sexta-feira, 25 de setembro de 2009
E agora, José?
Minha crónica no "Público" de hoje:
“E agora, José?" é o primeiro verso do famoso poema “José” do escritor brasileiro Carlos Drummond de Andrade (inserto no volume “Poesias”, Livraria José Olympio, 1942): “E agora, José?/ A festa acabou,/ a luz apagou,/ o povo sumiu,/ a noite esfriou,/ e agora, José?/ e agora, você?”. O poder da poesia é tão grande que, em português, a pergunta já adquiriu o significado que tem no poema: beco, impasse, situação sem saída óbvia. Esta será previsivelmente a situação após as próximas eleições. José Sócrates bem se poderá sentir na pele do José do poema se se esfumar a confortável maioria absoluta de que hoje dispõe no Parlamento e se vir confrontado com a necessidade de negociar uma coligação ou, pelo menos, obter os apoios mínimos que permitam a sobrevivência de um governo minoritário.
Se um líder é sempre um homem só, o líder do Partido Socialista (PS) estará particularmente só ao fazer aquela pergunta por uma circunstância simples: O PS é, tem sido, o seu líder. Os os cartazes mostram um só rosto e o discurso é na primeira pessoa. Nem era preciso ter havido campanha para chegar a essa conclusão. A bancada parlamentar do partido da maioria absoluta praticamente não existiu, limitando-se a ser instrumental da liderança. O problema não é de agora, embora se tenha vindo a agravar. Marco Lisi, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, no seu livro “A Arte de Ser Indispensável – Líder e organização no PS português” (ICS, 2009), analisou as lideranças do PS entre 1976 e 2006 – Soares, Constâncio, Sampaio, Guterres, Ferro Rodrigues e Sócrates –, tendo concluído que “o PS existe sobretudo em função do líder”. Segundo um despacho da Lusa que resume o estudo, “o PS já alcançou um carácter personalizado, ou seja, há uma crescente identificação do partido com o seu líder. O partido age em função do sucesso do seu secretário-geral, que dispõe da estrutura partidária como de um instrumento para a conquista e manutenção do poder.” Isso poderá ser também verdade para outros partidos, mas é sobretudo verdade para o PS, que agora, temendo perder o poder, juntou toda a sua gente em torno do seu líder.
Tal circunstância poderá pesar na decisão dos eleitores. Não terão tanto de escolher entre partidos (aliás os partidos do bloco central parecem-se mais do que eles próprios dão a entender), mas mais entre pessoas. O sufrágio será basicamente um referendo a José Sócrates: quem gostar dele quererá dar-lhe uma “nova oportunidade” e quem não gostar dele preferirá dar uma oportunidade a um outro líder partidário. A questão “E agora, José?” coloca-se, assim, a cada um de nós, Zés Povinhos, antes de se colocar a José Sócrates. Podemos diminuir-lhe, quiçá drasticamente, o leque das possíveis opções.
Nas últimas eleições legislativas a ponderação foi mais fácil. Desta vez confesso ter alguma dificuldade em fazê-la, pelo que não vou prescindir do dia da reflexão. A fulanização do PS é, ao mesmo tempo, uma enorme vantagem e uma terrível desvantagem. Se, por um lado, reconheço no primeiro-ministro algumas das qualidades exigidas a um governante, como a determinação (podem aplicar-se-lhe os versos de Drummond “Mas você não morre,/ você é duro, José!”), por outro lado não posso deixar de me indignar com algumas das suas determinações, de que há abundantes exemplos na área da educação (por exemplo, ele parece acreditar nos poderes mágicos do Magalhães e procura usá-los, qual Harry Potter da política). As alternativas não são, porém, famosas, exibindo a oposição fragilidades que, em muitos casos, pedem meças às do governo.
Vêm aí tempos difíceis, com a velha crise nacional, que não é só económica, a ser agravada pela nova crise económica internacional. A saída tem necessariamente de residir na democracia, segundo Winston Churchill “a pior forma de governo, salvo todas as outras que têm sido experimentadas” (disse-o no Parlamento em 1947, já depois de ter perdido as eleições). É nesse quadro que temos de procurar a melhor escolha, isto é, a menos má.
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10 comentários:
Tenhamos ao menos um partido que tem um líder. Um partido sem líder definido, que muda de líder constantemente, como vai liderar um país ao sucesso?
Agora toda a gente se queixa e critica, daqui a uns anos é que se avaliará correctamente projectos como o do Magalhães.
Tenho pena que este blog sirva cada vez mais para falar de política do que de divulgação científica...
Parte da reflexão aplicar-se-á em meu entender a qualquer outro partido onde se inclui a diferença: O PS existirá sobretudo em função do líder, mas o PSD tem um lider que apenas sobrevive (temporariamente) graças ao partido... o que justifica a manifesta inexistência de uma alternativa à governação socialista.
Quanto à maioria absoluta, não seria tão importante se tivessemos uma Assembleia da República mais ética.
Cumprimentos.
Falcão
Quanto ao conceito de politica ninguém sabe muito bem o que é?!
Ora vejamos,
"No que concerne ao conceito de política, a comunidade cientifica não é unânime quanto ao seu objecto, até porque, à semelhança do que é defendido pela investigadora Cristina Sarmento, o comportamento político ressente-se de várias características do ser humano que estão longe de ser acções totalmente compreensíveis. Ainda segundo o que, parcialmente, a mesma autora defende, os politólogos recorrem a todas as ciências do comportamento nomeadamente à sociologia, à psicologia, à psicanálise, à economia, à antropologia, à história, ao direito, às teorias da comunicação e às teorias das relações internacionais."
Cumpts,
Madalena Madeira
Este PS é demasiado perigoso para alguém poder pensar em votar em tal partido!
Na Quarta-Feira assisti ao discurso da líder do PSD, falou no endividamento e na forma de o vencer, falou no desemprego e na forma de o vencer, falou na dívida pública e na forma da diminuir, falou na fragilidade empresarial e na forma de a melhorar, falou no facilitismo no ensino e na forma de o combater, etc., etc. O que passou na comunicação social? ZERO! Os eleitores nem tiveram a oportunidade de ouvir estas propostas e muito menos de as considerarem boas ou más para o país!
Não me venham, por favor, dizer que isto é normal. Não me venham, por favor, dizer que isto é democrático!
Será que os eleitores não têm o direito de conhecer as propostas de todos os partidos? Será que só podem conhecer aquilo que o PS considera?
Antes da campanha eleitoral rebentaram com um telejornal da TVI e agora com o jornal Público. Será isto normal?
Como me disse um grande amigo, os portugueses terão o governo que merecem! Se quiserem poderão dizer que em Portugal houve duas datas marcantes: o 25 de Abril e o 27 de Setembro, se não o quiserem poderão dizer dentro de 15 anos: "Meu Deus, como vou pagar o meu empréstimo? Meu Deus, como posso viver com uma reforma que representa metade do meu último salário? Meu Deus!"
Ainda bem que este Blog tem, para além da componente científica, opinião. Recorda-se os estragos que este governo fez em termos das Escolas e das Universidades, pois a ciência em Portugal pagará bem caro o facilitismo e as mentiras destes 4 anos e meio de desgoverno...
O Isaltino Morais, o Valentim Loureiro, a Fátima Felgueiras, o Ferreira Torres, ganharam eleições já depois de serem suspeitos ou mesmo acusados por comportamentos desonestos.
Se o Sócrates voltar a ganhar não é surpresa nenhuma.
Realmente, de entre as escolhas à disposição resta-nos procurar a menos má.
Sim, daqui a uns anos, veremos quais foram os resultados das políticas educativas de hoje. E então confirmaremos dolorosamente a importância das políticas na educação e na investigação científica. Eu só gostaria, nessa altura, caso viva ainda, que os meus filhos e netos, me recordassem como sou pessimista nestes dias que correm...
As suas observações sobre o PS e o seu líder são enviezadas, uma vez que a discussão interna existe - o que são os vários deputados "dissidentes"? Mas a decisão tem de ter por base a opinião da maioria, ou não? Quanto à projecção dominante do líder não vejo em que é que a "dinâmica" de José Sócrates é diferente da de Louçã/Manuela/Portas ou Jerónimo!NÃO HÁ GOVERNOS PERFEITOS E ESTE FOI O MELHOR PARA O PAÍS. E VOTAR PS continua a ser o melhor para os próximos 4 anos.
Maria da Guia Manteigas
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