Publicado na edição de 1 de Março de 2011 do "Diário de Coimbra".
Daqui a cerca de um mês, mais precisamente a 2 de Abril, comemora-se o centésimo aniversário do 1º Jardim-Escola João de Deus de Coimbra, primeiro estabelecimento de ensino em Portugal dedicado ao ensino pré-primário e primário. A esta distância, parece-me oportuno publicar uma segunda parte inédita da entrevista que fiz ao Doutor Décio Ruivo Martins (Professor do Departamento de Física da FCTUC e Membro da Comissão Científica do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra), por alturas da comemoração do centenário da 1ª República.
António Piedade – Qual é a “radiografia” do ensino pré-escolar e primário em Portugal por alturas da implantação da 1ª República em 1910?
Décio Ruivo Martins – Em 1900 a situação do país era caracterizada por uma elevada taxa de analfabetismo. Numa população de 5.423.132 portugueses, 4.261.336 não sabiam ler. Esta era uma situação intolerável. A necessidade de uma mudança deste panorama ficou bem expressa na palavras de João de Deus que afirmava ser necessário derramar a plenos jorros a luz do alfabeto, pois o homem que não sabe ler é um bárbaro. Em 1901, foram introduzidas reformas no ensino primário que introduziam importantes alterações estruturais no sistema educativo. Pretendia-se que o ensino primário passasse a ser obrigatório para as crianças dos dois sexos, de idades compreendidas entre os seis e os doze anos.
.AP - Qual era o grau de inovação dessa reforma?
DRM - A grande inovação desta reforma previa a criação do ensino infantil, a ser frequentado por crianças entre os quatro e os seis anos. Constituiu-se assim, o primeiro modelo de ensino pré-escolar em Portugal. Refira-se no entanto, que na reforma de João Franco, de 1894, já se tivesse determinado que poderiam ser estabelecidas classes infantis em Lisboa, Porto e outras povoações importantes. Infelizmente, ainda hoje a cobertura plena do ensino infantil é uma grave lacuna do nosso sistema educativo. Um século depois, continuamos por cumprir este ideário republicano.
AP – Mas a 1.ª República deu um novo impulso na concretização dessas reformas?
DRM - Com a implantação da República, os intelectuais portugueses estavam de acordo que o primeiro dever do novo regime político era o de instruir o povo. O próprio Afonso Costa, em entrevista ao jornal O Porto anunciava que a instrução irá ser a cruzada imediata do novo governo. A paixão pela educação já tem pelo menos cem anos de existência. A evolução observada depois do 25 de Abril deve ser considerada muito positiva. Mas, muito ainda há por fazer para que Portugal atinja os índices educativos dos países mais desenvolvidos da Europa.
(continua)
António Piedade
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5 comentários:
e as TENTATIVAS DE reformas de Agostinho de CAMPOS EM 1906
FICAM NO ESQUECIMENTO?
JÁ aGOSTINHO DE cAMPOS TINHA PRECONIZADO ENSINO
pRÉ ESCOLAR À semelhança de outros países
e também o envio de professores para formação fora das nossas fronteiras
o que nunca se concretizou pois em 2010 saiu do cargo de director
os menos de 80% de analfabetismo
parecem um pouco exagerados
em 1910 os números são de 90% para as zonas rurais e de 75% para as urbanas
e 1.160.000 em 5,4milhões são mais de 20%
Em "Extremoz 93,7% de analfabetos entre os varões e 99,7% entre as fêmeas"
Fialho de Almeida no saibam quantos também indica percentagens elevadas
se os dados são das estatísticas do reino
deviam se calhar contar com quem sabia assinar o nome
Não obstante João de Deus haver sido um estudante relapso, mas excelente poeta, a Universidade de Coimbra agradeceu-lhe o amor às crianças, outorgando-lhe o grau de doutor "honoris causa" em dia memorável em que Coimbra em peso se atapetou de capas negras para ele passar sobre elas! JCN
É curioso que não tendo sido João de Deus um estudante aplicado, viesse depois a ser um pedagogo interessante. Ai se ele fora estrangeiro, iam ver a moda que pegava - mesmo que de estaca - em Portugal...
Os meus filhos aprenderam a ler pela "Cartilha Maternal".
De João de Deus retenho em particular uma ideia importante - a de que "não há método bom com professor mau nem método mau com professor bom". O que relativiza o alto coturno a que se arvoraram certos "metodólogos" nas últimas décadas. Como os resultados demonstram...
E depois há os versos.
Os (bons)versos, que (mesmo) os comuns mortais entendem.
Por causa dele, como cantou Manuel Bandeira, todos os autênticos poetas lusos passaram a ser... de Deus! JCN
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