Post convidado de Armando Vieira, Professor Coordenador do Instituto Superior de Engenharia do Porto:
O tema da educação é recorrente na comunicação social: baixos salários dos professores, violência, "rankings" de escolas. Acho justificável que se fale de um tema tão importante. Mas o que me preocupa é que se discutam problemas relacionados com a educação sem nunca se falar de educação.
Gostaria que se falasse da qualidade dos manuais escolares, da relevância dos programas escolares arcaicos, mais adaptados à realidade do século XIX do que aos alunos do século XXI. Seria interessante perceber porque se ensinam tantas horas de matemática e os alunos chegam ao ensino superior quase sem saber fazer uma conta de dividir. Poderia ainda ser esclarecedor saber porque não se ensina mais informática nas escolas ou não se realizam trabalhos laboratoriais, essenciais ao desenvolvimento do espírito crítico e de reflexão. Perceber, enfim, porque continuamos na cauda da Europa no que respeita ao desempenho dos alunos em várias matérias e que, por mais invenções que se criem para iludir as estatísticas, o nosso sistema de ensino falha redondamente.
Mas já que estes temas parecem despertar pouco interesse, falemos então do que tem estado na ordem do dia. As escolas estão novamente em guerra, desta vez por causa do processo de avaliação dos professores. Embora partilhe alguma da antipatia dos professores por esta ministra, acho, que desta vez, o problema não é dela. É importante separar o trigo do joio, incentivar os melhores professores e penalizar os piores. É um princípio elementar de justiça.
O problema é quando o Ministério da Educação (ME) tenta passar da teoria à acção. Não é preciso ser muito sábio para avaliar a qualidade de uma padaria, de um banco ou de um hotel, e das pessoas que lá trabalham. Escolhe-se simplesmente aquele que prestar o melhor serviço. Mas parece que o ME tem uma resposta mais completa a este problema. Segundo o ME, estas entidades deviam ser avaliadas preenchendo toneladas de formulários com todo o tipo de questões, desde a pontualidade dos funcionários à cor do seu uniforme. Formulários esses, preenchidos por outros funcionários, que se revezam entre si. Os clientes, esses, não são tidos nem achados no processo. Neste caso, quem decidiria sobre o melhor restaurante do seu bairro seria um imaginário Ministério da Restauração. Talvez a criação desse Ministério fosse uma boa ideia para acabar com uma das poucas coisas boas que ainda nos resta: a comida.
Maria de Lurdes Rodrigues é uma excelente profissional mas uma péssima ministra. Acho que qualquer pessoa, por mais sensata e inteligente que seja, seria sempre um péssimo ministro da educação. Isto porque o maior problema da educação em Portugal é o próprio ME. A educação não se decreta por leis ou regulamentos mas faz-se com empenho e dedicação. É uma tarefa árdua que cabe a todos e que de todos merece um sentimento hoje totalmente alienado do ensino: reconhecimento. Educar constrói-se também de baixo para cima e não só de cima para baixo.
Senhora ministra, deixe os professores fazer o que eles sabem, e querem, fazer: ensinar. Deixe de os tratar como se fossem meninos irresponsáveis e indisciplinados. Em vez de transformar os professores em obedientes funcionários públicos, que passam o dia a preencher papeis, dê-lhes autonomia e espaço para a criatividade. Dê autonomia às escolas e deixe que sejam elas a recrutar e gerir o seu corpo docente. A questão da avaliação do desempenho dos professores fica naturalmente resolvida.
Ao transferir responsabilidades para as escolas e para os pais, conseguiria reduzir para uma décima parte os funcionários da 5 de Outubro e para uma milésima parte as suas dores de cabeça.
Já agora, senhora ministra, em vez de criar guerras desnecessárias canalize as suas energias para fazer uma coisa importantíssima: definir uma estratégia de educação nacional com pés e cabeça, não para um, mas para dez anos.
Armando Vieira
Armando.vieira@kanguru.pt
Professor Coordenador do ISEP
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
A Educação e o seu Mi(ni)stério
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6 comentários:
Ora aí está uma opinião estruturada e com o cerne da questão bem explícito. Andamos às voltas com esta (Des)educação, quando a estrutura dos currículos está desadequada às novas exigências sociais e tecnológicas...enfim...andamos numa espécie de entretaineres...a experimentar modelitos educativos sem rumo e sem nexo...em vez de projectarmos a educação para um futuro..que exige cada vez mais dos nossos jovens...gosto de ser professora, mas começo a ficar farta de tanta incompetência nos rumos deste país.
Há um grande equívoco neste texto -os clientes das escolas não são os alunos, o cliente é o país, que tem interesse e lá põe o dinheiro. Segundo o interesse dos alunos e pais, ficavam melhor classificadas as escolas que facilitassem nas notas, e não as que ensinam melhor! No segundo caso, com exames nacionais ficam avaliados TODOS os intervenientes! O problema é que o ministério não quer avaliar os alunos.
O seu texto fez-me lembrar o discurso neo-liberal que advogava enfaticamente " deixem o mercado funcionar" que ele se auto-regula !
Temos visto o resultado.
Acontece que a menos que defenda a privatização pura e simples de todo o ensino, situação em que a tal "selecção natural" que preconiza poderia ocorrer ( logo se veria com que custos sociais...), não demonstra porque carga de água não deve a entidade patronal ( Estado ) ter a legitimidade de contratar e manter ao seu serviço quem considera mais apto para o mesmo.
No fim, recomenda a transferência de responsabilidades para as escolas, mas passando ao largo do facto de o modelo de avaliação proposto estar precisamente centrado na escola e esse ser o problema de fundo da sua recusa, uma vez que não passa pela cabeça de professores verem a sua ( in)competência escrutinada pelos seus pares.
Conclui sugerindo uma estratégia a dez anos.Ingenuidade ou demagogia ? Compete à ME alterar o ciclo politico ?! Se não, e se é de um pacto de regime que está a falar, não lhe parece que está a enviar a sugestão para o endereço errado ??
Oscar simplesmente genial. Em somente 2 linhas disse tudo. Depois do 25 de Abril a bandalheira foi total. Acabaram os exames acabou a bitola que colocava exigência, rigor e trabalho no sistema. Para mim, neste aspecto, a esquerda é de longe a mais culpada, com as suas histórias da carocinha sobre os pobres e os desfavorecidos, e no final, com tanto dó e peninha, acaba por os castrar.
Um abraço
mnita
Não concordo com a perspectiva do autor.
Quando diz que “Embora partilhe alguma da antipatia dos professores por esta ministra, acho, que desta vez, o problema não é dela”, em minha opinião está errado.
O problema é mesmo dela. Basta ver-lhe o semblante crispado, transpirando raiva, para perceber que a senhora tem um problema sério de intransigência ditatorial.
E se, na origem, o problema não é dela, então é de Sócrates, ou do Governo, mas foi ela que assumiu entusiasticamente a implementação e as consequências de um processo de avaliação enviezado desde o princípio.
Por outro lado, concordo em absoluto com a opinião do leitor Óscar, quando diz que “com exames nacionais ficam avaliados TODOS os intervenientes! O problema é que o ministério não quer avaliar os alunos.” Exactamente.
Já defendi esta ideia, por outras palavras, salientando aquilo que parece óbvio : um sistema de exames nacionais rigorosos não é só um método de avaliação com a objectividade que aquele que está em apreço não tem, mas é também um método eficiente, que se poderia dizer do género “dois em um”, na medida em que tanto avalia os resultados dos alunos como o trabalho dos professores. Melhor será difícil.
O problema do Ministério, da ministra e do governo socialista é que, por algum trauma não sublimado, são alérgicos a exames.
Mas é evidente que a Ministra está a fazer um péssimo trabalho. E nem tem a noção do erro que está a cometer para com o país e depois para com ela própria. E porque não pensa, tem é de ganhar a guerra onde a colocaram, e assim é empurrada politicamente a ter de cumprir, pois é preciso ser vencedora e ser bem vista pelos que lhe vão dando pancadinhas nas costas, assim há que por em prática o que lhe aconselham os seus tais doutos especialistas e em que psicologias das Ciências da Educação, a única autoridade que sabe do que é Educar.
E como diz o autor deste texto e que até concordo: Isto porque o maior problema da educação em Portugal é o próprio ME.
Exacto: Ah, mas não se esqueçam que toda esta azáfama de trabalho acrescido para as Escolas ou para os Professores deve-se ou serve para justificar as novas grandes profissões e em que cientifícas inventividades para o que é Educar (com a mais recente Faculdade da Psicologia e das Ciências da Educação).
E por isso esta enorme loucura à volta do Ensino. Se tudo fosse facilitado, depois como era com esses «grandes e científicos» especialistas das Psicologias e das Ciências da Educação, ficavam no desemprego, era? Não! É que os tempos mudaram e as modas são outras, e agora só estes sabem tudo, sim estão sempre a inventar mais e novos modelos, tem de ser, é preciso competir e ganhar o máximo com todas essas estratégias...
Os professores têm de se começar a habituar que serão cada vez mais umas cobaias nas mãos desses esxperimentalistas das cientificidades do que é Educar e porque, estes são os únicos conselheiros do Ministério da Educação.
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