quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

JÚLIO HENRIQUES SOBRE A ORIGEM DO HOMEM, 1866

Em 1866, no ano seguinte ao da sua tese doutoral, Júlio Henriques submete-se a provas para concurso para professor da Faculdade de Philosophia da Universidade de Coimbra com uma dissertação intitulada "Antiguidade do Homem". Esse pequeno volume saído do prelo da Imprensa da Universidade (30 páginas mais uma estampa) está "on-line" na Biblioteca Digital de Botânica da Universidade de Coimbra. Vale a pena transcrever um excerto, conservando a grafia da época:
"(...) Dizer isto é mostrar evidentemente que não acha fóra da razão a origem que dão ao homem os que partilham as idêas de Lamarck e Darwin.

Futuras descobertas virão talvez mostrar que a theoria da transformação, que tão conforme é ao plano geral da organisação dos seres vivos e dos factos paleontológicos, é apllicavel á origem humana - contra o que hoje é fortemente defendido pelas crenças religiosas e por grande parte dos homens de sciencia.

O que hoje é porem incontestável é que os unicos restos humanos, que contam alta antiguidade, em vez de nos mostrarem o homem d'esse tempo gigante, intelligente, capaz de dominar o mundo, querendo mesmo derrubar o poder do céo, nol'o apresentam pequeno, e com caracteres osteologicos unicamente semelhantes aos das raças mais inferiores que hoje se encontram na superficie da terra.

(...) Nenhum acontecimento notável, nenhuma circunstância extraordinaria acompanho a apparição do homem. Ja a maior parte da flora actual existia, bem como muitos dos animaes, que hoje se conhecem. Não foi necessaria nenhuma d' essas grandes revoluções, que a geologia imagina. No decorrer do tempo, num momento da vida na terra, appareceu elle como milhares de seres que o tinham precedido, para talvez desapparecer, como desappareceram muitos animaes seus contemporaneos nos primeiros tempos, e como muitos que hoje vão desapparecendo.

As leis organicas, immutaveis como as que regem os movimentos dos astros, devem dar origem a phenomenos identicos em quanto durarem. Se o homem tem de ser ainda na terra substituído por algum outro ser mais perfeito, se ao soberbo cedro do Libano e aos brilhantes vegetaes, que vivem com suas formas variadas e muitas vezes exquisitas, lá aonde o sol ardente derrama immensa luz, devem succeder outras formas, organismos diversos, o que é perfeitamente conforme á razão, não ha-de ser nenhuma causa extraordinaria, que ha de produzir semelhantes effeitos. Á vida de hoje não succederá a destruição universal, para que sobre suas ruinas a nova geração possa encontrar elementos de prosperidade.

Para estas modificações são sufficientes as causas que hoje se observam. As actuaes e lentas modificações dos continentes alteram os climas, e estes as formas organicas, como noutras eras poderia succeder com intensidade diversa, sem contudo a vida deixar um só momento de existir, desde que as leis que a regulam foram estabelecidas pelo creador de todas as cousas.

Assim como na Dinamarca ao Pinus silvestris succedeu o carvalho anão, a este o Quercus robur, e a este a faia; assim como ao urso das cavernas succederam, já talvez ao tempo do homem, as especies d'ursos que ainda vivem, ao mammouth o elephante, e ás especies da epocha quaternaria - assim as futuras gerações se succederão no decorrer dos seculos, sem interrupção, mas com a imponente regularidade com que se executam os movimentos d' esses milhares de mundos, entre os quaes a terra é nada."
O candidato foi aprovado. Lembre-se que o livro de Charles Darwin "The Origin of Species", de 1859, não falava sobre a origem do homem. Este é o tema central de "The Descent of Man" que teve primeira edição no ano de 1871.

2 comentários:

Anónimo disse...

Júlio Henriques

"(...) Dizer isto é mostrar evidentemente que não acha fóra da razão a origem que dão ao homem os que partilham as idêas de Lamarck e Darwin."

Ambos hoje consabidamente errados. As características adquiridas não são transmitidas aos descendentes, como pensava Lamarck.

A selecção natural não cria informação genética nova, codificadora de estruturas e funções inovadoras e mais complexas, como pensava Darwin.

Hoje sabe-se que as mutações ocorrem no genotipo, degradando a informação genética, ao passo que a selecção natural opera ao nível do fenotipo, diminuindo a informação genética.



"Futuras descobertas virão talvez mostrar que a theoria da transformação, que tão conforme é ao plano geral da organisação dos seres vivos e dos factos paleontológicos, é apllicavel á origem humana - contra o que hoje é fortemente defendido pelas crenças religiosas e por grande parte dos homens de sciencia."

A verdade é que as teorias actuais mostram que o genoma é essencialmente informação codificada e que não existe informação codificada sem origem inteligente. Pelo menos, não se conhece caso algum em que isso aconteça.

Assim, é possível ver que as mutações aleatórias introduzem ruído na informação pré-existente, assim se compreendendo que sejam na sua esmagadora maioria deletérias, provocando doenças e a morte.

Quanto aos dados paleontológicos, eles continuam a não apresentar evidência de evolução gradual, exactamente como sucedia no tempo de Darwin.

"O que hoje é porem incontestável é que os unicos restos humanos, que contam alta antiguidade,"

Essa idade era estimada a partir da aceitação das premissas uniformitaristas de James Hutton e Charles Lyell, hoje em vias de superação.

"...em vez de nos mostrarem o homem d'esse tempo gigante, intelligente, capaz de dominar o mundo, querendo mesmo derrubar o poder do céo, nol'o apresentam pequeno, e com caracteres osteologicos unicamente semelhantes aos das raças mais inferiores que hoje se encontram na superficie da terra."

É errado. Os seres humanos da antiguidade histórica construíam pirâmides e calendários astronómicos sofisticados.

Os fragmentos que se pensava serem de seres humanos inferiores eram, afinal, fragmentos de macacos interpretados de acordo com a teoria da evolução.


"(...) Nenhum acontecimento notável, nenhuma circunstância extraordinaria acompanho a apparição do homem. "

Isso é pura interpretação evolucionista, que não explica a origem da quantidade inabarcável de informação codificada que se encontra na dúpla hélice no núcleo da célula, então totalmente desconhecida.

"Ja a maior parte da flora actual existia, bem como muitos dos animaes, que hoje se conhecem."

Continua a pura interpretação a partir de premissas naturalistas, evolucionistas e uniformitaristas.

O naturalismo é desmentido pela existência de informação codificada no genoma.

O evolucionismo é desmentido pela inexistência de evidência de evolução no registo fóssil.

O uniformitarismo é desmentido pela abundância crescente de evidência de catastrofismo na natureza.

"Não foi necessaria nenhuma d' essas grandes revoluções, que a geologia imagina."

Tenta-se aqui afastar o catastrofismo em favor do uniformitarismo. Hoje a tendência é exactamente no sentido contrário.


"No decorrer do tempo, num momento da vida na terra, appareceu elle como milhares de seres que o tinham precedido, para talvez desapparecer, como desappareceram muitos animaes seus contemporaneos nos primeiros tempos, e como muitos que hoje vão desapparecendo."

O problema é que isso é mera reconstituição imaginativa da história, a partir de premissas naturalistas, evolucionistas e uniformitaristas, as quais não apenas não são demonstráveis, como se sabe que podem ser refutadas com argumentos convincentes.

!As leis organicas, immutaveis como as que regem os movimentos dos astros, devem dar origem a phenomenos identicos em quanto durarem."

Assume-se aqui uma visão naturalista e uniformitaristas, que afasta a criação a priori, embora não explique quem e como estabeleceu essas leis orgânicas e as demais leis imutáveis.

A verdade é esta: Deus estabeleceu essas leis. Os cientistas limitam-se a descobri-las e formulá-las.

Os planetas já se moviam em órbitas definidas antes de Kepler e Newwton. Estes apenas se limitaram a estudar e a formular as leis que os regem.

Newton reconhecia que ao fazer isso se limitava a tentar pensar os pensamentos de Deus depois de Deus.


"Se o homem tem de ser ainda na terra substituído por algum outro ser mais perfeito, se ao soberbo cedro do Libano e aos brilhantes vegetaes, que vivem com suas formas variadas e muitas vezes exquisitas, lá aonde o sol ardente derrama immensa luz, devem succeder outras formas, organismos diversos, o que é perfeitamente conforme á razão, não ha-de ser nenhuma causa extraordinaria, que ha de produzir semelhantes effeitos."

Trata-se apenas de poesia e imaginação fértil. Infelizmente, o ser humano do século XXI não olha para o futuro com tanto optimismo.

Acresce que quando olhamos para os genomas, vemos que eles tendem a deteriorar-se com o tempo e não a melhorar em quantidade e qualidade.

As mutações são cumulativas e degenerativas, sendo que a selecção natural não consegue travar o processo de degenerescência, porque opera a nível do fenotipo e não do genotipo.

Daí que a tendência efectivamente observável seja a da diminuição e da degradação dos genomas e não o contrário.

"Á vida de hoje não succederá a destruição universal, para que sobre suas ruinas a nova geração possa encontrar elementos de prosperidade."

Aí já está a extrapolar para o futuro, num registo de omnisciência.

Na verdade, é disso que se trata. Pessoas na nossa era procuram interpretar o presente, extrapolar para o passado e extrapolar para o futuro, com base nas suas visões do mundo.

Os criacionistas fazem isso mesmos, mas apoiados na sua fé de que o registo bíblico é aquele que melhor permite compreender o presente, conhecer o passado e prever o futuro.

Jesus disse: Eu sou o Alfa e o Ómega, o Princípio e o Fim, o Primeiro e o Derradeiro.





Para estas modificações são sufficientes as causas que hoje se observam. As actuaes e lentas modificações dos continentes alteram os climas, e estes as formas organicas, como noutras eras poderia succeder com intensidade diversa, sem contudo a vida deixar um só momento de existir, desde que as leis que a regulam foram estabelecidas pelo creador de todas as cousas.

Assim como na Dinamarca ao Pinus silvestris succedeu o carvalho anão, a este o Quercus robur, e a este a faia; assim como ao urso das cavernas succederam, já talvez ao tempo do homem, as especies d'ursos que ainda vivem, ao mammouth o elephante, e ás especies da epocha quaternaria - assim as futuras gerações se succederão no decorrer dos seculos, sem interrupção, mas com a imponente regularidade com que se executam os movimentos d' esses milhares de mundos, entre os quaes a terra é nada."

Anónimo disse...

"Para estas modificações são sufficientes as causas que hoje se observam."

As modificações acontecem. O meu carro também vai enferrujando.

"As actuaes e lentas modificações dos continentes alteram os climas, e estes as formas organicas, como noutras eras poderia succeder com intensidade diversa, sem contudo a vida deixar um só momento de existir, desde que as leis que a regulam foram estabelecidas pelo creador de todas as cousas."

As diferentes famílias têm grande variedade genética, que vai obtendo expressão de acordo com as pressões ambientais. No entanto, em todo o processo apenas se usa informação genética pré-existente.

"Assim como na Dinamarca ao Pinus silvestris succedeu o carvalho anão, a este o Quercus robur, e a este a faia; assim como ao urso das cavernas succederam, já talvez ao tempo do homem, as especies d'ursos que ainda vivem, ao mammouth o elephante, e ás especies da epocha quaternaria - assim as futuras gerações se succederão no decorrer dos seculos, sem interrupção, mas com a imponente regularidade com que se executam os movimentos d' esses milhares de mundos, entre os quaes a terra é nada."

A ideia de que as espécies se extinguem para dar lugar a outras não faz sentido em termos gerais.

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