Entrevista a Cristina Carvalho a propósito da biografia “Rómulo de Carvalho/António Gedeão – príncipe perfeito” que acaba de ser publicada pela Editorial Estampa.
Esta entrevista foi primeiramente publicada na imprensa regional.
António Piedade (AP) -
Porque é que escreveu o livro, porque é que o escreveu agora?
Cristina Carvalho (CC) – Nunca na minha vida
me tinha ocorrido escrever estes apontamentos biográficos sobre a vida de meu
pai. Sim, concordo que esse pensamento me podia ter até aconchegado, que seria
natural eu poder escrever sobre ele, e seria! Mas nunca tal ideia me aconteceu.
Foi por um convite da editorial Estampa, uma, duas, três vezes insistido que
tal veio a acontecer. Não foi fácil. Tal como digo no início do livro, não foi
nada fácil. Por questões psicológicas, por questões sentimentais, por razões
várias pouco dignas de interesse para quem lê esta entrevista, mas muito
importantes para mim. Contudo, acabei por aceitar o convite. E nunca me
arrependi. Foi uma experiência única, escrever estes breves apontamentos
biográficos.
AP - Que tipo de leitores tinha em mente quando o estruturou e
escreveu?
CC - Nunca tive em mente um determinado tipo de leitores embora
soubesse e pudesse prever a existência de um público leitor muito mais
interessado do que outro neste tipo de narrativa e sobre a pessoa que foi
Rómulo de Carvalho/António Gedeão, a começar por esse imenso número de alunos
que estão vivos, que o conheceram e
apreciaram e até amaram. Portanto, como disse, não estruturei o livro nem o
escrevi pensando em alguém, especialmente. Embora seja uma narrativa com certas
características muito específicas, foi este um outro livro que escrevi depois
de ter conseguido libertar-me de certas atitudes e de certas visões.
AP - Que tipo de leitores espera que leia o livro?
CC – Esta resposta vem um pouco no seguimento da anterior. Realmente,
há “tipos” de leitores se assim quisermos catalogar. E também há “tipos” de
livros.
Se me pergunta que tipo
de leitores eu espero que leia este livro, eu diria, todo o tipo de leitores,
embora eu saiba que isso não é possível. Um escritor escreve para ser lido, não
escreve com o fito determinado de ser lido por este ou por aquele. Mas sabe-se
que isso não acontece assim. Há, de facto, da parte de toda a gente inclinação
ou apetência ou gosto ou prazer ou o que quisermos chamar por certos livros. Eu
não gosto de certa literatura assim como a pessoa que vai ali no autocarro pode
gostar daquilo que eu não gosto. É uma atitude cultural, não é? Se uma pessoa
aprendeu a conhecer e a gostar e a escolher determinado escritor ou determinado
tipo de escrita ou certos temas, dificilmente se prenderá com outro tipo de
escrita, só mesmo por curiosidade. E às vezes essa curiosidade pode levar a
situações impensáveis, isso também é verdade. Eu posso julgar que não gosto
daquele livro e, afinal, gosto muito! O que eu gostaria mesmo é que este livro
pudesse ser útil e ser lido por muita, muita gente.
AP – Rómulo de Carvalho escreveu o principal estudo sobre a
História da Educação em Portugal. Desde o início da nacionalidade até ao 25 de
Abril. Na proximidade que manteve com o seu pai, pode dizer-nos algo sobre a
opinião dele em relação ao estado da educação em Portugal a seguir a 1974 e até
os últimos anos da sua vida?
CC – Efectivamente a “História do Ensino em Portugal”, editada pela
Fundação Gulbenkian e que já conheceu várias reedições é considerada por muitas
pessoas que se interessam pelas questões da pedagogia e do ensino em Portugal
como obra-mestra sobre esta temática. Já ouvi chamar-lhe uma espécie de
“bíblia” para professores e técnicos nesta matéria. Trata-se, na verdade, de
uma obra de referência que oferece uma panorâmica muito interessante e às vezes
surpreendente sobre a evolução e os vários ciclos do ensino no nosso país,
desde a fundação da nacionalidade até ao 25 de Abril de 1974.
Significativamente, terminou nessa data a abordagem que ele fez à história do
ensino.
O ensino, segundo eu
depreendo da leitura das “Memórias” e das abordagens privadas e públicas por
ele feitas, era visto como uma questão fundamental para o desenvolvimento da
sociedade. No período que se seguiu à Revolução, tal como aconteceu noutras
áreas da vida portuguesa, o ensino e as escolas passaram por grandes convulsões
e perturbações. Foi perante essa situação que ele abandonou, reformando-se
antecipadamente, a carreira a que se dedicara toda a vida. Maior expressão do
que esta sobre o que ele pensaria acerca do rumo que o ensino estava a levar
não poderá haver. No entanto, recomendo a leitura das suas “Memórias” onde ele
exprime em várias oportunidades o que pensava sobre este assunto.
AP – Rómulo de Carvalho é o nosso “patrono” da divulgação de
ciência. Como é que a Cristina Carvalho classifica a evolução da divulgação de
ciência em Portugal nas últimas décadas?
CC - Não serei a pessoa mais habilitada para responder a esta
questão, mas do que nos é dado observar à vista desarmada não parece haver
dúvidas de que se deram passos de gigante tanto no desenvolvimento da
investigação científica em Portugal e da sua inserção nas redes internacionais
da Ciência, como na divulgação científica. Felizmente há pessoas de elevada
craveira que brilham no firmamento da Ciência internacional e entre essas
pessoas são bastantes os jovens que se têm distinguido. Só espero que esta
caminhada prossiga e possa dar ao país e ao mundo grandes contributos para o
desenvolvimento global e em todos os sentidos.
António Piedade
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