domingo, 11 de janeiro de 2009

Brincadeira ou Delito?

Opinião de Ricardo Araújo Pereira na Visão sobre o caso do assalto à professora com pistola de plástico:

Julgo que a opinião da directora da DREN, Margarida Moreira, segundo a qual a ameaça a uma professora com uma arma de plástico foi uma brincadeira de mau gosto, é uma brincadeira de mau gosto. Mais uma vez se prova que a crítica de cinema é extremamente subjectiva. Eu também vi o filme no YouTube e não dei pela brincadeira de mau gosto. Vi dois ou três encapuzados rodearem uma professora e, enquanto um ergue os punhos e saltita junto dela, imitando um pugilista em combate, outro aponta-lhe uma arma e pergunta: «E agora, vai dar-me positiva ou não?» Na qualidade de apreciador de brincadeiras de mau gosto, fiquei bastante desapontado por não ter detectado esta antes da ajuda de Margarida Moreira.

Vejo-me então forçado a dizer, em defesa das brincadeiras de mau gosto, que, no meu entendimento, as brincadeiras de mau gosto têm duas características encantadoras: primeiro, são brincadeiras; segundo, são de mau gosto. Brincar é saudável, e o mau gosto tem sido muito subvalorizado. No entanto, aquilo que o filme captado na escola do Cerco mostra aproxima-se mais do crime do que da brincadeira. E os crimes, pensava eu, não são de bom-gosto nem de mau gosto. Para mim, estavam um pouco para além disso – o que é, aliás, uma das características encantadoras dos crimes. Se, como diz Margarida Moreira, o que se vê no vídeo se enquadra no âmbito da brincadeira de mau gosto, creio que acaba de se abrir todo um novo domínio de actividade para milhares de brincalhões que, até hoje, estavam convencidos, tal como eu, que o resultado de uma brincadeira é ligeiramente diferente do efeito que puxar de uma arma, mesmo falsa, no Bairro do Cerco, produz.

O mais interessante é que Margarida Moreira, a mesma que agora vê uma brincadeira de mau gosto no que mais parece ser um delito, é a mesma que viu um delito no que mais parecia ser uma brincadeira de mau gosto. Trata-se da mesma directora que suspendeu o professor Fernando Charrua por, numa conversa privada, ele ter feito um comentário desagradável, ou até insultuoso, sobre o primeiro-ministro. Ora, eu não me dou com ninguém que tenha apontado uma arma de plástico a um professor, mas quase toda a gente que conheço já fez comentários desagradáveis, ou até insultuosos, sobre o primeiro-ministro. Se os primeiros são os brincalhões e os segundos os delinquentes, está claro que preciso de arranjar urgentemente novos amigos.

12 comentários:

cmendes disse...

Na mouche!

Anónimo disse...

KAPOW !

João Silva disse...

Consideremos a seguinte situação:

"Num escritório, os funcionários juntam-se para pregar uma partida ao patrão, apontando-lhe uma arma falsa."
Terá o comportamento dos funcionários constituído um delito?
A maioria das pessoas responderá que não. Muitas vezes tais coisas se sucedem em empresas, por exemplo, e ninguém se importa. Não estou a dizer que estas atitudes sejam boas ou más, estou apenas a dizer que elas não são tomadas como constituindo delitos.

A situação nas escolas é bastante semelhante. Falo por experiência própria quando digo que em muitos casos o professor é visto não tanto como um mestre, mas como um capitão de equipa. Assim, tais coisas se propiciam. Estou apenas a constatar um facto.

Assim, a relação aluno/professor torna-se semelhante à de aluno/patrão. Não há o respeito necessário, originando-se excessos.

Analogamente, porque não consideramos os actos dos empregados brincalhões como crimes, também não devemos punir criminalmente os alunos brincalhões. Eles são apenas parte integrante de um clima na sala de aula que propicia este tipo de situções e que eles não provocaram totalmente.

Deverá este clima e esta relação aluno/professor existir? NÃO!Mas isso já é outra questão!

Deverão os jovens ser julgados por um acto sem o seu necessário enquadramento, sendo meros bodes expiatórios? Não!

Vanks Estevão disse...

Olá, vim convidar o De Rerum Natura para participar da blogagem coletiva, 2009 Ano Internacional da Astronomia que iniciei no blog Efeito Joule, um blog de ciência brasileiro.

o link para a blogagem é:

http://www.efeitojoule.com/2009/01/coletiva-ano-internacional-astronomia.html

Abraços,

Joe Rod disse...

A escola não ensina a diferença entre arremessar ovos, brandir armas de plástico e insultar o primeiro-ministro. Muito provavelmente porque algumas coisas são engraçadas (os ovos e os insultos) e outras são perigosas (as armas de plástico). Se as armas de plástico dispararem ovos e em vez de "pum", fizerem "Filho da p*ta", o pessoal já gargalha. É um direito que lhes assiste. Mas que baralha os discentes e o RAP. Sim, está a começar a chegar a hora de além de novos amigos, arranjar novos espectadores... Mas isto sou eu, que fui pouco à escola e não consigo achar graça a nada que dá para fazer humor com as escolas. E vai daí, não gargalho. Ou gargalho? Se calhar devia.

Humilde Canalizador disse...

O Joe Rod certamente engole as imbecilidades de Emídio Rangel e outros lacaios do Poder. Quando, onde, como, é que os professores mandaram os alunos atirar ovos à Ministra ou a quem quer que fosse?

É esse tipo de insinuações e calúnias que este Governo tem atirado para cima dos docentes desde que tomou posse. Descredibilizando os docentes, este Governo visa:

a) fazer experimentalismo no calcar de uma profissão, para passar para as seguintes (enfermeiros, polícias, médicos, juízes, etc.).

b) destruir o ensino público e favorecer o privado, dos compinchas.

c) poupar umas coroas, estrangulando a progressão.

d) intimidar, impor a lei da rolha, meter directores cor-de-rosa nas escolas.

Este Governo destruiu a gestão democrática das escolas, abriu as portas à violência impune, armazanou crianças com deficiências no ensino regular, promoveu sucesso artificial, fez campanha eleitoral com palermices do tipo magalhães e novas oportunidades.

Humilde Canalizador disse...

relativamente ao comentário do João Pedro: esta situação não tem paralelo com brincadeiras entre adultos num clima de espírito de equipa. A arma provavelmente era real, e sabe-se que em muitas escolads do país há armas de fogo a circular à vontade. Veja-se o caso da Casa Pia, onde foi assassinado um jovem, e as declarações de professores e funcionários, que denunciaram a circulação de armas de todo o tipo. As gestões das escolas têm ordens para abafar e não importunar os delinquentes.

Este caso da Escola do Cerco não é culpa da professora. Esta professora tem que se resignar a ir todos os dias trabalhar, e não pode fazer queixa nem impor regras, PORQUE NÃO TEM AUTORIDADE, E PORQUE SE FIZER QUEIXA É CONSIDERADA MÁ PROFISSIONAL.

Os professores actualmente não têm quaisquer meios para disciplinar alunos que se comportam mal, que são violentos e que se apresentam muitas vezes bêbados e drogados nas aulas. Podem marcar falta disciplinar e apresentar queixa, mas correm o risco de ficar mal vistos, ainda por cima, ou terem queixas dos pais dos visados, que o Ministério considera sempre correctas. É kafkiano, é uma camisa de onze varas, é um absurdo.

Na maior parte dos países, espancar professores, funcionários e alunos, ameaçar, insultar, etc., o dia a dia das escolas portuguesas, dá direito a transferência para colégio em regime de internato. Em muitos casos prisão.

João Silva disse...

Caro Jorge Arriaga,

Penso que não se está a cingir à questão levantada pelo RAP.

Eu não estou a dizer que o professor não deve ser uma figura de autoridade.
Faço apenas um juízo descritivo ao dizer que, actualmente, na maioria dos casos não o é (e com certeza neste não o seria). Assim, faz sentido castigar criminalmente os alunos por uma brincadeira excessiva quando estas situações são bastante comuns actualmente? (e mesmo na minha sala de aula!)

Dir-me-à que esta situação não é culpa dos professores. Não discuto. Mas não é essa a questão!

Devemos averiguar se estes alunos devem servir de bodes expiatórios para todo um sistema incorrecto.
Ora, eu acho que não!

Anónimo disse...

Uma chapelada, RAJ!

Fernando Martins disse...

Já agora, na punição dos infractores, os moços que ameaçaram com a arma a fingir a professora apanharam 5 dias de suspensão, o aluno que filmou 8 dias.

Moral da estória: brinquem, insultem, enxovalhem mas não publiquem na Internet...

Ana Cristina Leonardo disse...

Ver aqui quão bem pensa e escreve a Moreira
http://wwwmeditacaonapastelaria.blogspot.com/2009/01/redaco-distribuda-pela-dren-e-onde-se.html#links

Humilde Canalizador disse...

Caro João Pedro,
Entendo o seu raciocínio, mas deve haver regras claras. Apontar uma pistola a sério é crime. Apontar uma pistola de brincar pode ou não ser crime. Neste caso, se é que a pistola era de brincar, o propósito não era matar, obviamente, mas foi um total despautério de indisciplina, um deboche total, uma afronta e uma tortura psicológica da professora, ao fim de um período de torturas iguais ou piores. Não podemos relativizar tudo e atribuir as culpas à Sociedade. cada caso é um caso e há que agir com inteligência.

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