sexta-feira, 11 de setembro de 2009
A Portugal
Hoje, Jorge de Sena regressa a Portugal. Publicamos um poema dele com o título que está em cima:
Esta é a ditosa pátria minha amada. Não.
Nem é ditosa, porque o não merece.
Nem minha amada, porque é só madrasta.
Nem pátria minha, porque eu não mereço
A pouca sorte de nascido nela.
Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta
quanto esse arroto de passadas glórias.
Amigos meus mais caros tenho nela,
saudosamente nela, mas amigos são
por serem meus amigos, e mais nada.
Torpe dejecto de romano império;
babugem de invasões; salsugem porca
de esgoto atlântico; irrisória face
de lama, de cobiça, e de vileza,
de mesquinhez, de fatua ignorância;
terra de escravos, cu pró ar ouvindo
ranger no nevoeiro a nau do Encoberto;
terra de funcionários e de prostitutas,
devotos todos do milagre, castos
nas horas vagas de doença oculta;
terra de heróis a peso de ouro e sangue,
e santos com balcão de secos e molhados
no fundo da virtude; terra triste
à luz do sol calada, arrebicada, pulha,
cheia de afáveis para os estrangeiros
que deixam moedas e transportam pulgas,
oh pulgas lusitanas, pela Europa;
terra de monumentos em que o povo
assina a merda o seu anonimato;
terra-museu em que se vive ainda,
com porcos pela rua, em casas celtiberas;
terra de poetas tão sentimentais
que o cheiro de um sovaco os põe em transe;
terra de pedras esburgadas, secas
como esses sentimentos de oito séculos
de roubos e patrões, barões ou condes;
ó terra de ninguém, ninguém, ninguém:
eu te pertenço. És cabra, és badalhoca,
és mais que cachorra pelo cio,
és peste e fome e guerra e dor de coração.
Eu te pertenço mas seres minha, não.
Araraquara, 6/12/1961,
do Capítulo "Tempo de Peregrinatio ad loca infecta" (1959-1969) do livro "40 Anos de Servidão", 2ª edição revista, Círculo de Poesia da Moraes Editores, 1982
Jorge de Sena
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17 comentários:
Vai uma aposta em como se isto tivesse sido escrito por um comentador seria censurado ou utilizado como prova de mesquinhez do mesmo.
Como foi escrito pelo Jorge de Sena já é um grande poema.
Adoro as artes.
Quem tem amigos assim nem precisa de inimigos, tá claro!
Agora a sério, diga-nos o realmente pensa!
Naquele tempo Jorge de Sena já era velhaco, torpe,
padrasto dos próprios filhos,um infame um inútil que andando por Araraquara nunca ninguém reconheceu seus méritos.Homens desta valia não deviam sequer ser lembrados.Hoje deve estar arrependido de ter escrito este infame poema.
Quem assim escreve, com esta exímia acuidade linguística e qualidade poética, faz parte da cada vez mais gorda lista de seres que renunciaram à nacionalidade portuguesa. É claro que quem tem a coragem de ser consciente será sempre perseguido e difamado em vida. O contrário, é excepção à regra.
Como o comentário de zeserafim revela uma profunda igorância, sugiro este link: http://www.astormentas.com/biografia.aspx?t=autor&id=Jorge+de+Sena
Basta um clique para verificar que os comentários de opinião infundados são de uma profunda idiotice.
Se o poeta em causa fosse americano aconselhava-o a recordar as sábias palavras de John Fitzgerald Kennedy: "Não perguntes o que a América pode fazer por ti, mas o que é que tu podes fazer pela América!"
Já que o dito é "bacalhau", então, olhe, só fazem falta os que cá estão!
nem por acaso, estou a ler os sinais de fogo.
para aqueles que dizem mal do Jorge de Sena, vão mas é ler alguma coisa do mesmo para saberem do que falam!
grande senhor!
Claro que muito do que este texto diz é verdade, claro que está escrito com alguma mestria...e claro que nunca poderia ser objecto de censura ou razão para exílio...porque às vezes só nos gritando nos fazem ver os nossos defeitos...
Mas na verdade...não é um poema tão bom assim, chega mesmo a ser um pouco reles na forma e no conteúdo, indistinto da lama de onde pretenciosamente se pretende distinguir...
Quanto ao regresso a Portugal, depois destas palavras, provavelmente se poderá concluir que se está é a contraiar a vontade do seu autor ("Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta")
Quanto a Portugal, não deve renegar nenhum dos seus cidadãos que não sejam criminosos convictos mas também deve seleccionar os que escolhe para glorificar...e este não me parece que seja um deles, desculpem-me a franqueza!...
Dervich
Caro Dervich.
Que tiro certeiro!
Quase todos os comentários acima, são de quem não sabe quem é Jorge de Sena.
E não é apenas por este poema, de quem se sente insultado pela injustiça dum regime ditatorial e pouco inteligente, que lhe roubou a Pátria, que se pode aferir da grandeza deste HOMEM.
Leiam-no, conheçam-no e então tereis moral para falar.
Se o autor distingue a Pátria do "regime ditatorial e pouco inteligente", então não falava assim dela.
E o que falou não foi bonito.
Há quem pense que um insulto com palavrões dito por pessoa instruída é cultura e se dito por anafalbeto é má educação. Mas nem toda a gente pensa assim...
Eu não sei que idade tem, Américo, mas nos anos sessenta quando fui dos Açores estudar para Belas Artes em Lisboa, a grande "moda" eram assuntos escatológicos. Eu ia morrendo. Mas não morri e percebi que tudo é possível, consoante o contexto e a escala.
Se o Américo fica perturbado com estas sandices da época, então passe de lado. Não leia. Percebe-se que lhe faz mal.
Aos dezoito anos fica-se a saber que há bons e maus.
Aos trinta descobre-se que nem todos os bons estão do nosso lado e nem todos os maus do outro.
Mas é preciso chegar aos cinquenta para compreender que nem tudo o que os bons fazem é bom e nem tudo o que os maus fazem é mau.
Concordo consigo, Américo.
"Nem tudo o que os bons fazem..." é uma verdade insofismável. Você tem toda a razão.
Eu não gosto do poema acima, mas entendo as razões que o levaram a "vomitar" o dito. Conheço outras coisas fantásticas de Jorge de Sena e gosto delas. É, p'ra mim, indubitavelmente um grande escritor!!!
...e merece que lhe restituam a PÀTRIA...
Margarida e Americo:
Sou mais novo do que vós (mas também não muito mais) e vejo-me na obrigação de cá vir agradecer a Jorge de Sena a oportunidade de poder ter assistido a uma raridade nos dias correntes:
-Uma discussão construtiva entre duas pessoas inteligentes e esclarecidas...
Dervich
Infelizmente, porque na avidez politizamos. E, em irresponsabilidade e abandono ao bem comum, engordamos os políticos. Ou porque, pela nossa mesquinhez e falta de coragem para melhorar o Pátrio. O abandonamos e negamos. Ou pelo mundo, o vamos dilacerando, enquanto desculpamos a nossa traição e cobardia. Com fantasiosas histórias de tirania. Em países repletos de jardins de arame farpado. Encobertos em demagógicas utopias. Nesta farsa Macabra. O planeta, cada vez está mais só. Sege sem mão, que largue um cibo de pão, ao pobre que fizemos. Ou maneje o alicate a uma verdadeira liberdade universal. Nesta má sorte, quem nega a mãe, seja ela, boa ou má. Pela certa, não reconhece os filhos. Assim, a maquina da lapidação vai enferrujando, por falta de óleo de condigna conduta, nas faculdades do envernizamento.
A FORÇA É DIVINA
Em ondas brancas e mareantes.
Que no longínquo se formam ondulantes
A convidar os navegantes.
Zarpam os lusitanos argonautas.
Ao som de melodiosas flautas.
No azul do Céu, os anjos.
E todos os arcanjos.
Vigiam as caravelas
Com a Cruz de Cristo em suas velas.
E mais alto, no azul das Divindades.
As Celestiais Santidades.
Abençoam o Luso empreendimento.
De dar do mundo cabal conhecimento.
Homens, velas e os elementos.
Quantos tormentos.
Cerúleo de azul calmaria.
Ó Virgem Maria.
Sopra à vela alguma ventania.
Que a bom rumo seja capitania.
Céu de argênteo tenebroso.
Mar alteroso.
Mas no topo da mastreação
Que irá alargar a Lusa Nação.
Formas Divinas continuam em aclamação.
Ajudando e apoiando a Lusa navegação.
Assim, as Lusas caravelas sulcam os mares.
Na construção de dar ao mundo melhores altares.
Eduardo Dinis Henriques
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