance da linguagem humana não implica que não tenhamos emoções sobre elas. E que façamos rituais sobre elas, talvez precisamente porque não há linguagem que chegue.
Sou ateu, ou ainda menos que isso, e não tenho sombra daquilo a que os cristãos chamam fé. E - como dizia Miguel de Cervantes, se não estou em erro - graças a Deus que sou ateu, que a ideia de ter “fés” não me agrada nada. Mas consigo compreender que as pessoas com esse género de sentimentos inexprimíveis com completude em linguagem humana, elaborem ritos em torno do assunto, e sejam felizes com isso. Aliás – e desde que não impostos suave, ou à bruta, aos outros – parecem-me mesmo a parte mais racional da religião.
Cumprimentos.
Caro Rolando,
Obrigado pela sua resposta. Clarifico apenas duas coisas. Prineira: não quis dizer que as emoções que acompanhm a experiência religiosa são uma prova de que ela tem fundamento em Deus. Segunda: as emoções não estão apenas presentes na experiência religiosa. A recusa de Deus é também acompanhada por emoções, não é uma questão de pura racionalidade, como nada na vida. Por isso mesmo, a justificação do ateísmo ou do agnosticismo não é uma simples questão de racionalidade. O caso de Dawkins parece-me um bom exemplo.
Saudações.
António Parente
Não estou desatento como sugere. A resposta à minha questão não está em nenhum dos posts do Alfredo. Se por lá existe essa resposta tenha a bondade de me dizer qual é.
Eu sei perfeitamente que Alfredo e o Senhor Perspectiva não comungam das mesmas ideias. No entanto, tenho todas as razões para considerar que a mesma pergunta pode ser válida para ambos. É que eu gostaria de saber qual a posição de um (aparente) criacionista ortodoxo e um de um padre jesuíta (e evolucionista)…
Se para si estas duas posições sobre a mesma questão já estão elucidadas para mim não. Digo-lhe mais, nem esboçadas foram. O único que até agora se esforçou, mas sem se comprometer demasiado, foi o Alfredo.
Caro Quim,´
Procurei responder à sua questão no dia 21 às 00.20h.
Boas Festas!
Caro Zedeportugal,
aguardo ansiosamente a sua "dissertação"/resposta...
Alfredo,
Não vale a pena tentar “arrevesar” aquilo que a ciência afirma, ou melhor, o que a teoria aceite de momento pela maior parte da comunidade cientifica diz, que é que o homem descende dos primatas. Parece-me que essa posição é muito cómoda para muitos teólogos porque, por um lado, permite-lhes continuar com a ideia da origem divina do homem (…“feito à Sua Imagem e Semelhança”) e, por outro lado, “abre-lhes a porta” para incluírem a Teoria Darwiniana da evolução Humana. Desta forma fogem à discussão e a terem de assumir posições “arriscadas” perante grande parte da comunidade científica, assumindo assim na perfeição a posição do famoso ditado: “se não podes com eles junta-te a eles”.
Um parêntesis. Suponha Alfredo, aqui entre nós, que eu assuma a seguinte posição (por hipótese): não coloco a questão na crença ou descrença de Deus, coloco, antes, a evidência do SER, a necessidade radical de SER… (entende o que quero dizer?), Sem SER nada seria. Há Algo que É, o seu fundamental atributo é SER. – isto para não ter de me alongar sobre essa discussão da crença num suposto Deus (resta saber que Deus nos referimos), etc., etc.
Continuando. O Alfredo (não estando obviamente aqui em causa a sua pessoa mas apenas as ideias expressas por alguém que é um padre jesuíta, um teólogo do Catolicismo Romano) diz “A forma como Deus criou o mundo e o sustenta tem sido explicada de muitos modos por filósofos e teólogos, mas nenhuma delas é convincente nem sequer necessária, além de não nos ser acessível.”
Pois para mim está aí a fonte de muitas das ambiguidades do Catolicismo Romano (para não falar de outras “crenças” religiosas). Diga-me, por favor, que não está por detrás da sua afirmação “não ser acessível” o preceito católico de “não questionar”, ou a já celebre afirmativa de que “os mistérios de Deus são insondáveis”…
Deixando o Imanisfestado, o Insondável, a Raiz-sem-raiz, fora desta questão digo o seguinte: o processo de como o Universo veio à Manifestação e evolui encontra-se explicado, sim, em muitas tradições e filosofias religiosas de grande parte dos povos do mundo. Que os teólogos (e não só…) tenham perdido “as chaves” desse simbolismo filosófico arcaico (incluindo aquele presente no Génesis) já é outra história. E, talvez por isso, por não serem inteligíveis à primeira vista, não serem “convincentes”…
O Alfredo, depois de dizer que “nenhuma delas é convincente”, remata afirmando que nem é “sequer necessária”. NÃO É NECESSÁRIA? Como assim? É justamente uma das coisas mais necessárias no momento presente, o homem aprender, conhecer, saber QUEM É, DE ONDE VEIO, e PARA ONDE VAI! Sem isso, continuaremos a caminhar às cegas, conduzidos por “cegos”, construindo uma civilização esquizofrénica, capitaneados por uma Filosofia Materialista que, lentamente, apaga toda de todos os corações a pequena chama dos Valores Espirituais.
Não vou entrar na questão de relacionar “seis dias” da (suposta) criação com os milhares de anos da evolução… porque isso é uma conversa longa demais para o momento, isto é, se não quiser gerar mal entendidos. Mas vou finalizar com o seguinte: admitindo (ao contrário da ciência reducionista) que TUDO É VIDA e CONSCIÊNCIA (em diferentes níveis), tudo evolui! Tudo… será então tão fundamental que se “crie”???
Quim
Parece-me que nunca ficará satisfeito com as respostas de Alfredo Dinis, excepto se ele escrever o que pretende (o que eu, humildemente, confesso que não entendi). Por isso retiro a minha observação de que estava desatento.
Boas Festas
Caro António Parente,
Sabe quantas oportunidades surgem para debater com membros da Igreja Católica questões pertinentes desta natureza? Que eu tenha conhecimento, pouquíssimas.
O que me leva desde já a agradecer a amabilidade e, porque não, a coragem do Alfredo Dinis em se dispor a uma agradável e cordial reflexão com outros intervenientes. Não posso também deixar de saudar vivamente a iniciativa do De Rerum Natura.
Dito isto, não se trata de eu não ficar satisfeito “excepto se ele escrever o que [eu] pretende[o]”. Vamo-nos singir às ideias. Trata-se antes de questionar, de procurar saber com mais, de tentar ir um pouco “mais longe” nas reflexões.
Paralelamente a outros comentadores, porventura mais capacitados do que eu nas “minúcias” da argumentação sobre a (própria) argumentação, procuro apenas aproveitar a oportunidade para colocar outras questões que julgo igualmente pertinentes. Talvez esta discussão “filosófica” possa, usando as suas palavras, mostrar e “ter uma função pedagógica que todos aplaudiriam”.
Esta troca de ideias não faz parte de um monólogo. Muitos outros comentadores reflectem em conjunto e, com certeza, alguns frequentadores deste Blog vão acompanhando os “diálogos”.
Acima de tudo, é o próprio Alfredo se dispõe a responder às questões, o que muito lhe agradeço. Por isso António, fique certo que aprecio a sua sinceridade. E fique descansado que quando me sentir inconveniente, desagradável ou inoportuno, “desapareço” num ápice…!
Boas Festas para si também!
Caro mp-s:
Respondo à sua questão para mim começando pela que pôs ao sr Desidério no dia 19, que é importante mas ficou incompleta.
Um célebre argumento a priori intencionando demonstrar a existência real de alguma coisa é o célebre cartesiano do cogito, apresentável no modus tollens seguinte:
Se algo não existe, então não pensa
Eu penso
Eu existo
Descartes estava ciente da fragilidade desta base única para edificação de um sistema de conhecimentos “científicos” (que era o que lhe interessava), porque ficava insulado num círculo: eu existo porque eu penso um eu que pensa que existe… Numa palavra, ele precisava de demonstrar a capacidade deste pensamento fundamentar com a mesma evidência racional do cogito uma outra qualquer existência independente do seu próprio pensamento. E foi aí que se encontrou com a ideia de Deus e o argumento a priori semelhante (mas não idêntico) ao do medieval Anselmo.
E isto traz-me à questão sobre a “definição muito estranha” que viu na Wiki. Trata-se de facto de partir de uma certa ideia que o crente pode ter de Deus, uma ideia que Anselmo julga que o não crente (enquanto ser racional) também pode pensar. Ora, se é uma ideia de Deus (obviamente, do Deus judaico-cristão), o meu caro mp-s concederá que não estamos a falar de uma pintura ou de um segmento de recta ou da Fada Morgana.
Considere o conjunto de todos os entes e proposições referíveis ao domínio que chamamos “mundo empírico”. Pergunte-se: pode a razão humana pensar “algo de maior”? Parece que sim: o conjunto ME + o conjunto dos entes e proposições que podemos ter no domínio do que podemos chamar “mundo ideal”, o das ideia e valores não empíricos, não espaciotemporais. E podemos, como é natural, perguntarmo-nos se este mundo existe e, depois, se ainda é concebível existir “algo de maior”. De facto: podemos pensar ME e MI como subconjuntos do universo, e depois pensar em outros mundos possíveis no universo das entidades possíveis (“possibilia”). Ora bem, para o crente cristão, como é natural, com a palavra “Deus” não se nomeia um ente que se possa identificar tout court com nenhuma entidade que seja parte de qualquer mundo actual ou possível de qualquer universo pensável (note que eu disse: elemento-parte). É, portanto “algo de maior” que todos os multiversos pensáveis, e mais ainda: “maior de tal maneira que nada de maior se pode pensar.” É desta ideia (e doutros pressupostos) que Anselmo parte para a demonstração de que essa ideia refere um ente que não só necessariamente deve ser pensado como existente na realidade (1ª parte da demonstração), mas que existe na realidade necessariamente, isto é, não pode ser pensado como não existente (2ª parte da demonstração).
A questão complementar que faltou ao mp-s aqui põr é a seguinte: que válido argumento a posteriori (ou empírico) pode ser capaz de demonstrar que a alguma entidade do mundo empírico (a tela do computador que está a ver, p. e.) convém necessariamente o termo “existe”/”existência”. Enquanto procura algum que não caia em petição de princípio, vá-se lembrando que um Descartes dizia ser mais fácil e mais convincente demonstrar a existência de Deus do que de qualquer outra coisa…
Caro Desidério,
Não consegui ler os comentários todos, mas gostaria de lhe dar os parabéns pela clareza dos seus textos e pela excelente discussão. Embora eu seja até muito pouco crente, gosto de ler a Bíblia. De cor refiro a carta de S. Paulo "ora, a Fé é a prova das coisas que não podemos ver", ou ainda o caso do condenado que pede para aparecer aos seus familiares para os avisar dos perigos que corriam, ao qual Cristo diz que se eles não acreditaram nos profetas, porque iriam acreditar nele. A Fé é a prova do que não se vê, as demonstrações extraordinárias para as coisas extraordinárias não são suficientes! Quem puder, pode mergulhar na profundidade destes textos e ler toda a riqueza dos argumentos. E depois temos a Imitação de Cristo. Não sei porque ainda não me converti! Deve ser pela dureza do meu coração...
Desidério,
quem lhe disse que o Budismo é uma religião (ou filosofia religiosa) que não aceita a existência de divindades?
O Budismo aceita SIM, em especial o Budismo Mahayana, a existência de Seres (Inteligências) de Elevada Consciência e Sabedoria (Divindades: Bodhisatvas, Budas, Dhyani-Bhudas, etc...), muito superiores à consciênciao ser humano actual.
Claro que o problema que aqui se coloca é que a ciência "oficial" e reducionista não sabe ainda o que é a consciência e não admite que possam existir outros níveis/estados de consciência...
O que o Budismo não aceita é o absurdo de um Deus criador -- posição aliás partilhada por outras filosofias religiosas e místicas!
Esta discussão arrasta-se há séculos, e provavelmente continuará por muitos e bons anos... pelo menos enquanto houver seres humanos. Acredito num Deus criador sem que necessite de provas para isso. Aliás, se baseasse a minha crença em provas 'científicas', deixaria de se tratar de uma questão de fé. Também não penso que sejam os ateus a ter de provar que Deus não existe. No entanto, creio que até o Desidério admitirá que nunca o homem conseguirá desvendar todos os segredos do universo. Há coisas que, pura e simplesmente, escapam à nossa compreensão, porque somos todos humanos. Com todo o respeito que os filósofos como o Desidério me merecem, tenho a certeza que sei tanto como eles sobre a origem da Vida: zero. Para finalizar, tendo em conta que sempre teremos crentes e não crentes, julgo que o melhor a fazer é simplesmente aprender a viver uns com os outros, respeitando a liberdade de consciência de cada um. Quem quiser, que acredite. Quem não quiser, que não acredite. Mas por favor poupem-nos a proselitismos e a posturas radicais e intolerantes. Ninguém é dono da verdade, nem mesmo os Dawkins deste mundo.
Esta discussão arrasta-se há séculos, e provavelmente continuará por muitos e bons anos... pelo menos enquanto houver seres humanos. Acredito num Deus criador sem que necessite de provas para isso. Aliás, se baseasse a minha crença em provas 'científicas', deixaria de se tratar de uma questão de fé. Também não penso que sejam os ateus a ter de provar que Deus não existe. No entanto, creio que até o Desidério admitirá que nunca o homem conseguirá desvendar todos os segredos do universo. Há coisas que, pura e simplesmente, escapam à nossa compreensão, porque somos todos humanos. Com todo o respeito que os filósofos como o Desidério me merecem, tenho a certeza que sei tanto como eles sobre a origem da Vida: zero. Para finalizar, tendo em conta que sempre teremos crentes e não crentes, julgo que o melhor a fazer é simplesmente aprender a viver uns com os outros, respeitando a liberdade de consciência de cada um. Quem quiser, que acredite. Quem não quiser, que não acredite. Mas por favor poupem-nos a proselitismos e a posturas radicais e intolerantes. Ninguém é dono da verdade, nem mesmo os Dawkins deste mundo.
"Todas as emoções religiosas da generalidade dos crentes são ilusórias, dado que Deus não pode ser o objecto de tais emoções."
Não há emoções ilusórias.
As emoções são respostas estritamente biofisiológicas e bioquímicas, com implicações cognitivas e comportamentais.
Ou existem emoções ou não existem. Mais nada.
As emoções podem ser caracterizadas, observadas, analisadas e avaliado o seu nível de intensidade. Podemos até determinar as suas compormentes bioquímicas individuais.
Nada há de ilusório numa emoção.
As emoções humanas e animais básicas como o prazer, a alegria, a tristeza, o medo, a raiva, a hostilidade podem ser induzidas or um conjunto complexo de estímulos.
Nenhum desses estímulos é "ilusório", nem mesmo em termos de patologia psiquiátrica.
SE há uma resposta emocional é porque esse estímulo existe.Mesmo que intrapsíquico.
"""Deus existe e revelou-se ao longo da história da humanidade. """ <---- Frase simples, mas pq sera que nao convence?
Deus revelou-se como? Qual dos milhares de deuses? Decerto que foi o deus da pessoa que fez essa afirmacao. Claro.
Se um único ser celestial todo poderoso realmente existisse, sem dúvida que ele apareceria e provaria definitivamente a sua existência. Sem códigos, sem metáforas, sem mensagens escondidas, sem escolhidos, sem textos sujeitos a milhares de interpretações diferentes. Por que esse ser nunca apareceu para toda a humanidade definitivamente? Bastaria aparecer e ditar suas regras, simples assim. Não existiriam mais ateus e todos seguiriam uma só divindade. Não haveria mais guerras, pois as regras seriam as mesmas. Por que isso não acontece? das duas uma, ou esse ser existe e é um sádico ou não existe. Você escolhe.
Com o perdao da expressao....mas... por seculos eh essa mesma punheta mistica, cada um impondo sua ilusao clestial ao outro.
Vamos esquecer isso definitivamente minha gente. Esquecam essa Estoria de deuses.
Chega.
Desculpe entrar como anonimo.
Nao quero me envolver com malucos, so isso.
Abracos.
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