Já todos apreciámos magníficas fotos ou filmes (recordo um recente na National Geographic) com grandes planos de insectos que andam na superfície da água como se esta tivesse uma «pele» elástica. Esta «pele» na realidade é (mais) uma das propriedades anómalas apresentada pela água: a sua elevada tensão superficial de que já falei a propósito dos vulcões de Mentos e Coca-Cola.
A tensão superficial resulta do desequilíbrio das forças intermoleculares estabelecidas pelas moléculas na superfície do líquido. Assim, a tensão superficial é uma medida da intensidade das forças intermoleculares mas reflecte muito fortemente as dimensões da molécula, nomeadamente a área que esta ocupa na interface líquido-gás, a sua área superficial.
Para além da «pele», a tensão superficial, que se pode medir calculando o trabalho necessário para aumentar a superfície de um dado líquido, explica fenómenos como a capilaridade, a forma das gotas desse líquido e outra propriedade muito importante a que chamamos molhabilidade.
Assim, quanto menor a tensão superficial de um líquido maior é a sua molhabilidade ou a facilidade com que se espalha. As implicações deste fenómeno são várias, não só em muitas situações industriais - processos de fermentação, formação de gelo em alimentos congelados, estabilidade de emulsões e espumas, etc. -, como em muitas situações biológicas, por exemplo a nível dos pulmões. Neste exemplo, os pulmões recorrem a surfactantes pulmonares, os fosfolipídos, que baixam a tensão superficial da água nas paredes dos alvéolos e facilitam a difusão do oxigénio.
Os hidrocarbonetos, especialmente os de baixo peso molecular como os constituintes da gasolina, apresentam tensões superficiais muito baixas o que faz com que se espalhem facilmente. E se a Natureza é fértil em soluções hidrofóbicas (que repelem a água) - como as que recobrem as penas de aves e impedem que estas sejam molhadas pela água - não produziu materiais oleofóbicos que, por exemplo, ajudem a minorar as consequências de derrames como o do Prestige ou o mais recente no MarNegro.
Na revista Science de 7 de Dezembro, são apresentados no artigo «Designing Superoleophobic Surfaces» os primeiros materiais oleofóbicos, desenhados por cientistas do MIT. Na figura seguinte, é representada uma folha de lótus em contacto com água (a azul) e octano (a vermelho) antes (imagens superiores) e depois de revestida com um destes materiais.
A equipa do MIT resolveu o problema da baixa tensão superficial dos hidrocarbonetos desenhando um material compósito, microfibras que essencialmente «almofadam» gotas destes líquidos e impedem que estas se espalhem na superfície do material.
As microfibras são uma mistura de polímeros vulgares e moléculas denominadas fluoroPOSS - POSS, polyhedral oligomeric silsesquioxanes, ou seja, silsesquioxanos poliédricos oligoméricos, compostos de silício que têm gerado muito interesse nos últimos tempos pelas suas potencialidades no desenho de compósitos híbridos orgânicos-inorgânicos para aplicações em electrónica e fotónica, entre outras. Os silsesquioxanos, igualmente denominados esferosiloxanos por apresentarem estruturas poliédricas/cúbicas que são topologicamente equivalentes a uma esfera, exibem uma energia de superfície extremamente baixa.
Os compósitos desenvolvidos pelo MIT podem ser depositados em praticamente todas as superfícies, incluindo metal, vidro, plástico e mesmo superfícies biológicas como sejam as folhas de plantas. Ajustando os parâmetros de que dependem as propriedades destes materiais, os cientistas podem desenhar fibras que repelem diferentes tipos de hidrocarbonetos, e conseguiram mesmo produzir um material que permite a separação de água e octano (jet fuel).
A Força Aérea norte-americana, que financiou o projecto, está interessada em utilizar estes materiais para proteger do combustível os componentes de aviões e foguetões que podem sofrer danos estruturais depois de embebidos em hidrocarbonetos mas diria que as suas aplicações possíveis não se esgotam na oleofobicidade, como é exemplo o filtro de jet fuel representado.
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3 comentários:
a ciencia não pára... e ainda bem!
Aquilo que eu já sabia é que a rugosidade de uma superfície afecta a curvatura de uma gota depositada nessa superfície, mas nunca aprofundei, imagino que tenha algo que ver com as tais fibras, não sei!
luis
Já me tinha interrogado por que razão as aves marinhas ficam completamente encharcadas com os derrames dos petroleiros, chegando, pelo que me dizem, a morrer de frio, quando são tão impermeáveis à água (descontando alguns casos particulares, como os corvos-marinhos). Bom, fiquei a saber... Obrigado. :)
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