terça-feira, 15 de setembro de 2009

Este invento tem 130 anos e vai desaparecer


Parte inicial de um artigo saído no "Público" de ontem sobre a história da lâmpada de incandescência, que agora tem morte anunciada (o resto pode ser lido aqui):

Trocar uma lâmpada é como piscar um olho. Nem se dá pelo gesto, de tão banal que se tornou. Agarra-se no bolbo, desenrosca-se a base e já está. Há mais de um século que se faz assim, desde que Thomas Edison popularizou a lâmpada eléctrica, no final do século XIX.

O invento de Edison, no entanto, tem os dias contados. Resistiu ao tempo, mas agora, com o mundo desesperado à procura de soluções para poupar energia, já não serve. Desde o princípio deste mês, os fabricantes já não podem pôr à venda na União Europeia as lâmpadas incandescentes mais potentes, de 100 watts (W), segundo um regulamento comunitário aprovado no ano passado. Em 2011, desaparecem das prateleiras as de 60 W e no ano seguinte as de 40 W e 25 W.

No seu lugar, entram definitivamente as lâmpadas de baixo consumo, fluorescentes, que se enroscam e desenroscam à mesma, mas que funcionam com um princípio diferente do que o que vigorou por mais de um século. É a despedida de uma tecnologia de sucesso.

Thomas Edison ficou com a fama, mas não foi este criativo e empreendedor norte-americano, nascido em 1847, quem inventou a lâmpada eléctrica. O inglês Humphry Davy é o autor das experiências pioneiras, na primeira década de 1800, conseguindo produzir um arco luminoso entre duas hastes de carbono ligadas a baterias eléctricas.

Meio século depois, o princípio do arco voltaico foi a base da corrida à invenção de uma lâmpada que pudesse ser utilizada correntemente. O resultado mais bem sucedido foi a "vela eléctrica" de Jablochkoff, criada em 1875 e desde logo adoptada na iluminação pública. Em Portugal, seis delas abrilhantaram a celebração do aniversário de 15 anos do príncipe D. Carlos, na Cidadela de Cascais, em 28 de Setembro de 1878.

A luz eléctrica era algo completamente diferente do que antes havia - a iluminação pública a gás, ténue, poluente e perigosa. Agora, ao invés da combustão, eram outros os princípios que a produziam. "Passou-se da química para a física", afirma o professor Carlos Fiolhais, da Universidade de Coimbra.

Mas a lâmpada de arco voltaico era complexa e exigia potentes baterias para se manter acesa. Não se adequava à iluminação de pequenos espaços. Mais promissora era a lâmpada incandescente, na qual a luz emana de um filamento aquecido pela passagem da corrente eléctrica.

Muitos cientistas e inventores fizeram experiências com a lâmpada incandescente. Mas foram Thomas Edison e o físico-químico inglês Joseph Swan que chegaram, separadamente, a um modelo prático, em 1879. O principal problema era encontrar um filamento que aguentasse elevadas temperaturas por muitas horas, antes de se romper. Edison e Swan basearam-se primeiro em fibras de carvão obtidas a partir de algodão. Funcionou, mas não era suficiente. Incansável, Edison experimentou de tudo, até fios de barba dos seus colaboradores. Encontrou por fim uma fibra de bambu com a qual criou um filamento de carbono que se aguentava por centenas de horas.

Produzir um dispositivo eficaz foi uma das razões que fizeram o nome de Edison vingar sobre os demais. Mas havia outro, quiçá mais importante. "Edison compreendeu que precisava de ter uma sistema eléctrico", diz a investigadora Maria Paula Diogo, da Universidade Nova de Lisboa e do Centro Interuniversitário da História das Ciências e da Tecnologia, ou seja, não bastava a lâmpada, era preciso também uma fonte de electricidade e uma rede de cabos para transportá-la.

Com o dinheiro da alta finança norte-americana, o inventor pôs logo em prática a sua ideia. Construiu em Nova Iorque a primeira central eléctrica dos Estados Unidos e, a partir de 4 de Setembro de 1882, passou a levar luz a um quarteirão do centro financeiro de Manhattan. No final do ano seguinte, o sistema já tinha 508 clientes e alimentava cerca de 13 mil lâmpadas. Era o início do sucesso ascendente de uma empresa de electricidade entretanto criada por Thomas Edison e que acabaria por se transformar na gigantesca General Electric.

A inventividade e o espírito empresarial de Thomas Edison foram determinantes para o seu sucesso. Edison nem tinha formação científica. "Era um tecnólogo, não um cientista", afirma o físico Carlos Fiolhais. Chegava aos seus inventos por "engenhoquices", através do método de tentativa e erro. "Hoje isso é quase impossível", diz Fiolhais.

Mas conseguia. Registou mais de mil patentes, de inventos criados por si e pela equipa do seu laboratório ou aperfeiçoados a partir de patentes que comprava a outros inventores.

Foi rápida a aceitação da lâmpada incandescente. Em Lisboa, as lojas da Baixa já tinham luz eléctrica em 1880 - com lâmpadas incandescentes e de arco voltaico. No Teatro S. Carlos, a iluminação a gás deu lugar às novas lâmpadas em 1886. Mais do que um luxo, a luz eléctrica mexeu com a vida quotidiana. "Passámos a ter um tempo extra", diz Maria Paula Diogo. A noite escura e perigosa deu lugar ao que ficou conhecido como a "noite técnica".

Ao longo de 130 anos, a lâmpada em si não mudou muito, salvo alguns aperfeiçoamentos tecnológicos. O filamento de carbono foi substituído por um de tungsténio, que resiste muito mais ao calor. E, ao invés do vácuo, o interior do bolbo passou a ser preenchido com gases inertes.

Mas no formato, na essência e no princípio de funcionamento, a lâmpada que agora começa a despedir-se do mercado é a mesma que Edison trouxe à luz há mais de um século. (...)

Ricardo Garcia

6 comentários:

Sérgio O. Marques disse...

Quem diria que a lâmpada eléctrica já vem dos inícios do século XIX.
Vou começar a comprar lâmpadas de incandescência agora antes que acabem definitivamente. As de baixo consumo dão uma luz meio fosca.

JSA disse...

Uma nota em relação à guerra entre Edison e Tesla, com os métodos pouco ortodoxos (para ser simpático) daquele nã faria mal. Ou, pelo menos, o link para os posts que a Palmira escreveu no passado sobre o assunto.

Carlos Medina Ribeiro disse...

Em Portugal, a substituição vai ser MUITO mais difícil porque, pura e simplesmente, as novas lâmpadas não enroscam nos casquilhos actuais - como se pode comprovar [aqui].

Anónimo disse...

Edison era aquilo que em Portugal se chama um chico esperto trafulha. Explorava brutalmente os seus assalariados, ficava com os créditos das invenções destes como sendo dele, era científicamente ignorante e incompetente e utilizou todo o estilo de truques mesmo muito sujos na guerra do AC vs DC.

Já vai sendo tempo deste tipo de gentalha ocupar o seu devido lugar na história. Pelo menos Tesla era cientificamente competente (com algumas ideias estranhas/erradas). Felizmente foi omenageado com uma unidade e felizmente Edison nenhuma.

A luta entre estes dois homens mostra que para a polulaça o que fica é a escória.

José Gonçalves disse...

E o mercúrio, Senhores!?
Os "ambientalistas" estão "anestesiados"?

José Gonçalves disse...

E ainda os materiais fluorescentes que são bastante indigestos?

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