domingo, 15 de novembro de 2009

O dever de educar e de ensinar -1

Em Maio de 2009, uma vez terminado o ciclo de conferências O dever de educar que teve lugar na Livraria Minerva, em Coimbra, Rita Penedos Duarte, jornalista da revista Gingko, pediu-me um depoimento para realizar um trabalho intitulado Aprender a ensinar, que saiu no número deste mês. Reproduzo no De Rerum, em dois posts sequenciais, o essencial do diálogo que, na altura, tivemos.

P - Está na organização das conferências O dever de educar. Porque sentiram necessidade de criar este espaço de discussão?

R- A MinervaCoimbra Editora tem proporcionado na sua livraria, desde há mais de dez anos, um espaço de tertúlia que se designa por Terças-Feiras de Minerva.

Neste espaço têm sido realizados vários ciclos de conferências: de arte clássica, de música, de literatura, etc. As conferências a que se refere, surgem nesse quadro e decorreram de um desafio que há muito tempo a Isabel Garcia, a quem a editora pertence, me havia lançado para que nelas se falasse de aspectos menos convencionais da educação. Penso que esse desafio decorreu das muitas conversas que, ao longo dos anos, temos tido sobre o assunto.

Respondendo, em concreto, à sua pergunta: em torno da educação gravitam muitas ideias, algumas delas contraditórias, não sendo difícil encontrar dogmas. Ora, se seguirmos uma linha científica de pensamento, como na educação se deve seguir, não nos devemos conformar com isso, devemos explorar as ideias, no sentido de tentar perceber quais são os seus fundamentos e qual é a sua validade, onde é que elas nos conduziram e onde nos conduzirão. O espaço da livraria abriu-se a esse desafio, que é o de conversar sem outros constrangimentos que não sejam o do saber e da liberdade de pensar. Por outro lado, achámos que é preciso fazer alguma coisa para chamar as pessoas comuns a essa conversa, pois nos parece que o discurso pedagógico é visto (ou é mesmo) como muito académico, pouco compreensível e ainda menos realista.

P- Mas, nessas conferências os convidados não são apenas especialistas em pedagogia, há pessoas de diversos quadrantes…

R- A educação, mesmo a educação escolar, que é aquela que mais nos interessa, é da responsabilidade de todos e não só, nem principalmente, dos pedagogos e dos políticos, pelo que aqueles que tiverem uma real preocupação com a educação, que pensem sobre ela, que a estudem, que estejam, enfim, empenhadas na tarefa de educar, devem poder dar a sua opinião. É nesta lógica que temos tido entre os convidados filósofos, professores, alunos, jornalistas, músicos, investigadores das clássicas, da matemática, da ciências físicas e naturais, da psicologia, e, claro, também da pedagogia…

P- Qual é, então, o actual dever de educar? É o mesmo que ensinar?

R- Quando escolhemos o título do ciclo vacilámos entre o dever de educar e o dever de ensinar, sendo que tudo nos fazia pender para este último, pois o que pretendíamos era situar-nos na educação formal, da responsabilidade da Escola, e que os professores concretizam. Acabámos por optar pelo dever de educar, cujo sentido é mais amplo, pois percebemos que as conversas iriam “transbordar” da Escola para a sociedade e para as relações que se estabelecem entre ambas, assunto a que, aliás, já dedicámos duas sessão, uma O dever de educar com ou contra a sociedade – em que tivemos como convidado Carlos de Sousa Reis – e outra - Escola igualdade e diferença - em que o convidado foi Joaquim Pires Valentim.

Quanto à sua interrogação: o actual dever de educar não difere muito do dever de educar de outros tempos, nomeadamente na Antiguidade e na Idade Média, conforme deixaram perceber as intervenções de Delfim Leão e de Margarida Miranda, ambos classicistas. Aqui remeto para a intervenção que João Boavida fez na sessão de abertura. Temos, de facto, o dever de educar, e temos de assumir esse dever explicitamente, sem complexos, sem culpabilidade. A ideia de que as crianças e os jovens se podem desenvolver naturalmente, auto-orientando-se, porque têm em si os impulsos e as condições para o conseguir, e de que os educadores não devem intervir porque é sempre um processo de coacção e de prejuízo, é uma ideia romântica que está errada.

As crianças e os jovens devem ser educados no sentido da responsabilidade e da liberdade, mas isso implica ensinamentos e formas de controlo que a escola e a sociedade têm obrigação de fornecer. Esta mesma ideia foi debatida no plano do desenvolvimento cognitivo pelas psicólogas Salomé de Pinho, Isabel Festas e Paula Paixão, quando apresentaram dados concretos sobre a importância da estimulação nos processos de memória, de compreensão e de motivação. O mesmo sublinhou Manuel Rocha, músico e professor, em relação ao ensino da Música. E foi também a opinião de Regina Rocha e de Alexandra Azevedo, que falaram na qualidade de professoras, de Francisco Sobral Henriques, que falou como director de uma escola, e de Rui Marques Veloso, que falou como formador de professores. Digamos que esta é uma ideia em relação à qual todos os convidados estiveram de acordo.

Imagem: Manuel Rocha, professor e músico, um dos convidados do ciclo O dever de educar.

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A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...