domingo, 23 de novembro de 2008

A empresa é intrinsecamente amoral?

O assunto da ética nos negócios está em Portugal na ordem do dia. O nosso leitor Filipe J. Sousa, Professor do Departamento de Gestão e Economia da Universidade da Madeira, enviou-nos, com uma introdução, um excerto de uma tradução sua do livro "The Concept of Corporate Strategy" de Kenneth Andrews, famoso professor de Economia de Harvard (na foto), sobre a necessidade de incorporar a ética na estratégia empresarial:

A propósito da recente mediatização de
recorrentes comportamentos éticos impróprios e reprováveis no mundo empresarial, penso ser conveniente revisitar os ensinamentos de Kenneth Andrews (1926-2005) - professor emérito da Harvard Business School e um dos precursores académicos da área da Gestão Estratégica - no seu livro seminal de 1971 sobre a estratégia da empresa, nomeadamente no que concerne ao que a empresa deve fazer (ao invés do que faz de facto).

"O comportamento ético, à semelhança do exercício da preferência [individual], pode ser considerado um produto de valores. (...)

A definição legal e económica do propósito da empresa como a maximização da riqueza do accionista [ou proprietário] leva, todavia de forma indirecta, a conclusões de que o comportamento [humano] que não seja claramente ilegal ou imoral é aceitável - aliás indispensável ao sucesso na competição [inter-empresa]. (...)

A definição da empresa como [entidade] servindo unicamente os interesses financeiros dos accionistas
[ou proprietários] conduz naturalmente à subordinação da preocupação ética ao resultado financeiro. Mas aparte desta histórica má concepção, outras condições da vida empresarial, reprovadas por qualquer estratégia apropriada, tendem a tornar a empresa intrinsecamente amoral. Estas [condições] incluem a necessidade de sucesso sentida por indivíduos ambiciosos e energéticos, o desejo de 'ganhar' que é integral à competição, a tentação de renunciar à 'auto-estrada' em favor dos 'atalhos' [sinuosos], e a pressão das pessoas para atingirem o seu plano [pré-estabelecido] - uma pressão conducente a penalizações no que diz respeito à responsabilidade [da empresa] para com a comunidade envolvente e à sua conduta ética. (...)

Os estrategas [da empresa] necessitam de possuir motivações morais e económicas e competência [funcional]. A estratégia empresarial que governa a postura competitiva desses estrategas inclui a combinação de aspirações pessoais e morais com a escolha de bens e serviços a serem disponibilizados nos mercados em níveis apropriados de qualidade e valor que reflictam o intento ético e moral da empresa.

Por todas estas razões, não é mais possível evitar a discussão em torno das questões éticas. O desconforto e o desentendimento que complicam as conversações [dentro de e entre empresas acerca da ética nos negócios] são apenas um pequeno investimento na capacidade valiosa de reconhecer atempadamente a existência de dilemas éticos [com potenciais consequências nefastas] e de evitar o tipo de escândalo que arruina carreiras profissionais e exacerba a [massiva] crítica pública do mundo empresarial. (...)

Procurar encontrar a moralidade na escolha pode ser o mais extenuante empreendimento no âmbito da decisão estratégica." (Andrews, 1971, pp. 65, 68-9).

1 comentário:

Jorge disse...

Sobre este assunto, ver o que diz a encíclica "Laborem Exercens" (o Exercício do Trabalho) de João Paulo II, sobre a função social da empresa.

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