Post convidado de João Boavida sobre a recente publicação dos resultados da avaliação dos centros de investigação empreendida pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
Avaliação e resultados que tem levantado, na comunidade científica portuguesa, várias questões inquietantes que merecem uma discussão alargada.
A avaliação dos centros de investigação pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, por painéis de professores estrangeiros, virá por certo dar um empurrão à ciência em Portugal e tornar mais dinâmicas e competitivas as universidades e os centros de investigação. Os avaliadores estrangeiros têm bitolas internacionais, estão livres dos vícios da nossa cultura, não têm amigos nem inimigos e, portanto, podem dar-nos uma imagem do que valemos e apontar caminhos de recuperação e desenvolvimento. De acordo.
A avaliação dos centros de investigação pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, por painéis de professores estrangeiros, virá por certo dar um empurrão à ciência em Portugal e tornar mais dinâmicas e competitivas as universidades e os centros de investigação. Os avaliadores estrangeiros têm bitolas internacionais, estão livres dos vícios da nossa cultura, não têm amigos nem inimigos e, portanto, podem dar-nos uma imagem do que valemos e apontar caminhos de recuperação e desenvolvimento. De acordo.
É bom notar, contudo, que avaliar bem requer considerar muitos aspectos e ponderar muitas circunstâncias e, portanto, reduzir tudo a alguns parâmetros soberanos, além de errado pode ter efeitos perversos. E, sendo assim, ao lado desta perspectiva politicamente correcta, pode pensar-se num processo previamente definido para dar uns certos resultados. E a partir daí financiar uns centros, não financiar outros, de modo a que, dentro de alguns anos, haja uma hierarquia de universidades e de centros de investigação que irão corresponder à ideia que o Ministro programou. Por razões dele. É fácil assim criar grandes centros, aqueles de que nós gostamos, ou das áreas que preferimos, ou das cidades da nossa afeição, e acabar com outros, aqueles de que nós não gostamos. A partir de certos critérios facilmente se obterão resultados objectivos ao serviço de intenções subjectivas.
Não quer dizer que não haja bons e maus centros, bem como bons e maus investigadores, e que os bons não devam ser mais apoiados. É, por certo, a obrigação do Governo. Mas é evidente que ao definir critérios que não têm em conta certas realidades em que as instituições se integram e dentro da qual evoluíram, nem as especificidades das áreas, nem a mudança de paradigmas a que foram obrigadas, os resultados serão menos justos.
Por exemplo, um centro que vive à base da investigação de professores sobrecarregados com actividades lectivas não pode competir com outro que dispõe de investigadores a tempo inteiro, mesmo que estes sejam, como investigadores e cientistas, inferiores àqueles. Se uma Faculdade tem uma ou duas revistas científicas que vivem de muito do que seus membros investigam e estudam, não poderá mantê-las se tudo isso deixar de contar para as avaliações, seja qual for a qualidade dos trabalhos lá publicados.
Há pois uma ideia que merece análise pelas suas implicações. É sabido que o inglês se transformou na língua universal e no veículo por excelência da investigação e da divulgação científicas. Mas competirá a um ministro português tornar-se num combatente militante e implacável deste processo já de si tão avassalador? Isto é, deverá ele estabelecer critérios de avaliação onde os artigos publicados em língua francesa, ou alemã, ou espanhola, ou italiana, ou portuguesa não tenham peso para a avaliação, mesmo que publicados em boas e exigentes revistas?
Será que é só na literatura que a língua portuguesa tem obrigação de se afirmar e necessita de ser defendida e valorizada? E que os países não precisam de utilizar a sua língua como instrumento de construção científica, de pensamento, de debate e de divulgação? A médio prazo esta posição não leva a uma menorização fatal para a nossa língua? Será que as grandes línguas da cultura europeia (salvo o inglês pelo efeito americano) estão, por este processo, condenadas a definhar e a morrer?
E, aqui para nós, não estaremos perante uma forma de provincianismo?
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2 comentários:
"A partir de certos critérios facilmente se obterão resultados objectivos ao serviço de intenções subjectivas."
É verdade. Mas dá o post uma alternativa? Refere o post, para além do problema das publicações em não-inglês e o facto de docentes terem de fazer investigação, as tais as tais intenções subjectivas?
Quanto a: "Por exemplo, um centro que vive à base da investigação de professores sobrecarregados com actividades lectivas não pode competir com outro que dispõe de investigadores a tempo inteiro, mesmo que estes sejam, como investigadores e cientistas, inferiores àqueles."
Portugal sofre do problema de a carreira de investigação ter sido dizimada a certo ponto no tempo e se ter passado para uma política de "se queres investigar tens que ensinar na universidade".
Não sei como se pode fazer agora a transição de volta a um modelo onde há centros que apenas fazem investigação e outros que apenas leccionam. Claramente continuará a haver sobreposição, visto que as universidades têm a matéria-prima, viz. os estudantes.
Seja de que maneira for, o post queixa-se e não propõe alterações concretas aos critérios de avaliação e insinua que os investigadores a tempo inteiro só porque o são a tempo inteiro é que acabam avaliados em primeiro lugar...
Não haja medo, centros de investigação sem estudantes acabam por se extinguir.
E quanto
Não discuto o tema principal, por não estar por dentro do assunto.
Apenas manifesto a minha indignação pelo facto absurdo de se eleger oficialmente o Inglês como veículo único de expressão científica. É lamentável e inaceitável.
Como se diz mais acima, mais vale ser um Sócrates (ou qualquer outro Filósofo, "soi disant" Homem cultivado) instisfeito do que ser um porco (ou qualquer outro animal, "soi disant" cavalgadura) satisfeito.
Por outras palavras, e em linguagem comum e não científica, diria que, para Portugal e os portugueses, ou seja, para o Estado português, mais vale ter pior investigação, mas decifrável na nossa Língua, do que melhor investigação condicionada à utilização de uma língua estrangeira.
E isto é uma questão cultural, não científica, mas o Estado não deve ter competências científicas, mas outrossim culturais, porque decisivas para a identidade de um Povo!
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