A leitora Helena Serrão deu voz aqui a uma perplexidade comum quanto à noção de argumento cogente. A perplexidade resulta da curiosa dificuldade que as pessoas têm de separar a verdade do que pensamos que é verdade.
Um argumento é cogente se, e só se, obedece a três condições: é válido, tem premissas verdadeiras e tem premissas mais plausíveis do que a conclusão. Às duas primeiras condições chama-se “solidez”: um argumento é sólido quando é válido e tem premissas verdadeiras. Assim, para ser cogente um argumento tem de ser sólido. Mas para ser sólido tem de ter premissas verdadeiras. Então, pergunta a Helena, para que serve a cogência? Se as premissas já são verdadeiras, para que precisamos de ter premissas mais plausíveis do que a conclusão? Por duas razões.
Primeiro, porque é óbvio que há argumentos sólidos que não são cogentes por serem obviamente maus: “A neve é branca; logo, a neve é branca” é um argumento sólido, mas muito mau. E todos os argumentos circulares, as chamadas falácias da petição de princípio, ou petitio principii, são argumentos válidos, podendo alguns ser sólidos. Mas mesmo assim são maus. Porquê? Porque não desempenham a sua tarefa epistémica de dar razões, a quem não aceita a conclusão, para passar a aceitá-la. Isto acontece porque quem não aceita a conclusão também não aceita a premissa ou premissas, dado que uma delas, ou mais, é igual à conclusão. Portanto, não basta que um argumento seja sólido para ser bom.
Segundo, porque não seria muito avisado defender que um dado argumento é cogente só por ser válido e ter premissas plausíveis, mais plausíveis do que a conclusão, mesmo que o argumento tivesse premissas falsas. O que é mais natural dizer, neste caso, é que pensamos que o argumento é cogente, mas estamos enganados. E estamos enganados porque as premissas são falsas, apesar de nós pensarmos, erradamente, que são verdadeiras. Nós não somos omniscientes. Tanto podemos considerar plausível uma falsidade, como implausível uma verdade; erramos. Mas seria desavisado considerar cogente qualquer argumento que nos pareça ter premissas verdadeiras, mesmo que as não tenha.
Eu explico este aspecto mais pormenorizadamente no livro Pensar Outra Vez. Mas espero que esta breve nota tenha esclarecido a Helena.
Um argumento é cogente se, e só se, obedece a três condições: é válido, tem premissas verdadeiras e tem premissas mais plausíveis do que a conclusão. Às duas primeiras condições chama-se “solidez”: um argumento é sólido quando é válido e tem premissas verdadeiras. Assim, para ser cogente um argumento tem de ser sólido. Mas para ser sólido tem de ter premissas verdadeiras. Então, pergunta a Helena, para que serve a cogência? Se as premissas já são verdadeiras, para que precisamos de ter premissas mais plausíveis do que a conclusão? Por duas razões.
Primeiro, porque é óbvio que há argumentos sólidos que não são cogentes por serem obviamente maus: “A neve é branca; logo, a neve é branca” é um argumento sólido, mas muito mau. E todos os argumentos circulares, as chamadas falácias da petição de princípio, ou petitio principii, são argumentos válidos, podendo alguns ser sólidos. Mas mesmo assim são maus. Porquê? Porque não desempenham a sua tarefa epistémica de dar razões, a quem não aceita a conclusão, para passar a aceitá-la. Isto acontece porque quem não aceita a conclusão também não aceita a premissa ou premissas, dado que uma delas, ou mais, é igual à conclusão. Portanto, não basta que um argumento seja sólido para ser bom.
Segundo, porque não seria muito avisado defender que um dado argumento é cogente só por ser válido e ter premissas plausíveis, mais plausíveis do que a conclusão, mesmo que o argumento tivesse premissas falsas. O que é mais natural dizer, neste caso, é que pensamos que o argumento é cogente, mas estamos enganados. E estamos enganados porque as premissas são falsas, apesar de nós pensarmos, erradamente, que são verdadeiras. Nós não somos omniscientes. Tanto podemos considerar plausível uma falsidade, como implausível uma verdade; erramos. Mas seria desavisado considerar cogente qualquer argumento que nos pareça ter premissas verdadeiras, mesmo que as não tenha.
Eu explico este aspecto mais pormenorizadamente no livro Pensar Outra Vez. Mas espero que esta breve nota tenha esclarecido a Helena.
12 comentários:
Boas,
Quando se fala que "Nós não somos omniscientes", que estaremos a dizer? Primeiramente podemos perguntar de onde podemos saber que fomos buscar esse conceito de omnisciência, pois se realmente não somos omniscientes e usamos esse termo é porque haverá algo que o deve ser. O argumento que diz que "não necessariamente possa existir algo que seja omnisciente, mas podemos falar de omnisciencia" é algo distorcido dado que, se falamos sobre esse conceito, terá de obviamente ser baseado em algo sólido que sustente tal preposição. Ou seja, não nos vamos enganar em relação às premissas, sabemos de onde elas vêem quando realmente as procuramos no lugar certo. Podemos no entanto, enganarmo-nos quando achamos que sejam falsas e portanto, vamos continuar numa busca incessante por algo quando temos à resposta bem frente aos nossos olhos.
Realmente não somos omniscientes, há muita coisas que não conhecemos, mas a questão passar por saber se queremos ser omniscientes aos nossos olhos ou conhecer quem seja omnisciente e ir atrás do seu conhecimento. Quando queremos ser omniscientes aos nossos olhos, podemos facilmente enganarmo-nos pois podemos desenvolver percepções que são plausíveis, mas no entanto, podem não ajudar-nos a entender as questões últimas da vida. Diria que o fim desta tentativa vinda da nossa parte é incluir tudo o que vemos dentro desta perspectiva e mesmo assim acharmos que ainda falta muito para conhecer. É interessante que já muita gente tem feito isso, observando e desenvolvendo conceitos que abarcam muitas percepções do mundo. No entanto, quando passamos à parte prática, ou seja, da sua aplicação, falham redondamente pois as pessoas não vão simplesmente ceder a outras que dizem "saber" sobre tudo. Este tipo de práticas já foram feitas com consequências trágicas e o princípio seja de não repeti-las. Os argumentos usados podem até parecer válidos, as premissas podem ser plausiveis, no entanto, as consequências podem ser trágicas.
Estamos num momento chave da nossa história, muito rapidamente pode surgir alguém que diz ter grandes respostas para este mundo, sim porque já muito foi observado, muito foi investigado e por isso, sobre esses ombros de quem fez essas observações, podemos construir a nossa postura sobre a vida. Falta é saber quantos vão seguir esse tal alguém, e quantos não vão. As consequências dizem não saber. Eu diria, não querem ver, pois como disse, na história abundam exemplos de quem já tentou fazê-lo. Se os argumentos usados são cogentes ou não, pode ser irrelevante, até porque se virmos realmente, muito do que fazemos não é baseado em cogência de argumentos, no entanto, pode-nos servir introduzir conceitos diferentes no sentido de desviar a atenção sobre as verdadeiras questões da vida. Diria que já vi isso acontecer... e sei quais foram as consequências. E não sou omnisciente. Toda a gente já viu também.
Cumprimentos,
Rui
O argumento de que tem de haver seres omniscientes para termos o conceito de omnisciência é inválido, dado que se isso fosse assim também teria de haver quadrados redondos para nós podemos dizer que não somos quadrados redondos.
Quadrados redondos existem na imaginação do homem pois na realidade eles não existem. Agora, quanto à omnisciência, esta não pode vir da sua imaginação dada a limitação inerente do homem. Se o homem fala sobre ela, é porque teve de provir de algum local fora do homem. O homem por si mesmo não pode falar da sua limitação se não souber que algo poderá ser ilimitado. Pode no entanto, não querer reconhecer esse algo ilimitado, e como consequência pode não reconhecer correctamente as suas limitações. Facilmente poderá abusar de si mesmo e dos outros quando não conhecemos os limites e isso também é observável. Uma coisa é certa: o homem nunca poderá saber os limites se não for por alguém que os conheça. Mesmo o mais sábio dos sábios não sabia e só dependendo de quem conhecia é que poderia conhecer.
Para saber que não somos omniscientes não é necessário nada disso. Basta a experência de descobrir que uma coisa que se pensava ser verdade afinal não o é. Basta a experiência de pensar que deixámos as chaves no quarto, e depois descobrir que as deixámos na sala. Nada mais.
Então parece que não conhecemos o significado de omnisciência pois a experiencia de descobrir que uma coisa que se pensava ser verdade afinal não é só mostra que não conhecemos essa coisa que não é verdade, e não tudo. Conhecer tudo não é conhecer alguma coisa, é simplesmente o oposto de não conhecer nada, o que também não acontece com os seres humanos. Conhecemos sempre alguma coisa, mas não conhecemos tudo e nunca poderemos conhecer tudo pois se o fizéssemos, esse algo absoluto deixaria de o ser. Agora, o absoluto pode não ser o que pensamos ser absoluto pois, como não conhecemos ninguém absoluto (no sentido de ter o conhecimento de tudo) por nós mesmos, podemos cair no erro de conhecer alguma coisa e no final até mesmo não conhecer nada. Por nós mesmos, ou seja, o homem por si mesmo não conhece o que é absoluto, por isso pode ter uma ideia errada de si mesmo e do que o rodeia quando tenta descobrir em si mesmo e no que o rodeia a resposta para esta questão. Aqueles que tentam fazer e já observaram muito e investigaram muito acabaram desenvolvendo ideias obscuras e obscurecendo quem os seguia (se realmente tiveram seguidores para as suas ideias). Como cada vez mais essa prática está sendo descartada pelas consequências trágicas que têm (e como disse, há muitos exemplos desse tipo de práticas, mesmo actualmente), talvez seja interessante ver que possamos não estar a tomar o melhor caminho. Afinal de contas, se mudamos de direcção quando não encontramos a chave no quarto mas fomos à procura delas na sala, também podemos querer mudar de direcção no sentido de procurar fora de nós as respostas que não temos.
Quando falo de práticas obscuras falo de práticas que procuram controlar ou aquietar a mente. Este fenómenos crescente da meditação, ou uso de mantras repetitivos é uma prática oculta e é muito perigosa. Pode levar a uma confusão das questões últimas pois no final, procura fundir tudo e dizer que tudo é absoluto. Se realmente nós somos diferentes das chaves que procuramos, por exemplo, então, quando procuramos fundirmo-nos com as chaves, podemos estar a retirar percepções importantes para o nosso bem-estar. Cada vez mais aqueles que dizem conhecer muito sobre alguma coisa, estão mais perto de não conhecer nada pois chega a um ponto em que a mente fica demasiado cheia e a procura vai ser por esvaziá-la. Então procuram essas prácticas ocultas que não fazem mais que enganar as pessoas e pô-las em situações ainda piores.
Realmente não conhecemos muito coisa, mas a práctica de querer conhecer ao buscar dentro de nós (acabando sendo prisioneiros dos nossos pensamentos e ideias... ou dos outros), pode nos levar a tropeçar pois pode ser difícil de parar. Não admira o número de doenças mentais a aumentar... que no entanto, podem não passar de más orientações tomadas. Caminhos há muitos, mas nem todos nos libertam realmente. Caminhos há muitos mas nem todos poderão levar ao conhecimento.
O texto a seguir é um caso sério, mas em certa altura pessoas quase mijam de rir. Talvez seja porque alguns de nós riem para suplantar um problema num difícil momento de sobrevivência.
Trata-se de uma gratidão aos pais valorosos e brilhantes que acionaram os EUA para que seus filhos tivessem liberdade de ter consciência pelo menos na escola.
O Criacionismo na Fidelidade Rigorosa da Bíblia.
O que é intrigante é a posição da Terra em relação ao céu. Parece que o Muito Grande e poderoso sentado no Trono, quando dá uma descarga vem tudo direto pra cabeça de suas igrejas. E quando isso chega, a Terra fica com cheiro não muito bom. Talvez isso explique porque nos sentimos mal quando seus escolhidos superiores passam um mau-hálito quando falam tanto e tão perto de nossos ouvidos.
Parece que somos como que uma espécie de pano-de-chão lá de cima.
Rigorosamente pela escrita nosso pai, na melhor das hipóteses, é um assassino; o outro rapaz era bom; o poderoso não achou bom revivê-lo, e deixou o assassino se dar bem com as cabras. Daí que, uns de nós cismam, com certa razão, que são ovelhas; e os homens já têm assim coceira de chifres desde novos. Nosso avô é um mentiroso; nossa avó andava dando idéia às escondidas pra uma cobra. Como ela já gostava de cobra mentiu também pra ver se conseguia segurar no cipó do nosso avô.
É uma HESTÓRIA linda; e muito criativa; e explica pra nós direitinho nossa condição nesse reino. Pra azar de nosso avõ ele ainda teve também dois filhos, igualzinho ao poderoso Manda-Chuva. Nesse reino existe uma certa aversão por mulheres. E parece que pra piorar os dois playboys sem muito o que fazer em suas vidas eternas, vidraram o olho logo aqui pra esse planeta, com tantos por aí. Talvez seja porque é o único que fica embaixo deles; pois no Universo a idéia de em cima e embaixo é de mero contexto proximal e precisa, no mínimo, de referencial. Mas isso não é pra aqui. Isso é coisa de somenos. Como diria o do curso de mau-hálito.
O problema é que esses dois príncipes encantados parece que são muito espertos, apesar de ter um pai preguiçoso, que depende da gente pra fazer tudo, e só vive sentado e dando descarga, e cisma que temos que ficar gritando e batendo palmas pra ele, pra disfarçar o barulho que faz debaixo do trono; assim ele fica bem na fita. Ele é muito capacitado, por isso manda a gente fazer assim. E nos dá velas e cruzes e uma cartilha grossa que devemos ler todo dia de trás pra frente e de frente pra trás, pra decorarmos a estória desse reino maravilhoso, forte, e conselheiro.
Os príncipes encantados, por serem crias de uma obra perfeita, vivem brigando. Parece que um continua chegado nas cabritas daqui, e o outro se amarrou na idéia de ser suspendido no tronco.
A coisa desandou quando o outro, de sacanagem, chegou pro Tremendo e disse que o principezinho andava se amarrando em preferir só os jumentos; e tava com a idéia fixa de mandar todo mundo se entregar e entrar na onda dele. O negócio ficou feio lá por cima; e o monte de trovão e raio veio bater tudo em cima de quem? Dos filhos das cabras.
Aí é que fica o problema. Porque parece que nenhum dos dois gosta de estudar; mas o pai deles ao invés de resolver a picuinha deles (nessa eternidade), pra nossa sorte manda os dois virem cobrar de nós a leitura da malfadada cartilha.
É uma sina nossa, um karma; que será eterno enquanto dure.
Fim do final.
Tenho este livro e desde já o felicito por tão interessante tema. Tenho bastante gosto por filosofia, tenho alguns livros sobre o assunto.
PS: Tenho tido alguma dificuldade nos comentários
Vou partilhar aqui uma nota com os leitores do blogue, na esperança de que traga alguma claridade sobre esta coisa da argumentação:
Fui ontem a uma pequena palestra com um ilustrador francês e a dada altura o homem pede ao público para definir "desenho". Imediatamente, toda a gente começa a disparar as coisas mais recambolescas, desde variações sobre o tema do "sentido" até à "presença do ausente", etc.
Quando parou o dilúvio de palavreado, o homem voltou-se simplesmente para nós e disse:
"fazer um traço, com um objecto qualquer, numa superfície qualquer".
E eu sorri em silêncio, pensando em um milhão de coisas, naquele momento.
Estas confusões da omnisciência encaixam perfeitamente nesse milhão de exemplos...
Rui, estás quase lá!
Mas lê mais (há mais «pensamento» e conhecimento para além daquele que é impingido nas escolas (da primária à universidade), como sabes; mas, e sobretudo, medita e reflete e deixa fluir o pensamento -- se fores capaz, e isto não é uma ironia, porque como disse Aristóteles «o mais difícil é dominar o pensamento» (tal como dizes: «acabando sendo prisioneiros dos nossos pensamentos e ideias» -- e deixa o troca-tintismo (vulgo «cogentismo») para os que gostam de «folclore mental» (não tenho nada contra...). A filosofia é ser-se, aqui e agora, «si mesmo», ou seja, fazer «tabula rasa» e deixar-se penetrar (numa espécie de catarse) pela energia (positiva, claro) do Universo... e verás que (se o conseguires), a verdade é isso mesmo... tu e o universo ser/es/em UM.
E lembra-te de uma coisa: o conhecimento é uma coisa transitória, efémera (como demonstra a história, máxime da ciência), e a sabedoria é outra coisa...
Agora quanto a omnisciência, a resposta só pode estar dentro de ti (de cada um), porque pensar demais só pode levar ao ruído («nada em demasia, já diziam os gregos) ou em termos populares «pensar duas vezes antes de agir), que talvez seja a versão erudita do Desidério quando se refere a «pensar outra vez» (mas aqui é apenas especulação minha, pois não li o livro).
lol .. quero a ajuda do público
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