Respigo esta história da história da ciência de um artigo que publiquei há anos no Boletim da Associação de Professores de Biologia e Geologia:
A existência dos átomos foi “pressentida” por filósofos e poetas da Antiguidade Clássica como Demócrito, Epicuro e Leucipo. Foi preciso porém esperar até ao século XIX para que o conceito de átomo passasse pelo crivo da verificação experimental. O autor das primeiras verificações foi o químico inglês John Dalton (1766-1844). O nome de Dalton invoca imediatamente o daltonismo, um defeito de visão que consiste na confusão de algumas cores e que afecta quase dez por cento da população masculina incluindo-me a mim (a população feminina transmite o defeito geneticamente, mas só o possui em grau muito inferior). De facto, Dalton e um seu irmão eram daltónicos!
Dalton estudou o ar. Sabia que o ar não era um elemento químico único, como supunham os antigos gregos, mas antes uma mistura de vários elementos, como o oxigénio e o azoto. E supôs que o ar era formado por pequenas partículas, os tais átomos (palavra que significa entidades indivisíveis, em grego). Para Dalton os átomos do mesmo elemento eram todos iguais no peso, no tamanho e na forma, isto é, os elementos distinguiam-se pelos seus átomos. A partir da observação de várias amostras de ar, concluiu que cada transformação química era o resultado da combinação de átomos, chegando mesmo a alguns resultados quantitativos. Claro que a junção de átomos dá origem a moléculas, mas a ideia de moléculas era estranha ao pensamento de Dalton.
Em 1828, quando Dalton tinha 62 anos, um botânico escocês sem qualquer relação nem com ele nem sequer com o estudo dos átomos, efectuou uma observação que haveria, muito mais tarde, de vir a confirmar as ideias atomistas. Robert Brown (1773-1858) reparou que minúsculos grãos de pólen, colocados em água, se moviam de um modo muito desordenado. Na altura pensava-se que o pólen teria vida própria, mas o problema da explicação do movimento browniano persistiu durante quase um século.
Através de numerosas e variadas observações físico-químicas a hipótese atómica de Dalton foi-se consolidando. Um dos seus maiores defensores foi o físico austríaco Ludwig Boltzmann (1844-1906), que estudou o movimento caótico dos átomos ou moléculas de gases (a palavra “gás” surgiu a partir da palavra “caos”). Mas houve fortes opositores: os mais famosos foram o alemão Wilhelm Ostwald (1853-1932) e o austríaco Ernst Mach (1838-1916), que defendiam o primado da energia sobre a matéria - por isso foram chamados energeticistas – e do contínuo sobre o discreto.
A correcta interpretação do movimento browniano efectuada por Einstein (1879-1955) no “annus mirabilis” de 1905 veio confirmar a hipótese atómica. A partir de então os átomos deixaram de ser uma mera hipótese. O jovem Einstein descreveu e interpretou o movimento browniano, concluindo que os grandes grãos de pólen tinham um movimento errático devido ao embate de moléculas de água muito menores. Era o movimento irregular e incessante das moléculas de água que originava o movimento, visível apenas ao microscópio, dos grãos de pólen. Os cálculos de Einstein seriam confirmados por experiências do físico francês Jean Perrin (1870-1942), alguns anos mais tarde, que lhe valeram o Prémio Nobel da Física. Até hoje e já passou bastante tempo, a descoberta do movimento browniano foi, sem dúvida nenhuma, a maior contribuição que a botânica deu à física!
Quanto aos detractores do atomismo, Ostwald acabou por se convencer da justeza do atomismo devido à influência de Boltzmann e, obviamente, à clareza dos resultados experimentais. Contudo, Mach conservou até ao fim da sua vida a sua ilusão na continuidade da matéria. Apesar do triunfo do atomismo, Boltzmann teve um fim trágico: suicidou-se por enforcamento em 1906, quando estava em Trieste, havendo algum mistério sobre as causas da sua morte. Há quem diga que teria sido desespero pela incompreensão de que foi vítima nos meios científicos; nesse caso, bem podia ter esperado um bocadinho...
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1 comentário:
Outros dizem que foi o abandono de sua amante. Historiadores mais recentes enfatizam que Boltzmann sofria de transtorno bipolar.
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