quarta-feira, 9 de setembro de 2009
A magia dos números: o nove
Artigo meu que saiu no "Entre as Artes e Letras" de hoje, 9/09/09:
Quando o leitor me estiver a ler, poderão ser 9h09 do dia 9/9/09. Claro que é uma coincidência curiosa, assim como houve e haverá outras: no ano passado o relógio passou pelas 8h08 do dia 8/8/08 e, no próximo ano, passará com toda a certeza pelas 10h10 do dia 10/10/10 (um perfeito dez!).
Mas o pretexto é bom para falar da “magia” dos números, ou melhor, do poder de sedução dos números. Os números e os jogos entre eles sempre atraíram os seres humanos. Em particular, muitos artistas encontraram nos números inspiração para as suas obras.
O número nove é o número preferido do engenheiro e também arquitecto britânico Cecil Balmond, que é entre várias outras obras responsável pelo planeamento estrutural da pála do Pavilhão de Portugal no Parque das Nações em Lisboa, da autoria do arquitecto Álvaro Siza Vieira, e responsável pela arquitectura da ponte Pedro e Inês sobre o rio Mondego em Coimbra (como a “The New Yorker” fez questão de lembrar, num artigo consagrado a Balmond, esta foi, em todo o mundo, a primeira obra de arquitectura do até então apenas engenheiro civil). Pois Cecil Balmond é o autor de uma curiosa obra dedicada na sua totalidade ao número nove, com prefácio de António Mega Ferreira: “O número 9. Em busca do código sigma” (Replicação, 2000). Nesse livro, o autor discorre sobre as propriedades do número nove, partindo de uma história sobre o “ponto fixo do vento” (o centro da rosa dos ventos, que tem quatro pontos cardeais e quatro subcardeais). Conta-nos as propriedades que a história e as lendas associam ao nove. Apesar de não ter a “mística” do três ou do sete, o nove tem muita fama na religião e na literatura. Há, na tradição grega, nove musas, filhas de Zeus e Mnemósina (associadas a nove virtudes: eloquência, persuasão, sageza, conhecimento, matemática, astronomia, poesia, música e dança). Há, na tradição cristã, nove coros de anjos no Paraíso, nove círculos do Inferno na “Divina Comédia” de Dante, nove categorias de abençoados no Sermão da Montanha, e, segundo o Evangelho de S. Marcos, Jesus Cristo morreu à nona hora. Na tradição árabe, Alá é abençoado com 99 nomes e a festa do Ramadão ocorre no nono mês do ano lunar (portanto, por estes dias). E, na tradição hindu, o 9 é considerado um número completo, perfeito e divino até porque fecha um ciclo no sistema decimal, originário da Índia. Shakespeare põe, em “Macbeth”, as bruxas a cantar ”Três vezes para ti, três vezes para mim, e três vezes mais parta contar nove”. E, na cultura pop, os Beatles cantam, como bem lembra António Mega Ferreira, a canção “Revolution 9”, repetindo o 9. No cinema, em 9/9/09 vai ser lançado um filme de animação com o curto título “9” (talvez o mais curto título da história do cinema!) do realizador Shane Acker com coprodução de Tim Burton e, em Novembro, estreará o filme “Nove”, de Rob Marschal, com Penélope Cruz, Nikole Kidman e Sophia Loren, inspirado no famoso “8 ½” de Frederico Fellini. Dada a fama do nove, não admira que algumas pessoas tenham ficado aborrecidas quando os planetas do sistema solar deixaram há pouco tempo de ser nove, com a requalificação de Plutão...
Mas o que vem a ser “código sigma” de que fala Balmond? Sigma é a letra grega que é usada para designar somatório. E o autor usa-a para associar a cada número inteiro a soma dos seus dígitos e depois a soma dos dígitos que ficam, e assim sucessivamente até ficar só um dígito. É esse o procedimento que se usa na chamada “prova dos nove” que serve, ou pelo menos servia antigamente, para verificar a correcção de operações aritméticas (deve ser dito que esta técnica, embora útil, não garante a correcção do resultado). A propriedade subjacente a este simples teste, também chamado dos "nove fora", terá seduzido Balmond a escrever sobre o número nove (ele diz que "os “noves não deixam marcas”), tal como outros arquitectos escreveram sobre outros números (por exemplo, Le Corbusier escreveu sobre a razão dourada). Há, portanto, que reconhecer a existência de uma certa “magia” ligada ao nove, mas tem de se acrescentar que muitas divagações numerológicas deste tipo são algo ou mesmo perfeitamente vazias ("noves fora nada")...
O matemático David Wells, no seu “Dicionário de Números Interessantes e Curiosos” (publicado em 1996 na estupenda colecção “O Prazer da Matemática” da Gradiva) enuncia algumas propriedades peculiares do nove: é o terceiro quadrado (depois do um e do quatro, já que um é o quadrado de um, quatro é o quadrado de dois e, logo a seguir, nove é o quadrado de três). Constitui, com o oito, as únicas potências conhecidas que diferem de uma unidade. É, além disso, o único quadrado que é a soma de dois cubos consecutivos, pois nove é a soma de um ao cubo com dois ao cubo.
Wells fala também de quadrados mágicos, um tópico fascinante que une a aritmética, a geometria e a arte. Albrecht Duerer, na sua gravura ”Melancolia”, mostra um quadrado mágico de 16 casas, (quatro por quatro). O quadrado mágico mais conhecido é, porém, de nove casas (três por três): este quadrado está dividido em nove casas: só há basicamente uma maneira de dispor os nove algarismos - o zero não conta - no quadrado de modo a somar sempre o mesmo número, quer ao longo de qualquer linha, quer ao longo de qualquer coluna quer ainda ainda ao longo das diagonais. A soma é 15 e o número 5, por uma questão de simetria, tem de estar no meio. Experimente o leitor construir um quadrado mágico, é como um “sudoku”... Os antigos chineses já conheciam o quadrado mágico de números. E os antigos romanos usavam um quadrado mágico quatro por quatro com letras, que podem ser lidas em linha ou em coluna, em qualquer sentido. É o chamado palíndroma, cujo significado tem sido muito discutido: SATOR AREPO TENET OPERA ROTAS. Experimente o leitor colocar estas palavras umas sob as outras e lê-las na vertical...
Como não podia deixar de ser, há maldições também associadas ao número nove (não há nada de mau no nove: há maldições associadas asociadas a vários outros números!). Uma das mais famosas diz que não se podem compor mais de nove sinfonias: Beethoven, como se sabe, morreu depois de concluir a “Nona”, deixando a “Décima” incompleta. Schubert e Brueckner não chegaram a acabar none sinfonias. Mahler escreveu a “Canção da Terra” depois da sua oitava. Quando estava a escrever a nona, que era de facto a décima, morreu... Também Dvorak só escreveu nove sinfonias. Que se trata, porém, de uma superstição é provado pelo facto de o compositor russo Dmitri Chostakovich ter escrito 15 sinfonias...
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7 comentários:
A matemática é, de facto, fascinante.
Laplace, um eminente matemático francês dos fins do século XVIII, princípios do século XIX, descreveu certa vez a teoria das probabilidades como sendo nada mais do que "senso comum reduzido a cálculo".
Vejamos até que ponto a anedota seguinte justifica esta descrição:
Dois estudantes procuram decidir como hão-de passar uma noite. Concordam por fim em deixar que a decisão pertença a uma moeda ao ar. Caras, vão ao cinema. Cunhos, vão beber uma cerveja. Se a moeda ficar de pé, de esquina, vão estudar!
(Curiosidades da Matemática, Eugene Northrop)
Eu desde que atirei o meu telemóvel para cima da cama, de longe, e ele ficou imóvel em pé, já acredito em tudo!... :)
erro lamentável na 17ª linha, onde escreve "persuação" ao invés, creio, de persuasão...
Os meus cumprimentos ao estimado Professor.
Zeros e uns! , o sistema binário. O zero é igual a um? Ou não ?. Já o 7 é um número mágico!? Pode ser para o bem ou para o mal?!
No que diz respeito à ligação da neurofisiologia e da cibercultura política, é de salientar as experiência de Hopfield e Tank (no campo da neurofisiologia), que adaptaram os métodos computacionais que simulavam o comportamento de magnetes intermitentes com vista à previsão do que aconteceria com os neurónios criando um programa concebido de forma a comportar-se como uma rede neuronal hipotética constituída por uma antena de neurónios interligados, mas apta a correr num computador convencional (Penzias, 1992: 120-121). O processo seguiu os seguintes trâmites: uma dada “palavra” com 100 bits de dimensão, numa sequência binária de 1 (uns) e 0 (zeros) impunha aos neurónios excitação, fazendo com que cada neurónio corresponda a 1 se “excitasse” ou “ligasse” (Penzias, 1992: 120-121). Então, os investigadores estabeleceram um conjunto de sinapses permanentes, de modo que esses neurónios comunicassem o estímulo a cada um dos outros neurónios a “excitar”, geran¬do-se, desse modo, um estado de equilíbrio para a palavra imposta (Penzias, 1992: 120-121).
Cumpts,
Madalena Madeira
Já corrigi a palavra persuasão e outras gralhas que encontrei. Obrigado.
Carlos Fiolhais
Mas o que vem a ser “código sigma” de que fala Balmond? Sigma é a letra grega que é usada para designar somatório.
a letra que indica somatório - N
enígma - sígma
Discordo de: Balmond a escrever sobre o número nove (ele diz que "os “noves não deixam marcas”)
Palíndroma - forma a cruz de tal
...Le Corbusier escreveu sobre a razão dourada...
E não só.
Projetado pelo escultor francês Antoine Bourdel, é uma variabilidade de fabricação de bronze sólido ou oco (pelo menos duas produções tchecas, um oficial da Kremnice - Mincovňa Kremnica - Tchecoslováquia, e uma privado, Estabelecimentos Pichl, e alguns de fabricação francesa (de Delande, mais leve e com um tom dourado). Há também variantes para a fita, mais ou menos espessas e com uma faixa central de mais ou menos de mesma largura original.
Creio que justifica o (dito) maior livro do mundo, o Codex Giga.
Espero ter colaborado com vosso artigo, Doutor Carlos Fiolhais.
- Pense em um número de 2 a 9
- Multiplique por 9
- Some os algarismos
- Agora pegue o resultado e subtraia por 5
- Chegou a um novo número? Pois bem, atribua uma letra para esse número, da seguinte forma: se o resultado foi 1 (letra A), se foi 2 (letra B), se foi 3 (letra C), se foi 4 (letra D) e assim sucessivamente... até chegar na letra correspondente.
- Agora pegue essa letra e pense em um país
- Última missão: pegue a 5a letra desse país e pense em um animal
- O resultado é...
Dinamarca e Macaco
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